Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5784452-98.2019.4.03.9999
Relator(a) para Acórdão
Desembargador Federal MARISA FERREIRA DOS SANTOS
Relator(a)
Juiz Federal Convocado VANESSA VIEIRA DE MELLO
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
31/01/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 04/02/2020
Ementa
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA - ART. 203, INCISO V, DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. DEFICIÊNCIA NÃO COMPROVADA. APELAÇÃO IMPROVIDA.
I - O Supremo Tribunal Federal, no RE n. 567.985, reconheceu a inconstitucionalidade parcial,
sem pronúncia de nulidade, do art.20, §3º, da Lei nº 8.742/93, e do art. 34, par. único, da Lei nº
10.741/2003.
II - O laudo médico-pericial feito em 8.5.2018, informa que o autor, com 40 anos na ocasião, que
trabalhou como açougueiro e autônomo, no ramo pet shop, banho e tosa de animais, é portador
do vírus HIV B24, desde o ano de 2016. O perito concluiu pela ausência de incapacidade para as
atividades habituais, tendo em vista que o autor está clinicamente apto para o exercício de suas
atividades laborativas.
III - O vírus é patologia que inexoravelmente acarreta limitações para o mercado de trabalho,
diante das frequentes manifestações de quadros de infecções, que debilitam progressivamente o
organismo, além de ser incurável, de forma a impor tratamento e acompanhamento médico
permanentes. No entanto, não é este o caso dos autos, pois, conforme assevera o perito, “a parte
autora está clinicamente apta às suas atividades habituais”.
IV - A situação apontada pelo perito não se ajusta ao conceito de pessoa com deficiência previsto
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
no art. 20, § 2º, I e II.
V - Apelação improvida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5784452-98.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA VANESSA MELLO
APELANTE: JOAO BATISTA DE SOUZA
Advogado do(a) APELANTE: JOEL ALEXANDRE SCARPIN AGOSTINI - SP245469-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5784452-98.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA VANESSA MELLO
APELANTE: JOAO BATISTA DE SOUZA
Advogado do(a) APELANTE: JOEL ALEXANDRE SCARPIN AGOSTINI - SP245469-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso de apelação, interposto pela parte autora, em face da r. sentença que julgou
improcedente o pedido deduzido na inicial, de concessão de benefício assistencial a pessoa
deficiente.
Pretendeo apelante seja reformado o julgado, sustentando, em síntese, a presença dos requisitos
à outorga da benesse, ao lume de suas condições pessoais, visto ser portador de HIV. Suscita,
por fim, o prequestionamento legal para efeito de interposição de recursos.
Decorrido, “in albis”, o prazo para as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
O Ministério Público Federal ofertou parecer. Opinoupelo desprovimento da apelação.
É o relatório.
DECLARAÇÃO DE VOTO
A Desembargadora Federal MARISA SANTOS: Cuida-se de declarar o voto proferido no
julgamento da apelação interposta pelo autor contra sentença que julgou improcedente o pedido
de concessão de benefício assistencial.
Alega a presença dos requisitos autorizadores da concessão do benefício, destacando a sua
condição de portador de HIV.
Na sessão de julgamento de 27 de novembro de 2019, a senhora Relatora deu provimento à
apelação para conceder o benefício, sendo divergente o voto desta Magistrada que lhe negava
provimento.
Passo a declarar o voto.
O benefício da assistência social, de caráter não contributivo, tem como alguns de seus princípios
norteadores a construção de uma sociedade livre, justa e solidária e o enfrentamento da pobreza
no nosso País, que constituem os objetivos fundamentais consagrados no art. 3º, I e III, da CF,
garantindo-se os mínimos sociais àqueles que efetivamente necessitam.
A Lei nº 8.742, de 07.12.1993, regulamentou a Assistência Social, prevista no mencionado art.
203, V, da CF. Em seu art. 20, dispôs sobre as condições para a concessão do benefício: ser
pessoa portadora de deficiência, ou idoso com 70 (setenta) anos ou mais - idade posteriormente
reduzida para 67 (sessenta e sete) anos - e, em ambos os casos, sem condições de prover seu
próprio sustento ou tê-lo provido pela família.
O Estatuto do Idoso - Lei nº 10.741, de 01.10.2003 - reduziu a idade mínima do idoso para 65
anos - art. 34.
O art. 20 da LOAS - Lei Orgânica da Assistência Social foi alterado pela Lei nº 12.435, de
06.7.2011 (DOU 07.7.2011), que adotou a expressão "pessoa com deficiência" e a idade de 65
(sessenta e cinco) anos ou mais já prevista no Estatuto do Idoso.
Também o conceito de pessoa com deficiência foi alterado pela nova lei. O § 2º do art. 20 passou
a dispor:
§ 2º. Para efeito de concessão deste benefício, considera-se:
I - pessoa com deficiência: aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física,
intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua
participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas;
II - impedimentos de longo prazo: aqueles que incapacitam a pessoa com deficiência para a vida
independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.
