
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004247-21.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LEILA PAIVA
APELANTE: AROLDO ALVES TEIXEIRA
Advogado do(a) APELANTE: ROBINSON CASTILHO VIEIRA - MS19713-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004247-21.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LEILA PAIVA
APELANTE: AROLDO ALVES TEIXEIRA
Advogado do(a) APELANTE: ROBINSON CASTILHO VIEIRA - MS19713-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
R E L A T Ó R I O
A Senhora Desembargadora Federal Leila Paiva (Relatora):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora em demanda ajuizada em face do Instituto Nacional de Seguro Social (INSS), com pedido de tutela antecipada, objetivando a concessão de benefício assistencial ao deficiente desde a data do indeferido do pedido administrativo, em 13/10/2020 (ID 262336662 - Pág. 104).
O dispositivo da sentença foi assim estabelecido (ID 262336662 - Pág. 276/282):
"Ante o exposto, com fulcro no artigo 487, I, do Código de Processo Civil, resolvo o mérito, julgando improcedente pretensão formulada na inicial. Condeno a parte requerente ao pagamento de honorários advocatícios, os quais estabeleço em 10% sobre o valor atualizado da causa, na forma do artigo 85 do Código de Processo Civil. Porém, suspendo a exigibilidade em razão da concessão da gratuidade judiciária."
Em suas razões recursais, a parte autora alega, em síntese:
a) ser portadora de Doença Grave, CID. 54.5 dores lombares e CID. E039 - Hipotireoidismo não especificado, conforme Laudo Médico, Receituário Médico e Exames anexos, necessitando de medicação controlada, alimentação balanceada e acompanhamento clínico permanente, o que implica na existência de incapacidade para vida independente e ao trabalho, além de haver completado 65 anos no curso do processo;
b) não consegue laborar devido as suas condições sociais e clínicas, assim como não possui condições de prover seu próprio sustento e de sua família, e por não possuir nenhum parente que possa prover sua subsistência;
c) a renda do casal é formada pela pensão por morte auferida pela cônjuge do autor, no valor líquido de R$ 859,00 (em razão de empréstimos) e do benefício AUXÍLIO BRASIL no importe de R$ 400,00 recebido por ele, totalizando uma renda per capita de R$ 629,50, insuficiente para o atendimento de suas necessidades básicas;
d) o critério da renda inferior a 1/4 do salário mínimo é relativo, devendo ser considerados outros fatores na aferição da miserabilidade;
e) deve ser descontado o valor de um salário mínimo auferido pela cônjuge do autor, a título de pensão por morte, no cálculo da renda familiar;
Prequestiona a matéria para futura interposição de recurso às instâncias superiores e, ao final, requer o provimento do recurso, reformando-se in totum a r. sentença.
Sem apresentação de contrarrazões, subiram os autos a esta Corte
Manifesta-se o r. Ministério Público Federal pelo provimento da apelação autoral (ID 263333068 - Pág. 1/8)
É o relatório.
pat
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004247-21.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LEILA PAIVA
APELANTE: AROLDO ALVES TEIXEIRA
Advogado do(a) APELANTE: ROBINSON CASTILHO VIEIRA - MS19713-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
V O T O
A Senhora Desembargadora Federal Leila Paiva (Relatora):
Cinge-se a insurgência recursal à concessão de benefício assistencial ao deficiente, desde o requerimento administrativo, com pedido de tutela antecipada.
O recurso de apelação preenche os requisitos de admissibilidade e merece ser conhecido nos termos em que devolvido, restringindo sua apreciação à matéria impugnada na apelação, em observância ao princípio “tantum devolutum quantum appellatum”.
Benefício de prestação continuada
A Constituição da República (CR) em seu artigo 203, inciso V, prevê o benefício de amparo social no valor de um salário-mínimo, nos seguintes termos, in verbis:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
(...) V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
A Lei n. 8.742, de 07/12/1993, denominada Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), deu eficácia às normas constitucionais criando o benefício de prestação continuada (BPC), também denominado benefício assistencial, na forma de seu artigo 20, in verbis:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei n. 12.435, de 2011) (Vide Lei n. 13.985, de 2020)
A LOAS está regulamentada, atualmente, pelo Decreto n. 6.214, de 26/09/2007.
Dos requisitos ao benefício assistencial
O artigo 20 da LOAS e o artigo 1º de seu decreto regulamentar estabelecem que são requisitos à concessão do amparo assistencial, a comprovação: (1) alternativamente, ser idoso com idade igual ou superior a 65 anos ou ser pessoa com deficiência; e (2) estar em situação de hipossuficiência econômica (miserabilidade), que se caracteriza pela ausência de condições para prover a própria subsistência ou tê-la provida por família.
