Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5002675-06.2017.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal SERGIO DO NASCIMENTO
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
31/01/2018
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 06/02/2018
Ementa
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ARTIGO 203, V, CF.
REQUISITOS LEGAIS COMPROVADOS. LEI 8.742/93, ART. 20, §3º. DEFICIÊNCIA.
INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO E. STF. HIPOSSUFICIÊNCIA
ECONÔMICA. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. CONSECTÁRIOS LEGAIS. IMPLANTAÇÃO
IMEDIATA.
I - Não se olvida que o conceito de "pessoa portadora de deficiência" para fins de proteção estatal
e de concessão do benefício assistencial haja sido significativamente ampliado com as alterações
trazidas após a introdução no ordenamento pátrio da Convenção sobre os Direitos das Pessoas
com Deficiência e de seu Protocolo Facultativo, aprovada pelo Decreto Legislativo 186/2008, na
forma do artigo 5º, § 3º, da Constituição da República. No caso dos autos, a parte autora
apresenta 'impedimentos de longo prazo' de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os
quais, em interação com diversas barreiras, podem 'obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas'.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
II - Quanto à hipossuficiência econômica, à luz da jurisprudência consolidada no âmbito do E. STJ
e do posicionamento usual desta C. Turma, no sentido de que o art. 20, §3º, da Lei 8.742/93
define limite objetivo de renda per capita a ser considerada, mas não impede a comprovação da
miserabilidade pela análise da situação específica de quem pleiteia o benefício. (Precedente do
E. STJ).
III - Em que pese a improcedência da ADIN 1.232-DF, em julgamento recente dos Recursos
Extraordinários 567.985-MT e 580.983-PR, bem como da Reclamação 4.374, o E. Supremo
Tribunal Federal modificou o posicionamento adotado anteriormente, para entender pela
inconstitucionalidade do disposto no art. 20, §3º, da Lei 8.742/93.
IV - O entendimento que prevalece atualmente no âmbito do E. STF é os de que as significativas
alterações no contexto socioeconômico desde a edição da Lei 8.742/93 e o reflexo destas nas
políticas públicas de assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios para
aferição da miserabilidade previstos na LOAS e aqueles constantes no sistema de proteção social
que veio a se consolidar.
V - O termo inicial do benefício deve ser fixado a contar da data do requerimento administrativo
(01.02.2016).
VI – A correção monetária e os juros de mora deverão ser calculados de acordo com a lei de
regência, observando-se as teses firmadas pelo E.STF no julgamento do RE 870.947, realizado
em 20.09.2017. Quanto aos juros de mora será observado o índice de remuneração da caderneta
de poupança a partir de 30.06.2009.
VII - Honorários advocatícios fixados em 15% do valor das prestações vencidas até a presente
data, uma vez que o pedido foi julgado improcedente no Juízo "a quo", nos termos da Súmula 111
do STJ e de acordo com entendimento firmado por esta 10ª Turma.
VIII - No que tange ao pagamento de custas processuais, destaco que no Estado do Mato Grosso
do Sul, a isenção era conferida ao INSS pelas Leis nºs 1.936/98 e 2.185/2000. Atualmente, no
entanto, vige a Lei Estadual/MS nº 3.779, de 11.11.2009, que prevê expressamente o pagamento
de custas pela autarquia previdenciária, as quais devem ser recolhidas ao final do feito, pela parte
vencida, em consonância com o artigo 27 do CPC/73 (atual art. 91 do CPC/2015).
IX – Determinada a imediata implantação do benefício, na forma do artigo 497 do NCPC.
X - Apelação da parte autora parcialmente provida.
Acórdao
APELAÇÃO (198) Nº 5002675-06.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: NICOLY ANDRADE DO SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: JESSICA LORENTE MARQUES - MS1693300A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELAÇÃO (198) Nº 5002675-06.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: NICOLY ANDRADE DO SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: JESSICA LORENTE MARQUES - MS1693300A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Senhor Desembargador Federal Sérgio Nascimento (Relator): Trata-se de apelação de
sentença pela qual foi julgado improcedente o pedido do autor objetivando a concessão do
benefício de prestação continuada previsto no art. 203, V, da Constituição da República. Pela
sucumbência, a autora foi condenada a pagar honorários advocatícios fixados em 10% do valor
da causa, observando-se, contudo, o fato de ser beneficiária da Justiça Gratuita.
