Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5000387-51.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal SERGIO DO NASCIMENTO
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
26/04/2018
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 03/05/2018
Ementa
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. REQUISITOS LEGAIS
COMPROVADOS. LEI 8.742/93, ART. 20, §3º. IDOSA. INCONSTITUCIONALIDADE
RECONHECIDA PELO E. STF. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. COMPROVAÇÃO POR
OUTROS MEIOS.TERMO INICIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
I - Para fazer jus ao amparo constitucional, o postulante deve ser portador de deficiência ou ser
idoso (65 anos ou mais) e ser incapaz de prover a própria manutenção ou tê-la provida por sua
família. A autora, nascida em 31.07.1944, implementou o requisito etário.
II - Quanto à hipossuficiência econômica, à luz da jurisprudência consolidada no âmbito do E. STJ
e do posicionamento usual desta C. Turma, no sentido de que o art. 20, §3º, da Lei 8.742/93
define limite objetivo de renda per capita a ser considerada, mas não impede a comprovação da
miserabilidade pela análise da situação específica de quem pleiteia o benefício. (Precedente do
E. STJ).
III - Em que pese a improcedência da ADIN 1.232-DF, em julgamento recente dos Recursos
Extraordinários 567.985-MT e 580.983-PR, bem como da Reclamação 4.374, o E. Supremo
Tribunal Federal modificou o posicionamento adotado anteriormente, para entender pela
inconstitucionalidade do disposto no art. 20, §3º, da Lei 8.742/93.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
IV - O entendimento que prevalece atualmente no âmbito do E. STF é os de que as significativas
alterações no contexto socioeconômico desde a edição da Lei 8.742/93 e o reflexo destas nas
políticas públicas de assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios para
aferição da miserabilidade previstos na LOAS e aqueles constantes no sistema de proteção social
que veio a se consolidar.
V – O termo inicial do benefício deve ser mantido a partir do requerimento administrativo, ante o
firme entendimento jurisprudencial nesse sentido.
VI - Ante o trabalho adicional do patrono da parte autora em grau recursal, a teor do disposto no
artigo 85, § 11, do CPC de 2015, basede cálculo da verba honorária fica majorada para as
parcelas que seriam devidas até a presente data, conforme o entendimento desta 10ª Turma.
VII - Apelação do réu e remessa oficial, tida por interposta, improvidas.
Acórdao
APELAÇÃO (198) Nº 5000387-51.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LEONILDE RODRIGUES OLIVEIRA
Advogado do(a) APELADO: MAICON APARECIDO CARVALHO - MS1675000A
APELAÇÃO (198) Nº 5000387-51.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LEONILDE RODRIGUES OLIVEIRA
Advogado do(a) APELADO: MAICON APARECIDO CARVALHO - MS1675000A
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Senhor Desembargador Federal Sergio Nascimento (Relator): Trata-se de apelação de
sentença pela qual foi julgado procedente o pedido da autora para condenar o réu a lhe conceder
o benefício de prestação continuada previsto no art. 203, V, da Constituição da República, no
valor mensal de um salário mínimo, desde a data do requerimento administrativo (16.10.2013). As
parcelas vencidas deverão ser corrigidas monetariamente segundo os critérios indicados na Lei
nº 11.960/2009. Pela sucumbência, o réu arcará com os honorários advocatícios da parte
contrária, fixados em 10% sobre as parcelas vencidas, entendidas como tais aquelas devidas até
a data da sentença. Não houve condenação em custas.
Em virtude da decisão anterior que deferiu a antecipação dos efeitos da tutela, foi implantado o
benefício em favor da demandante (doc. ID Num. 1602335 - Pág. 48/49).
Em suas razões recursais, alega a Autarquia, em resumo, que a autora não faz jus à concessão
do benefício, vez que sua família não pode ser considerada em situação de vulnerabilidade
financeira. Subsidiariamente, requer seja o termo inicial do benefício estabelecido na data da
juntada aos autos do laudo médico-pericial, bem como seja a verba honorária reduzida para 5%
do valor da causa. Suscita o prequestionamento da matéria ventilada.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
Em parecer, o i. representante do Parquet Federal, opinou pelo parcial conhecimento do recurso
do INSS e, na parte conhecida, pelo seu desprovimento.
É o relatório.
APELAÇÃO (198) Nº 5000387-51.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LEONILDE RODRIGUES OLIVEIRA
Advogado do(a) APELADO: MAICON APARECIDO CARVALHO - MS1675000A
V O T O
Nos termos do art. 1.011 do CPC de 2015, recebo a apelação do INSS.
