Processo
ReeNec - REEXAME NECESSÁRIO / SP
5040208-62.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal SERGIO DO NASCIMENTO
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
02/05/2019
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 03/05/2019
Ementa
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. REQUISITOS LEGAIS
COMPROVADOS. LEI 8.742/93, ART. 20, §3º. IDOSA. INCONSTITUCIONALIDADE
RECONHECIDA PELO E. STF. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. COMPROVAÇÃO POR
OUTROS MEIOS. TERMO INICIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
I - Para fazer jus ao amparo constitucional, o postulante deve ser portador de deficiência ou ser
idoso (65 anos ou mais) e ser incapaz de prover a própria manutenção ou tê-la provida por sua
família. A autora, nascida em 31.07.1944, implementou o requisito etário.
II - Quanto à hipossuficiência econômica, à luz da jurisprudência consolidada no âmbito do E. STJ
e do posicionamento usual desta C. Turma, no sentido de que o art. 20, §3º, da Lei 8.742/93
define limite objetivo de renda per capita a ser considerada, mas não impede a comprovação da
miserabilidade pela análise da situação específica de quem pleiteia o benefício. (Precedente do
E. STJ).
III - Em que pese a improcedência da ADIN 1.232-DF, em julgamento recente dos Recursos
Extraordinários 567.985-MT e 580.983-PR, bem como da Reclamação 4.374, o E. Supremo
Tribunal Federal modificou o posicionamento adotado anteriormente, para entender pela
inconstitucionalidade do disposto no art. 20, §3º, da Lei 8.742/93.
IV - O entendimento que prevalece atualmente no âmbito do E. STF é os de que as significativas
alterações no contexto socioeconômico desde a edição da Lei 8.742/93 e o reflexo destas nas
políticas públicas de assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios para
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
aferição da miserabilidade previstos na LOAS e aqueles constantes no sistema de proteção social
que veio a se consolidar.
V – O termo inicial do benefício deve ser mantido a partir do requerimento administrativo, ante o
firme entendimento jurisprudencial nesse sentido.
VI – Ante a ausência de trabalho adicional do patrono da parte autora em grau recursal, fica a
verba honorária mantida na forma estabelecida na sentença.
VII - Remessa oficial improvida.
Acórdao
REEXAME NECESSÁRIO (199) Nº 5040208-62.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
JUÍZO RECORRENTE: IRACI MARIA BEZERRA
Advogados do(a) JUÍZO RECORRENTE: NATALIA APARECIDA ROSSI ARTICO - MS16128-N,
DENILSON ARTICO FILHO - SP326478-N
PARTE RÉ: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
REEXAME NECESSÁRIO (199) Nº 5040208-62.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
JUÍZO RECORRENTE: IRACI MARIA BEZERRA
Advogados do(a) JUÍZO RECORRENTE: NATALIA APARECIDA ROSSI ARTICO - MS16128-N,
DENILSON ARTICO FILHO - SP326478-N
PARTE RÉ: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Senhor Desembargador Federal Sergio Nascimento (Relator): Trata-se de remessa
oficial de sentença pela qual foi julgado procedente o pedido da autora para condenar o réu a lhe
conceder o benefício de prestação continuada previsto no art. 203, V, da Constituição da
República, no valor mensal de um salário mínimo, desde a data do requerimento administrativo.
As parcelas vencidas serão acrescidas de juros e correção monetária na forma do Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal. Pela sucumbência, o réu
arcará com os honorários advocatícios da parte contrária, fixados em 10% sobre as parcelas
vencidas, entendidas como tais aquelas devidas até a data da sentença. Não houve condenação
em custas. Deferida a antecipação dos efeitos da tutela, determinando-se a implantação do
benefício no prazo de 45 dias, contados da intimação.
Pelo doc. ID Num. 5405446 - Pág. 1 foi noticiado o cumprimento da determinação judicial.
Em parecer, o i. representante do Parquet Federal, opinou pelo não conhecimento do reexame
necessário.
É o relatório.
REEXAME NECESSÁRIO (199) Nº 5040208-62.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
JUÍZO RECORRENTE: IRACI MARIA BEZERRA
Advogados do(a) JUÍZO RECORRENTE: NATALIA APARECIDA ROSSI ARTICO - MS16128-N,
DENILSON ARTICO FILHO - SP326478-N
PARTE RÉ: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Do reexame necessário.
