Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5132922-07.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal MARISA FERREIRA DOS SANTOS
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
08/08/2019
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 12/08/2019
Ementa
E M E N T A
CONSTITUCIONAL - BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA - ART. 203, V, DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. REQUISITOS COMPROVADOS. TERMO INICIAL -
REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA - LEI
11.960/09. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELAÇÃO PROVIDA.
I - O Supremo Tribunal Federal, no RE n. 567.985, reconheceu a inconstitucionalidade parcial,
sem pronúncia de nulidade, do art.20, §3º, da Lei nº 8.742/93, e do art. 34, par. único, da Lei nº
10.741/2003.
II - O estudo social feito em 12.06.2016 (ID-25076545) indica que a autora reside com a mãe,
Terezinha Mochosque, de 42 anos, e os irmãos Janaína Mochosque Ferreira, de 13, Mateus
Junior Moschosque Fernandes, de 11, e Raymyllane Moschosque Fernandes, de 08, em
“companhia da filha casada, Jaqueline Stefany Ferreira, casada, com um filho de 07 meses”, uma
vez que residiam em imóvel da Cohab, invadido. A residência é de “alvenaria, sem forro,
composta por 03 dormitórios, sala cozinha e banheiro. O mobiliário é básico, composto por
camas, cômodas, armário, mesas com cadeira, tanquinho e TV em cores. Atualmente a família
vive as expensas da filha e do genro”. A renda da família advém das pensões alimentícias que a
autora e as irmãs recebem, no valor total de R$ 530,00 (quinhentos e trinta reais) mensais. A mãe
da atora é trabalhadora rural e encontra-se temporariamente desempregada.
III – A consulta ao CNIS aponta que o último vínculo de trabalho da mãe da autora cessou em
25.08.2006.
IV - A renda familiar per capita sempre foi inferior à metade do salário mínimo ao mês.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
V - O laudo médico-pericial feito em 28.07.2016 (ID – 25076555) atesta que a autora apresenta
sequelas de trauma de crânio: crise convulsiva que compensadas com medicamentos, dificuldade
no aprendizado, tendo lentidão nas solicitações verbais, não sabe ler e identifica palavras curtas,
esquecimento de nomes de pessoas conhecidas, atualmente necessita de acompanhamento com
equipe multidisciplinar . Portanto sua incapacidade é total e temporária por um período de dois
anos necessitando de nova avaliação para considerar sequelas definitivas, considerei data do
acidente DII: 02/05/2015”.
VI - A autora tem limitações significativas, uma vez que é portadora de sequelas de trauma de
crânio, está em desvantagem se comparado a uma criança da mesma idade que não tenha o
mesmo problema e, considerando os múltiplos fatores do meio em que está inserido, como
família que se encontra na linha de pobreza, com pouca escolaridade, desemprego, baixa renda e
ausência de acesso a bens e serviços imprescindíveis à garantia dos direitos sociais básicos,
conforme parecer da Assistente Social, conclui-se que a autora se enquadra ao conceito de
pessoa com deficiência previsto no art. 20, § 2º, I e II.
VII - Levando-se em consideração as informações do estudo social e as demais condições
apresentadas, não justifica o indeferimento do benefício.
VIII - A situação é precária e de miserabilidade, dependendo do benefício assistencial para suprir
as necessidades básicas, sem condições de prover o seu sustento com a dignidade exigida pela
Constituição Federal.
IX - Comprovado o requerimento na via administrativa, o benefício é devido desde essa data.
X - A correção monetária será aplicada em conformidade com a Lei n. 6.899/81 e legislação
superveniente, de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da
Justiça Federal, observados os termos do julgamento final proferido na Repercussão Geral no RE
870.947, em 20/09/2017, ressalvada a possibilidade de, em fase de execução do julgado, operar-
se a modulação de efeitos, por força dedecisão a ser proferida pelo STF.