Da remessa oficial tida por interposta
Aplica-se ao presente caso o Enunciado da Súmula 490 do E. STJ, que assim dispõe:
A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for
inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas.
Do mérito
O benefício pretendido pela parte autora está previsto no artigo 203, V, da Constituição da
República, que dispõe:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de
contribuição à seguridade social, e tem por objetivo:
(...)
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou tê-la provida por sua
família, conforme dispuser a lei.
A regulamentação legislativa do dispositivo constitucional restou materializada com o advento da
Lei 8.742/93, que dispõe na redação atualizada do caput do seu artigo 20:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa
com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
Assim, para fazer jus ao amparo constitucional, o postulante deve ser portador de deficiência ou
ser idoso (65 anos ou mais) e ser incapaz de prover a própria manutenção ou tê-la provida por
sua família.
No caso dos autos, a demandante, nascida em 23.08.1946, conta atualmente com 71 anos de
idade.
Há que se reconhecer, portanto, que a parte autora fará jus ao benefício assistencial, caso
preencha o requisito socioeconômico, haja vista ter implementado o requisito etário.
No que toca ao requisito socioeconômico, cumpre observar que o §3º do artigo 20 da Lei
8.742/93 estabeleceu para a sua aferição o critério de renda familiar per capita, observado o limite
de um quarto do salário mínimo, que restou mantido na redação dada pela Lei 12.435/11, acima
transcrita.
A questão relativa à constitucionalidade do critério de renda per capita não excedente a um
quarto do salário mínimo para que se considerasse o idoso ou pessoa com deficiência aptos à
concessão do benefício assistencial, foi analisada pelo E. Supremo Tribunal Federal em sede de
Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 1.232/DF), a qual foi julgada improcedente (STF. ADI
1.232-DF. Rel. p/ Acórdão Min. Nelson Jobim. J. 27.08.98; D.J. 01.06.2001).
Todavia, conquanto reconhecida a constitucionalidade do §3º do artigo 20, da Lei 8.742/93, a
jurisprudência evoluiu no sentido de que tal dispositivo estabelecia situação objetiva pela qual se
deve presumir pobreza de forma absoluta, mas não impedia o exame de situações subjetivas
tendentes a comprovar a condição de miserabilidade do requerente e de sua família. Tal
interpretação seria consolidada pelo E. Superior Tribunal de Justiça em recurso especial julgado
pela sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil (STJ - REsp. 1.112.557-MG;
Terceira Seção; Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho; j. 28.10.2009; DJ 20.11.2009).
O aparente descompasso entre o desenvolvimento da jurisprudência acerca da verificação da
miserabilidade dos postulantes ao benefício assistencial e o entendimento assentado por ocasião
do julgamento da ADI 1.232-DF levaria a Corte Suprema a voltar ao enfrentamento da questão,
após o reconhecimento da existência da sua repercussão geral, no âmbito da Reclamação 4374 -
PE, julgada em 18.04.2013.
Naquela ocasião, prevaleceu o entendimento de que "ao longo de vários anos desde a sua
promulgação, o §3º do art. 20 da LOAS passou por um processo de inconstitucionalização". Com
efeito, as significativas alterações no contexto socioeconômico desde então e o reflexo destas
nas políticas públicas de assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios
para aferição da miserabilidade previstos na Lei 8.742/93 e aqueles constantes no sistema de
proteção social que veio a se consolidar (Rcl 4374, Relator Ministro Gilmar Mendes, Tribunal
Pleno, j. 18.04.2013, DJe-173 03.09.2013).
Destarte, é de se reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação
específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência
é através da própria natureza dos males que a assolam, do seu grau e intensidade, que poderão
ser mensuradas suas necessidades. Não há, pois, que se enquadrar todos os indivíduos em um
mesmo patamar e entender que somente aqueles que contam com menos de um quarto do
salário-mínimo possam fazer jus ao benefício assistencial.