A parte autora apela aduzindo restarem preenchidos os requisitos para a concessão do benefício,
a saber, é portadora de deficiência e não possui meios para prover sua manutenção ou tê-la
provida por sua família. Pugna pelo deferimento do amparo social almejado, desde a negativa do
INSS, com o pagamento das parcelas vencidas, acrescidas de correção monetária e juros de
mora de 1% ao mês, contados da citação.
Sem contrarrazões, os autos vieram a esta E. Corte.
Em parecer, a representante do Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento do apelo.
É o relatório.
APELAÇÃO (198) Nº 5002675-06.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: NICOLY ANDRADE DO SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: JESSICA LORENTE MARQUES - MS1693300A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
V O T O
Nos termos do art. 1011 do CPC/2015, recebo a apelação da parte autora.
O benefício pretendido pela parte autora está previsto no artigo 203, V, da Constituição da
República, que dispõe:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de
contribuição à seguridade social, e tem por objetivo:
(...)
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou tê-la provida por sua
família, conforme dispuser a lei.
A regulamentação legislativa do dispositivo constitucional restou materializada com o advento da
Lei 8.742/93, que dispõe na redação atualizada do caput do seu artigo 20:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa
com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
Assim, para fazer jus ao amparo constitucional, o postulante deve ser portador de deficiência ou
ser idoso (65 anos ou mais) e ser incapaz de prover a própria manutenção ou tê-la provida por
sua família.
Quanto ao requisito relativo à deficiência, a Lei 8.742/93, que regulamentou a concessão do
dispositivo constitucional acima, dispunha no § 2º do seu artigo 20, em sua redação original:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à
pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais e que comprovem não
possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
(...)
§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela
incapacitada para a vida independente e para o trabalho.
Nesse ponto, cumpre salientar que o texto constitucional garante o pagamento de um salário
mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência, sem exigir, como fez a norma
regulamentadora, em sua redação original, a existência de incapacidade para a vida
independente e para o trabalho.
Nota-se, portanto, que ao definir os contornos da expressão pessoa portadora de deficiência
constante do dispositivo constitucional, a norma infraconstitucional reduziu a sua abrangência,
limitando o seu alcance aos casos em que a deficiência é geradora de incapacidade laborativa.
Todavia, observa-se que, em 10.07.2008, o Congresso Nacional promulgou o Decreto Legislativo
186/2008, aprovando, pelo rito previsto no artigo 5º, § 3º, da Constituição da República, o texto da
Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu Protocolo Facultativo,
assinados em Nova Iorque, em 30 de março de 2007, e conferindo à referida Convenção status
normativo equivalente ao das emendas constitucionais.
A Convenção, aprovada pelo Decreto Legislativo 186/2008, já no seu Artigo 1, cuidou de tratar do
conceito de "pessoa com deficiência", definição ora constitucionalizada pela adoção do rito do
artigo 5º, § 3º, da Carta, a saber:
Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir
sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais
pessoas.
Em coerência à alteração promovida em sede constitucional, o artigo 20, § 2º, da Lei 8.742/93,
viria a ser alterado pela Lei 12.470/11, passando a reproduzir em seu texto a definição de
"pessoa com deficiência" constante da norma superior. Dispõe a LOAS, em sua redação
atualizada:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa
com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
(...)
§ 2o Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que
tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais,
em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº
12.470, de 2011).
Não há dúvida, portanto, de que o conceito de 'deficiência' atualmente albergado é mais extenso
do que aquele outrora estabelecido, vez que considera como tal qualquer impedimento, inclusive
de natureza sensorial, que tenha potencialidade para a obstrução da participação social do
indivíduo em condições de igualdade.
Coerente com esta nova definição de 'deficiência' para fins de concessão do benefício
constitucional, a mencionada Lei 12.470/11 acrescentou à Lei 8.742/93 o artigo 21-A, com a
seguinte redação:
Art. 21-A. O benefício de prestação continuada será suspenso pelo órgão concedente quando a
pessoa com deficiência exercer atividade remunerada, inclusive na condição de
microempreendedor individual. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 1o Extinta a relação trabalhista ou a atividade empreendedora de que trata o caput deste artigo
e, quando for o caso, encerrado o prazo de pagamento do seguro-desemprego e não tendo o
beneficiário adquirido direito a qualquer benefício previdenciário, poderá ser requerida a
continuidade do pagamento do benefício suspenso, sem necessidade de realização de perícia
médica ou reavaliação da deficiência e do grau de incapacidade para esse fim, respeitado o
período de revisão previsto no caput do art. 21.