XI - Os juros moratórios serão calculados de forma global para as parcelas vencidas antes da
citação, e incidirão a partir dos respectivos vencimentos para as parcelas vencidas após a
citação. E serão de 0,5% (meio por cento) ao mês, na forma dos arts. 1.062 do antigo CC e 219
do CPC/1973, até a vigência do CC/2002, a partir de quando serão de 1% (um por cento) ao mês,
na forma dos arts. 406 do CC/2002 e 161, § 1º, do CTN. A partir de julho de 2.009, os juros
moratórios serão de 0,5% (meio por cento) ao mês, observado o disposto no art. 1º-F da Lei n.
9.494/97, alterado pelo art. 5º da Lei n. 11.960/2009, pela MP n. 567, de 13.05.2012, convertida
na Lei n. 12.703, de 07.08.2012, e legislação superveniente, bem comoResolução 458/2017 do
Conselho da Justiça Federal.
XII - O percentual da verba honorária será fixado somente na liquidação do julgado, na forma do
disposto no art. 85, § 4º, II, e § 11, e no art. 86, ambos do CPC/2015, e incidirá sobre as parcelas
vencidas até a data desta decisão (Súmula 111 do STJ).
XIII - Apelação provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5132922-07.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. MARISA SANTOS
APELANTE: RAYSSA MOSCHOSQUE FERNANDES
Advogado do(a) APELANTE: JOSE BRUN JUNIOR - SP128366-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5132922-07.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. MARISA SANTOS
APELANTE: RAYSSA MOSCHOSQUE FERNANDES
Advogado do(a) APELANTE: JOSE BRUN JUNIOR - SP128366-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Desembargadora Federal MARISA SANTOS (Relatora): Ação ajuizada contra o Instituto
Nacional do Seguro Social - INSS, para a obtenção do benefício assistencial previsto no ar. 203,
V, da CF.
Segundo a inicial, a autora é pessoa com deficiência, não tendo condições de prover seu sustento
ou de tê-lo provido por sua família, fazendo jus ao benefício.
Concedidos os benefícios da justiça gratuita.
O Juízo de 1º grau julgou improcedente o pedido e condenou a autora ao pagamento das custas,
despesas processuais e dos honorários advocatícios fixados em 10% do valor da causa,
observando-se os benefícios da justiça gratuita.
Sentença proferida em 30.08.2017.
Em apelação, a autora sustenta que preencheu os requisitos para a obtenção do benefício.
Sem contrarrazões, subiram os autos.
O Ministério Público Federal manifestou-se pelo provimento da apelação.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5132922-07.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. MARISA SANTOS
APELANTE: RAYSSA MOSCHOSQUE FERNANDES
Advogado do(a) APELANTE: JOSE BRUN JUNIOR - SP128366-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Desembargadora Federal MARISA SANTOS (Relatora): Ação ajuizada contra o Instituto
Nacional do Seguro Social - INSS, para a obtenção do benefício assistencial previsto no ar. 203,
V, da CF.
O benefício da assistência social, de caráter não contributivo, tem como alguns de seus princípios
norteadores a construção de uma sociedade livre, justa e solidária e o enfrentamento da pobreza
no nosso País, que constituem os objetivos fundamentais consagrados no art. 3º, I e III, da CF,
garantindo-se os mínimos sociais àqueles que efetivamente necessitam.
A Lei nº 8.742, de 07.12.1993, regulamentou a Assistência Social, prevista no mencionado art.
203, V, da CF. Em seu art. 20, dispôs sobre as condições para a concessão do benefício: ser
pessoa portadora de deficiência, ou idoso com 70 (setenta) anos ou mais - idade posteriormente
reduzida para 67 (sessenta e sete) anos - e, em ambos os casos, sem condições de prover seu
próprio sustento ou tê-lo provido pela família.
O Estatuto do Idoso - Lei nº 10.741, de 01.10.2003 - reduziu a idade mínima do idoso para 65
anos - art. 34.
O art. 20 da LOAS - Lei Orgânica da Assistência Social foi alterado pela Lei nº 12.435, de
06.7.2011 (DOU 07.7.2011), que adotou a expressão "pessoa com deficiência" e a idade de 65
(sessenta e cinco) anos ou mais já prevista no Estatuto do Idoso.
Também o conceito de pessoa com deficiência foi alterado pela nova lei. O § 2º do art. 20 passou
a dispor:
§ 2º. Para efeito de concessão deste benefício, considera-se:
I - pessoa com deficiência: aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física,
intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua
participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas;
II - impedimentos de longo prazo: aqueles que incapacitam a pessoa com deficiência para a vida
independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.
