Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5231329-48.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal MARISA FERREIRA DOS SANTOS
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
28/07/2019
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 31/07/2019
Ementa
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA - ART. 203, INCISO V, DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. DEFICIÊNCIA NÃO COMPROVADA. APELAÇÃO IMPROVIDA.
I - Desnecessária a produção de nova perícia porque o laudo médico foi feito por profissional
habilitado, bem como sua conclusão baseou-se em exames físicos. O laudo pericial conclusivo e
fundamentado, não havendo qualquer contrariedade ou dúvida. Não houve prejuízo às partes
capaz de ensejar a nulidade do feito.
II - O Supremo Tribunal Federal, no RE n. 567.985, reconheceu a inconstitucionalidade parcial,
sem pronúncia de nulidade, do art.20, §3º, da Lei nº 8.742/93, e do art. 34, par. único, da Lei nº
10.741/2003.
III - O laudo médico-pericial feito em 22.11.2017 (ID- 31712491) atesta que o autor é portador de
artrose na coluna, que não o incapacita para o trabalho.
IV – A patologia apontada pelo perito não se ajusta ao conceito de pessoa com deficiência
previsto no art. 20, § 2º, I e II.
V - Apelação improvida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5231329-48.2019.4.03.9999
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. MARISA SANTOS
APELANTE: ANTONIO CARLOS ESTEVAM
Advogados do(a) APELANTE: JOSE EDUARDO BORTOLOTTI - SP246867-N, SHEILA
FERNANDA PIMENTA - SP393926-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5231329-48.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. MARISA SANTOS
APELANTE: ANTONIO CARLOS ESTEVAM
Advogados do(a) APELANTE: JOSE EDUARDO BORTOLOTTI - SP246867-N, SHEILA
FERNANDA PIMENTA - SP393926-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Desembargadora Federal MARISA SANTOS (Relatora): Ação ajuizada contra o Instituto
Nacional do Seguro Social - INSS, para a obtenção do benefício assistencial previsto no art. 203,
V, da CF.
Segundo a inicial, o autor é pessoa com deficiência, não tendo condições de prover seu sustento
ou de tê-lo provido por sua família, fazendo jus ao benefício.
Concedidos os benefícios da assistência judiciária gratuita.
O Juízo de 1º grau julgou improcedente o pedido e condenou o autor ao pagamento das custas,
despesas processuais e dos honorários advocatícios fixados em R$ 500,00, observando-se os
termos do art. 98, §3º, do CPC.
Sentença proferida em 29.09.2017.
Em apelação, o autor sustenta que a sentença “merece ser ANULADA, afim de que seja realizado
novo exame médico pericial em razão da inexatidão dos resultados do laudo pericial judicial e, via
de consequência, NÃO RESTANDO SUFICIENTE ESCLARECIA A MATÉRIA”, e, no mérito,
alega que preencheu os requisitos para a obtenção do benefício.
Sem contrarrazões, subiram os autos.
Parecer do Ministério Público Federal, opinando pelo improvimento da apelação.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5231329-48.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. MARISA SANTOS
APELANTE: ANTONIO CARLOS ESTEVAM
Advogados do(a) APELANTE: JOSE EDUARDO BORTOLOTTI - SP246867-N, SHEILA
FERNANDA PIMENTA - SP393926-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Desembargadora Federal MARISA SANTOS (Relatora): Ação ajuizada contra o Instituto
Nacional do Seguro Social - INSS, para a obtenção do benefício assistencial previsto no art. 203,
V, da CF.
Desnecessária a produção de nova perícia porque o laudo médico foi feito por profissional
habilitado, bem como sua conclusão baseou-se em exames físicos.
Ademais, o laudo pericial conclusivo e fundamentado, não havendo qualquer contrariedade ou
dúvida.
Não houve prejuízo às partes capaz de ensejar a nulidade do feito, não havendo cerceamento de
defesa.
Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL: AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. APRESENTAÇÃO DE
LAUDO PERICIAL. INSTRUÇÃO PROCESSUAL ENCERRADA. REALIZAÇÃO DE NOVA
PERÍCIA. DESNECESSIDADE. RECURSO IMPROVIDO.
I - O destinatário da prova é o juiz que verificará a necessidade de sua realização a fim de formar
sua convicção a respeito da lide, nos termos do art. 130, do CPC.
II - Verificada a desnecessidade de realização da prova, é lícito ao magistrado indeferi-la, quando
o fato controvertido não depender desta para seu deslinde. Só ao juiz cabe avaliar a necessidade
de novas provas.