O § 3º do art. 20 da Lei 8.742/93 estabelece que a renda per capita familiar deve ser inferior a ¼
do salário mínimo. A inconstitucionalidade desse dispositivo da LOAS foi arguida na ADIN nº
1.232-1, julgada improcedente por maioria de votos pelo Plenário do STF.
A questão não restou pacificada na jurisprudência do STJ e do próprio STF, que passaram a
adotar o entendimento de que a ADIn nº 1.232-1 não retirou a possibilidade de aferição da
necessidade por outros meios de prova que não a renda per capita familiar, mas, sim, que o § 3º
do art. 20 estabeleceu uma presunção objetiva e absoluta de miserabilidade. Assim sendo, a
família com renda mensal per capita inferior a ¼ do salário mínimo encontra-se em estado de
penúria, configurando tal situação prova incontestável de necessidade do benefício, dispensando
outros elementos probatórios. Daí que, caso suplantado tal limite, outros meios de prova
poderiam ser utilizados para a demonstração da condição de miserabilidade, expressa na
situação de absoluta carência de recursos para a subsistência.
Nesse sentido o entendimento do STJ - REsp 222778/SP, 5ª Turma, Rel. Min. Edson Vidigal, j.
04.11.1999, DJU 29.11.1999, p. 190:
"A Lei 8742/93, Art. 20, § 3º, quis apenas definir que a renda familiar inferior a ¼ do salário-
mínimo é, objetivamente considerada, insuficiente para a subsistência do idoso ou portador de
deficiência; tal regra não afasta, no caso em concreto, outros meios de prova da condição de
miserabilidade da família do necessitado".
A questão foi novamente levada a julgamento pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, que
reconheceu a Repercussão Geral da matéria nos autos do Recurso Extraordinário 567985/MT,
Rel. Min. Marco Aurélio, Rel. p/ Acórdão Min. Gilmar Mendes, j. 18/04/2013, publicado em
03.10.2013:
"... O requisito financeiro estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao
fundamento de que permitiria que situações de patente miserabilidade social fossem
consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto constitucionalmente. Ao apreciar
a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal declarou a
constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS. 3. Decisões judiciais contrárias aos critérios
objetivos preestabelecidos e Processo de inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei
8.742/1993. A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia
quanto à aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS.
Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se contornar o critério objetivo e
único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias
com entes idosos ou deficientes. Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios
mais elásticos para a concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004,
que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à
Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder
Executivo a conceder apoio financeiro a Municípios que instituírem programas de garantia de
renda mínima associados a ações socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões
monocráticas, passou a rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade do
critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de
notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações
legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros
benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro). 4. Declaração de inconstitucionalidade
parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993. 5. Recurso extraordinário
a que se nega provimento" (destaquei).
A fixação da renda per capita familiar inferior ao salário mínimo é excludente do bem-estar e
justiça sociais que o art. 193 da Constituição Federal elegeu como objetivos da Ordem Social.
A fixação do salário mínimo como garantia do trabalhador e do inativo para fins de garantir sua
manutenção e de sua família, com o mínimo necessário à sobrevivência com dignidade,
representa um critério quantificador do bem-estar social que a todos deve ser garantido, inclusive
aos beneficiários do benefício assistencial previsto no art. 203, V, da Constituição.
Nessa linha de entendimento, o correto seria que a renda per capita familiar, para fins de
concessão do BPC, não pudesse ser superior a 1 (um) salário mínimo. Esse critério traria para
dentro do sistema de Assistência Social um número bem maior de pessoas idosas e com
deficiência. Seria dar a todos, dentro e fora do sistema de Assistência Social, o mesmo grau de
dignidade e de bem-estar, reduzindo desigualdades sociais.
A declaração de inconstitucionalidade do § 3º do art. 20 da LOAS - Lei Orgânica da Assistência
Social, na prática, resulta na inexistência de nenhum critério, abrindo a possibilidade de o
intérprete utilizar todos os meios de provas disponíveis para a verificação da situação de miséria
que a lei quer remediar.
Cabe à legislação infraconstitucional a definição dos critérios e requisitos para concessão do
benefício, conforme prevê o art. 203, V, da CF. Deve, para isso, obedecer aos princípios do art.
194, dentre eles a seletividade e distributividade. Ou seja, cabe ao legislador ordinário selecionar
as contingências merecedoras de proteção e distribuí-las de acordo com o número de
beneficiários e o orçamento de que dispõe.
A seletividade e a distributividade, contudo, por serem princípios setoriais, estão conformadas ao
princípio geral do respeito à isonomia. Não pode a lei eleger como discrimen critério violador da
isonomia.
