
| D.E. Publicado em 28/06/2018 |
EMENTA
| CONSTITUCIONAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. PRELIMINARES. EFEITO SUSPENSIVO. REMESSA OFICIAL TIDA POR INTERPOSTA. REQUISITOS LEGAIS COMPROVADOS. LEI 8.742/93, ART. 20, §3º. DEFICIÊNCIA. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO E. STF. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. COMPROVAÇÃO POR OUTROS MEIOS. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. |
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar arguida pelo réu e, no mérito, dar parcial provimento à apelação do réu e à remessa oficial, tida por interposta, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007963-83.2018.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Desembargador Sergio Nascimento (Relator):Trata-se de apelação de sentença pela qual foi julgado procedente o pedido para condenar o INSS a pagar a parte autora o benefício assistencial previsto no art. 203, V, da Constituição da República, no valor mensal de um salário mínimo, a contar da data da citação. Pela sucumbência, o réu foi condenado a pagar honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, observando-se que a base de cálculo sobre a qual incidirá mencionado percentual será composta apenas do valor das prestações devidas entre o termo inicial do benefício e a data da sentença, em consonância com a Súmula 111 do STJ. O vencido é isento de custas (art. 8º, §1º, da Lei n. 8.620/93). Determinada a imediata implantação do benefício, tendo sido cumprida a decisão judicial, consoante fl. 141.
Em sua apelação, o Instituto réu requer, preliminarmente, o recebimento do recurso com efeito suspensivo, diante da irreversibilidade do provimento. No mérito, noticia a modificação do núcleo familiar do requerente, em decorrência do óbito de seu genitor em 20.09.2016, sustentando não estarem preenchidos os requisitos necessários à concessão do benefício ao autor após a referida modificação, tampouco à época do requerimento, vez que em ambas as ocasiões a renda per capita é superior ao limite previsto no artigo 20, § 3º, da Lei 8.742/93. Sustenta, ainda a impossibilidade de aplicação, por analogia, do art. 34 do Estatuto do Idoso. Subsidiariamente, requer seja a verba honorária sucumbencial calculada somente quando da liquidação do julgado, bem como sejam aplicados juros de 0,5% até a vigência do atual Código Civil e juros de 1% após a entrada em vigor desse diploma e até edição da Lei 11.960/09; correção monetária e juros de poupança a partir da vigência da Lei 11.960/09.
Sem contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
Em parecer de fls. 163/168, a i. representante do Ministério Público Federal, Rose Santa Rosa, apesar de opinar pelo desprovimento do recurso, fundamenta em sentido diverso, entendendo não estar configurada a situação de miserabilidade e de total desamparo a justificar a concessão de benefício e afirmando que ainda que desconsiderado o benefício de pensão por morte recebido pela genitora idosa do autor, é fato que eles residem em casa própria equipada com móveis e eletrodomésticos básicos e utilizam o SUS para acesso a tratamentos e medicamentos, não estando preenchidos os requisitos necessários à obtenção do benefício, merecendo reforma a sentença que julgou procedente a ação.
É o relatório.
SERGIO NASCIMENTO
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007963-83.2018.4.03.9999/SP
VOTO
Nos termos do artigo 1.011 do Novo CPC/2015, recebo a apelação interposta pelo réu.
Da preliminar
Deve ser rejeitada a preliminar, arguida pelo INSS, quanto à concessão de efeito suspensivo à apelação, haja vista não se encontrarem presentes no caso em comento os requisitos previstos no §4º do art. 1.012 do CPC de 2015.
Da remessa oficial tida por interposta
Aplica-se ao presente caso o Enunciado da Súmula 490 do E. STJ, que assim dispõe: A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas.
Do mérito
O benefício pretendido pela parte autora está previsto no artigo 203, V, da Constituição da República, que dispõe:
A regulamentação legislativa do dispositivo constitucional restou materializada com o advento da Lei 8.742/93, que dispõe na redação atualizada do caput do seu artigo 20:
Assim, para fazer jus ao amparo constitucional, o postulante deve ser portador de deficiência ou ser idoso (65 anos ou mais) e ser incapaz de prover a própria manutenção ou tê-la provida por sua família.
Quanto ao requisito relativo à deficiência, a Lei 8.742/93, que regulamentou a concessão do dispositivo constitucional acima, dispunha no § 2º do seu artigo 20, em sua redação original:
Nesse ponto, cumpre salientar que o texto constitucional garante o pagamento de um salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência, sem exigir, como fez a norma regulamentadora, em sua redação original, a existência de incapacidade para a vida independente e para o trabalho.
Nota-se, portanto, que ao definir os contornos da expressão pessoa portadora de deficiência constante do dispositivo constitucional, a norma infraconstitucional reduziu a sua abrangência, limitando o seu alcance aos casos em que a deficiência é geradora de incapacidade laborativa.