No caso dos autos, o estudo social realizado em 31.05.2016 constatou que o núcleo familiar da
autora é formado por ela e seu filho José Antônio Luiz de Oliveira, de 52 anos à época, o qual
padece de epilepsia e deficiência física (cadeirante), sendo totalmente dependente para os atos
da vida cotidiana, como tomar banho e vestir-se, tarefas nas quais a autora é auxiliada por um
vizinho, pois incapaz de realizá-las sozinha. Residem em imóvel próprio, de alvenaria, composto
por três quartos, sala e cozinha conjugadas e um banheiro, em ótimo estado de higiene e
conservação, guarnecido por eletrodomésticos básicos (geladeira usada, fogão, televisão 14
polegadas, rádio e máquina de lavar tipo tanquinho). A moradia localizada em rua com
pavimentação asfáltica e é atendida pela rede de esgoto, água encanada e energia elétrica. A
renda familiar provém integralmente do benefício assistencial de prestação continuada percebido
pelo filho da autora e as despesas consistem em supermercado (R$ 300,00), energia elétrica (R$
85,00), água (R$ 37,00), plano de saúde (R$ 40,00) e farmácia (R$ 76,00), em valor total
equivalente a R$ 538,00.
Cumpre salientar, entretanto, que o benefício assistencial recebido por deficiente, bem como o
assistencial e o previdenciário de até um salário-mínimo recebido por idoso com mais de 65 anos
devem ser excluídos do cálculo da renda familiar per capta, face ao reconhecimento da
inconstitucionalidade, por omissão parcial, do artigo 34, parágrafo único da Lei nº 10.741/2003
(RE 580963/PR).
Há que se ter em conta, ainda, que se trata de pessoa idosa, mais vulnerável a necessidades
extraordinárias, sem meios de suprir suas necessidades básicas.
Portanto, resta comprovado que a autora é idosa e que não possui meios para prover sua
manutenção ou tê-la provida por sua família, fazendo jus à concessão do benefício assistencial.
O termo inicial do benefício deve ser mantido a partir do requerimento administrativo
(16.10.2013), ante o firme entendimento jurisprudencial nesse sentido.
Mantida a correção monetária na forma estabelecida na sentença, ante a ausência de recurso da
parte autora. Os juros de mora também deverão incidir na forma do julgado de primeiro grau.
Ante o trabalho adicional do patrono da parte autora em grau recursal, a teor do disposto no artigo
85, § 11, do CPC de 2015, basede cálculo da verba honorária fica majorada para as parcelas que
seriam devidas até a presente data, conforme o entendimento desta 10ª Turma.
Diante do exposto, nego provimento àapelaçãodo réu eà remessa oficial, tida por interposta. Os
valores em atraso serão resolvidos em sede de liquidação de sentença, compensando-se aqueles
já recebidos por força da antecipação dos efeitos da tutela.
É como voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. REQUISITOS LEGAIS
COMPROVADOS. LEI 8.742/93, ART. 20, §3º. IDOSA. INCONSTITUCIONALIDADE
RECONHECIDA PELO E. STF. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. COMPROVAÇÃO POR
OUTROS MEIOS.TERMO INICIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
I - Para fazer jus ao amparo constitucional, o postulante deve ser portador de deficiência ou ser
idoso (65 anos ou mais) e ser incapaz de prover a própria manutenção ou tê-la provida por sua
família. A autora, nascida em 31.07.1944, implementou o requisito etário.
II - Quanto à hipossuficiência econômica, à luz da jurisprudência consolidada no âmbito do E. STJ
e do posicionamento usual desta C. Turma, no sentido de que o art. 20, §3º, da Lei 8.742/93
define limite objetivo de renda per capita a ser considerada, mas não impede a comprovação da
miserabilidade pela análise da situação específica de quem pleiteia o benefício. (Precedente do
E. STJ).
III - Em que pese a improcedência da ADIN 1.232-DF, em julgamento recente dos Recursos
Extraordinários 567.985-MT e 580.983-PR, bem como da Reclamação 4.374, o E. Supremo
Tribunal Federal modificou o posicionamento adotado anteriormente, para entender pela
inconstitucionalidade do disposto no art. 20, §3º, da Lei 8.742/93.
IV - O entendimento que prevalece atualmente no âmbito do E. STF é os de que as significativas
alterações no contexto socioeconômico desde a edição da Lei 8.742/93 e o reflexo destas nas
políticas públicas de assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios para
aferição da miserabilidade previstos na LOAS e aqueles constantes no sistema de proteção social
que veio a se consolidar.
V – O termo inicial do benefício deve ser mantido a partir do requerimento administrativo, ante o
firme entendimento jurisprudencial nesse sentido.
VI - Ante o trabalho adicional do patrono da parte autora em grau recursal, a teor do disposto no
artigo 85, § 11, do CPC de 2015, basede cálculo da verba honorária fica majorada para as
parcelas que seriam devidas até a presente data, conforme o entendimento desta 10ª Turma.
VII - Apelação do réu e remessa oficial, tida por interposta, improvidas.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, A Décima Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação do réu e à remessa oficial, tida por interposta.,
nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