Verifica-se, portanto, que a legislação ordinária, em deferência às alterações promovidas em sede
constitucional, não apenas deixou de identificar os conceitos de 'incapacidade laborativa' e
'deficiência', como passou a autorizar expressamente que a pessoa com deficiência elegível à
concessão do amparo assistencial venha a exercer atividade laborativa - seja como empregada,
seja como microempreendedora - sem que tenha sua condição descaracterizada pelo trabalho,
ressalvada tão somente a suspensão do benefício enquanto este for exercido.
Observados estes parâmetros para a aferição da deficiência, no caso dos autos, foi realizada
perícia médica em 18.08.2016, que constatou que a autora, nascida em 20.07.2011, apresenta
retardo do desenvolvimento fisiológico normal (CID R62). Faz-se mister, aqui, observar o que
dispõe o art. 4º, §1º, do Decreto 6.214/2007:
Art. 4o Para os fins do reconhecimento do direito ao benefício, considera-se:
§ 1o Para fins de reconhecimento do direito ao Benefício de Prestação continuada às crianças e
adolescentes menores de dezesseis anos de idade, deve ser avaliada a existência da deficiência
e o seu impacto na limitação do desempenho de atividade e restrição da participação social,
compatível com a idade.
Neste passo, em se tratando de criança, não há que se perquirir quanto à sua capacidade
laborativa, mas deve-se ter em conta às limitações que a deficiência de que é portadora impõem
ao seu desenvolvimento e a atenção especial de que necessita.
Assim, a deficiência apresentada pela autora, autoriza a concessão do benefício assistencial,
caso preencha o requisito socioeconômico, haja vista possuir 'impedimentos de longo prazo', com
potencialidade para 'obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade, em igualdade de
condições com outras pessoas.
No que toca ao requisito socioeconômico, cumpre observar que o §3º do artigo 20 da Lei
8.742/93 estabeleceu para a sua aferição o critério de renda familiar per capita, observado o limite
de um quarto do salário mínimo, que restou mantido na redação dada pela Lei 12.435/11, acima
transcrita.
A questão relativa à constitucionalidade do critério de renda per capita não excedente a um
quarto do salário mínimo para que se considerasse o idoso ou pessoa com deficiência aptos à
concessão do benefício assistencial, foi analisada pelo E. Supremo Tribunal Federal em sede de
Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 1.232/DF), a qual foi julgada improcedente, por acórdão
que recebeu a seguinte ementa:
CONSTITUCIONAL. IMPUGNA DISPOSITIVO DE LEI FEDERAL QUE ESTABELECE O
CRITÉRIO PARA RECEBER O BENEFÍCIO DO INCISO V DO ART. 203, DA CF. INEXISTE A
RESTRIÇÃO ALEGADA EM FACE AO PRÓPRIO DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL QUE
REPORTA À LEI PARA FIXAR OS CRITÉRIOS DE GARANTIA DO BENEFÍCIO DE SALÁRIO
MÍNIMO À PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA FÍSICA E AO IDOSO. ESTA LEI TRAZ
HIPÓTESE OBJETIVA DE PRESTAÇÃO ASSISTENCIAL DO ESTADO. AÇÃO JULGADA
IMPROCEDENTE.
(STF. ADI 1.234-DF. Rel. p/ Acórdão Min. Nelson Jobim. J. 01.06.01).
Todavia, conquanto reconhecida a constitucionalidade do §3º do artigo 20, da Lei 8.742/93, a
jurisprudência evoluiu no sentido de que tal dispositivo estabelecia situação objetiva pela qual se
deve presumir pobreza de forma absoluta, mas não impedia o exame de situações subjetivas
tendentes a comprovar a condição de miserabilidade do requerente e de sua família. Tal
interpretação seria consolidada pelo E. Superior Tribunal de Justiça em recurso especial julgado
pela sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil (STJ - REsp. 1.112.557-MG;
Terceira Seção; Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho; j. 28.10.2009; DJ 20.11.2009).
