Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5000101-78.2015.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal ANA LUCIA JORDAO PEZARINI
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
25/07/2017
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 31/07/2017
Ementa
EMENTA
CONSTITUCIONAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ARTIGO 203, CAPUT, DA
CR/88, E LEI Nº 8.742/1993. SENTENÇA NÃO SUBMETIDA AO REEXAME NECESSÁRIO.
ART. 475, § 2º, DO CPC/1973. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA NÃO COMPROVADA.
BENEFÍCIO INDEFERIDO. TUTELA ANTECIPADA REVOGADA.
- O artigo 475, § 2º, do CPC/1973, com redação dada pelo art. 1º da Lei nº 10.352/2001, que
entrou em vigor em 27 de março de 2002, dispõe que não está sujeita ao reexame necessário a
sentença em ações cujo direito controvertido não exceda a 60 (sessenta) salários mínimos.
- Consideradas as datas do termo inicial do benefício e da prolação da sentença, quando houve a
concessão da tutela, bem como o valor da benesse, verifica-se que a hipótese em exame não
ultrapassa o mencionado limite, não sendo o caso de submeter o decisum de Primeiro Grau à
remessa oficial.
- Atrelam-se, cumulativamente, à concessão do benefício de prestação continuada, o implemento
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
de requisito etário ou a detecção de deficiência, demonstrada por exame pericial, e a verificação
da ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da benesse, ou de tê-
la suprida pela família.
- Não comprovada situação de hipossuficiência, de rigor o indeferimento do benefício.
- Honorários advocatícios fixados em 10% do valor atualizado da causa, observado o disposto no
art. 98, § 3º, do novo CPC, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita.
- Apelação do INSS provida. Sentença reformada, para julgar improcedente o pedido. Tutela
antecipada revogada.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação
do INSS, para reformar a sentença e julgar improcedente o pedido, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Acórdao
APELAÇÃO (198) Nº 5000101-78.2015.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - DES. FED. ANA PEZARINI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE:
APELADO: LEANDRO FURTADO RODRIGUES
Advogado do(a) APELADO: FELIPE LEAL MARTINS FERREIRA - MS16847
APELAÇÃO (198) Nº 5000101-78.2015.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - DES. FED. ANA PEZARINI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE:
APELADO: LEANDRO FURTADO RODRIGUES
Advogado do(a) APELADO: FELIPE LEAL MARTINS FERREIRA - MS16847
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação do INSS interposta em face da r. sentença, não submetida ao reexame
necessário, que julgou procedente o pedido deduzido na inicial, condenando a Autarquia
Previdenciária a conceder, à parte autora, representada por sua genitora, o benefício assistencial
a pessoa deficiente, desde o requerimento administrativo, discriminados os consectários,
antecipada a tutela jurídica provisória (doc. 7278).
Pretende, o apelante, que seja reformada a sentença, sustentando a ausência de comprovação
de miserabilidade. Prequestiona a matéria para fins recursais (doc. 7294).
Com contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal (doc. 7327).
O Ministério Público Federal ofertou parecer opinando pelo provimento do apelo autárquico (doc.
363884).
É o relatório.
APELAÇÃO (198) Nº 5000101-78.2015.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - DES. FED. ANA PEZARINI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE:
APELADO: LEANDRO FURTADO RODRIGUES
Advogado do(a) APELADO: FELIPE LEAL MARTINS FERREIRA - MS16847
V O T O
Inicialmente, afigura-se correta a não submissão da r. sentença à remessa oficial.
De fato, o artigo 475, § 2º, do CPC/1973, com redação dada pelo art. 1º da Lei nº 10.352/2001,
que entrou em vigor em 27 de março de 2002, dispõe que não está sujeita ao reexame
necessário a sentença em ações cujo direito controvertido não exceda a 60 (sessenta) salários
mínimos.
Nesse sentido, segue o entendimento do e. Superior Tribunal de Justiça:
"AGRAVO REGIMENTAL. PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. REEXAME
NECESSÁRIO. SENTENÇA ILÍQUIDA. PERDA DA AUDIÇÃO. AUXÍLIO-ACIDENTE.