1. Dos beneficiários
O benefício assistencial é devido a “brasileiros natos, naturalizados e estrangeiros residentes no País, atendidos os requisitos constitucionais e legais”, conforme foi pacificado pelo Colendo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do RE n. 587.970, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO, com repercussão geral, (Tribunal Pleno, j. 20/04/2017, publ. 22-09-2017).
Anote-se, ainda, que a concessão, a manutenção e a revisão do benefício assistencial depende da regularidade das inscrições no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) e no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico), consoante previsto em regulamento (§ 12 do art. 20 da LOAS, incluído pela Lei n. 13.846, de 18/06/2019).
Da qualidade de idoso
A pessoa idosa é considerada aquela com idade mínima de 65 anos, conforme o artigo 34 da Lei n. 10.741, de 01/10/2003 (Estatuto do Idoso).
Da qualidade de pessoa com deficiência
A pessoa com deficiência, segundo o artigo 20, § 2º, da LOAS, é aquela que tem “impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas”, conforme a redação dada pela Lei n. 13.146, de 06/07/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência).
Ressalte-se que o impedimento de longo prazo é aquele que produz efeitos pelo prazo mínimo de dois anos, na forma do artigo 20, § 10º, da LOAS, incluído pela Lei n. 12.470, de 31/08/2011. Ainda, “para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada, o conceito de pessoa com deficiência, que não se confunde necessariamente com situação de incapacidade laborativa, exige a configuração de impedimento de longo prazo com duração mínima de 2 (dois) anos, a ser aferido no caso concreto, desde o início do impedimento até a data prevista para a sua cessação”, esse é o teor da Súmula 48 da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU). (Redação alterada na sessão de 25/04/2019).
Esse tema foi enfrentado por esta Egrégia Décima Turma conforme o excerto da ementa que ora trazemos à colação:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. DEFICIÊNCIA. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. REQUISITOS PREENCHIDOS. TERMO INICIAL MANTIDO. CONSECTÁRIOS LEGAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. POSSIBILIDADE DE FIXAÇÃO DE MULTA DIÁRIA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA EM CASO DE ATRASO NO CUMPRIMENTO DE DECISÃO JUDICIAL. PRAZO EXÍGUO PARA IMPLANTAÇÃO DE BENEFÍCIO. AMPLIAÇÃO.
1. O benefício assistencial de prestação continuada ou amparo social encontra assento no art. 203, V, da Constituição Federal, tendo por objetivo primordial a garantia de renda à pessoa deficiente e ao idoso com idade igual ou superior a 65 (sessenta e cinco anos) em estado de carência dos recursos indispensáveis à satisfação de suas necessidades elementares, bem assim de condições de tê-las providas pela família.
2. Segundo a Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência) "para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas". De acordo com a referida lei, entende-se por longo prazo o impedimento cujos efeitos perduram pelo prazo mínimo de 02 (dois) anos.
3. Consoante perícia médica produzida é possível concluir que o estado clínico da parte autora implica a existência de impedimento de longo prazo, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, poderia obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, devendo, assim, ser considerada pessoa com deficiência para os efeitos legais.
(...)
(TRF 3ª Região, 10ª Turma, APELAÇÃO CÍVEL - 0010184-23.2011.4.03.6139, Rel. Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR, julgado em 30/11/2021, Intimação via sistema DATA: 03/12/2021)
2. Da situação de hipossuficiência econômica
Do núcleo familiar
O conceito de família para fins de obtenção do BPC está contido no artigo 20, § 1º, in verbis:
Art. 20 (...)§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei n. 12.435, de 2011)
Cabe anotar que a evolução do conceito de família, para fins de se avaliar a hipossuficiência econômica, passou pela unidade mononuclear sob o mesmo teto (redação original da LOAS); depois alcançou o conjunto de pessoas elencadas no artigo 16 da Lei n. 8.213, de 24/07/1991, desde que vivessem sob o mesmo teto (MP n. 1.473-34, de 11/08/1997, convertida na Lei n. 9.720, de 30/11/1998).
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. LEI 8.742/1993. CONCEITO DE FAMÍLIA PARA AFERIÇÃO DA RENDA PER CAPITA. EXCLUSÃO DA RENDA DO FILHO CASADO. APLICAÇÃO DO ARTIGO 20, § 1o. DA LEI 12.435/2011 (LOAS). AGRAVO INTERNO DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. A Constituição Federal prevê, em seu art. 203, caput e inciso V, a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
2. A Lei 12.435/2011 alterou o § 1o. do art. 20 da LOAS, determinando que § 1º Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
3. O critério da família reside no estado civil, vez que as pessoas que possuírem vínculo matrimonial ou de união estável fazem parte de outro grupo familiar, e seus rendimentos são direcionados a este, mesmo que resida sobre o mesmo teto, para efeito de aferição da renda mensal per capita nos termos da Lei.
4. Agravo Interno do INSS a que se nega provimento.
(STJ, AgInt REsp 1.718.668/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, DJe de 26/03/2019).