A fixação do critério aferidor da necessidade é atribuição do legislador e não do juiz. Mas, diante
do caso concreto, a jurisdição não pode ser negada por falta de critério legal.
A atividade legislativa não é do Poder Judiciário, de modo que não lhe cabe criar critério que
substitua o previsto no § 3º do art. 20. Porém, parece razoável estabelecer presunção absoluta de
miserabilidade quando a renda per capita familiar for inferior a metade do salário mínimo vigente,
para que, em sendo superior, outras provas possam ser consideradas para averiguar a real
necessidade de concessão do benefício.
O laudo médico-pericial feito em 8.5.2018, informa que o autor, com 40 anos na ocasião, que
trabalhou como açougueiro e autônomo, no ramo pet shop, banho e tosa de animais, é portador
do vírus HIV B24, desde o ano de 2016. O perito concluiu pela ausência de incapacidade para as
atividades habituais, tendo em vista que o autor está clinicamente apto para o exercício de suas
atividades laborativas.
Observo que, em regra, o vírus é patologia que inexoravelmente acarreta limitações para o
mercado de trabalho, diante das frequentes manifestações de quadros de infecções, que
debilitam progressivamente o organismo, além de ser incurável, de forma a impor tratamento e
acompanhamento médico permanentes. No entanto, não é este o caso dos autos, pois, conforme
assevera o perito, “a parte autora está clinicamente apta às suas atividades habituais”.
Dessa forma, a situação apontada pelo perito não se ajusta ao conceito de pessoa com
deficiência previsto no art. 20, § 2º, I e II.
Assim, não preenchendo a autora o requisito da deficiência, desnecessária a apreciação de sua
hipossuficiência.
Com essas considerações, pedindo vênia à senhora Relatora, NEGO PROVIMENTO à apelação.
É voto.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5784452-98.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA VANESSA MELLO
APELANTE: JOAO BATISTA DE SOUZA
Advogado do(a) APELANTE: JOEL ALEXANDRE SCARPIN AGOSTINI - SP245469-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A teor do disposto no art. 1.011 do Código de Processo Civil, conheço do recurso de apelação,
uma vez cumpridos os requisitos de admissibilidade.
Previsto no art. 203, caput, da Constituição Federal e disciplinado pela Lei nº 8.742/1993, de
natureza assistencial e não previdenciária, o benefício de prestação continuada tem sua
concessão desvinculada do cumprimento dos quesitos de carência e de qualidade de segurado,
atrelando-se, cumulativamente, ao implemento de requisito etário ou à detecção de deficiência,
nos termos do art. 20, §2º, da Lei n° 8.742/93, demonstrada por exame pericial; à verificação da
ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da benesse, ou de tê-lo
suprido pela família; e, originalmente, à constatação de renda mensal per capita não superior a ¼
(um quarto) do salário mínimo. Recorde-se, a este passo, da sucessiva redução da idade mínima,
primeiramente de 70 para 67 anos, pelo art. 1º da Lei nº 9.720/98 e, ao depois, para 65 anos,
conforme art. 34 da Lei nº 10.741/ 2003.
No que diz respeito ao critério da deficiência, as sucessivas alterações legislativas ocorridas na
redação do § 2º, do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social demonstram a evidente
evolução na sua conceituação.
Em sua redação originária, a Lei 8.742/1993 definia a pessoa portadora de deficiência, para efeito
de concessão do benefício assistencial, aquela incapacitada para a vida independente e para o
trabalho.
Posteriormente, a Lei n. 12.435/2011 promoveu modificação ao dispositivo legal, ampliando o
conceito de deficiência, com base no Decreto n. 6.949/2009, que promulgou a Convenção
Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
O § 2º da art. 20 da Lei n. 8.742 passou então a vigorar com a seguinte redação:
"Art. 20
(...)
§ 2º - para efeito de concessão deste benefício, considera-se:
I - pessoa com deficiência, aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir
sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas.
II - impedimentos de longo prazo: aqueles que incapacitam a pessoa com deficiência para a vida
independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos."
Vê-se, portanto, que ao fixar o entendimento da expressão "impedimentos de longo prazo", a Lei
n. 12.435/2011 optou por restringir a concessão do benefício exclusivamente às pessoas com
deficiência que apresentem incapacidade para a vida independente e para o trabalho pelo prazo
mínimo de 2 (dois) anos.
Atualmente, o dispositivo em exame encontra-se vigendo com a redação conferida pelo Estatuto
da Pessoa com Deficiência, Lei n. 13.146/2015, a qual explicitou a definição legal de pessoa com
deficiência:
"Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com
deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou
sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e
efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas."
De se registrar que o § 10 do mesmo dispositivo, incluído pela Lei n. 12.470/2011, considera de
longo prazo o impedimento cujos efeitos perduram pelo prazo mínimo de 02 (dois) anos.