PRESSUPOSTOS. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. IMPOSSIBILIDADE. 1. A sentença ilíquida
proferida contra a União, o Estado, o Distrito Federal, o Município e as respectivas autarquias e
fundações de direito público está sujeita ao duplo grau de jurisdição, exceto quando se tratar de
valor certo não excedente de 60 (sessenta) salários mínimos. 2. Afastado, na origem, o direito ao
auxílio-acidente, em razão de inexistirem os pressupostos à sua concessão, impede o reexame
da matéria, em âmbito especial, o enunciado 7 da Súmula desta Corte. 3. Agravo interno ao qual
se nega provimento." (STJ, AgRg no Ag 1274996/SP, Rel. Min. Celso Limongi, 6ª Turma, DJe
22.06.2010)
No caso dos autos, considerando as datas do termo inicial do benefício (12/3/2014, doc. 7293, fl.
01) e da prolação da sentença, quando houve a antecipação da tutela (31/8/2015), bem como o
valor da benesse, de um salário mínimo, verifico que a hipótese em exame não excede os 60
salários mínimos.
Não sendo, pois, o caso de submeter o decisum de primeiro grau à remessa oficial, passo à
análise do recurso interposto pelo INSS.
Discute-se, in casu, o direito à concessão do benefício de prestação continuada ao deficiente.
Previsto no artigo 203, caput, da CR/88 e disciplinado pela Lei nº 8.742/1993, de natureza
assistencial e não previdenciária, o benefício de prestação continuada tem sua concessão
desvinculada do cumprimento dos quesitos de carência e de qualidade de segurado, atrelando-
se, cumulativamente, ao implemento de requisito etário (recordando-se, a este passo, da
sucessiva redução da idade mínima, primeiramente de 70 para 67 anos, pelo art. 1º da Lei nº
9.720/98 e, ao depois, para 65 anos, conforme art. 34 da Lei nº 10.741/ 2003) ou à detecção de
deficiência, nos termos do art. 20, §2º, da Lei n° 8.742/93, demonstrada por exame pericial; à
verificação da ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da
benesse, ou de tê-lo suprido pela família; e, originalmente, à constatação de renda mensal per
capita não superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo.
No que diz respeito ao critério da deficiência, as sucessivas alterações legislativas ocorridas na
redação do § 2º, do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social demonstram a evidente
evolução na sua conceituação.
Em sua redação originária, a Lei 8.742/1993 definia a pessoa portadora de deficiência, para efeito
de concessão do benefício assistencial , aquela incapacitada para a vida independente e para o
trabalho.
Posteriormente, a Lei n. 12.435/2011 promoveu modificação ao dispositivo legal, ampliando o
conceito de deficiência, com base no Decreto n. 6.949/2009, que promulgou a Convenção
Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
O § 2º da art. 20 da Lei n. 8.742 passou então a vigorar com a seguinte redação:
"Art. 20
(...)
§ 2º - para efeito de concessão deste benefício, considera-se:
I - pessoa com deficiência, aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir
sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas.
II - impedimentos de longo prazo: aqueles que incapacitam a pessoa com deficiência para a vida
independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos."
Vê-se, portanto, que ao fixar o entendimento da expressão "impedimentos de longo prazo", a Lei
n. 12.435/2011 optou por restringir a concessão do benefício exclusivamente às pessoas com
deficiência que apresentem incapacidade para a vida independente e para o trabalho pelo prazo
mínimo de 2 (dois) anos.
Atualmente, o dispositivo em exame encontra-se vigendo com a redação conferida pela Lei n.
13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), a qual explicitou a definição legal de pessoa
com deficiência:
"Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com
deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou
sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e
efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas."
De se registrar que o § 10 do mesmo dispositivo, incluído pela Lei n. 12.470/2011, considera de
longo prazo o impedimento cujos efeitos perduram pelo prazo mínimo de 02 (dois) anos.
Acerca do derradeiro pressuposto, o C. STF, no âmbito da Reclamação nº 4374 e dos Recursos
Extraordinários nºs. 567985 e 580963, submetidos à sistemática da repercussão geral, reputou
defasado esse método aritmético de aferição de contexto de miserabilidade, suplantando, assim,
o que outrora restou decidido na ADI 1.232-DF, ajuizada pelo Procurador-Geral da República e
em cujo âmbito se declarara a constitucionalidade do §3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93. A
motivação empregada pela Excelsa Corte reside no fato de terem sido "editadas leis que
estabeleceram critérios mais elásticos para concessão de outros benefícios assistenciais, tais
como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa
Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que
autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a municípios que instituírem programas
de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas" (RE nº 580963).