III - Produção de prova pericial deferida. Apresentado o laudo, o perito respondeu às questões
formuladas pelos requerentes.
IV - Considerando que o laudo pericial apresentado contém elementos suficientes para a
formação do convencimento do Magistrado a quo, e que atendeu plenamente as indagações
apresentadas, não restando qualquer omissão ou imprecisão a sanar, desnecessária a realização
de uma nova perícia médica.
V - Inocorrência de cerceamento de defesa, vez que, a agravante teve oportunidade de se
manifestar sobre o laudo.
VI - Agravo não provido.
(TRF 3ª Região, AG 193962, Proc. 200303000735242/SP, 8ª Turma, unânime, Des. Fed.
Marianina Galante, DJU 29/03/2006, p. 537).
O benefício da assistência social, de caráter não contributivo, tem como alguns de seus princípios
norteadores a construção de uma sociedade livre, justa e solidária e o enfrentamento da pobreza
no nosso País, que constituem os objetivos fundamentais consagrados no art. 3º, I e III, da CF,
garantindo-se os mínimos sociais àqueles que efetivamente necessitam.
A Lei nº 8.742, de 07.12.1993, regulamentou a Assistência Social, prevista no mencionado art.
203, V, da CF. Em seu art. 20, dispôs sobre as condições para a concessão do benefício: ser
pessoa portadora de deficiência, ou idoso com 70 (setenta) anos ou mais - idade posteriormente
reduzida para 67 (sessenta e sete) anos - e, em ambos os casos, sem condições de prover seu
próprio sustento ou tê-lo provido pela família.
O Estatuto do Idoso - Lei nº 10.741, de 01.10.2003 - reduziu a idade mínima do idoso para 65
anos - art. 34.
O art. 20 da LOAS - Lei Orgânica da Assistência Social foi alterado pela Lei nº 12.435, de
06.7.2011 (DOU 07.7.2011), que adotou a expressão "pessoa com deficiência" e a idade de 65
(sessenta e cinco) anos ou mais já prevista no Estatuto do Idoso.
Também o conceito de pessoa com deficiência foi alterado pela nova lei. O § 2º do art. 20 passou
a dispor:
§ 2º. Para efeito de concessão deste benefício, considera-se:
I - pessoa com deficiência: aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física,
intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua
participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas;
II - impedimentos de longo prazo: aqueles que incapacitam a pessoa com deficiência para a vida
independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.
O § 3º do art. 20 da Lei 8.742/93 estabelece que a renda per capita familiar deve ser inferior a ¼
do salário mínimo. A inconstitucionalidade desse dispositivo da LOAS foi arguida na ADIN nº
1.232-1, julgada improcedente por maioria de votos pelo Plenário do STF.
A questão não restou pacificada na jurisprudência do STJ e do próprio STF, que passaram a
adotar o entendimento de que a ADIn nº 1.232-1 não retirou a possibilidade de aferição da
necessidade por outros meios de prova que não a renda per capita familiar, mas, sim, que o § 3º
do art. 20 estabeleceu uma presunção objetiva e absoluta de miserabilidade. Assim sendo, a
família com renda mensal per capita inferior a ¼ do salário mínimo encontra-se em estado de
penúria, configurando tal situação prova incontestável de necessidade do benefício, dispensando
outros elementos probatórios. Daí que, caso suplantado tal limite, outros meios de prova
poderiam ser utilizados para a demonstração da condição de miserabilidade, expressa na
situação de absoluta carência de recursos para a subsistência.
Nesse sentido o entendimento do STJ - REsp 222778/SP, 5ª Turma, Rel. Min. Edson Vidigal, j.
04.11.1999, DJU 29.11.1999, p. 190:
"A Lei 8742/93, Art. 20, § 3º, quis apenas definir que a renda familiar inferior a ¼ do salário-
mínimo é, objetivamente considerada, insuficiente para a subsistência do idoso ou portador de
deficiência; tal regra não afasta, no caso em concreto, outros meios de prova da condição de
miserabilidade da família do necessitado".
A questão foi novamente levada a julgamento pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, que
reconheceu a Repercussão Geral da matéria nos autos do Recurso Extraordinário 567985/MT,
Rel. Min. Marco Aurélio, Rel. p/ Acórdão Min. Gilmar Mendes, j. 18/04/2013, publicado em
03.10.2013:
"... O requisito financeiro estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao
fundamento de que permitiria que situações de patente miserabilidade social fossem
consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto constitucionalmente. Ao apreciar
a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal declarou a
constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS. 3. Decisões judiciais contrárias aos critérios
objetivos preestabelecidos e Processo de inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei
8.742/1993. A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia
quanto à aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS.
Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se contornar o critério objetivo e
único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias
com entes idosos ou deficientes. Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios
mais elásticos para a concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004,
que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à
Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder
Executivo a conceder apoio financeiro a Municípios que instituírem programas de garantia de
renda mínima associados a ações socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões
monocráticas, passou a rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade do
critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de
notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações
legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros
benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro). 4. Declaração de inconstitucionalidade
parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993. 5. Recurso extraordinário
a que se nega provimento" (destaquei).
A fixação da renda per capita familiar inferior ao salário mínimo é excludente do bem-estar e
justiça sociais que o art. 193 da Constituição Federal elegeu como objetivos da Ordem Social.
A fixação do salário mínimo como garantia do trabalhador e do inativo para fins de garantir sua
manutenção e de sua família, com o mínimo necessário à sobrevivência com dignidade,
representa um critério quantificador do bem-estar social que a todos deve ser garantido, inclusive
aos beneficiários do benefício assistencial previsto no art. 203, V, da Constituição.
Nessa linha de entendimento, o correto seria que a renda per capita familiar, para fins de
concessão do BPC, não pudesse ser superior a 1 (um) salário mínimo. Esse critério traria para
dentro do sistema de Assistência Social um número bem maior de pessoas idosas e com
deficiência. Seria dar a todos, dentro e fora do sistema de Assistência Social, o mesmo grau de
dignidade e de bem-estar, reduzindo desigualdades sociais.
A declaração de inconstitucionalidade do § 3º do art. 20 da LOAS - Lei Orgânica da Assistência
Social, na prática, resulta na inexistência de nenhum critério, abrindo a possibilidade de o
intérprete utilizar todos os meios de provas disponíveis para a verificação da situação de miséria
que a lei quer remediar.
Cabe à legislação infraconstitucional a definição dos critérios e requisitos para concessão do
benefício, conforme prevê o art. 203, V, da CF. Deve, para isso, obedecer aos princípios do art.
194, dentre eles a seletividade e distributividade. Ou seja, cabe ao legislador ordinário selecionar
as contingências merecedoras de proteção e distribuí-las de acordo com o número de
beneficiários e o orçamento de que dispõe.
A seletividade e a distributividade, contudo, por serem princípios setoriais, estão conformadas ao
princípio geral do respeito à isonomia. Não pode a lei eleger como discrimen critério violador da
isonomia.
A fixação do critério aferidor da necessidade é atribuição do legislador e não do juiz. Mas, diante
do caso concreto, a jurisdição não pode ser negada por falta de critério legal.
A atividade legislativa não é do Poder Judiciário, de modo que não lhe cabe criar critério que
substitua o previsto no § 3º do art. 20. Porém, parece razoável estabelecer presunção absoluta de
miserabilidade quando a renda per capita familiar for inferior a metade do salario mínimo vigente,
para que, em sendo superior, outras provas possam ser consideradas para averiguar a real
necessidade de concessão do benefício.
O laudo médico-pericial feito em 22.11.2017 (ID- 31712491) atesta que o autor é portador de
artrose na coluna, que não o incapacita para o trabalho.
Dessa forma, a patologia apontada pelo perito não se ajusta ao conceito de pessoa com
deficiência previsto no art. 20, § 2º, I e II.
Assim, não preenchendo o autor o requisito da deficiência, desnecessária a apreciação de sua
hipossuficiência.
NEGO PROVIMENTO à apelação.
É o voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA - ART. 203, INCISO V, DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. DEFICIÊNCIA NÃO COMPROVADA. APELAÇÃO IMPROVIDA.
I - Desnecessária a produção de nova perícia porque o laudo médico foi feito por profissional
habilitado, bem como sua conclusão baseou-se em exames físicos. O laudo pericial conclusivo e
fundamentado, não havendo qualquer contrariedade ou dúvida. Não houve prejuízo às partes
capaz de ensejar a nulidade do feito.
II - O Supremo Tribunal Federal, no RE n. 567.985, reconheceu a inconstitucionalidade parcial,
sem pronúncia de nulidade, do art.20, §3º, da Lei nº 8.742/93, e do art. 34, par. único, da Lei nº
10.741/2003.
III - O laudo médico-pericial feito em 22.11.2017 (ID- 31712491) atesta que o autor é portador de
artrose na coluna, que não o incapacita para o trabalho.
IV – A patologia apontada pelo perito não se ajusta ao conceito de pessoa com deficiência
previsto no art. 20, § 2º, I e II.
V - Apelação improvida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelaçao, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