No caso de crianças e adolescentes menores de dezesseis anos de idade, deve ser avaliada,
para tanto, "a existência da deficiência e o seu impacto na limitação do desempenho de atividade
e restrição da participação social, compatível com a idade", ex vi do art. 4º, inciso II e § 1º, do
Decreto nº 6.214/2007, que regulamenta o benefício de prestação continuada da assistência
social de que trata a Lei n° 8.742/93, tornando-se despiciendo o exame da inaptidão laboral, na
esteira do precedente da Terceira Seção deste E. Tribunal, in verbis:
“PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS INFRINGENTES. BENEFÍCIO DE
PRESTAÇÃO CONTINUADA. MENOR. DEFICIÊNCIA FÍSICA E MENTAL. HIPOSSUFICIÊNCIA
ECONÔMICA. COMPROVAÇÃO. I - As limitações físicas e mentais de que padece o
demandante, apontadas pelo próprio expert e pela fisioterapeuta que o acompanha, impõem-lhe
significativas restrições às atividades típicas de sua idade (correr, participar de brincadeiras,
acompanhar satisfatoriamente a escola), não sendo necessário perquirir quanto à existência ou
não de capacidade laborativa, a teor do art. 4º, §2º, doDecretonº 6.214/2007. (...) V - Embargos
Infringentes do INSS a que se nega provimento.” (EI 994950, Relator Desembargador Federal
Sergio Nascimento, j. 25/08/2011, e-DJF3 14/09/2011)
Ainda, o posicionamento da Nona Turma deste E. Tribunal no mesmo sentido, nos seguintes
julgados: AC 0008758-60.2016.4.03.9999, D.E. 24/11/2016; AC 0002545-37.2013.4.03.6121,
D.E. 04/11/2016; AC 0007387-51.2012.4.03.6103, D.E. 24/11/2016.
Acerca do derradeiro pressuposto, o C. STF, no âmbito da Reclamação nº 4374 e dos Recursos
Extraordinários nºs. 567985 e 580963, submetidos à sistemática da repercussão geral, reputou
defasado esse método aritmético de aferição de contexto de miserabilidade, suplantando, assim,
o que outrora restou decidido na ADI 1.232-DF, ajuizada pelo Procurador-Geral da República e
em cujo âmbito se declarara a constitucionalidade do §3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93. A
motivação empregada pela Excelsa Corte, no RE nº 580963, reside no fato de terem sido
"editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para concessão de outros benefícios
assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que
instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa
Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a municípios
que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas".
À vista disso, a mensuração da hipossuficiência não mais se restringe ao parâmetro da renda
familiar, devendo, sim, aflorar da análise desse requisito e das demais circunstâncias concretas
de cada caso, na linha do que já preconizava a jurisprudência majoritária, no sentido de que a
diretiva do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93 não consistiria em singular meio para se verificar a
condição de miserabilidade preceituada na Carta Magna, cuidando-se, tão-apenas, de critério
objetivo mínimo, a revelar a impossibilidade de subsistência do portador de deficiência e do idoso,
não empecendo a utilização, pelo julgador, de outros fatores igualmente capazes de denotar a
condição de precariedade financeira da parte autora. Veja-se, a exemplo, STJ: REsp nº
314264/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Félix Fischer, j. 15/05/2001, v.u., DJ 18/06/2001, p. 185;
EDcl no AgRg no REsp 658705/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Felix Fischer, j. 08/03/2005, v.u., DJ
04/04/2005, p. 342; REsp 308711/SP, Sexta Turma, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 19/09/2002,
v.u., DJ 10/03/2003, p. 323.
Em plena sintonia com o acima esposado, o c. STJ, quando da apreciação do RESP n.
1.112.557/MG, acentuou que o art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93 comporta exegese tendente ao
amparo do cidadão vulnerável, donde concluir-se que a delimitação do valor de renda familiar per
capita não pode ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado.
Em substituição à diretriz inicialmente estampada na lei, a jurisprudência vem evoluindo para
eleger a renda mensal familiar per capita inferior à metade do salário mínimo como indicativo de
situação de precariedade financeira, tendo em conta que outros programas sociais, dentre eles o
bolsa família, o Programa Nacional de Acesso à Alimentação e o bolsa escola, instituídos pelas
Leis nºs 10.836/04, 10.689/03 e 10.219/01, nessa ordem, contemplam esse patamar.