À vista disso, a mensuração da hipossuficiência não mais se restringe ao parâmetro da renda
familiar, devendo, sim, aflorar da análise desse requisito e das demais circunstâncias concretas
de cada caso, na linha do que já preconizava a jurisprudência majoritária, no sentido de que a
diretiva do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93 não consistiria em singular meio para se verificar a
condição de miserabilidade preceituada na Carta Magna, cuidando-se, tão-apenas, de critério
objetivo mínimo, a revelar a impossibilidade de subsistência do portador de deficiência e do idoso,
não empecendo a utilização, pelo julgador, de outros fatores igualmente capazes de denotar a
condição de precariedade financeira da parte autora (v., a exemplo, STJ: REsp nº 314264/SP,
Quinta Turma, Rel. Min. Félix Fischer, j. 15/05/2001, v.u., DJ 18/06/2001, p. 185; EDcl no AgRg
no REsp 658705/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Felix Fischer, j. 08/03/2005, v.u., DJ 04/04/2005, p.
342; REsp 308711/SP, Sexta Turma, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 19/09/2002, v.u., DJ
10/03/2003, p. 323).
Em plena sintonia com o acima esposado, o c. STJ, quando da apreciação do RESP n.
1.112.557/MG, acentuou que o art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93 comporta exegese tendente ao
amparo do cidadão vulnerável, donde concluir-se que a delimitação do valor de renda familiar per
capita não pode ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado.
Em substituição à diretriz inicialmente estampada na lei, a jurisprudência vem evoluindo para
eleger a renda mensal familiar per capita inferior à metade do salário mínimo como indicativo de
situação de precariedade financeira, tendo em conta que outros programas sociais, dentre eles o
bolsa família (Lei nº 10.836/04), o Programa Nacional de Acesso à Alimentação (Lei nº 10.689/03)
e o bolsa escola (Lei nº 10.219/01), contemplam esse patamar.
Consultem-se arestos da Terceira Seção nesse diapasão:
“AGRAVO LEGAL EM EMBARGOS INFRINGENTES. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL À PESSOA IDOSA. PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO
DO BENEFÍCIO. AGRAVO IMPROVIDO (...) 3 - Da análise do sistema CNIS/DATAPREV,
verifica-se que o filho da autora possui apenas pequenos vínculos de trabalho, na maioria inferior
a 03 meses, sendo que na maior parte do tempo esteve desempregado. Desse modo, mesmo
incluindo a aposentadoria do marido da autora, a renda familiar per capita corresponde a pouco
mais de R$ 300,00, ou seja, inferior a meio salário mínimo. 4 - Restou demonstrada, quantum
satis, no caso em comento, situação de miserabilidade, prevista no art. 20, § 3º, da Lei
8.742/1993, a ensejar a concessão do benefício assistencial. 5 - Agravo improvido."
(EI 00072617120124036112, Relator Desembargador Federal Toru Yamamoto, TRF3, j.
22/10/2015, e-DJF3 05/11/2015)
“PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (LOAS). EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM
AGRAVO LEGAL. CARÁTER INFRINGENTE. IMPOSSIBILIDADE. CONTRADIÇÃO
INEXISTENTE. (...)- No caso em exame, não há omissão a ser sanada, sendo o benefício
indeferido pelo fato da renda familiar "per capita" ser superior a 1/2 salário mínimo. (...) 5-
Embargos de declaração rejeitados."
(AR 00082598120084030000, Relator Juiz Convocado Silva Neto, TRF3, j. 25/09/2014, e-DJF3
08/10/2014)
Nesse exercício de sopesamento do conjunto probatório, importa averiguar a necessidade, na
precisão da renda familiar, de abatimento do benefício de valor mínimo percebido por idoso ou
deficiente, pertencente à unidade familiar. Nesta quadra, há, inclusive, precedente do egrégio
STF, submetido à sistemática da repercussão geral, em que se consagrou a inconstitucionalidade
por omissão do artigo 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso, considerando a "inexistência de
justificativa plausível para discriminação dos portadores de deficiência em relação aos idosos,
bem como dos idosos beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de
benefícios previdenciários no valor de até um salário mínimo." (RE nº 580.963/PR, DJe
14.11.2013).