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL.RENDA MENSAL PER CAPITA.CONCEITO DE FAMÍLIA. ART. 20, § 1º, DA LEI N. 8.742/93, ALTERADO PELA LEI N. 12.435/2011. PRECEDENTES. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
I - Na origem, cuida-se de ação ajuizada em desfavor do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS objetivando a concessão do benefício da assistência social à pessoa com deficiência. Foram interpostos recursos especiais pelo beneficiário e pelo Ministério Público Federal.
II - O Tribunal de origem negou o benefício assistencial pleiteado por entender que a renda mensal, proveniente da aposentadoria por invalidez do cunhado e do salário do sobrinho da parte autora, é suficiente para prover o seu sustento, afastando, assim, a condição de miserabilidade.
III - O conceito de renda mensal da família contido na Lei n. 8.472/1991 deve ser aferido levando-se em consideração a renda das pessoas do grupo familiar indicado no § 1º do citado art. 20 que compartilhem a moradia com aquele que esteja sob vulnerabilidade social (idoso, com 65 anos ou mais, ou pessoa com deficiência), qual seja: '[...] o requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto'.
IV - Portanto, entende-se que 'são excluídas desse conceito as rendas das pessoas que não habitem sob o mesmo teto daquele que requer o benefício social de prestação continuada e das pessoas que com ele coabitem, mas que não sejam responsáveis por sua manutenção socioeconômica'.
(REsp n. 1.538.828/SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, Primeira Turma, julgado em 17/10/2017, DJe 27/10/2017.)
Da composição da renda
O cômputo da renda para fins de aferição da situação de hipossuficiência não pode indicar outros benefícios sociais, segundo o que foi preconizado pelo artigo 20, § 4º, da LOAS, in verbis:
Art. 20 (...)§ 4º O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória. (Redação dada pela Lei n. 12.435, de 2011)
Essa regra, no entanto, foi alterada pelo parágrafo único do artigo 34 da Lei n. 10.741, de 01/10/2003, o Estatuto do Idoso, que excluiu do cômputo da renda familiar o benefício assistencial concedido a qualquer membro da família idoso.
Verificada a ocorrência de discriminação quanto ao cálculo da renda para fins de portadores de deficiência, que não tinham sido contemplados, o C. STF decretou, no julgamento do RE 580.963/PR, Rel. Ministro GILMAR MENDES, a inconstitucionalidade por omissão parcial da referida norma, sem pronúncia de nulidade. Eis o excerto da ementa que trago à colação, in verbis:
(...) 4. A inconstitucionalidade por omissão parcial do art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/2003. O Estatuto do Idoso dispõe, no art. 34, parágrafo único, que o benefício assistencial já concedido a qualquer membro da família não será computado para fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS. Não exclusão dos benefícios assistenciais recebidos por deficientes e de previdenciários, no valor de até um salário mínimo, percebido por idosos. Inexistência de justificativa plausível para discriminação dos portadores de deficiência em relação aos idosos, bem como dos idosos beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de benefícios previdenciários no valor de até um salário mínimo. Omissão parcial inconstitucional. 5. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/2003. 6. Recurso extraordinário a que se nega provimento.
(RE 580963, Relator Ministro GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 18/04/2013, Processo Eletrônico Repercussão Geral – Mérito, publ. 14/11/2013)
Nessa linha de intelecção, o C. STJ assentou, no julgamento do REsp 1.355.052, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, o teor do Tema 640/STJ: “Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93”, (j. 25/02/2015, DJe 05/11/2015, transitado em 16/12/2015).
Atualmente, perdeu o sentido a discussão acerca da aplicação do artigo 34 do Estatuto do Idoso para fins da composição da renda, porquanto a Lei n. 13.982, de 02/04/2020, incluiu o § 14 ao artigo 20 da LOAS, prevendo expressamente a exclusão de benefício assistencial ou previdenciário de um salário-mínimo na composição da renda para fins de concessão de BPC. Eis o teor in verbis:
Art. 20 (...)§ 14. O benefício de prestação continuada ou o benefício previdenciário no valor de até 1 (um) salário-mínimo concedido a idoso acima de 65 (sessenta e cinco) anos de idade ou pessoa com deficiência não será computado, para fins de concessão do benefício de prestação continuada a outro idoso ou pessoa com deficiência da mesma família, no cálculo da renda a que se refere o § 3º deste artigo.
Portanto, conforme o entendimento jurisprudencial firmado pelas Cortes Superiores, recente positivado pelo legislador, deve ser excluído do cômputo da renda per capita o valor proveniente de benefício assistencial ou previdenciário no valor de até um salário-mínimo, recebido por idoso ou pessoa com deficiência, pertencente ao núcleo familiar.
Da condição de miserabilidade
A definição legal de hipossuficiência, para fins de concessão do BPC, foi também marcada por discussões que conduziram à evolução legislativa e jurisprudencial.