O § 3º do art. 20 da Lei 8.742/93 estabelece que a renda per capita familiar deve ser inferior a ¼
do salário mínimo. A inconstitucionalidade desse dispositivo da LOAS foi arguida na ADIN nº
1.232-1, julgada improcedente por maioria de votos pelo Plenário do STF.
A questão não restou pacificada na jurisprudência do STJ e do próprio STF, que passaram a
adotar o entendimento de que a ADIn nº 1.232-1 não retirou a possibilidade de aferição da
necessidade por outros meios de prova que não a renda per capita familiar, mas, sim, que o § 3º
do art. 20 estabeleceu uma presunção objetiva e absoluta de miserabilidade. Assim sendo, a
família com renda mensal per capita inferior a ¼ do salário mínimo encontra-se em estado de
penúria, configurando tal situação prova incontestável de necessidade do benefício, dispensando
outros elementos probatórios. Daí que, caso suplantado tal limite, outros meios de prova
poderiam ser utilizados para a demonstração da condição de miserabilidade, expressa na
situação de absoluta carência de recursos para a subsistência.
Nesse sentido o entendimento do STJ - REsp 222778/SP, 5ª Turma, Rel. Min. Edson Vidigal, j.
04.11.1999, DJU 29.11.1999, p. 190:
"A Lei 8742/93, Art. 20, § 3º, quis apenas definir que a renda familiar inferior a ¼ do salário-
mínimo é, objetivamente considerada, insuficiente para a subsistência do idoso ou portador de
deficiência; tal regra não afasta, no caso em concreto, outros meios de prova da condição de
miserabilidade da família do necessitado".
A questão foi novamente levada a julgamento pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, que
reconheceu a Repercussão Geral da matéria nos autos do Recurso Extraordinário 567985/MT,
Rel. Min. Marco Aurélio, Rel. p/ Acórdão Min. Gilmar Mendes, j. 18/04/2013, publicado em
03.10.2013:
"... O requisito financeiro estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao
fundamento de que permitiria que situações de patente miserabilidade social fossem
consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto constitucionalmente. Ao apreciar
a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal declarou a
constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS. 3. Decisões judiciais contrárias aos critérios
objetivos preestabelecidos e Processo de inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei
8.742/1993. A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia
quanto à aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS.
Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se contornar o critério objetivo e
único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias
com entes idosos ou deficientes. Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios
mais elásticos para a concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004,
que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à
Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder
Executivo a conceder apoio financeiro a Municípios que instituírem programas de garantia de
renda mínima associados a ações socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões
monocráticas, passou a rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade do
critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de
notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações
legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros
benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro). 4. Declaração de inconstitucionalidade
parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993. 5. Recurso extraordinário
a que se nega provimento" (destaquei).
A fixação da renda per capita familiar inferior ao salário mínimo é excludente do bem-estar e
justiça sociais que o art. 193 da Constituição Federal elegeu como objetivos da Ordem Social.
A fixação do salário mínimo como garantia do trabalhador e do inativo para fins de garantir sua
manutenção e de sua família, com o mínimo necessário à sobrevivência com dignidade,
representa um critério quantificador do bem-estar social que a todos deve ser garantido, inclusive
aos beneficiários do benefício assistencial previsto no art. 203, V, da Constituição.
Nessa linha de entendimento, o correto seria que a renda per capita familiar, para fins de
concessão do BPC, não pudesse ser superior a 1 (um) salário mínimo. Esse critério traria para
dentro do sistema de Assistência Social um número bem maior de pessoas idosas e com
deficiência. Seria dar a todos, dentro e fora do sistema de Assistência Social, o mesmo grau de
dignidade e de bem-estar, reduzindo desigualdades sociais.
A declaração de inconstitucionalidade do § 3º do art. 20 da LOAS - Lei Orgânica da Assistência
Social, na prática, resulta na inexistência de nenhum critério, abrindo a possibilidade de o
intérprete utilizar todos os meios de provas disponíveis para a verificação da situação de miséria
que a lei quer remediar.