O aparente descompasso entre o desenvolvimento da jurisprudência acerca da verificação da
miserabilidade dos postulantes ao benefício assistencial e o entendimento assentado por ocasião
do julgamento da ADI 1.232-DF levaria a Corte Suprema a voltar ao enfrentamento da questão,
após o reconhecimento da existência da sua repercussão geral, no âmbito da Reclamação 4374 -
PE, julgada em 18.04.2013.
Naquela ocasião, prevaleceu o entendimento de que "ao longo de vários anos desde a sua
promulgação, o §3º do art. 20 da LOAS passou por um processo de "inconstitucionalização". Com
efeito, as significativas alterações no contexto socioeconômico desde então e o reflexo destas
nas políticas públicas de assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios
para aferição da miserabilidade previstos na Lei 8.742/93 e aqueles constantes no sistema de
proteção social que veio a se consolidar. Verifique-se:
Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição.
(...)
4. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de
inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993.
(...)
Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças
fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos
patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais
por parte do Estado brasileiro).
5. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei
8.742/1993.
6. Reclamação constitucional julgada improcedente.
(Rcl 4374, Relator Ministro Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, j. 18.04.2013, DJe-173 03.09.2013).
Destarte, é de se reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação
específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência
é através da própria natureza dos males que a assolam, do seu grau e intensidade, que poderão
ser mensuradas suas necessidades. Não há, pois, que se enquadrar todos os indivíduos em um
mesmo patamar e entender que somente aqueles que contam com menos de um quarto do
salário-mínimo possam fazer jus ao benefício assistencial.
No caso dos autos, o estudo social realizado em 06.07.2016 revela que a autora reside com a
mãe, o pai e a avó, em imóvel pertencente a esta última. A casa é de alvenaria, com três quartos,
sala, cozinha e banheiro, e é guarnecida com móveis e eletrodomésticos que dão conforto à
família. A renda familiar é composta pelo benefício previdenciário percebido pela avó da
demandante, bem como pelo salário de seu genitor, que conforme os dados do CNIS (doc. ID
1030962), oscilava por volta de R$ 1.300,00 no início de 2016. A autora recebe tratamento na
APAE e no SUS.
Importante salientar, entretanto, que a avó não pode ser considerada como integrante do núcleo
familiar da demandante, consoante o disposto no artigo 20, § 1º, da LOAS.
Destarte, em que pese a renda mensal per capita superar o limite de ¼ do salário mínimo, a
situação fática ora examinada permite concluir pela absoluta insuficiência de recursos, tendo em
vista a gravidade da doença de que é portadora a autora, que exige cuidados médicos contínuos
e onerosos.
Portanto, resta comprovado que a autora é portadora de deficiência e que não possui meios para
prover sua manutenção ou tê-la provida por sua família, fazendo jus a concessão do benefício
assistencial.
O termo inicial do benefício deve ser fixado a contar da data do requerimento administrativo
(01.02.2016; doc. ID 1030960 - Pág. 28), consoante firme entendimento jurisprudencial.
A correção monetária e os juros de mora deverão ser calculados de acordo com a lei de regência,
observando-se as teses firmadas pelo E.STF no julgamento do RE 870.947, realizado em
20.09.2017. Quanto aos juros de mora será observado o índice de remuneração da caderneta de
poupança a partir de 30.06.2009.
Fixo os honorários advocatícios em 15% do valor das prestações vencidas até a presente data,
uma vez que o pedido foi julgado improcedente no Juízo a quo, nos termos da Súmula 111 do
STJ e de acordo com entendimento firmado por esta 10ª Turma.
No que tange ao pagamento de custas processuais, destaco que no Estado do Mato Grosso do
Sul, a isenção era conferida ao INSS pelas Leis nºs 1.936/98 e 2.185/2000. Atualmente, no
entanto, vige a Lei Estadual/MS nº 3.779, de 11.11.2009, que prevê expressamente o pagamento
de custas pela autarquia previdenciária, as quais devem ser recolhidas ao final do feito, pela parte
vencida, em consonância com o artigo 27 do CPC/73 (atual art. 91 do CPC/2015).
Diante do exposto, dou parcial provimento à apelação da parte autora, para julgar procedente o
pedido e condenar o réu a conceder-lhe o benefício de prestação continuada, a partir da data do
requerimento administrativo (01.02.2016). Honorários advocatícios fixados em 15% sobre o valor
das prestações vencidas até a data do presente julgamento.