Diversas alterações legais foram verificadas quanto à fixação da renda mensal per capta máxima, inicialmente, na dicção originária do § 3º do artigo 20 da LOAS, era exigida a renda inferior a ¼ (um quarto) do salário-mínimo.
Na esfera judicial, esse parâmetro foi confrontado por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade ADI 1.232-1/DF, a qual foi julgada improcedente pelo Colendo Supremo Tribunal Federal, que declarou a constitucionalidade do § 3º do artigo 20 da Lei n. 8.742/1993. (ADI 1232, Relator p/ Acórdão: Min. NELSON JOBIM, Tribunal Pleno, j. 27/08/1998).
Entretanto, diversas leis editadas posteriormente fixaram parâmetros mais favoráveis, conduzindo à conclusão lógica no sentido de que o Poder Legislativo havia suplantado o limite de um quarto do salário-mínimo, permeando, assim, a análise judicial dos pedidos pela interpretação sistemática, para fins de observar a ordem jurídica como um todo coeso.
Nessa senda, o Colendo STJ pacificou o entendimento quanto à possibilidade de admitir distintos parâmetros para aferição da condição de miserabilidade, cristalizando o Tema 185/STJ: “A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo”. (REsp 1.112.557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Terceira Seção, j. 28/10/2009, transitado em julgado em 21/03/2014).
A persistência dos debates conduziu o Colendo STF a declarar a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º do artigo 20 da LOAS, no julgamento do RE 567.985, sob os auspícios da repercussão geral, cuja excerto da ementa pedimos licença para transcrever:
3. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993. A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS. Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se contornar o critério objetivo e único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias com entes idosos ou deficientes. Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a Municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade dos critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro).
4. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993.
5. Recurso extraordinário a que se nega provimento.
(RE 567.985, Relator p/ Acórdão Ministro GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, j. 18/04/2013, publ. 03/10/2013)
O precedente emanado ensejou a tese do Tema 27/STF:“É inconstitucional o § 3º do artigo 20 da Lei 8.742/1993, que estabelece a renda familiar mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo como requisito obrigatório para concessão do benefício assistencial de prestação continuada previsto no artigo 203, V, da Constituição”.
Prosseguindo, novas alterações do artigo 20 da LOAS foram verificadas. A Lei n. 13.981, de 23/03/2020, majorou o critério objetivo para 1/2 (meio) salário-mínimo. Todavia, teve a sua eficácia suspensa pelo C. STF, por liminar concedida na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 662. A Lei n. 13.982, de 02/04/2020, alterando novamente o § 3º do artigo 20 da LOAS, fez retornar a sua redação original.
A Lei n. 13.146, de 06/07/2015, incluiu o § 11 ao artigo 20 da Lei n. 8.742/1993, possibilitando a utilização de outros parâmetros aptos à avaliação da renda per capta familiar e, consequentemente, da miserabilidade. Eis o teor da norma inserta:
Art. 20 (...) § 11. Para concessão do benefício de que trata o caput deste artigo, poderão ser utilizados outros elementos probatórios da condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade, conforme regulamento.
Além disso, em complemento à definição dos critérios de concessão do benefício assistencial, a Lei n. 14.176, de 22/06/2021, acrescentou o § 11-A ao artigo 20 da Lei n. 8.742/1993, concedendo expressamente licença normativa ao regulamento para fins de ampliar o limite da renda per capta até ½ (meio) salário-mínimo, in verbis:
Art. 20 (...) § 11-A. O regulamento de que trata o § 11 deste artigo poderá ampliar o limite de renda mensal familiar per capita previsto no § 3º deste artigo para até 1/2 (meio) salário-mínimo, observado o disposto no art. 20-B desta Lei. (Incluído pela Lei nº 14.176, de 2021).
Nesse diapasão, superada está a questão relacionada à limitação do critério de avaliação socioeconômica, cuja ampliação ao limite de ½ (meio) salário-mínimo encontra supedâneo legal.
Dos elementos probatórios
O artigo 20-B da LOAS, incluído pela Lei n. 14.176, de 22/06/2021, estabeleceu que para ampliação do critério de aferição da renda familiar mensal per capita, prevista no § 11 do mesmo artigo, devem ser avaliados outros elementos probatórios da condição de miserabilidade e da situação de vulnerabilidade. São eles:
I – o grau da deficiência;
II – a dependência de terceiros para o desempenho de atividades básicas da vida diária; e.
III – o comprometimento do orçamento do núcleo familiar de que trata o § 3º do art. 20 desta Lei exclusivamente com gastos médicos, com tratamentos de saúde, com fraldas, com alimentos especiais e com medicamentos do idoso ou da pessoa com deficiência não disponibilizados gratuitamente pelo SUS, ou com serviços não prestados pelo Suas, desde que comprovadamente necessários à preservação da saúde e da vida.