Consultem-se arestos da Terceira Seção nesse diapasão:
“AGRAVO LEGAL EM EMBARGOS INFRINGENTES. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL À PESSOA IDOSA. PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO
DO BENEFÍCIO. AGRAVO IMPROVIDO (...) 3 - Da análise do sistema CNIS/DATAPREV,
verifica-se que o filho da autora possui apenas pequenos vínculos de trabalho, na maioria inferior
a 03 meses, sendo que na maior parte do tempo esteve desempregado. Desse modo, mesmo
incluindo a aposentadoria do marido da autora, a renda familiar per capita corresponde a pouco
mais de R$ 300,00, ou seja, inferior a meio salário mínimo. 4 - Restou demonstrada, quantum
satis, no caso em comento, situação de miserabilidade, prevista no art. 20, § 3º, da Lei
8.742/1993, a ensejar a concessão do benefício assistencial. 5 - Agravo improvido." (EI
00072617120124036112, Relator Desembargador Federal Toru Yamamoto, TRF3, j. 22/10/2015,
e-DJF3 05/11/2015)
“PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (LOAS). EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM
AGRAVO LEGAL. CARÁTER INFRINGENTE. IMPOSSIBILIDADE. CONTRADIÇÃO
INEXISTENTE. (...)- No caso em exame, não há omissão a ser sanada, sendo o benefício
indeferido pelo fato da renda familiar "per capita" ser superior a 1/2 salário mínimo. (...) 5-
Embargos de declaração rejeitados." (AR 00082598120084030000, Relator Juiz Convocado Silva
Neto, TRF3, j. 25/09/2014, e-DJF3 08/10/2014)
Nesse exercício de sopesamento do conjunto probatório, importa averiguar a necessidade, na
precisão da renda familiar, de abatimento do benefício de valor mínimo percebido por idoso ou
deficiente, pertencente à unidade familiar. Nesta quadra, há, inclusive, precedente do egrégio
STF, no julgamento do RE nº 580.963/PR, disponibilizado no DJe 14.11.2013, submetido à
sistemática da repercussão geral, em que se consagrou a inconstitucionalidade por omissão do
art. 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso, considerando a "inexistência de justificativa
plausível para discriminação dos portadores de deficiência em relação aos idosos, bem como dos
idosos beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de benefícios
previdenciários no valor de até um salário mínimo.".
Quanto à questão da composição da renda familiar per capita, o C. STJ, no julgamento do RESP
n. 1.355.052/SP, exarado na sistemática dos recursos representativos de controvérsia, assentou,
no mesmo sentido, a aplicação analógica do parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso, com
vistas à exclusão do benefício previdenciário recebido por idoso ou por deficiente, no valor de um
salário mínimo, no cálculo da renda per capita prevista no art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93
De se realçar que a jurisprudência - antes, mesmo, do aludido recurso repetitivo - já se firmara no
sentido da exclusão de qualquer benefício de valor mínimo recebido por idoso com mais de 65
anos, por analogia ao disposto no art. 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/2003, preceito esse
que, na origem, limitava-se a autorizar a desconsideração de benefício de prestação continuada
percebido pelos referidos idosos.
Note-se que os precedentes não autorizam o descarte do benefício de valor mínimo recebido por
qualquer idoso, assim compreendidas pessoas com idade superior a 60 anos, mas, sim, pelos
idosos com idade superior a 65 anos.
Essa é a inteligência reinante na jurisprudência. A propósito, os seguintes julgados: STJ, AGP
8479, Rel. Des. Convocada Marilza Maynard, 3ª Seção, DJE 03/02/2014; STJ, AGP 8609, Rel.
Min. Assusete Magalhães, 3ª Seção, DJE 25/11/2013; STJ, AGRESP 1178377, Rel. Min. Maria
Thereza de Assis Moura, 6ª Turma, DJE 19/3/2012. E da atenta leitura da íntegra do acórdão do
recurso representativo de controvérsia - nº 1.355.052/SP - chega-se à idêntica conclusão.
Outro dado sobremodo relevante diz respeito à acepção de família, para a finalidade da Lei nº
8.742/1993, cujo conceito experimentou modificação ao longo do tempo. Num primeiro lanço, o
art. 20, § 1º, do citado diploma nomeava família "a unidade mononuclear, vivendo sob o mesmo
teto, cuja economia é mantida pela contribuição de seus integrantes". Ao depois, a Lei nº 9.720,
em 30/11/98, fruto de conversão da Medida Provisória nº 1.473-34, de 11/08/97, passou a
compreendê-la como o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei nº 8.213/91, dês que
conviventes sob mesmo teto. Finalmente, na vigência da Lei nº 12.435/2011, é havida como o
núcleo integrado pelo requerente, cônjuge ou companheiro, os pais, ou, na ausência destes, pela
madrasta ou padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados,
todos, também, sob o mesmo teto.
SITUAÇÃO DOS AUTOS
No caso dos autos, o laudo médico colacionado ao doc. 72985965, realizado em 08/05/2018,
descrevei a situação do autor, então, com 40 anos de idade, ensino básico até 2º ano, que
trabalhou como auxiliar de açougueiro e, conforme estudo social acostado ao doc. 72985967,
realizado em 18/07/2018, laborou como autônomo no ramo de pet-shop banho e tosa,
desenvolvido na própria residência alugada. Trata-se de pessoa com HIV B24, desde o ano de
2016, que não lhe causa incapacidade para as atividades anteriormente desenvolvidas.