De início, entendo que se aplica ao presente caso o Enunciado da Súmula 490 do E. STJ, que
assim dispõe:
A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for
inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas.
Conheço, portanto, da remessa oficial.
Do mérito.
O benefício pretendido pela parte autora está previsto no artigo 203, V, da Constituição da
República, que dispõe:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de
contribuição à seguridade social, e tem por objetivo:
(...)
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou tê-la provida por sua
família, conforme dispuser a lei.
A regulamentação legislativa do dispositivo constitucional restou materializada com o advento da
Lei 8.742/93, que dispõe na redação atualizada do caput do seu artigo 20:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa
com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
Assim, para fazer jus ao amparo constitucional, o postulante deve ser portador de deficiência ou
ser idoso (65 anos ou mais) e ser incapaz de prover a própria manutenção ou tê-la provida por
sua família.
No caso dos autos, a demandante, nascida em 08.08.1949, conta atualmente com 69 anos de
idade.
Há que se reconhecer, portanto, que a parte autora fará jus ao benefício assistencial, caso
preencha o requisito socioeconômico, haja vista ter implementado o requisito etário.
No que toca ao requisito socioeconômico, cumpre observar que o §3º do artigo 20 da Lei
8.742/93 estabeleceu para a sua aferição o critério de renda familiar per capita, observado o limite
de um quarto do salário mínimo, que restou mantido na redação dada pela Lei 12.435/11, acima
transcrita.
A questão relativa à constitucionalidade do critério de renda per capita não excedente a um
quarto do salário mínimo para que se considerasse o idoso ou pessoa com deficiência aptos à
concessão do benefício assistencial, foi analisada pelo E. Supremo Tribunal Federal em sede de
Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 1.232/DF), a qual foi julgada improcedente (STF. ADI
1.232-DF. Rel. p/ Acórdão Min. Nelson Jobim. J. 27.08.98; D.J. 01.06.2001).
Todavia, conquanto reconhecida a constitucionalidade do §3º do artigo 20, da Lei 8.742/93, a
jurisprudência evoluiu no sentido de que tal dispositivo estabelecia situação objetiva pela qual se
deve presumir pobreza de forma absoluta, mas não impedia o exame de situações subjetivas
tendentes a comprovar a condição de miserabilidade do requerente e de sua família. Tal
interpretação seria consolidada pelo E. Superior Tribunal de Justiça em recurso especial julgado
pela sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil (STJ - REsp. 1.112.557-MG;
Terceira Seção; Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho; j. 28.10.2009; DJ 20.11.2009).
O aparente descompasso entre o desenvolvimento da jurisprudência acerca da verificação da
miserabilidade dos postulantes ao benefício assistencial e o entendimento assentado por ocasião
do julgamento da ADI 1.232-DF levaria a Corte Suprema a voltar ao enfrentamento da questão,
após o reconhecimento da existência da sua repercussão geral, no âmbito da Reclamação 4374 -
PE, julgada em 18.04.2013.
Naquela ocasião, prevaleceu o entendimento de que "ao longo de vários anos desde a sua
promulgação, o §3º do art. 20 da LOAS passou por um processo de inconstitucionalização". Com
efeito, as significativas alterações no contexto socioeconômico desde então e o reflexo destas
nas políticas públicas de assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios
para aferição da miserabilidade previstos na Lei 8.742/93 e aqueles constantes no sistema de
proteção social que veio a se consolidar (Rcl 4374, Relator Ministro Gilmar Mendes, Tribunal
Pleno, j. 18.04.2013, DJe-173 03.09.2013).
Destarte, é de se reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação
específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência
é através da própria natureza dos males que a assolam, do seu grau e intensidade, que poderão
ser mensuradas suas necessidades. Não há, pois, que se enquadrar todos os indivíduos em um
mesmo patamar e entender que somente aqueles que contam com menos de um quarto do
salário-mínimo possam fazer jus ao benefício assistencial.