O exame da condição da pessoa com deficiência e do grau de impedimento está a cargo do Instituto Nacional de Seguro Social (INSS), por meio de perícia médica e social, observando-se, inclusive, a avaliação biopsicossocial, nos termos do artigo 2º, §§ 1º e 2º, da Lei n. 13.146, de 06/07/2015, o Estatuto da Pessoa com Deficiência, bem assim do artigo 20, § 6º, e 20-B, § 3º, e 40-B da LOAS.
Ainda quanto aos gastos familiares, o comprometimento do orçamento do núcleo familiar será definido em ato normativo conjunto do Ministério da Cidadania, da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia e do INSS, a partir de valores médios dos gastos realizados pelas famílias, facultando-se ao interessado a possibilidade de comprovação de que os gastos efetivos ultrapassam os valores médios, conforme dispõe o artigo 20-B, § 4º, da LOAS.
Da data do início do benefício (DIB)
No que diz respeito à data de início do benefício (DIB), é cediço que a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento no sentido de que a implantação do benefício tem como termo inicial a data do requerimento administrativo.
Neste sentido:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL AO DEFICIENTE. TERMO INICIAL. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. ENTENDIMENTO PACÍFICO DO STJ.
1. Cuida-se de inconformismo com acórdão do Tribunal de origem que entendeu devida a concessão do benefício assistencial ao deficiente, considerando como termo inicial o requerimento administrativo.
2. É assente o entendimento do STJ no sentido de que, na existência de requerimento administrativo, este deve ser o marco inicial para o pagamento do benefício discutido, sendo irrelevante que tenha a comprovação da implementação dos requisitos se verificado apenas em âmbito judicial.
3. A propósito: "Nos termos da jurisprudência do STJ, o benefício previdenciário de cunho acidental ou o decorrente de invalidez deve ser concedido a partir do requerimento administrativo e, na sua ausência, a partir da citação. A fixação do termo a quo a partir da juntada do laudo em juízo estimula o enriquecimento ilícito do INSS, visto que o benefício é devido justamente em razão de incapacidade anterior à própria ação judicial." (REsp 1.411.921/SC, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 15/10/2013, DJe 25/10/2013). No mesmo sentido: AgInt no REsp 1.611.325/RN, Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe 24/03/2017; AgInt no REsp 1.601.268/SP, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 30/6/2016; AgInt no REsp 1.790.912/PR, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 17/10/2019. REsp 1.731.956/PE, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 29/5/2018.
4. Recurso Especial não provido.
(REsp 1851145/SE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/02/2020, DJe 13/05/2020)
PREVIDENCIÁRIO. APLICABILIDADE DO ART. 557 DO CPC. ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVISTO NO ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. TERMO INICIAL. DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO QUANDO JÁ PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
I - O presente feito decorre de ação de concessão de benefício de prestação continuada objetivando a concessão do benefício previsto no art. 203, V, da Constituição Federal de 1988, sob o fundamento de ser pessoa portadora de deficiência e não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. Na sentença, julgou-se improcedente o pedido. No Tribunal Regional Federal da 3ª Região, a sentença foi reformada.
II - Esta Corte consolidou o entendimento de que havendo requerimento administrativo, como no caso, este é o marco inicial dos efeitos financeiros do benefício assistencial. Nesse sentido: REsp n. 1610554/SP, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 18/4/2017, DJe 2/5/2017; REsp n. 1615494/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 1/9/2016, DJe 6/10/2016 e Pet n. 9.582/RS, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Seção, julgado em 26/8/2015, DJe 16/9/2015.
III - Correta, portanto, a decisão que deu provimento ao recurso especial do Ministério Público Federal.
IV - Agravo interno improvido.
(AgInt no REsp 1662313/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/03/2019, DJe 27/03/2019)
Entretanto, tendo sido indeferido o pedido pelo INSS, a revisão do ato administrativo está sujeita à prescrição quinquenal:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. VIOLAÇÃO DO ART. 1.022, II, DO CPC/2015. ALEGAÇÕES GENÉRICAS. SÚMULA N. 284/STF. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. RETROAÇÃO AO PRIMEIRO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. IMPOSSIBILIDADE. TRANSCORRIDOS MAIS DE CINCO ANOS ENTRE O INDEFERIMENTO ADMINISTRATIVO E O AJUIZAMENTO DA AÇÃO. PRECEDENTES.
(...)
II - Acórdão regional em conformidade com o entendimento jurisprudencial desta Corte no sentido de que o termo inicial do benefício assistencial de prestação continuada, previsto no art. 20 da Lei n. 8.742/93, é a data do requerimento administrativo, e, na ausência deste, da data da citação.