Do ponto de vista estritamente médico, o laudo é hígido e bem fundamentado, não deixando
dúvidas quanto à sua conclusão. Ou seja, segundo o laudo médico, a parte autora está
clinicamente apta às suas atividades habituais.
Todavia, o juiz é livre para formar seu próprio convencimento, desde que fundamente sua
decisão.
Essa é a diretriz do princípio processual do livre convencimento motivado, pautado na persuasão
racional, elencado nos artigos 371 e 479 do Código de Processo Civil. Tais dispositivos legais
permitem ao magistrado formar a sua convicção com base nas provas disponíveis nos autos,
desde que indique na decisão os motivos que lhe formaram o convencimento.
Desse modo, o laudo pericial é dirigido ao juiz, competindo a este, com espeque no livre
convencimento motivado, sopesá-lo, adotando-o ou rejeitando-o a partir dos demais elementos
probatórios carreados aos autos.
Tratando-se de ação envolvendo pessoa portadora de HIV, mister se faz que se aprecie o pedido
avaliando as condições sociais da parte autora. Neste sentido é a redação da súmula 78,
aprovada pela Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU) na
sessão realizada no dia 11 de setembro, em Brasília, verbis:
"Comprovado que o requerente de benefício é portador do vírus HIV, cabe ao julgador verificar as
condições pessoais, sociais, econômicas e culturais, de forma a analisar a incapacidade em
sentido amplo, em face da elevada estigmatização social da doença."
Relevante reconhecer que a nova ordem constitucional estabeleceu como prioridade a dignidade
da pessoa humana, consubstanciada em uma sociedade livre, justa e solidária, que mira erradicar
a pobreza e reduzir as desigualdades sociais. Não se erradicam as desigualdades sem enfrentar
o preconceito que permeia os mais diversos substratos sociais.
Logo, a Constituição Federal de 1988 estabeleceu novas diretrizes à aplicação e à interpretação
do direito, tendo sempre como esteio a dignidade da pessoa humana.
Destarte, no cumprimento de seu dever maior, o juiz deve assegurar a máxima eficácia aos
direitos fundamentais.
Conforme mencionado, tratando-se de pedido de concessão de benefício assistencial formulado
por pessoa portadora do vírus da AIDS, a análise da deficiência deve ser feita levando-se em
conta as condições pessoais, sociais, econômicas e culturais. E essa regra não comporta
qualquer exceção.
A produção científica e os avanços tecnológicos revolucionaram a sociedade. E essa
transformação se torna ainda mais patente no campo da medicina.
Hoje, diversas patologias consideradas fatais na década de 80 podem ser tratadas, possibilitando
a seus portadores um aumento da expectativa e da qualidade de vida.
Todavia, se os avanços tecnológicos atenuam as causas biológicas da doença, o mesmo não
aconteceu com relação à extirpação do preconceito. E a desinformação contribui com a
perpetuação dessa situação.
Mesmo diante de tratamentos cada vez mais eficazes, algumas patologias possuem um forte e
negativo apelo social, na medida em que seus portadores são estigmatizados e tratados com
párias.
Patente que a AIDS é uma doença com caráter estigmatizante muito forte, uma vez que o
tratamento envolve o controle da doença e não a cura definitiva.
Um dos piores efeitos sociais para os portadores dessa doença ocorre, justamente, no ambiente
de trabalho.
É sabido que os portadores dessa síndrome vivenciam situações de negativas causadas pelo
preconceito no ambiente de trabalho.
Por ser uma doença estigmatizante, os portadores do vírus HIV enfrentam, sem omitir essa
condição, uma enorme dificuldade de conseguir emprego. Aqueles que conseguem colocação no
mercado de trabalho encaram, diariamente, o descrédito e afastamento social de seus colegas,
clientes e superiores.
Atento a essa mazela social e constada essa situação fática, recentemente o Tribunal Superior do
Trabalho editou a seguinte súmula:
"Súmula nº 443 do TST. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. PRESUNÇÃO. EMPREGADO
PORTADOR DE DOENÇA GRAVE. ESTIGMA OU PRECONCEITO. DIREITO À
REINTEGRAÇÃO - Presume-se discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV
ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito. Inválido o ato, o empregado tem
direito à reintegração no emprego."
No caso, haure-se, do mencionado estudo social, que o vindicante sempre desenvolveu
atividades laborativas regulares, até o advento da doença.
Transcrevo excerto do laudo, nesse ponto:
“O requerente tem 40 anos, é solteiro, sem filhos e, desde que atingiu a maioridade realizava
trabalho remunerado, que lhe proporcionava renda suficiente para manutenção de suas despesas
e necessidades pessoais. Dentre as suas atividades laborativas, foi açougueiro em empresa
local, durante aproximadamente 04 anos, seguido de trabalho autônomo no ramo de pet-shop
banho e tosa, desenvolvido na própria residência alugada, onde permaneceu nos últimos 05 anos
produtivos.
