
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0003377-16.2011.4.03.6000
RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: GEDERSON FRANCO ROCHA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: DANIELLE CRISTINE ZAGO DUAILIBI - MS8652-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: WISLEY RODRIGUES DOS SANTOS - MS12334
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0003377-16.2011.4.03.6000
RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA VANESSA MELLO
APELANTE: GEDERSON FRANCO ROCHA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: DANIELLE CRISTINE ZAGO DUAILIBI - MS8652-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: WISLEY RODRIGUES DOS SANTOS - MS12334
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
"Art. 20
(...)
§ 2º - para efeito de concessão deste benefício, considera-se:
I - pessoa com deficiência, aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas.
II - impedimentos de longo prazo: aqueles que incapacitam a pessoa com deficiência para a vida independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos."
"Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas."
“AGRAVO LEGAL EM EMBARGOS INFRINGENTES. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA IDOSA. PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. AGRAVO IMPROVIDO (...) 3 - Da análise do sistema CNIS/DATAPREV, verifica-se que o filho da autora possui apenas pequenos vínculos de trabalho, na maioria inferior a 03 meses, sendo que na maior parte do tempo esteve desempregado. Desse modo, mesmo incluindo a aposentadoria do marido da autora, a renda familiar per capita corresponde a pouco mais de R$ 300,00, ou seja, inferior a meio salário mínimo. 4 - Restou demonstrada, quantum satis, no caso em comento, situação de miserabilidade, prevista no art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993, a ensejar a concessão do benefício assistencial. 5 - Agravo improvido." (EI 00072617120124036112, Relator Desembargador Federal Toru Yamamoto, TRF3, j. 22/10/2015, e-DJF3 05/11/2015)
“PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (LOAS). EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO LEGAL. CARÁTER INFRINGENTE. IMPOSSIBILIDADE. CONTRADIÇÃO INEXISTENTE. (...)- No caso em exame, não há omissão a ser sanada, sendo o benefício indeferido pelo fato da renda familiar "per capita" ser superior a 1/2 salário mínimo. (...) 5- Embargos de declaração rejeitados." (AR 00082598120084030000, Relator Juiz Convocado Silva Neto, TRF3, j. 25/09/2014, e-DJF3 08/10/2014)
"Comprovado que o requerente de benefício é portador do vírus HIV, cabe ao julgador verificar as condições pessoais, sociais, econômicas e culturais, de forma a analisar a incapacidade em sentido amplo, em face da elevada estigmatização social da doença."
“A partir dos dados colhidos através do estudo social, concluímos que é real a condição de hipossuficiência de Gederson. Constata-se que, no momento, o requerente sobrevive em situação de precariedade econômica, não tem renda fixa, é totalmente dependente financeiramente dos pais. Reside sozinho numa casa ao lado da dos pais, o que denota veladamente sua segregação e solidão a que está submetido por questões culturais e sociais de rejeição.
Diante do quadro, as condições físicas e emocionais estão debilitadas para prover o próprio sustento. Nessa perspectiva é necessário a concessão do beneficio, visto que o requerente não reside no mesmo teto que os pais. E por se tratar de um adulto, as questões psicológicas para adquirir autonomia financeira, ficou comprometida com o diagnóstico da doença, que traz uma carga de preconceito que o impede de ter uma vida dentro da normalidade e de buscar sua promoção social e o coloca em situação de hipossuficiência.”
Assim, restou demonstrada situação de hipossuficiência econômica, como indicado no sobredito paradigma do C. Supremo Tribunal Federal, exarado em repercussão geral, a autorizar o implante da benesse assistencial.
No que tange ao termo inicial do benefício, cabe considerar que, segundo a jurisprudência, inclusive assentada pelo C. Superior Tribunal de Justiça, em sede de repercussão geral (Recurso Especial nº 1.369.165/SP), os benefícios por incapacidade devem ser concedidos, em regra, a partir do requerimento administrativo ou, na sua ausência, da citação. Na hipótese vertente, contudo, o benefício há de ser concedido a partir de 27/02/2013, ocasião em que caracterizada a deficiência, restando, assim, preenchidos os requisitos legais à sua outorga.
Passo à análise dos consectários.
Cumpre esclarecer que, em 20 de setembro de 2017, o STF concluiu o julgamento do RE 870.947, definindo as seguintes teses de repercussão geral sobre a incidência da Lei n. 11.960/2009: "1) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput); quanto às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09; e 2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina."