Quanto à questão da composição da renda familiar per capita, o C. STJ, no julgamento do RESP
n. 1.355.052/SP, exarado na sistemática dos recursos representativos de controvérsia, assentou,
no mesmo sentido, a aplicação analógica do parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso, com
vistas à exclusão do benefício previdenciário recebido por idoso ou por deficiente, no valor de um
salário mínimo, no cálculo da renda per capita prevista no art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93
De se realçar que a jurisprudência - antes, mesmo, do aludido recurso repetitivo - já se firmara no
sentido da exclusão de qualquer benefício de valor mínimo recebido por idoso com mais de 65
anos, por analogia ao disposto no art. 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/2003, preceito esse
que, na origem, limitava-se a autorizar a desconsideração de benefício de prestação continuada
percebido pelos referidos idosos.
Note-se que os precedentes não autorizam o descarte do benefício de valor mínimo recebido por
qualquer idoso (assim compreendidas pessoas com idade superior a 60 anos), mas, sim, pelos
idosos com idade superior a 65 anos.
Essa é a inteligência reinante na jurisprudência. A propósito, os seguintes julgados: STJ, AGP
8479, Rel. Des. Convocada Marilza Maynard, 3ª Seção, DJE 03/02/2014; STJ, AGP 8609, Rel.
Min. Assusete Magalhães, 3ª Seção, DJE 25/11/2013; STJ, AGRESP 1178377, Rel. Min. Maria
Thereza de Assis Moura, 6ª Turma, DJE 19/3/2012. E da atenta leitura da íntegra do acórdão do
recurso representativo de controvérsia - nº 1.355.052/SP - chega-se à idêntica conclusão.
Outro dado sobremodo relevante diz respeito à acepção de família, para a finalidade da Lei nº
8.742/1993, cujo conceito experimentou modificação ao longo do tempo. Num primeiro lanço, o
art. 20, § 1º, do citado diploma nomeava família "a unidade mononuclear, vivendo sob o mesmo
teto, cuja economia é mantida pela contribuição de seus integrantes". Ao depois, a Lei nº 9.720,
em 30/11/98, fruto de conversão da Medida Provisória nº 1.473-34, de 11/08/97, passou a
compreendê-la como o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei nº 8.213/91, dês que
conviventes sob mesmo teto. Finalmente, na vigência da Lei nº 12.435/2011, é havida como o
núcleo integrado pelo requerente, cônjuge ou companheiro, os pais, ou, na ausência destes, pela
madrasta ou padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados,
todos, também, sob o mesmo teto.
Na espécie, o requisito da deficiência restou incontroverso no átrio judicial.
Avançando, então, na análise da hipossuficiência, importa examinar o estudo social coligido aos
autos, produzido em 16/01/2015 (doc. 7279).
Segundo o laudo adrede confeccionado, o autor, de 39 anos (nascido em 30/9/1975, doc. 7309, fl.
03), interditado por sentença judicial proferida em 26/02/2007, transitada em julgado em
12/3/2007 (cf. doc. 7309, fl. 04), reside com os genitores, ambos de 61 anos, idades
correspondentes à data do estudo socioeconômico.
O casal é proprietário de um sítio, localizado a 76 km da cidade, e há quatro anos adquiriu um
imóvel na zona urbana de Paranaíba, pois o proponente cansa-se muito nas viagens que tem que
realizar para tratamento médico (em média, duas vezes ao mês), e também, para que os pais
possam ficar no imóvel, em casos de internação do mesmo. Esta casa é construída em alvenaria,
com cômodos pequenos, simples, em satisfatórias condições de habitabilidade, guarnecida com
poucos móveis e eletrodomésticos, suficientes para atender o conforto da família.
O requerente realiza tratamento médico no sistema público de saúde e com médico particular,
quando necessário. Faz fisioterapia com a mãe, em casa, a qual aprendeu com os profissionais
os exercícios que são necessários ao autor, haja vista que sua locomoção é desgastante tanto
para ele quanto para os pais.
A renda familiar advém das aposentadorias titularizadas pelos genitores, no valor de um salário
mínimo cada. De se esclarecer que o salário mínimo era de R$ 788,00. Possuem, também, gado
leiteiro, auferindo, com a venda de leite, cerca de R$ 800,00, conforme o mês. Além disso, a mãe
do vindicante passou a torrar farinha para contribuir no orçamento doméstico.