III - Hipótese que a parte recorrente objetiva a retroação do benefício desde o primeiro requerimento administrativo, o que não é possível, visto que, conforme entendimento jurisprudencial desta Corte, entende-se que a revisão do ato administrativo que indeferiu o benefício assistencial está sujeita à prescrição quinquenal prevista no art. 1º do Decreto n. 20.910/32. Precedentes: AgRg no REsp 1576098/DF, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 1/3/2016, DJe 8/3/2016; e REsp 1731956/PE, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 22/5/2018, DJe 29/5/2018.
IV - No caso dos autos, a presente ação foi ajuizada, em 19/8/2012, após o decurso do prazo prescricional de cinco anos a contar do primeiro requerimento administrativo, formulado em 5/4/2007, o que torna inviável a retroação do benefício a essa data.
V - Recurso especial improvido.
(REsp 1746544/RJ, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/02/2019, DJe 14/02/2019)
DO CASO CONCRETO
Trata-se de pedido de concessão de benefício assistencial ao deficiente.
Da análise da perícia médica realizada em 18/06/2021, observa-se que o autor, nascido em 24/05/1956, contava com 65 anos de idade, estudou até a 1ª série do ensino fundamental, trabalhador rural e ajudante de serraria, alegou ser portador de dor lombar e problema na tireóide, patologias que o incapacitam para o trabalho.
O perito médico trouxe as seguintes conclusões (ID 262336662 - Pág. 233/243):
"Histórico da Moléstia Alegada:
Não trouxe relatórios ou exames médicos.
Requerente refere que não consegue trabalhar porque sente dores nos joelhos e na coluna lombar.
Não faz acompanhamento com ortopedista e não procurou atendimento médico para essas queixas.
Refere que faz acompanhamento na UBS por “ problema na tireoide “.
Mora em casa própria sozinho. Tem 5 filhos. Refere que vive da ajuda dos filhos e de alguns bicos que realiza. Refere que recebe auxilio de 150 do governo.
III - EXAME FÍSICO GERAL
Não evidenciado alterações psíquicas relevantes no Reclamante.
IV - EXAME ESPECIAL
Coluna
- Equilíbrio preservado.
- Pescoço com movimentos de flexão, extensão, rotação lateral preservados
- Coluna lombar sem desvios e sem contraturas paravertebrais
- Movimento de flexão, extensão e rotação de tronco preservados.
- Tireoide: normopalpável, com dimensões de 1 polpa digital, sem sinais de bócio.
Com exceção das queixas relativas às alegadas moléstias acima apuradas, todas as indagações foram negativas no que concerne aos outros sistemas orgânicos.
V – EXAMES, PARECERES, RELATÓRIOS E OU ANÁLISES COMPLEMENTARES
Não trouxe relatórios ou exames médicos."
Em resposta aos quesitos do Juízo e das partes, o perito atestou:
1. Queixa o periciando apresenta no ato da perícia?
R.: Dor lombar e problema na tireoide.
2. Doença, lesão ou deficiência diagnosticada por ocasião da perícia (com CID)?
R.: Não foi constatada doença, lesão ou deficiência por ocasião da perícia.
15. O periciando está realizando tratamento? Qual a previsão de duração do tratamento? Há previsão ou foi realizado tratamento cirúrgico? O tratamento é oferecido pelo SUS?
R.: Requerente não trouxe e não constam no processo receitas médicas, relatório médicos ou exames recentes.
Quesito do INSS
5. Na perícia médica realizada na parte autora (periciado), foram constatados impedimentos de natureza física, mental, intelectual ou sensorial? Quais seriam estes impedimentos nas Estruturas do Corpo e os qualificadores de intensidade atribuídos a eles, no respectivo domínio da CIF?
R: Não foram constatados impedimentos de natureza física, mental, intelectual ou sensorial nesse ato médico pericial."
É assente que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, nos termos do artigo 479 do CPC, devendo sopesar todos os elementos constantes dos autos para formar sua convicção.
Em que pese o laudo médico pericial tenha concluído pelo não enquadramento na condição de deficiente, o conjunto probatório dos autos apontam de forma consistente para o cumprimento do requisito em questão.
Vejamos.
Consta do Relatório médico emitido em 18/08/2020 (ID 262336662 - Pág. 159):
"Atesto para os devidos fins que o paciente, o Sr. Aroldo Alves Teixeira, de 64 anos de idade, foi por mim examinado nesta data, é acompanhado pela Unidade de Estratégia de Saúde da Família - ESF Piravevê , é portador de transtorno da tireoide com formação de bocio em fase inicial, o mesmo apresenta quadro de cervicalgia, lombalgia com irradiação aos membros inferiores, alterações em coluna vertebral diagnosticada através de exames radiográficos. Faz uso do seguinte medicamento continuo: Levoid 50 mcg - 01 comp ao dia.
Trata-se de pessoa idosa com doença crônica e alteraçoes ósseas e articulares, por esta razão encontra-se impossibilitado de realizar funçoes laborais e/ou proÍissionais em caráter definitivo. Encaminho para avaliação junto ao INSS.
