Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5678297-71.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal SERGIO DO NASCIMENTO
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
05/03/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 09/03/2020
Ementa
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. REQUISITOS LEGAIS NÃO
COMPROVADOS. LEI 8.742/93, ART. 20, §3º. AUSÊNCIA DE MISERABILIDADE. VERBAS DE
SUCUMBÊNCIA.I - Não obstante o implemento do requisito referente à deficiência, verifica-se
que não restou comprovada a miserabilidade da parte autora.II - Observo que não se olvida que o
entendimento predominante na jurisprudência é o de que o limite de renda per capita de um
quarto do salário mínimo, previsto no artigo 20, §3º, da Lei 8.742/93, à luz do sistema de proteção
social ora consolidado, se mostra inconstitucional, devendo a análise da miserabilidade levar em
conta a situação específica do postulante ao benefício assistencial.III - Honorários advocatícios
mantidosem R$ 800,00 (oitocentosreais). A exigibilidade da verba honorária ficará suspensa por
05 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a
concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, nos termos do artigo 98, §3º, do
mesmo estatuto processual.IV - Apelação da parte autora improvida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5678297-71.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: M. I. F.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
REPRESENTANTE: CELI ISABEL PEREIRA
Advogado do(a) APELANTE: SHERLA CRISTINA SANTOS - SP394561-N,
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5678297-71.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: M. I. F.
REPRESENTANTE: CELI ISABEL PEREIRA
Advogado do(a) APELANTE: SHERLA CRISTINA SANTOS - SP394561-N,
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Sérgio Nascimento (Relator): Trata-se de apelação de
sentença pela qual foi julgado improcedente o pedido em ação previdenciária objetivando a
concessão do benefício de prestação continuada. A parte autora foi condenada ao pagamento de
custas, despesas processuais e de honorários advocatícios fixados em R$ 800,00, observando-
se, contudo, ser beneficiária da Justiça Gratuita.Em apelação, a parte autora sustenta restarem
preenchidos os requisitos necessários à concessão do benefício em comento.Sem contrarrazões,
os autos vieram a esta Corte.Em parecer o Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento
da apelação interposta.É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5678297-71.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: M. I. F.
REPRESENTANTE: CELI ISABEL PEREIRA
Advogado do(a) APELANTE: SHERLA CRISTINA SANTOS - SP394561-N,
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Nos termos do art. 1011 do CPC/2015, recebo a apelação da parte autora.
O benefício pretendido pela parte autora está previsto no artigo 203, V, da Constituição da
República, que dispõe:Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar,
independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivo:(...)V - a garantia de
um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que
comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou tê-la provida por sua família,
conforme dispuser a lei.
A regulamentação legislativa do dispositivo constitucional restou materializada com o advento da
Lei 8.742/93, que dispõe na redação atualizada do caput do seu artigo 20:Art. 20. O benefício de
prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao
idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a
própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
Assim, para fazer jus ao amparo constitucional, o postulante deve ser portador de deficiência ou
ser idoso (65 anos ou mais) e ser incapaz de prover a própria manutenção ou tê-la provida por
sua família.
Quanto ao requisito relativo à deficiência, a Lei 8.742/93, que regulamentou a concessão do
dispositivo constitucional acima, dispunha no § 2º do seu artigo 20, em sua redação original:Art.
20. O benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à pessoa
portadora de deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais e que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.(...)§ 2º Para efeito
de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a
vida independente e para o trabalho.
Nesse ponto, cumpre salientar que o texto constitucional garante o pagamento de um salário
mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência, sem exigir, como fez a norma
regulamentadora, em sua redação original, a existência de incapacidade para a vida
independente e para o trabalho.
Nota-se, portanto, que ao definir os contornos da expressão pessoa portadora de deficiência
constante do dispositivo constitucional, a norma infraconstitucional reduziu a sua abrangência,
limitando o seu alcance aos casos em que a deficiência é geradora de incapacidade laborativa.
Todavia, observa-se que, em 10.07.2008, o Congresso Nacional promulgou o Decreto Legislativo
186/2008, aprovando, pelo rito previsto no artigo 5º, § 3º, da Constituição da República, o texto da
Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu Protocolo Facultativo,
assinados em Nova Iorque, em 30 de março de 2007, e conferindo à referida Convenção status
normativo equivalente ao das emendas constitucionais.
A Convenção, aprovada pelo Decreto Legislativo 186/2008, já no seu Artigo 1, cuidou de tratar do
conceito de "pessoa com deficiência", definição ora constitucionalizada pela adoção do rito do
artigo 5º, § 3º, da Carta, a saber:Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de
longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com
diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades
de condições com as demais pessoas.
Em coerência à alteração promovida em sede constitucional, o artigo 20, § 2º, da Lei 8.742/93,
viria a ser alterado pela Lei 12.470/11, passando a reproduzir em seu texto a definição de
"pessoa com deficiência" constante da norma superior. Dispõe a LOAS, em sua redação
atualizada:Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo
mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que
comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua
família.(...)§ 2o Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência
aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial,
os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº
12.470, de 2011).