Todavia, observa-se que, em 10.07.2008, o Congresso Nacional promulgou o Decreto Legislativo 186/2008, aprovando, pelo rito previsto no artigo 5º, § 3º, da Constituição da República, o texto da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova Iorque, em 30 de março de 2007, e conferindo à referida Convenção status normativo equivalente ao das emendas constitucionais.
A Convenção, aprovada pelo Decreto Legislativo 186/2008, já no seu Artigo 1, cuidou de tratar do conceito de "pessoa com deficiência", definição ora constitucionalizada pela adoção do rito do artigo 5º, § 3º, da Carta, a saber:
Em coerência à alteração promovida em sede constitucional, o artigo 20, § 2º, da Lei 8.742/93, viria a ser alterado pela Lei 12.470/11, passando a reproduzir em seu texto a definição de "pessoa com deficiência" constante da norma superior. Dispõe a LOAS, em sua redação atualizada:
Não há dúvida, portanto, de que o conceito de 'deficiência' atualmente albergado é mais extenso do que aquele outrora estabelecido, vez que considera como tal qualquer impedimento, inclusive de natureza sensorial, que tenha potencialidade para a obstrução da participação social do indivíduo em condições de igualdade.
Coerente com esta nova definição de 'deficiência' para fins de concessão do benefício constitucional, a mencionada Lei 12.470/11 acrescentou à Lei 8.742/93 o artigo 21-A, com a seguinte redação:
Verifica-se, portanto, que a legislação ordinária, em deferência às alterações promovidas em sede constitucional, não apenas deixou de identificar os conceitos de 'incapacidade laborativa' e 'deficiência', como passou a autorizar expressamente que a pessoa com deficiência elegível à concessão do amparo assistencial venha a exercer atividade laborativa - seja como empregada, seja como microempreendedora - sem que tenha sua condição descaracterizada pelo trabalho, ressalvada tão somente a suspensão do benefício enquanto este for exercido.
Observados estes parâmetros para a aferição da deficiência, no caso dos autos, o laudo médico pericial, elaborado em 17.11.1985 (fls. 78), atesta que o demandante apresenta retardo mental grave, epilepsia e hipertensão arterial, apresentando incapacidade total e permanente.
Ademais, há nos autos certidão de interdição (fls. 122), na qual consta ter sido o autor considerado absolutamente incapaz de reger os atos da vida civil.
Portanto, a parte autora fará jus ao benefício assistencial caso preencha o requisito socioeconômico, haja vista possuir 'impedimentos de longo prazo', com potencialidade para 'obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade, em igualdade de condições com outras pessoas'.
No que toca ao requisito socioeconômico, cumpre observar que o §3º do artigo 20 da Lei 8.742/93 estabeleceu para a sua aferição o critério de renda familiar per capita, observado o limite de um quarto do salário mínimo, que restou mantido na redação dada pela Lei 12.435/11, acima transcrita.
A questão relativa à constitucionalidade do critério de renda per capita não excedente a um quarto do salário mínimo para que se considerasse o idoso ou pessoa com deficiência aptos à concessão do benefício assistencial, foi analisada pelo E. Supremo Tribunal Federal em sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 1.232/DF), a qual foi julgada improcedente, por acórdão que recebeu a seguinte ementa:
Todavia, conquanto reconhecida a constitucionalidade do §3º do artigo 20, da Lei 8.742/93, a jurisprudência evoluiu no sentido de que tal dispositivo estabelecia situação objetiva pela qual se deve presumir pobreza de forma absoluta, mas não impedia o exame de situações subjetivas tendentes a comprovar a condição de miserabilidade do requerente e de sua família. Tal interpretação seria consolidada pelo E. Superior Tribunal de Justiça em recurso especial julgado pela sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil (STJ - REsp. 1.112.557-MG; Terceira Seção; Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho; j. 28.10.2009; DJ 20.11.2009).
O aparente descompasso entre o desenvolvimento da jurisprudência acerca da verificação da miserabilidade dos postulantes ao benefício assistencial e o entendimento assentado por ocasião do julgamento da ADI 1.232-DF levaria a Corte Suprema a voltar ao enfrentamento da questão, após o reconhecimento da existência da sua repercussão geral, no âmbito da Reclamação 4374 - PE, julgada em 18.04.2013.
Naquela ocasião, prevaleceu o entendimento de que "ao longo de vários anos desde a sua promulgação, o §3º do art. 20 da LOAS passou por um processo de inconstitucionalização". Com efeito, as significativas alterações no contexto socioeconômico desde então e o reflexo destas nas políticas públicas de assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios para aferição da miserabilidade previstos na Lei 8.742/93 e aqueles constantes no sistema de proteção social que veio a se consolidar. Verifique-se:
Destarte, é de se reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência é através da própria natureza dos males que a assolam, do seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades. Não há, pois, que se enquadrar todos os indivíduos em um mesmo patamar e entender que somente aqueles que contam com menos de um quarto do salário-mínimo possam fazer jus ao benefício assistencial.