GID: I10 / M54.5 1M54.2/ E039 / M54.3"
Outrossim, o Relatório médico emitido em 05/12/2018 (ID 262336662 - Pág. 144) atesta:
“Tireoidite, com formação de bócio em fase inicial, o mesmo apresenta inapetência, além de apresentar cervicalgia, lombalgia, com alterações em coluna vertebral diagnosticas através de exames radiográficos. Faz uso de medicação contínua: Puran T4 50 mg, 01 comp/dia” Por esta razão encontra-se impossibilitado de realizar suas funções laborais e/ou profissionais. Solicito avaliação junto ao INSS. CID: M54.5 / E039” (ID 260748520 – pág. 23 – grifo meu)."
Corrobora a conclusão pela condição de deficiente do autor a manifestação Ministerial do Parquet Federal, da qual se extrai o seguinte excerto (ID 263333068):
"(...) Outrossim, e sem prejuízo do retro exposto, há que se destacar que a médica perita do Juízo elaborou o laudo médico sem analisar o exame radiográfico ou outros exames médicos, conforme relatado no laudo (ID 262336662 – pág. 236).
Desta forma, sem analisar exames radiográficos, a médica perita do Juízo não verificou as condições da coluna vertebral do autor, e portanto não pôde identificar as questões descritas na inicial, nem a capacidade laboral do autor. Assim sendo, o laudo pericial médico (ID 262336662 – pág. 233/243) é inconclusivo e diverge dos elementos de prova juntados aos autos, demonstrando-se insuficiente para atender aos objetivos da realização da perícia médica judicial.
Em caso assemelhado, essa Colenda 10ª Turma decidiu que o julgador não está adstrito apenas à prova pericial, podendo valer-se de outros indicadores para a análise do
caso concreto (...)
Cumpre evidenciar, ainda, que além do requisito da deficiência restar cabalmente comprovado, o autor atingiu o requisito etário em 24/05/2021, eis que nascido em 24/05/1956 (ID 262336662 – pág. 15)."
Dessa forma, exsurge evidente a deficiência para fins assistenciais, nos termos do artigo 20, § 2º, da LOAS.
Ademais, o autor implementou o requisito etário no curso do processo, ao completar 65 anos de idade em 24/05/2021.
No que tange à hipossuficiência econômica, o estudo social, realizado em 08/12/2021, trouxe as seguintes constatações (ID 262336662 - Pág. 254/256):
I - O núcleo familiar é composto pelo autor, viúvo, de 65 anos de idade, e sua companheira, viúva, de 61 anos de idade, com quem reside há 2 anos em imóvel próprio, situado em terreno não legalizado pelo INCRA, pois pertencia a um antigo acampamento. A casa é edificada em alvenaria, sem forro e sem pintura. Composto de dois quartos, sala, cozinha e 02 banheiros, conta na parte interna com móveis básicos. A geladeira e fogão foram adquiridos recentemente com o auxílio emergencial. Na data da visita, o imóvel passava por reformas (colocação de cerâmica no piso e no banheiro). A obra estava sendo realizada por um dos filhos do autor, Sr. Rogério Rodrigues da Silva. O material foi adquirido com o auxílio emergencial e empréstimo contraído pela Sra. Edna.
II - A renda familiar em 2020/2022 foi composta pelo auxílio emergencial do governo federal. Atualmente é formada pelo Auxílio Brasil no valor de R$ 400,00 e pela pensão por morte auferida pela companheira do autor, no valor de um salário mínimo mensal (R$ 1.045,00 em 2020 e R$ 1.100,00 em 2021). Dessa pensão, é descontado o valor de um empréstimo para a reforma da residência, restando líquido o valor de R$ 859,00 mensais.
III - As despesas declaradas somam: R$ 100,00 com o fornecimento de energia e água; R$ 100,00 com gás e R$ 500,00 com alimentação.
IV - Concluiu a assistente social que o benefício possibilitará a manutenção deste estilo de vida saudável para o casal.
Na presente hipótese, considerando-se a renda mensal declarada, exsurge que a família sobrevive com a renda per capta de meio salário mínimo, o que caracteriza a condição de hipossuficiência econômica e vulnerabilidade social.
Destarte, diante do conteúdo probatório dos autos, evidenciam-se preenchidos os requisitos legais necessários à concessão do benefício assistencial.
De acordo com os elementos probatórios, o termo inicial do benefício assistencial deve ser fixado na data do requerimento administrativo, em 13/10/2020 (ID 262336662 - Pág. 191), porque nessa data já se apresentam elementos suficientes à demonstração do direito à percepção do benefício assistencial.
As prestações vencidas deverão ser corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora.
Ajuizada a presente ação em 03/11/2020, decorrido menos de 05 (cinco) da data do indeferimento administrativo, em 13/10/2020 (ID 262336662 - Pág. 104), inocorrente, in casu, a prescrição quinquenal.