Há aproximadamente 02 anos foi diagnosticado portador de HIV e, devido à queda de peso e
baixa imunidade, é comum sofrer com o aparecimento de doenças oportunistas, principalmente
no sistema respiratório.
(...) Nessa circunstância, deixou de realizar trabalho remunerado e passou a descumprir os
compromissos financeiros, inclusive aluguel da última residência.”
Ademais, por ser portador do vírus HIV e diante do desconhecimento que cerca essa patologia, o
pretendente, sem esconder essa condição, dificilmente seria contratado para trabalhar.
O temor de contágio e o preconceito criariam uma barreira invisível, difícil de ser derrubada pelo
autor. Por exemplo, no dia-a-dia de seus afazeres habituais, o pretendente manuseia facas ou
outros objetos cortantes. Assim, caso viesse a se cortar, por menor que fosse o machucado e
mesmo diante da impossibilidade de contágio, imperioso reconhecer que o desconhecimento e a
ignorância submeteriam esse trabalhador a vivenciar uma situação que lhe causaria
discriminação.
A condição social da parte autora e as suas profissões habituais, inegavelmente, a tornam
duplamente vitimada. Além da enfermidade acometida e das mazelas decorrentes da doença,
caso voltasse a exercer a profissão de açougueiro, ou mesmo, no ramo de banho e tosa de pet-
shop, ela passaria a ser estigmatizada, ou seja, seria tratada por seus empregadores, clientes e
colegas de forma negativa, suportando, consequentemente, o preconceito.
Ademais, pode ser que o autor, ao relatar ser portador do vírus HIV, jamais consiga nova
colocação no mercado de trabalho, diante do medo e da ignorância que cercam tal doença, como
anteriormente salientado, ainda que a desculpa pela recusa da concessão do emprego seja
camuflada por outro motivo.
Forçar a recolocação da parte autora no mercado de trabalho, submetendo-a ao estigma e ao
preconceito poderia ocasionar a redução drástica da sua qualidade de vida, desaguando na sua
exclusão social.
Os abalos psicológicos decorrentes da exclusão social seriam trágicos. Notório que o fator
emocional interfere, negativamente, na saúde do ser humano, incluído o próprio sistema
imunológico. E no portador do vírus HIV esse vital sistema de defesa já está suficientemente
fragilizado.
O juiz deve estar atento ao contexto social que o cerca. Sendo assim, apesar de estar
clinicamente apta ao trabalho, a patologia que acomete a parte autora causa grande estigma
social, autorizando concluir pela existência de comprometimento ou restrições sociais decorrentes
da enfermidade verificada, por mais de 2 (dois) anos, configurando-se, por conseguinte, quadro
de deficiência necessário à concessão do benefício de prestação continuada, nos termos
estabelecidos no art. 20, § 10, da Lei nº 8.742/1993.
Avançando, então, na análise da hipossuficiência, importa examinar o laudo socioeconômico.
Pois bem. O autor, solteiro, mora em imóvel composto por três cômodos, construído em terreno
financiado, com o auxílio de amigos e da comunidade. O imóvel encontra-se no contrapiso e sem
reboco.
Está provido por móveis e eletrodomésticos insuficientes para atender ao morador, todos usados
e frutos de doações.
As tarifas de água e energia elétrica vem sendo parceladas, em razão de atraso no pagamento,
com risco de corte no abastecimento. As parcelas de financiamento do terreno no qual foi
construída a moradia do requerente estão sem pagamento há, aproximadamente, um ano.
Quanto à alimentação, vem sendo provida pelos genitores do requerente, contudo, não tem sido
possível ao mesmo, usufruir de alimentação balanceada, conforme orientação da equipe médica,
devido à insuficiência de recursos dos pais, já idosos e com a saúde comprometida.
O vindicante recebe a transferência de R$ 87,00, pelo Programa Bolsa Família, cabendo,
lembrar,no entanto, que, na contabilização da renda familiar, torna-se imperiosa a exclusão dos
aludidos rendimentos, por força do disposto no Decreto nº 6.135/2007.
Desse modo, não resta, como passível de consideração jurídica, qualquer valor percebido pelo
proponente.
Nesse cenário, caracterizada, no momento, conjuntura de miserabilidade.
Assim, restou demonstrada situação de hipossuficiência econômica, como indicado no sobredito
paradigma do C. Supremo Tribunal Federal, exarado em repercussão geral, a autorizar o implante
da benesse.
De acordo com o entendimento esposado pela jurisprudência dominante, o termo inicial do
benefício deve ser fixado a partir do requerimento administrativo. Nesse sentido: APELREEX
00122689420114036139, Nona Turma, Relatora Desembargadora Federal Marisa Santos, j.
