
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5183404-22.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES
APELANTE: CIRLEI FRANCISCA DE SOUSA
Advogado do(a) APELANTE: ORLANDO LOLLI JUNIOR - SP280159-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5183404-22.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES
APELANTE: CIRLEI FRANCISCA DE SOUSA
Advogado do(a) APELANTE: ORLANDO LOLLI JUNIOR - SP280159-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
"Art. 20
(...)
§ 2º - para efeito de concessão deste benefício, considera-se:
I - pessoa com deficiência, aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas.
II - impedimentos de longo prazo: aqueles que incapacitam a pessoa com deficiência para a vida independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos."
"Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas."
“AGRAVO LEGAL EM EMBARGOS INFRINGENTES. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA IDOSA. PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. AGRAVO IMPROVIDO (...) 3 - Da análise do sistema CNIS/DATAPREV, verifica-se que o filho da autora possui apenas pequenos vínculos de trabalho, na maioria inferior a 03 meses, sendo que na maior parte do tempo esteve desempregado. Desse modo, mesmo incluindo a aposentadoria do marido da autora, a renda familiar per capita corresponde a pouco mais de R$ 300,00, ou seja, inferior a meio salário mínimo. 4 - Restou demonstrada, quantum satis, no caso em comento, situação de miserabilidade, prevista no art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993, a ensejar a concessão do benefício assistencial. 5 - Agravo improvido." (EI 00072617120124036112, Relator Desembargador Federal Toru Yamamoto, TRF3, j. 22/10/2015, e-DJF3 05/11/2015)
“PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (LOAS). EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO LEGAL. CARÁTER INFRINGENTE. IMPOSSIBILIDADE. CONTRADIÇÃO INEXISTENTE. (...)- No caso em exame, não há omissão a ser sanada, sendo o benefício indeferido pelo fato da renda familiar "per capita" ser superior a 1/2 salário mínimo. (...) 5- Embargos de declaração rejeitados." (AR 00082598120084030000, Relator Juiz Convocado Silva Neto, TRF3, j. 25/09/2014, e-DJF3 08/10/2014)
"Reside em casa alugada, declara o valor mensal com aluguel de R$ 300,00, a casa possui dois quartos, sala e cozinha conjugada, um banheiro, não possui área externa, não possui piso e revestimentos nas paredes, a construção é bem simples e possui móveis e utensílios domésticos bem simples, em mau estado de conservação devido às inúmeras vezes em que a família mudou-se de endereço, sendo todos de necessidades básicas, tais como geladeira e fogão, cama, sofá e televisão, o que condiz com a renda relatada pela família.
A localização do imóvel conta com infraestrutura, saneamento básico, pavimentação asfáltica e energia."
O companheiro da autora tem outros três filhos, para os quais paga pensão alimentícia no valor total de R$ 150,00. Declara "que esse é o valor que ele hoje tem condições de pagar".
Além disso, "é o responsável de todo o cuidado e compromisso em relação à Ítalo Samuel, como acordá-lo e levá-lo para a escola, nesta situação, Manuel que saí muito cedo para pegar o transporte que os leva até a lavoura, deixa Ítalo Samuel na residência de Zilda, irmã de Cirlei, que leva Ítalo Samuel até a Escola Municipal de Educação Infantil, onde cursa o Pré 2. No período vespertino, Ítalo Samuel frequenta o Projeto Social até as 16h, sendo esse traslado realizado pelo transporte escolar municipal".
O filho segue, ainda, em acompanhamento com terapeuta ocupacional, uma vez por semana, na Unidade Básica de Saúde, em razão de atraso de aprendizagem.
A postulante, "devido às medicações, não consegue ser responsável pelos cuidados diários que o filho necessita".
Os ganhos da família advém do trabalho do companheiro, diarista na atividade rural, obtendo R$ 60,00 por diária laborada, "sendo essa uma atividade sazonal que depende do plantio e colheita da safra do alimento cultivado.
A assistente social consignou que "Manuel é o único provedor da família e apresenta dificuldades em suprir todas as necessidades apresentadas pela família. A falta de qualificação profissional e baixa escolaridade dificultam que ele consiga trabalhar no mercado formal, com seus direitos trabalhistas assegurados e com melhor remuneração".
Além disso, recebem a transferência de R$ 124,00, pelo Programa Bolsa Família.
A esta altura, cabe lembrar que, na contabilização da renda familiar, torna-se imperiosa a exclusão dos rendimentos percebidos do aludido programa social, por força do Decreto nº 6.135/2007, que dispõe sobre o Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal, c/c o item 16.7 da OI INSS/DIRBEN nº 81/2003.
Assim, ainda que, por remota hipótese, o companheiro da autora trabalhasse todos os dias úteis do mês - assim considerada a média de 22 dias - a renda per capita não suplantaria a metade do salário mínimo, à época, de R$ 937,00.