No caso dos autos, o estudo social realizado em 12.02.2016 (fl. 90/91) e complementado às fls. 119/120 constatou que o núcleo familiar do autor era formado por ele e seus pais. Residiam em casa própria, situada em local de difícil acesso, com cinco cômodos em estado razoável de conservação, com poucos móveis muito simples e alguns equipamentos eletroeletrônicos básicos. A família não tinha linha de telefone fixo e nem serviço de internet, somente um aparelho celular simples para as situações de emergência. A mãe do requerente era idosa (69 anos) e hipertensa, não trabalhava e não possuía renda. O núcleo familiar sobrevivia com a aposentadoria por invalidez de valor mínimo, recebida pelo pai do demandante, que possuía problemas cardíacos. Declararam gastar em média R$ 120,00 a R$ 150,00 mensais com farmácia para a manutenção da saúde da família, uma vez que a rede pública não disponibilizava toda a medicação necessária. Concluiu a assistente social, na ocasião, que a situação socioeconômica da família era de extrema vulnerabilidade social, necessitando de um suporte financeiro para a manutenção de suas necessidades básicas, pois todos os seus membros apresentavam problemas de saúde, além do distúrbio mental do requerente, ficando as responsabilidades e afazeres por conta da sua mãe idosa. Ademais, esclareceu que a família não participava de nenhum programa social de transferência de renda, excetuando-se os descontos das tarifas de água e energia.
Portanto, o conjunto probatório existente nos autos demonstra que a parte autora preenche o requisito referente à deficiência e comprovou sua hipossuficiência econômica, fazendo jus à concessão do benefício assistencial.
Consigno que o INSS, em sede de apelação, noticiou o falecimento do genitor do requerente em 20.09.2016. Consequente, a mãe do autor passou a receber pensão por morte de valor mínimo, passando a ser essa a renda da família, agora reduzida a dois membros.
Faz-se mister, nesse caso, observar o disposto no art. 34, da Lei 10.741/2001:
A Lei determina, portanto, a exclusão da renda proveniente de benefício assistencial ao idoso do cômputo da renda familiar per capita de outro idoso na mesma família. Ainda que tal norma, dado o seu caráter especial, não trate, especificamente, do deficiente físico que recebe benefício assistencial, tem-se que ela estabelece critério objetivo a ser utilizado na aferição da hipossuficiência econômica, que deve ser aplicado analogicamente aos casos de benefício por incapacidade, vez que a equiparação entre idosos e portadores de deficiência para fins de proteção da assistência social é feita pela própria Constituição da República (art. 203, V).
De outra parte, cabe destacar, ainda, o julgamento do Recurso Especial Representativo de Controvérsia - REsp 1355052/SP, cuja ementa abaixo transcrevo:
Destarte, é possível inferir que a aplicação da analogia reportada no julgamento paradigmático tem lugar nas hipóteses em que o titular do benefício previdenciário, no importe de um salário mínimo, apresenta incapacidade total para o trabalho ou conta com 65 anos de idade ou mais.
No caso em tela, anoto que a genitora do autor é detentora de benefício no valor de um salário mínimo, contando atualmente com 71 anos de idade, razão pela qual sua renda não pode ser computada para efeito de cálculo da renda per capita da família, não possuindo a autora, portanto, renda alguma.
O termo inicial do benefício deve ser mantido a partir da data da citação (16.06.2015 - fl. 20 verso), eis que incontroverso.
A correção monetária e os juros de mora deverão ser calculados de acordo com a lei de regência, observando-se as teses firmadas pelo E.STF no julgamento do RE 870.947, realizado em 20.09.2017. Quanto aos juros de mora será observado o índice de remuneração da caderneta de poupança a partir de 30.06.2009.
Mantenho os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor das prestações vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula 111 do E. STJ e de acordo com o entendimento firmado por esta 10ª Turma.
Diante do exposto, rejeito a preliminar arguida pelo réu e, no mérito, dou parcial provimento à apelação do réu e à remessa oficial, tida por interposta, para que os juros de mora sejam calculados na forma acima explicitada. Honorários advocatícios em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a sentença.
As parcelas recebidas a título de antecipação de tutela serão resolvidas em liquidação de sentença.
Expeça-se e-mail ao INSS para que altere a DIB do benefício NB 87/171.493.114 (fl. 141), de titularidade do autor Rodrigo Alves da Silva (representado por sua mãe Catarina da Silva), para 16.06.2015, uma vez que esta é a data correta da citação, e não 13.08.2015, conforme constou à fl. 141.
É como voto.
SERGIO NASCIMENTO
Desembargador Federal Relator
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | SERGIO DO NASCIMENTO:10045 |
| Nº de Série do Certificado: | 11A21703174550D9 |
| Data e Hora: | 19/06/2018 17:09:47 |