Assim, a questão relativa à aplicação da Lei n. 11.960/2009, no que se refere aos juros de mora e à correção monetária, não comporta mais discussão, cabendo apenas o cumprimento da decisão exarada pelo STF em sede de repercussão geral.
Nesse cenário, sobre os valores em atraso incidirão juros e correção monetária em conformidade com os critérios legais compendiados no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, observadas as teses fixadas no julgamento final do RE 870.947, de relatoria do Ministro Luiz Fux.
Deve o INSS arcar com os honorários advocatícios em percentual mínimo a ser definido na fase de liquidação, nos termos do inciso II do § 4º do art. 85 do Código de Processo Civil, observando-se o disposto nos §§ 3º e 5º desse mesmo dispositivo legal e considerando-se as parcelas vencidas até a data da decisão concessiva do benefício, nos termos da Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Está o instituto previdenciário isento do pagamento de custas processuais, consoante o art. 4º, inciso I, da Lei Federal n. 9.289/96, art. 6º, da Lei do Estado de São Paulo n. 11.608/2003 e das Leis do Mato Grosso do Sul, de n. 1.135/91 e 1.936/98, alteradas pelos arts. 1º e 2º, da Lei n. 2.185/2000. Excluem-se da isenção as respectivas despesas processuais, além daquelas devidas à parte contrária.
Os valores já pagos, seja na via administrativa ou por força de decisão judicial, a título de quaisquer benefícios previdenciários ou assistenciais não cumuláveis, deverão ser integralmente abatidos do débito.
Saliente-se que, nos termos do art. 21, caput, da Lei n. 8.742/93, o benefício de prestação continuada deve ser revisto a cada dois anos, para avaliação da continuidade das condições que lhe deram origem.
Ante a natureza alimentar da prestação, oficie-se ao INSS com cópia dos documentos necessários, para que sejam adotadas medidas para a imediata implantação do benefício, independentemente de trânsito em julgado, conforme requerido pelo Ministério Público Federal.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, PARA REFORMAR A SENTENÇA E JULGAR PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO, concedendo-lhe o benefício de prestação continuada, a partir de 27/02/2013, e fixando consectários na forma explicitada, abatidos eventuais valores já recebidos.
É como voto.
DECLARAÇÃO DE VOTO
A Exma. Sra. Desembargadora Federal Daldice Santana: A Juíza Federal Convocada Leila Paiva, em seu fundamentado voto deu provimento à apelação da parte autora, para reformar a sentença e julgar parcialmente procedente o pedido, concedendo-lhe o benefício de prestação continuada, a partir de 27/02/2013.
Ouso, porém, apresentar divergência, pelas seguintes razões.
Discute-se o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício assistencial de prestação continuada previsto no artigo 20 da Lei n. 8.742/1993, regulamentado, atualmente, pelos Decretos n. 6.214/2007 e 7.617/2011.
Essa lei deu eficácia ao inciso V do artigo 203 da Constituição Federal, ao estabelecer, em seu artigo 20, as condições para a concessão do benefício da assistência social, a saber: ser o postulante portador de deficiência ou idoso e, em ambas as hipóteses, comprovar a miserabilidade ou a hipossuficiência, ou seja, não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
Com a devida vênia, entendo não estar patenteada a miserabilidade para fins assistenciais.
Segundo o relatório do estudo social, datado de 10/06/2015 (Id 90268932):
(i) o autor (34 anos), reside sozinho na propriedade que pertence à família (ao lado da casa dos pais)
(ii) O imóvel está dividido em dois quartos, um banheiro e uma cozinha.
(iii) O genitor (Sr Nelcírio) trabalha como vigilante e a genitora (Sra Ana Dalva) como costureira, ambos funcionários da Prefeitura Municipal de Maracaju-MS.
(iv) O autor possui dois irmãos: Geferson e Genislau e uma irmã Gjnara, todos casados e morando com as suas respectivas famílias.
(v) Em complemento ao Estudo Social, consta do ID 90262933 (pág 3/8) que o Sr Nelcírio recebeu salário de R$ 1.725,10, em abril/2011, de R$ 2.526,98, em junho/2015, e de R$2.347,07, em novembro/2015 e a Sra Ana Dalva auferiu salário de R$ 776,36, em abril/2011, de R$ 1.013,64, em junho/2015, e de R$ 1.013,64, em novembro/2015.