Cabe à legislação infraconstitucional a definição dos critérios e requisitos para concessão do
benefício, conforme prevê o art. 203, V, da CF. Deve, para isso, obedecer aos princípios do art.
194, dentre eles a seletividade e distributividade. Ou seja, cabe ao legislador ordinário selecionar
as contingências merecedoras de proteção e distribuí-las de acordo com o número de
beneficiários e o orçamento de que dispõe.
A seletividade e a distributividade, contudo, por serem princípios setoriais, estão conformadas ao
princípio geral do respeito à isonomia. Não pode a lei eleger como discrimen critério violador da
isonomia.
A fixação do critério aferidor da necessidade é atribuição do legislador e não do juiz. Mas, diante
do caso concreto, a jurisdição não pode ser negada por falta de critério legal.
A atividade legislativa não é do Poder Judiciário, de modo que não lhe cabe criar critério que
substitua o previsto no § 3º do art. 20. Porém, parece razoável estabelecer presunção absoluta de
miserabilidade quando a renda per capita familiar for inferior a metade do salario mínimo vigente,
para que, em sendo superior, outras provas possam ser consideradas para averiguar a real
necessidade de concessão do benefício.
O estudo social feito em 12.06.2016 (ID-25076545) indica que a autora reside com a mãe,
Terezinha Mochosque, de 42 anos, e os irmãos Janaína Mochosque Ferreira, de 13, Mateus
Junior Moschosque Fernandes, de 11, e Raymyllane Moschosque Fernandes, de 08, em
“companhia da filha casada, Jaqueline Stefany Ferreira, casada, com um filho de 07 meses”, uma
vez que residiam em imóvel da Cohab, invadido. A residência é de “alvenaria, sem forro,
composta por 03 dormitórios, sala cozinha e banheiro. O mobiliário é básico, composto por
camas, cômodas, armário, mesas com cadeira, tanquinho e TV em cores. Atualmente a família
vive as expensas da filha e do genro”. A renda da família advém das pensões alimentícias que a
autora e as irmãs recebem, no valor total de R$ 530,00 (quinhentos e trinta reais) mensais. A mãe
da atora é trabalhadora rural e encontra-se temporariamente desempregada.
A consulta ao CNIS aponta que o último vínculo de trabalho da mãe da autora cessou em
25.08.2006.
Assim, a renda familiar per capita sempre foi inferior à metade do salário mínimo ao mês.
Dessa forma, a autora preenche o requisito da hipossuficiência.
O laudo médico-pericial feito em 28.07.2016 (ID – 25076555) atesta que a autora apresenta
sequelas de trauma de crânio: crise convulsiva que compensadas com medicamentos, dificuldade
no aprendizado, tendo lentidão nas solicitações verbais, não sabe ler e identifica palavras curtas,
esquecimento de nomes de pessoas conhecidas, atualmente necessita de acompanhamento com
equipe multidisciplinar . Portanto sua incapacidade é total e temporária por um período de dois
anos necessitando de nova avaliação para considerar sequelas definitivas, considerei data do
acidente DII: 02/05/2015”.
A autora tem limitações significativas, uma vez que é portadora de sequelas de trauma de crânio,
está em desvantagem se comparado a uma criança da mesma idade que não tenha o mesmo
problema e, considerando os múltiplos fatores do meio em que está inserido, como família que se
encontra na linha de pobreza, com pouca escolaridade, desemprego, baixa renda e ausência de
acesso a bens e serviços imprescindíveis à garantia dos direitos sociais básicos, conforme
parecer da Assistente Social, conclui-se que a autora se enquadra ao conceito de pessoa com
deficiência previsto no art. 20, § 2º, I e II.
Nesse sentido:
"PREVIDENCIÁRIO - BENEFÍCIO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL - ART. 203, V, DA CF/88 -
PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA - EXTINÇÃO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO -
MENOR IMPÚBERE - APELAÇÃO DA PARTE AUTORA - ARTIGO 20, DA LEI Nº 8.742/93 -
SENTENÇA REFORMADA - APELAÇÃO PROVIDA.