Considerando, tão somente, o valor dos proventos no cômputo da renda mensal familiar, visto
que os demais rendimentos são variáveis, já se teria renda per capita de R$ 525,33, suplantando
metade do salário mínimo (R$ 394,00).
As despesas, à época do laudo, perfaziam R$ 1.501,50, consistindo em tarifas de água (R$
42,00) e energia elétrica (R$ 43,50, na casa da cidade, e R$ 86,00, no sítio), supermercado (R$
700,00), medicamentos (R$ 480,00) e fraldas (R$ 150,00), não fornecidos pela rede pública de
saúde.
Compram vestimentas quando tem condições, geralmente à credito, necessitando, contudo,
frequentemente, de roupas de cama para o solicitante, algumas vezes, doadas por terceiros.
Não obstante os elevados gastos com os cuidados requeridos pela parte autora, vê-se que as
despesas informadas no laudo social são inferiores à renda total declarada.
No mais, a família conta, ainda, com veículo (Uno/1996).
Sopesados, então, todos os elementos probantes amealhados, temos que se trata de família
certamente modesta e imersa em cenário de pobreza, não, contudo, em contingência de miséria,
esta, sim, apta a amparar a outorga do benefício pleiteado.
E, como se sabe, dentre os escopos do benefício de prestação continuada, não está o de
suplementar renda ou propiciar maior conforto ao interessado (e.g.: AC 00394229420044039999,
Relatora Desembargadora Federal Marisa Santos, TRF3, Nona Turma, DJU 24/11/2005).
Assim, não restou comprovada situação de hipossuficiência, ainda que por outros meios
probantes, como indicado no sobredito paradigma do C. Supremo Tribunal Federal, exarado em
repercussão geral.
Não se descarte a possibilidade de alteração desse cenário, no decorrer do tempo, a ponto de,
eventualmente, justificar-se a concessão do benefício, hipótese em que resta, de todo modo,
franqueado ao pretendente deduzir nova postulação quanto à outorga da benesse pleiteada.
Quanto ao prequestionamento suscitado, assinalo não haver qualquer infringência à legislação
federal ou a dispositivos constitucionais.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, PARA REFORMAR A SENTENÇA
E JULGAR IMPROCEDENTE O PEDIDO.
Independentemente do trânsito em julgado, oficie-se ao INSS para cancelamento do benefício
implantado por força da tutela antecipada concedida na sentença.
Condeno a parte autora em honorários advocatícios fixados em 10% do valor atualizado da
causa, observado o disposto no art. 98, § 3º, do Novo CPC, por ser beneficiária da justiça
gratuita.
É como voto.
EMENTA
CONSTITUCIONAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ARTIGO 203, CAPUT, DA
CR/88, E LEI Nº 8.742/1993. SENTENÇA NÃO SUBMETIDA AO REEXAME NECESSÁRIO.
ART. 475, § 2º, DO CPC/1973. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA NÃO COMPROVADA.
BENEFÍCIO INDEFERIDO. TUTELA ANTECIPADA REVOGADA.
- O artigo 475, § 2º, do CPC/1973, com redação dada pelo art. 1º da Lei nº 10.352/2001, que
entrou em vigor em 27 de março de 2002, dispõe que não está sujeita ao reexame necessário a
sentença em ações cujo direito controvertido não exceda a 60 (sessenta) salários mínimos.
- Consideradas as datas do termo inicial do benefício e da prolação da sentença, quando houve a
concessão da tutela, bem como o valor da benesse, verifica-se que a hipótese em exame não
ultrapassa o mencionado limite, não sendo o caso de submeter o decisum de Primeiro Grau à
remessa oficial.
- Atrelam-se, cumulativamente, à concessão do benefício de prestação continuada, o implemento
de requisito etário ou a detecção de deficiência, demonstrada por exame pericial, e a verificação
da ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da benesse, ou de tê-
la suprida pela família.
- Não comprovada situação de hipossuficiência, de rigor o indeferimento do benefício.
- Honorários advocatícios fixados em 10% do valor atualizado da causa, observado o disposto no
art. 98, § 3º, do novo CPC, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita.
- Apelação do INSS provida. Sentença reformada, para julgar improcedente o pedido. Tutela
antecipada revogada.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação
do INSS, para reformar a sentença e julgar improcedente o pedido, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, A Nona Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