Destarte, aflora, dos elementos dos autos, contexto de precariedade financeira tal a justificar a inclusão da parte autora no elenco de beneficiários da prestação buscada.
Dessa forma, divisa-se caracterizada conjuntura de miserabilidade.
Assim, restou demonstrada situação de hipossuficiência econômica, como indicado no sobredito paradigma do C. Supremo Tribunal Federal, exarado em repercussão geral, a autorizar o implante da benesse.
De acordo com o entendimento esposado pela jurisprudência dominante, o termo inicial do benefício deve ser fixado a partir da data de entrada do requerimento administrativo agilizado em 17/03/2016. Nesse sentido: APELREEX 00122689420114036139, Nona Turma, Relatora Desembargadora Federal Marisa Santos, j. 30/05/2016, e-DJF3 13/06/2016; APELREEX 00331902220114039999, Nona Turma, Relator Juiz Convocado Rodrigo Zacharias, j. 14/03/2016, e-DJF3 31/03/2016.
Averbe-se a esse respeito que, conquanto o perito médico não tenha estabelecido a data de início da incapacidade da requerente, observa-se que a ação foi instruída com documentos médicos contemporâneos à data do mencionado requerimento administrativo, trazendo diagnósticos idênticos aos inseridos no laudo pericial, situação que permite concluir que o requisito da deficiência já se fazia presente desde a postulação da benesse, na via administrativa.
Passo à análise dos consectários.
Cumpre esclarecer que, em 20 de setembro de 2017, o STF concluiu o julgamento do RE 870.947, definindo as seguintes teses de repercussão geral sobre a incidência da Lei n. 11.960/2009: "1) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput); quanto às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09; e 2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina."
Assim, a questão relativa à aplicação da Lei n. 11.960/2009, no que se refere aos juros de mora e à correção monetária, não comporta mais discussão, cabendo apenas o cumprimento da decisão exarada pelo STF em sede de repercussão geral.
Nesse cenário, sobre os valores em atraso incidirão juros e correção monetária em conformidade com os critérios legais compendiados no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, observadas as teses fixadas no julgamento final do RE 870.947, de relatoria do Ministro Luiz Fux.
Deve o INSS arcar com os honorários advocatícios em percentual mínimo a ser definido na fase de liquidação, nos termos do inciso II do § 4º do art. 85 do Código de Processo Civil, observando-se o disposto nos §§ 3º e 5º desse mesmo dispositivo legal e considerando-se as parcelas vencidas até a data da decisão concessiva do benefício, nos termos da Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Está o instituto previdenciário isento do pagamento de custas processuais, consoante o art. 4º, inciso I, da Lei Federal n. 9.289/96, art. 6º, da Lei do Estado de São Paulo n. 11.608/2003 e das Leis do Mato Grosso do Sul, de n. 1.135/91 e 1.936/98, alteradas pelos arts. 1º e 2º, da Lei n. 2.185/2000. Excluem-se da isenção as respectivas despesas processuais, além daquelas devidas à parte contrária.
Os valores já pagos, seja na via administrativa ou por força de decisão judicial, a título de quaisquer benefícios previdenciários ou assistenciais não cumuláveis, deverão ser integralmente abatidos do débito.
Saliente-se que, nos termos do art. 21, caput, da Lei n. 8.742/93, o benefício de prestação continuada deve ser revisto a cada dois anos, para avaliação da continuidade das condições que lhe deram origem.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, PARA REFORMAR A SENTENÇA E JULGAR PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO, concedendo-lhe o benefício de prestação continuada, a partir da data de entrada do requerimento administrativo, e fixando consectários na forma explicitada, abatidos eventuais valores já recebidos.
É como voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART. 203, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E LEI Nº 8.742/1993. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO CONCEDIDO.
- Atrelam-se, cumulativamente, à concessão do benefício de prestação continuada, o implemento de requisito etário ou a detecção de deficiência, demonstrada por exame pericial, e a verificação da ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da benesse, ou de tê-la suprida pela família.
- Constatadas, pelos laudos periciais, a deficiência e a hipossuficiência econômica, é devido o Benefício de Prestação Continuada, a partir da data de entrada do requerimento administrativo. Precedentes.
- Juros de mora, correção monetária e custas processuais fixados na forma explicitada.
- Honorários advocatícios a cargo do INSS em percentual mínimo a ser definido na fase de liquidação.
- Isenção da autarquia previdenciária do pagamento de custas processuais, com exceção das custas e despesas comprovadamente realizadas pela parte autora.
- Revisão do Benefício de Prestação Continuada a cada dois anos, para avaliação da continuidade das condições que lhe deram origem.
- Apelação da parte autora provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu dar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