Determino que, independentemente do trânsito em julgado, expeça-se e-mail ao INSS, instruído
com os devidos documentos da parte autora Nicoly Andrade dos Santos (incapaz), representada
por sua genitora Tatiana Andrade do Espírito Santo, a fim de serem adotadas as providências
cabíveis para que seja implantado o benefício de prestação continuada, com data de início - DIB
em 01.02.2016, no valor de um salário mínimo, tendo em vista o "caput" do artigo 497 do CPC.
É como voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ARTIGO 203, V, CF.
REQUISITOS LEGAIS COMPROVADOS. LEI 8.742/93, ART. 20, §3º. DEFICIÊNCIA.
INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO E. STF. HIPOSSUFICIÊNCIA
ECONÔMICA. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. CONSECTÁRIOS LEGAIS. IMPLANTAÇÃO
IMEDIATA.
I - Não se olvida que o conceito de "pessoa portadora de deficiência" para fins de proteção estatal
e de concessão do benefício assistencial haja sido significativamente ampliado com as alterações
trazidas após a introdução no ordenamento pátrio da Convenção sobre os Direitos das Pessoas
com Deficiência e de seu Protocolo Facultativo, aprovada pelo Decreto Legislativo 186/2008, na
forma do artigo 5º, § 3º, da Constituição da República. No caso dos autos, a parte autora
apresenta 'impedimentos de longo prazo' de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os
quais, em interação com diversas barreiras, podem 'obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas'.
II - Quanto à hipossuficiência econômica, à luz da jurisprudência consolidada no âmbito do E. STJ
e do posicionamento usual desta C. Turma, no sentido de que o art. 20, §3º, da Lei 8.742/93
define limite objetivo de renda per capita a ser considerada, mas não impede a comprovação da
miserabilidade pela análise da situação específica de quem pleiteia o benefício. (Precedente do
E. STJ).
III - Em que pese a improcedência da ADIN 1.232-DF, em julgamento recente dos Recursos
Extraordinários 567.985-MT e 580.983-PR, bem como da Reclamação 4.374, o E. Supremo
Tribunal Federal modificou o posicionamento adotado anteriormente, para entender pela
inconstitucionalidade do disposto no art. 20, §3º, da Lei 8.742/93.
IV - O entendimento que prevalece atualmente no âmbito do E. STF é os de que as significativas
alterações no contexto socioeconômico desde a edição da Lei 8.742/93 e o reflexo destas nas
políticas públicas de assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios para
aferição da miserabilidade previstos na LOAS e aqueles constantes no sistema de proteção social
que veio a se consolidar.
V - O termo inicial do benefício deve ser fixado a contar da data do requerimento administrativo
(01.02.2016).
VI – A correção monetária e os juros de mora deverão ser calculados de acordo com a lei de
regência, observando-se as teses firmadas pelo E.STF no julgamento do RE 870.947, realizado
em 20.09.2017. Quanto aos juros de mora será observado o índice de remuneração da caderneta
de poupança a partir de 30.06.2009.
VII - Honorários advocatícios fixados em 15% do valor das prestações vencidas até a presente
data, uma vez que o pedido foi julgado improcedente no Juízo "a quo", nos termos da Súmula 111
do STJ e de acordo com entendimento firmado por esta 10ª Turma.
VIII - No que tange ao pagamento de custas processuais, destaco que no Estado do Mato Grosso
do Sul, a isenção era conferida ao INSS pelas Leis nºs 1.936/98 e 2.185/2000. Atualmente, no
entanto, vige a Lei Estadual/MS nº 3.779, de 11.11.2009, que prevê expressamente o pagamento
de custas pela autarquia previdenciária, as quais devem ser recolhidas ao final do feito, pela parte
vencida, em consonância com o artigo 27 do CPC/73 (atual art. 91 do CPC/2015).
IX – Determinada a imediata implantação do benefício, na forma do artigo 497 do NCPC.
X - Apelação da parte autora parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, A Décima Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação da parte autora, para julgar procedente o
pedido e condenar o réu a conceder-lhe o benefício de prestação continuada, a partir da data do
requerimento administrativo (01.02.2016), nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