- O artigo 20 e parágrafos da Lei nº 8.472/93 garantem o benefício assistencial de um salário
mínimo à pessoa portadora de deficiência, sem distinguir se o deficiente é menor impúbere ou
maior de 16 (dezesseis) anos.
- A norma insculpida no artigo 7º, inciso XXXIII da Constituição Federal visa a proteção da criança
e adolescente ao fixar idade mínima para o desenvolvimento de atividade laboral. Assim, ante o
caráter protetivo da referida norma, sua interpretação não pode restringir ou impedir o amparo
assistencial ao hipossuficiente.
- O laudo pericial é meio hábil para esclarecimento acerca da impossibilidade total e permanente
para o exercício das atividades laborais e da vida diária, caso constatada a deficiência física ou
mental, sem que seja necessário aguardar a idade limite para o ingresso no mercado de trabalho.
- Sentença reformada.
- Apelação provida."
(APELAÇÃO CÍVEL Nº 2003.03.99.027632-5/SP, Rel. Desembargadora Federal Eva Regina, 7ª
Turma, publicado no D.E. em 18/01/2010).
Acrescente-se que, nos termos do art. 21, caput, da Lei n. 8.742/93, o benefício de prestação
continuada deve ser revisto a cada dois anos, para avaliação da continuidade das condições que
lhe deram origem.
Assim, preenche a autora os requisitos necessários ao deferimento do benefício.
Comprovado o requerimento na via administrativa, o benefício é devido desde essa data.
As parcelas vencidas serão acrescidas de correção monetária a partir dos respectivos
vencimentos e de juros moratórios a partir da citação.
A correção monetária será aplicada em conformidade com a Lei n. 6.899/81 e legislação
superveniente, de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da
Justiça Federal, observados os termos do julgamento final proferido na Repercussão Geral no RE
870.947, em 20/09/2017, ressalvada a possibilidade de, em fase de execução do julgado, operar-
se a modulação de efeitos, por força dedecisão a ser proferida pelo STF.
Os juros moratórios serão calculados de forma global para as parcelas vencidas antes da citação,
e incidirão a partir dos respectivos vencimentos para as parcelas vencidas após a citação. E
serão de 0,5% (meio por cento) ao mês, na forma dos arts. 1.062 do antigo CC e 219 do
CPC/1973, até a vigência do CC/2002, a partir de quando serão de 1% (um por cento) ao mês, na
forma dos arts. 406 do CC/2002 e 161, § 1º, do CTN. A partir de julho de 2.009, os juros
moratórios serão de 0,5% (meio por cento) ao mês, observado o disposto no art. 1º-F da Lei n.
9.494/97, alterado pelo art. 5º da Lei n. 11.960/2009, pela MP n. 567, de 13.05.2012, convertida
na Lei n. 12.703, de 07.08.2012, e legislação superveniente, bem comoResolução 458/2017 do
Conselho da Justiça Federal.
Tratando-se de decisão ilíquida, o percentual da verba honorária será fixado somente na
liquidação do julgado, na forma do disposto no art. 85, § 4º, II, e § 11, e no art. 86, ambos do
CPC/2015, e incidirá sobre as parcelas vencidas até a data desta decisão (Súmula 111 do STJ).
DOU PROVIMENTO à apelação para julgar procedente o pedido e condenar o INSS a pagar ao
autor o benefício assistencial desde a data do requerimento administrativo, em 01.10.2015, com
correção monetária, juros de mora e honorários advocatícios nos termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL - BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA - ART. 203, V, DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. REQUISITOS COMPROVADOS. TERMO INICIAL -
REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA - LEI
11.960/09. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELAÇÃO PROVIDA.
I - O Supremo Tribunal Federal, no RE n. 567.985, reconheceu a inconstitucionalidade parcial,
sem pronúncia de nulidade, do art.20, §3º, da Lei nº 8.742/93, e do art. 34, par. único, da Lei nº
10.741/2003.