No caso dos autos, o estudo social realizado em 20.11.2017 (doc. ID Num. 5405419 - Pág. 1/4)
constatou que o núcleo familiar da autora é formado por ela suas filhas Edite Maria da Silva,
Edinete Maria Silva, ambas desempregadas, e Edna Maria Silva Santos, portadora de Síndrome
de Down, e de dois netos, filhos de Edinente, menores de idade. Residem em imóvel financiado
pela Cohab CDHU, em nome da filha Edna, edificado em alvenaria, composto por dois quartos,
sala, cozinha e um banheiro, com dimensões pequenas e em regular estado de higiene e
conservação, guarnecido por móveis e utensílios domésticos simples e escassos. A moradia é
localizada em rua com pavimentação asfáltica e é atendida pela rede de esgoto, água encanada
e energia elétrica. A renda familiar provém integralmente do benefício assistencial de prestação
continuada percebido pela filha Edna e do valor recebido pela filha Edinete decorrente do
programa Bolsa Família (R$ 78,00) e as despesas consistem em mercado (R$ 700,00), energia
elétrica (R$ 150,00), água (R$ 50,00), prestação da casa (R$ 140,00, sendo que há várias
parcelas em atraso) e gás (R$ 75,00). Conclui que a demandante apresenta acentuada
vulnerabilidade social, sobrevivendo com restrições quantitativas e qualitativas até na
alimentação.
Cumpre salientar, entretanto, que o benefício assistencial recebido por deficiente, bem como o
assistencial e o previdenciário de até um salário-mínimo recebido por idoso com mais de 65 anos
devem ser excluídos do cálculo da renda familiar per capta, face ao reconhecimento da
inconstitucionalidade, por omissão parcial, do artigo 34, parágrafo único da Lei nº 10.741/2003
(RE 580963/PR).
Há que se ter em conta, ainda, que se trata de pessoa idosa, mais vulnerável a necessidades
extraordinárias, sem meios de suprir suas necessidades básicas.
Portanto, resta comprovado que a autora é idosa e que não possui meios para prover sua
manutenção ou tê-la provida por sua família, fazendo jus à concessão do benefício assistencial.
O termo inicial do benefício deve ser mantido a partir do requerimento administrativo
(25.08.2016), ante o firme entendimento jurisprudencial nesse sentido.
A correção monetária e os juros de mora deverão ser calculados de acordo com a lei de regência.
Ante a ausência de trabalho adicional do patrono da parte autora em grau recursal, fica a verba
honorária mantida na forma estabelecida na sentença.
Diante do exposto, nego provimentoà remessa oficial. Os valores em atraso serão resolvidos em
sede de liquidação de sentença, compensando-se aqueles já recebidos por força da antecipação
dos efeitos da tutela.
É como voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. REQUISITOS LEGAIS
COMPROVADOS. LEI 8.742/93, ART. 20, §3º. IDOSA. INCONSTITUCIONALIDADE
RECONHECIDA PELO E. STF. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. COMPROVAÇÃO POR
OUTROS MEIOS. TERMO INICIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
I - Para fazer jus ao amparo constitucional, o postulante deve ser portador de deficiência ou ser
idoso (65 anos ou mais) e ser incapaz de prover a própria manutenção ou tê-la provida por sua
família. A autora, nascida em 31.07.1944, implementou o requisito etário.
II - Quanto à hipossuficiência econômica, à luz da jurisprudência consolidada no âmbito do E. STJ
e do posicionamento usual desta C. Turma, no sentido de que o art. 20, §3º, da Lei 8.742/93
define limite objetivo de renda per capita a ser considerada, mas não impede a comprovação da
miserabilidade pela análise da situação específica de quem pleiteia o benefício. (Precedente do
E. STJ).
III - Em que pese a improcedência da ADIN 1.232-DF, em julgamento recente dos Recursos
Extraordinários 567.985-MT e 580.983-PR, bem como da Reclamação 4.374, o E. Supremo
Tribunal Federal modificou o posicionamento adotado anteriormente, para entender pela
inconstitucionalidade do disposto no art. 20, §3º, da Lei 8.742/93.
IV - O entendimento que prevalece atualmente no âmbito do E. STF é os de que as significativas
alterações no contexto socioeconômico desde a edição da Lei 8.742/93 e o reflexo destas nas
políticas públicas de assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios para
aferição da miserabilidade previstos na LOAS e aqueles constantes no sistema de proteção social
que veio a se consolidar.
V – O termo inicial do benefício deve ser mantido a partir do requerimento administrativo, ante o
firme entendimento jurisprudencial nesse sentido.
VI – Ante a ausência de trabalho adicional do patrono da parte autora em grau recursal, fica a
verba honorária mantida na forma estabelecida na sentença.
VII - Remessa oficial improvida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à remessa
oficial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