Atente-se que os valores pagos, na via administrativa ou por força de decisão judicial, a título de benefícios inacumuláveis no período, deverão ser integralmente abatidos do débito.
Finalmente, quanto ao eventual prequestionamento suscitado, assinalo não haver qualquer infringência à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Custas e despesas processuais
A Autarquia Previdenciária é isenta do pagamento de custas e emolumentos no âmbito da Justiça Federal e nas ações processadas perante a Justiça Estadual de São Paulo, por força do artigo 4º, I, da Lei Federal n. 9.289/1996, e do artigo 6º da Lei Estadual paulista n. 11.608/2003.
A isenção, por sua vez, não a exime do reembolso das despesas judiciais eventualmente recolhidas pela parte vencedora, desde que devidamente comprovada nos autos, consoante o parágrafo único do referido artigo 4º da Lei n. 9.289/1996.
Quanto às demandas aforadas no Estado de Mato Grosso do Sul, a isenção prevista nas Leis Estaduais sul-mato-grossenses ns. 1.135/1991 e 1.936/1998 foi revogada pela Lei Estadual n. 3.779/2009 (art. 24, §§ 1º e 2º), razão pela qual cabe ao INSS o ônus do pagamento das custas processuais naquele Estado.
Por fim, caberá à parte vencida arcar com as despesas processuais e as custas somente ao final, na forma do artigo 91 do CPC.
Consectários legais
A correção monetária e os juros de mora incidirão conforme a legislação de regência, observando-se os critérios preconizados pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal.
Quanto aos juros, destaque-se que são devidos até a data da expedição do ofício precatório ou da requisição de pequeno valor (RPV), conforme o Tema 96/STF, cristalizado pelo C. STF no julgamento do RE n. 579.431, observando-se, a partir de então, o teor da Súmula Vinculante 17/STF.
Dos honorários advocatícios
Em razão da sucumbência, condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios fixados em patamar mínimo sobre o valor da condenação, observadas as normas do artigo 85, §§ 3º e 5º, do CPC.
Os honorários advocatícios, conforme a Súmula 111 do C. STJ, incidem sobre as parcelas vencidas até a sentença de procedência; porém, tendo em vista que a pretensão da requerente apenas foi deferida nesta sede recursal, a condenação da verba honorária incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da presente decisão.
Da tutela antecipada
Consoante o entendimento desta E. Décima Turma, cabe a concessão da tutela antes do trânsito em julgado do acórdão. Precedentes: AC 5045516-79.2018.4.03.9999, AC 5290088-68.2020.4.03.9999, AC 5147690-98.2020.4.03.9999 e AC 5001378-27.2018.4.03.9999.
Concedo a antecipação da tutela, com fundamento nos artigos 300, ‘caput’, 302, e, 536, ‘caput’ e 537 e parágrafos, todos do CPC, a fim de determinar ao INSS imediata implantação da benesse aqui deferida, em face do caráter alimentar do benefício.
Determino a remessa desta decisão à D. Autoridade Administrativa por meio eletrônico, para cumprimento da ordem judicial no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias, sobre pena de multa diária, a ser oportunamente fixada na hipótese de descumprimento.
Benefício: Benefício assistencial
DIB:13/10/2020 (DER)
Comunique-se ao INSS.
Na hipótese da necessidade de outras medidas executivas, estas devem ser requeridas perante o r. Juízo de origem, competente para tanto, ainda que o processo esteja nesta instância.
Dispositivo
Ante o exposto, dou provimento à apelação da parte autora.
É o voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. LOAS. DEFICIENTE. DEFICIÊNCIA E MISERABILIDADE CONFIGURADAS. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. DEVIDA A CONCESSÃO DO AMPARO ASSISTENCIAL.
- O benefício de prestação continuada, previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição da República Federativa do Brasil, consiste na “garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família” (artigo 20, 'caput', da Lei n. 8.742/1993).
- É assente que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, nos termos do artigo 479 do CPC, devendo sopesar todos os elementos constantes dos autos para formar sua convicção.
- No que tange ao requisito da deficiência, em que pese o laudo médico pericial tenha concluído pelo não enquadramento na condição de deficiente, o conjunto probatório dos autos aponta de forma consistente para o cumprimento do requisito em questão.
- Quanto à hipossuficiência econômica, conforme constou no estudo social, o núcleo familiar sobrevive de forma modesta, com uma renda familiar per capita inferior a meio salário mínimo vigente à época, o que caracteriza a condição de hipossuficiência econômica e vulnerabilidade social.
- Presentes os requisitos estabelecidos no artigo 20 da Lei n. 8.742/1993, é devido o benefício assistencial.
- O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo, porque nessa data já se apresentam elementos suficientes à demonstração do direito à percepção do benefício assistencial.
- Apelação provida.