II - O estudo social feito em 12.06.2016 (ID-25076545) indica que a autora reside com a mãe,
Terezinha Mochosque, de 42 anos, e os irmãos Janaína Mochosque Ferreira, de 13, Mateus
Junior Moschosque Fernandes, de 11, e Raymyllane Moschosque Fernandes, de 08, em
“companhia da filha casada, Jaqueline Stefany Ferreira, casada, com um filho de 07 meses”, uma
vez que residiam em imóvel da Cohab, invadido. A residência é de “alvenaria, sem forro,
composta por 03 dormitórios, sala cozinha e banheiro. O mobiliário é básico, composto por
camas, cômodas, armário, mesas com cadeira, tanquinho e TV em cores. Atualmente a família
vive as expensas da filha e do genro”. A renda da família advém das pensões alimentícias que a
autora e as irmãs recebem, no valor total de R$ 530,00 (quinhentos e trinta reais) mensais. A mãe
da atora é trabalhadora rural e encontra-se temporariamente desempregada.
III – A consulta ao CNIS aponta que o último vínculo de trabalho da mãe da autora cessou em
25.08.2006.
IV - A renda familiar per capita sempre foi inferior à metade do salário mínimo ao mês.
V - O laudo médico-pericial feito em 28.07.2016 (ID – 25076555) atesta que a autora apresenta
sequelas de trauma de crânio: crise convulsiva que compensadas com medicamentos, dificuldade
no aprendizado, tendo lentidão nas solicitações verbais, não sabe ler e identifica palavras curtas,
esquecimento de nomes de pessoas conhecidas, atualmente necessita de acompanhamento com
equipe multidisciplinar . Portanto sua incapacidade é total e temporária por um período de dois
anos necessitando de nova avaliação para considerar sequelas definitivas, considerei data do
acidente DII: 02/05/2015”.
VI - A autora tem limitações significativas, uma vez que é portadora de sequelas de trauma de
crânio, está em desvantagem se comparado a uma criança da mesma idade que não tenha o
mesmo problema e, considerando os múltiplos fatores do meio em que está inserido, como
família que se encontra na linha de pobreza, com pouca escolaridade, desemprego, baixa renda e
ausência de acesso a bens e serviços imprescindíveis à garantia dos direitos sociais básicos,
conforme parecer da Assistente Social, conclui-se que a autora se enquadra ao conceito de
pessoa com deficiência previsto no art. 20, § 2º, I e II.
VII - Levando-se em consideração as informações do estudo social e as demais condições
apresentadas, não justifica o indeferimento do benefício.
VIII - A situação é precária e de miserabilidade, dependendo do benefício assistencial para suprir
as necessidades básicas, sem condições de prover o seu sustento com a dignidade exigida pela
Constituição Federal.
IX - Comprovado o requerimento na via administrativa, o benefício é devido desde essa data.
X - A correção monetária será aplicada em conformidade com a Lei n. 6.899/81 e legislação
superveniente, de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da
Justiça Federal, observados os termos do julgamento final proferido na Repercussão Geral no RE
870.947, em 20/09/2017, ressalvada a possibilidade de, em fase de execução do julgado, operar-
se a modulação de efeitos, por força dedecisão a ser proferida pelo STF.
XI - Os juros moratórios serão calculados de forma global para as parcelas vencidas antes da
citação, e incidirão a partir dos respectivos vencimentos para as parcelas vencidas após a
citação. E serão de 0,5% (meio por cento) ao mês, na forma dos arts. 1.062 do antigo CC e 219
do CPC/1973, até a vigência do CC/2002, a partir de quando serão de 1% (um por cento) ao mês,
na forma dos arts. 406 do CC/2002 e 161, § 1º, do CTN. A partir de julho de 2.009, os juros
moratórios serão de 0,5% (meio por cento) ao mês, observado o disposto no art. 1º-F da Lei n.
9.494/97, alterado pelo art. 5º da Lei n. 11.960/2009, pela MP n. 567, de 13.05.2012, convertida
na Lei n. 12.703, de 07.08.2012, e legislação superveniente, bem comoResolução 458/2017 do
Conselho da Justiça Federal.
XII - O percentual da verba honorária será fixado somente na liquidação do julgado, na forma do
disposto no art. 85, § 4º, II, e § 11, e no art. 86, ambos do CPC/2015, e incidirá sobre as parcelas
vencidas até a data desta decisão (Súmula 111 do STJ).
XIII - Apelação provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