Nessas circunstâncias, embora evidentemente a parte autora seja pobre, certo é que não se encontra em situação de miserabilidade, uma vez que possui condições razoáveis de moradia e de sobrevivência - (depreende-se dos autos que o autor recebe ajuda sistemática financeira e material dos pais e familiares).
Ressalte-se que o já mencionado artigo 203, V, da Constituição Federal é claro ao estabelecer que, para fins de concessão desse benefício, a responsabilidade do Estado é subsidiária.
Vale dizer: o benefício somente deve ser concedido àqueles que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. Não se destina à complementação de renda familiar.
Assim, embora o pretendido benefício pudesse melhorar o padrão de vida do postulante e de sua família, o sistema de assistência social foi concebido para auxiliar pessoas em situação de penúria (incapazes de sobrevivência sem a ação do Estado), e não para incremento de padrão de vida.
Diante desse contexto, não se enxerga, no caso, circunstância de vulnerabilidade social apta a ensejar a concessão do benefício de assistência social e, assim, nego provimento à apelação da apelação da parte autora.
Fica mantida a condenação em honorários de advogado, ora arbitrados em 15% (quinze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º e 11, do Novo CPC. Porém, fica suspensa a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do referido código, por ser beneficiária da justiça gratuita.
É o voto.
DALDICE SANTANA
Desembargadora Federal
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. LEI Nº 8.213/1991. PREEXISTÊNCIA. INOCORRÊNCIA. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART. 203, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E LEI Nº 8.742/1993. HIV. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO CONCEDIDO.
- A aposentadoria por invalidez é devida ao segurado que, cumprida a carência mínima, quando exigida, for considerado incapaz para o trabalho e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, ao passo que o auxílio-doença destina-se àquele que ficar temporariamente incapacitado para o exercício de sua atividade habitual.
- O art. 15, inciso I, da Lei n.º 8.213/91, c/c o art. 137 da Instrução Normativa INSS/PRES Nº 77, de 21/01/2015, estabelece que a qualidade de segurado é mantida, sem limite de prazo, para quem está em gozo de benefício, perdurando por até doze meses após a cessação de benefícios por incapacidade.
- As normas legais atinentes ao ingresso no Regime Geral da Previdência Social não impedem a filiação de pessoa doente, vedando, sim, a concessão de benefício por incapacidade ao segurado que ingressa inapto ao trabalho, salvo quando essa inaptidão advém de agravamento da moléstia, sendo esta a hipótese que exsurge dos autos.
- Contudo, a parte autora não ostentava a condição de segurado da Previdência Social quando da sobrevinda da incapacidade laborativa, constatada pela perícia médica, não havendo elementos nos autos que permitam concluir pela incapacidade em período anterior.
- À concessão do benefício de prestação continuada, atrelam-se, cumulativamente, o implemento de requisito etário ou a detecção de deficiência, demonstrada por exame pericial, e a verificação da ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da benesse, ou de tê-la suprida pela família.
- Tratando-se de pedido de concessão de benefício assistencial formulado por pessoa portadora do vírus da AIDS, a análise da deficiência deve ser feita levando-se em conta as condições pessoais, sociais, econômicas e culturais.
- No caso, a condição social da parte autora e a ausência de experiência profissional, consorciadas às mazelas decorrentes da doença, inegavelmente, a tornam duplamente vitimada, justificando-se a concessão do benefício assistencial requerido.
- Constatadas, pelos laudos periciais, a deficiência e a hipossuficiência econômica, é devido o Benefício de Prestação Continuada, a partir de 27/02/2013, quando preenchidos os requisitos legais à sua outorga.
- Juros de mora, correção monetária e custas processuais fixados na forma explicitada.
- Honorários advocatícios a cargo do INSS em percentual mínimo a ser definido na fase de liquidação.
- Isenção da autarquia previdenciária do pagamento de custas processuais, com exceção das custas e despesas comprovadamente realizadas pela parte autora.
- Revisão do Benefício de Prestação Continuada a cada dois anos, para avaliação da continuidade das condições que lhe deram origem.
- Apelação da parte autora provida. Sentença reformada para julgar parcialmente procedente o pedido. Tutela antecipada de mérito concedida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por maioria, decidiu dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do voto da Relatora, que foi acompanhada pelo Desembargador Federal Gilberto Jordan e pelo Desembargador Federal Batista Gonçalves (4º voto). Vencida a Desembargadora Federal Daldice Santana, que lhe negava provimento. Julgamento nos termos do disposto no art. 942, caput e § 1º, do CPC , nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