Não há dúvida, portanto, de que o conceito de 'deficiência' atualmente albergado é mais extenso
do que aquele outrora estabelecido, vez que considera como tal qualquer impedimento, inclusive
de natureza sensorial, que tenha potencialidade para a obstrução da participação social do
indivíduo em condições de igualdade.
Coerente com esta nova definição de 'deficiência' para fins de concessão do benefício
constitucional, a mencionada Lei 12.470/11 acrescentou à Lei 8.742/93 o artigo 21-A, com a
seguinte redação:Art. 21-A. O benefício de prestação continuada será suspenso pelo órgão
concedente quando a pessoa com deficiência exercer atividade remunerada, inclusive na
condição de microempreendedor individual. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)§ 1o Extinta a
relação trabalhista ou a atividade empreendedora de que trata o caput deste artigo e, quando for
o caso, encerrado o prazo de pagamento do seguro-desemprego e não tendo o beneficiário
adquirido direito a qualquer benefício previdenciário, poderá ser requerida a continuidade do
pagamento do benefício suspenso, sem necessidade de realização de perícia médica ou
reavaliação da deficiência e do grau de incapacidade para esse fim, respeitado o período de
revisão previsto no caput do art. 21.
Verifica-se, portanto, que a legislação ordinária, em deferência às alterações promovidas em sede
constitucional, não apenas deixou de identificar os conceitos de 'incapacidade laborativa' e
'deficiência', como passou a autorizar expressamente que a pessoa com deficiência elegível à
concessão do amparo assistencial venha a exercer atividade laborativa - seja como empregada,
seja como microempreendedora - sem que tenha sua condição descaracterizada pelo trabalho,
ressalvada tão somente a suspensão do benefício enquanto este for exercido.
Observados estes parâmetros para a aferição da deficiência, no caso dos autos, a perícia médica
realizada em 23.01.2018, constatou que a autora é portadora de Síndrome de Down com
comprometimento cognitivo, estando incapacitada de forma total e definitiva para o trabalho.
Portanto, a parte autora fará jus ao benefício assistencial caso preencha o requisito
socioeconômico, haja vista possuir 'impedimentos de longo prazo', com potencialidade para
'obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade, em igualdade de condições com outras
pessoas', mesmo tendo o laudo pericial concluído por sua capacidade residual, levando-se em
conta suas condições sociais e as patologias das quais é portador.
Porém, conforme estudo social realizado em 10.12.2017, o núcleo familiar da autora é composto
por ela,sua mãe e uma irmã.Residem em casa própria, com4 (quatro) cômodos e um banheiro,
construídaem um terreno de meio lote. Os cômodos construídos de alvenaria, com forro de
alvenaria “laje”, as paredes são rebocadas e pintadas, o chão de todos os cômodo são de piso de
cerâmica, a garagem e o quintal são apenas cimentados, banheiro com revestimento até o teto, a
cozinha com revestimento até na metade da parede.Construção simples, germinada, com
iluminação e ventilação adequada. A parte autora tem uma outra irmã que está participando de
intercâmbio nos EUA, por conta própria, sem depender de ajuda financeira da família.A renda é
proveniente do salário da genitora, no valor de R$ 1.126,87, sendo as despesas de
aproximadamente R$ 1.668,00, inclusive com internet e tv por assinatura.
Ademais, consoante informações no CNIS o salário atual da genitora é de R$ 2.395,89.
Portanto, o conjunto probatório existente nos autos demonstra que a autora não se encontra em
situação de miserabilidade que justifique a concessão do amparo assistencial.
Observo, por último, que a autora poderá pleitear a benesse novamente, caso haja alteração de
sua situação socioeconômica.
Honorários advocatícios mantidosem R$ 800,00 (oitocentosreais), conforme previsto no artigo 85,
§§ 4º, III, e 8º, do CPC. A exigibilidade da verba honorária ficará suspensa por 05 (cinco) anos,
desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos
benefícios da assistência judiciária gratuita, nos termos do artigo 98, §3º, do mesmo estatuto
processual.
Diante do exposto, nego provimento à apelação da parte autora.
É como voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. REQUISITOS LEGAIS NÃO
COMPROVADOS. LEI 8.742/93, ART. 20, §3º. AUSÊNCIA DE MISERABILIDADE. VERBAS DE
SUCUMBÊNCIA.I - Não obstante o implemento do requisito referente à deficiência, verifica-se
que não restou comprovada a miserabilidade da parte autora.II - Observo que não se olvida que o
entendimento predominante na jurisprudência é o de que o limite de renda per capita de um
quarto do salário mínimo, previsto no artigo 20, §3º, da Lei 8.742/93, à luz do sistema de proteção
social ora consolidado, se mostra inconstitucional, devendo a análise da miserabilidade levar em
conta a situação específica do postulante ao benefício assistencial.III - Honorários advocatícios
mantidosem R$ 800,00 (oitocentosreais). A exigibilidade da verba honorária ficará suspensa por
05 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a
concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, nos termos do artigo 98, §3º, do
mesmo estatuto processual.IV - Apelação da parte autora improvida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egregia Decima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3 Regiao, por unanimidade, negar provimento a apelacao
da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