30/05/2016, e-DJF3 13/06/2016; APELREEX 00331902220114039999, Nona Turma, Relator Juiz
Convocado Rodrigo Zacharias, j. 14/03/2016, e-DJF3 31/03/2016.
Passo à análise dos consectários.
Cumpre esclarecer que, em 20 de setembro de 2017, o STF concluiu o julgamento do RE
870.947, definindo as seguintes teses de repercussão geral sobre a incidência da Lei n.
11.960/2009: "1) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na
parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é
inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem
ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito
tributário, em respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput); quanto às
condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o
índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta
extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09; e
2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que
disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a
remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição
desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica
como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a
promover os fins a que se destina."
Assim, a questão relativa à aplicação da Lei n. 11.960/2009, no que se refere aos juros de mora e
à correção monetária, não comporta mais discussão, cabendo apenas o cumprimento da decisão
exarada pelo STF em sede de repercussão geral.
Nesse cenário, sobre os valores em atraso incidirão juros e correção monetária em conformidade
com os critérios legais compendiados no Manual de Orientação de Procedimentos para os
Cálculos na Justiça Federal, observadas as teses fixadas no julgamento final do RE 870.947, de
relatoria do Ministro Luiz Fux.
Deve o INSS arcar com os honorários advocatícios em percentual mínimo a ser definido na fase
de liquidação, nos termos do inciso II do § 4º do art. 85 do Código de Processo Civil, observando-
se o disposto nos §§ 3º e 5º desse mesmo dispositivo legal e considerando-se as parcelas
vencidas até a data da decisão concessiva do benefício, nos termos da Súmula n. 111 do
Superior Tribunal de Justiça.
Está o instituto previdenciário isento do pagamento de custas processuais, consoante o art. 4º,
inciso I, da Lei Federal n. 9.289/96, art. 6º, da Lei do Estado de São Paulo n. 11.608/2003 e das
Leis do Mato Grosso do Sul, de n. 1.135/91 e 1.936/98, alteradas pelos arts. 1º e 2º, da Lei n.
2.185/2000. Excluem-se da isenção as respectivas despesas processuais, além daquelas devidas
à parte contrária.
Os valores já pagos, seja na via administrativa ou por força de decisão judicial, a título de
quaisquer benefícios previdenciários ouassistenciaisnão cumuláveis, deverão ser integralmente
abatidos do débito.
Saliente-se que, nos termos do art. 21, caput, da Lei n. 8.742/93, o benefício de prestação
continuada deve ser revistoa cada dois anos,para avaliação da continuidade das condições que
lhe deram origem.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, PARA REFORMAR A
SENTENÇA E JULGAR PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO, concedendo-lhe o
benefício de prestação continuada, a partir da data de entrada do requerimento administrativo, e
fixando consectários na forma explicitada, abatidos eventuais valores já recebidos.
É como voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA - ART. 203, INCISO V, DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. DEFICIÊNCIA NÃO COMPROVADA. APELAÇÃO IMPROVIDA.
I - O Supremo Tribunal Federal, no RE n. 567.985, reconheceu a inconstitucionalidade parcial,
sem pronúncia de nulidade, do art.20, §3º, da Lei nº 8.742/93, e do art. 34, par. único, da Lei nº
10.741/2003.
II - O laudo médico-pericial feito em 8.5.2018, informa que o autor, com 40 anos na ocasião, que
trabalhou como açougueiro e autônomo, no ramo pet shop, banho e tosa de animais, é portador
do vírus HIV B24, desde o ano de 2016. O perito concluiu pela ausência de incapacidade para as
atividades habituais, tendo em vista que o autor está clinicamente apto para o exercício de suas
atividades laborativas.
III - O vírus é patologia que inexoravelmente acarreta limitações para o mercado de trabalho,
diante das frequentes manifestações de quadros de infecções, que debilitam progressivamente o
organismo, além de ser incurável, de forma a impor tratamento e acompanhamento médico
permanentes. No entanto, não é este o caso dos autos, pois, conforme assevera o perito, “a parte
autora está clinicamente apta às suas atividades habituais”.
IV - A situação apontada pelo perito não se ajusta ao conceito de pessoa com deficiência previsto
no art. 20, § 2º, I e II.
V - Apelação improvida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por maioria,
decidiu negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do voto da Desembargadora
Federal Marisa Santos, que foi acompanhada pela Desembargadora Federal Daldice Santana e
pelo Desembargador Federal Gilberto Jordan (que votou nos termos do art. 942 caput e § 1º do
CPC). Vencida a Relatora que lhe dava provimento. Julgamento nos termos do disposto no artigo
942 caput e § 1º do CPC. Lavrará acórdão a Desembargadora Federal Marisa Santos, nos termos
do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
