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CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO RETIDO NÃO REITERADO NAS CONTRARRAZÕES. NÃO CONHECIMENTO. APELAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ART. 37, § 6º, ...

Data da publicação: 09/07/2020, 21:34:12

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO RETIDO NÃO REITERADO NAS CONTRARRAZÕES. NÃO CONHECIMENTO. APELAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ART. 37, § 6º, CF. CANCELAMENTO INDEVIDO DE AUXÍLIO-DOENÇA DE MARIDO FALECIDO. FATO LESIVO, DANO MORAL E NEXO CAUSAL. COMPROVAÇÃO. VALOR DA CONDENAÇÃO. CONSECTÁRIOS LEGAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. - Não se conhece de agravo retido não reiterado nas razões ou contrarrazões de apelação (artigo 523, § 1º, do CPC). - A Constituição Federal de 1988 impõe ao Estado o dever de indenizar os danos causados a terceiros por seus servidores, independentemente da prova do dolo ou culpa (Art. 37, § 6º). - Segundo a doutrina, para fazer jus ao ressarcimento em juízo, cabe à vítima provar o nexo causal entre o fato ofensivo, que, segundo a orientação citada, pode ser comissivo ou omissivo, e o dano, assim como o seu montante. De outro lado, o poder público somente se desobrigará se provar a culpa exclusiva do lesado. - Está exaustivamente comprovado que o marido da autora teve seu benefício de auxílio-doença cancelado indevidamente, visto que estava gravemente doente e impossibilitado para o trabalho e o motivo alegado pelo INSS para o cancelamento é que estaria apto para tais atividades. - Os elementos probatórios apresentados nos autos demonstram todo o sofrimento do pai dessa família, o qual é o bastante para evidenciar tudo o que esse grupo familiar suportou naquele período. É mais do que incontroverso que, se o "arrimo de família" tem seu direito ao benefício previdenciário violado, ainda mais em uma situação de doença em que não é possível exercer qualquer atividade rentável, tal irá refletir diretamente em todos os indivíduos pertencentes àquele grupo, que dependem dele não só economicamente, como também emocionalmente. São notórios os danos morais sofridos pela requerente e sua família, consubstanciados na dor de ficar endividada, não ter o que comer e precisar da ajuda de conhecidos para se alimentar, quando poderia tê-lo feito por suas próprias expensas, caso seu marido pudesse ter exercido seu direito de contribuinte e beneficiário da previdência social. - Configurou-se o nexo causal, na medida em que o dano moral comprovado foi resultado do cancelamento indevido pelo INSS de benefício a que o falecido fazia jus. É notório o equívoco do citado profissional da autarquia previdenciária, que atestou a capacidade do de cujus para o trabalho, quando na realidade ela não existia, tanto que o segurado veio a falecer das causas que o levaram a pleitear o benefício poucos meses depois. Ademais, frise-se que o ente estatal não provou culpa exclusiva da vítima. Assim, é de rigor a reparação à apelante. - A tese de que o perito do INSS estava em exercício regular de direito, razão pela qual não caberia indenização na espécie, não deve prosperar. A ilicitude da conduta do agente público não é pressuposto da responsabilidade estatal, a qual, como visto, é objetiva, de modo que eventual presença de excludente de ilicitude não é suficiente para afastá-la. Poderia sim, em tese, favorecer ao agente, cuja responsabilidade é subjetiva - O valor da indenização, segundo doutrina e jurisprudência pátrias, tem duplo conteúdo, de sanção e compensação. Certamente, as situações humilhantes e revoltantes às quais a apelante e sua família foram submetidos lhes causaram dor moral passível de reparação. Para fins de fixação da indenização, deve ser considerado também o período de privação pelo qual passou a família, que pelo que consta dos autos se estendeu de 06/07/2005 a 13/01/2006, data em que foi deferido benefício de pensão por morte à autora. Diante desse quadro, penso que a indenização deve ser fixada, conforme pleiteado, em R$ 30.000,00 (trinta mil reais), como forma de atender aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade e cumprir os critérios mencionados. - Sobre o valor da condenação incidirá juros moratórios, a contar da data do evento danoso (Súmula 54 do Superior Tribunal de Justiça), e correção monetária, a partir da presente data (Súmula 362 do Superior Tribunal de Justiça), a serem calculados de acordo com o Manual de Cálculos da Justiça Federal. - Trata-se de ação em que foi vencida a fazenda pública, razão pela qual a fixação dos honorários advocatícios deverá ser feita conforme apreciação equitativa, sem a obrigatoriedade de adoção, como base para o cômputo, do valor da causa ou da condenação, conforme artigo 20, parágrafos 3º e 4º, do CPC. Dessa forma, considerado o trabalho realizado e a natureza da causa, fixo-os em R$ 2.000,00 (dois mil reais), dado que propiciam remuneração adequada e justa ao profissional. - Agravo retido não conhecido. Apelação provida. (TRF 3ª Região, QUARTA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1456730 - 0000619-55.2007.4.03.6113, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRE NABARRETE, julgado em 14/05/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:03/06/2015 )


Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 08/06/2015
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000619-55.2007.4.03.6113/SP
2007.61.13.000619-8/SP
RELATOR:Desembargador Federal ANDRE NABARRETE
APELANTE:IOLANDA APARECIDA SCORSATO INACIO
ADVOGADO:SP159340 ZELIA DA SILVA FOGACA LOURENCO e outro
APELADO(A):Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
ADVOGADO:SP265924 SILVIO MARQUES GARCIA e outro
:SP000030 HERMES ARRAIS ALENCAR

EMENTA

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO RETIDO NÃO REITERADO NAS CONTRARRAZÕES. NÃO CONHECIMENTO. APELAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ART. 37, § 6º, CF. CANCELAMENTO INDEVIDO DE AUXÍLIO-DOENÇA DE MARIDO FALECIDO. FATO LESIVO, DANO MORAL E NEXO CAUSAL. COMPROVAÇÃO. VALOR DA CONDENAÇÃO. CONSECTÁRIOS LEGAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- Não se conhece de agravo retido não reiterado nas razões ou contrarrazões de apelação (artigo 523, § 1º, do CPC).
- A Constituição Federal de 1988 impõe ao Estado o dever de indenizar os danos causados a terceiros por seus servidores, independentemente da prova do dolo ou culpa (Art. 37, § 6º).
- Segundo a doutrina, para fazer jus ao ressarcimento em juízo, cabe à vítima provar o nexo causal entre o fato ofensivo, que, segundo a orientação citada, pode ser comissivo ou omissivo, e o dano, assim como o seu montante. De outro lado, o poder público somente se desobrigará se provar a culpa exclusiva do lesado.
- Está exaustivamente comprovado que o marido da autora teve seu benefício de auxílio-doença cancelado indevidamente, visto que estava gravemente doente e impossibilitado para o trabalho e o motivo alegado pelo INSS para o cancelamento é que estaria apto para tais atividades.
- Os elementos probatórios apresentados nos autos demonstram todo o sofrimento do pai dessa família, o qual é o bastante para evidenciar tudo o que esse grupo familiar suportou naquele período. É mais do que incontroverso que, se o "arrimo de família" tem seu direito ao benefício previdenciário violado, ainda mais em uma situação de doença em que não é possível exercer qualquer atividade rentável, tal irá refletir diretamente em todos os indivíduos pertencentes àquele grupo, que dependem dele não só economicamente, como também emocionalmente. São notórios os danos morais sofridos pela requerente e sua família, consubstanciados na dor de ficar endividada, não ter o que comer e precisar da ajuda de conhecidos para se alimentar, quando poderia tê-lo feito por suas próprias expensas, caso seu marido pudesse ter exercido seu direito de contribuinte e beneficiário da previdência social.
- Configurou-se o nexo causal, na medida em que o dano moral comprovado foi resultado do cancelamento indevido pelo INSS de benefício a que o falecido fazia jus. É notório o equívoco do citado profissional da autarquia previdenciária, que atestou a capacidade do de cujus para o trabalho, quando na realidade ela não existia, tanto que o segurado veio a falecer das causas que o levaram a pleitear o benefício poucos meses depois. Ademais, frise-se que o ente estatal não provou culpa exclusiva da vítima. Assim, é de rigor a reparação à apelante.
- A tese de que o perito do INSS estava em exercício regular de direito, razão pela qual não caberia indenização na espécie, não deve prosperar. A ilicitude da conduta do agente público não é pressuposto da responsabilidade estatal, a qual, como visto, é objetiva, de modo que eventual presença de excludente de ilicitude não é suficiente para afastá-la. Poderia sim, em tese, favorecer ao agente, cuja responsabilidade é subjetiva
- O valor da indenização, segundo doutrina e jurisprudência pátrias, tem duplo conteúdo, de sanção e compensação. Certamente, as situações humilhantes e revoltantes às quais a apelante e sua família foram submetidos lhes causaram dor moral passível de reparação. Para fins de fixação da indenização, deve ser considerado também o período de privação pelo qual passou a família, que pelo que consta dos autos se estendeu de 06/07/2005 a 13/01/2006, data em que foi deferido benefício de pensão por morte à autora. Diante desse quadro, penso que a indenização deve ser fixada, conforme pleiteado, em R$ 30.000,00 (trinta mil reais), como forma de atender aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade e cumprir os critérios mencionados.
- Sobre o valor da condenação incidirá juros moratórios, a contar da data do evento danoso (Súmula 54 do Superior Tribunal de Justiça), e correção monetária, a partir da presente data (Súmula 362 do Superior Tribunal de Justiça), a serem calculados de acordo com o Manual de Cálculos da Justiça Federal.
- Trata-se de ação em que foi vencida a fazenda pública, razão pela qual a fixação dos honorários advocatícios deverá ser feita conforme apreciação equitativa, sem a obrigatoriedade de adoção, como base para o cômputo, do valor da causa ou da condenação, conforme artigo 20, parágrafos 3º e 4º, do CPC. Dessa forma, considerado o trabalho realizado e a natureza da causa, fixo-os em R$ 2.000,00 (dois mil reais), dado que propiciam remuneração adequada e justa ao profissional.
- Agravo retido não conhecido. Apelação provida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer do agravo retido e dar provimento à apelação para julgar procedente a ação e condenar o INSS a pagar à autora indenização por danos morais no montante de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) e honorários advocatícios no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), os juros de mora e a correção monetária incidirão conforme consignado no voto, custas na forma da lei, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 14 de maio de 2015.
André Nabarrete
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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Data e Hora: 20/05/2015 14:52:48



APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000619-55.2007.4.03.6113/SP
2007.61.13.000619-8/SP
RELATOR:Desembargador Federal ANDRE NABARRETE
APELANTE:IOLANDA APARECIDA SCORSATO INACIO
ADVOGADO:SP159340 ZELIA DA SILVA FOGACA LOURENCO e outro
APELADO(A):Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
ADVOGADO:SP265924 SILVIO MARQUES GARCIA e outro
:SP000030 HERMES ARRAIS ALENCAR

RELATÓRIO

Apelação de IOLANDA APARECIDA SCORSATO INÁCIO de sentença que, em sede de ação indenizatória por danos morais, julgou-a improcedente e condenou a requerente ao pagamento de honorários advocatícios no montante de R$ 465,00, observado que é beneficiária da assistência judiciária gratuita. Custas na forma da lei (fls. 240/241vº).


Alega, em síntese, que, se o seu falecido marido estava incapacitado total e definitivamente quando da realização da perícia judicial, é óbvio que já estava incapacitado quando passou pelo perito da autarquia, que indevidamente cessou o benefício de auxílio-doença. A apelante e seu esposo eram pessoas que dependiam do benefício para sobreviver, à vista da total incapacidade dele para o trabalho e da ausência de outra fonte de renda para o sustento da família. Aduz que a injusta negativa de concessão do benefício previdenciário acarretou afronta à dignidade e, consequentemente, danos morais a ambos. Pleiteia reversão do julgado (fls. 244/249).


Em suas contrarrazões (fls. 254/256), o INSS aduz que a sentença deve ser mantida, porquanto não estão presentes os elementos ensejadores do ressarcimento por dano moral requerido.


A autarquia previdenciária interpôs agravo retido (fls. 110/111), no qual alega sua ilegitimidade passiva, ao fundamento de que a responsabilidade objetiva do ente público disposta no artigo 37, § 6º, da CF não pode ser estendida a ponto de ser responsabilizada a pessoa jurídica por eventual dano moral sofrido pelo autor em decorrência de entendimento contrário ao seu interesse.


Junte-se o relatório e encaminhem-se os autos ao revisor.



André Nabarrete
Desembargador Federal Relator


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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000619-55.2007.4.03.6113/SP
2007.61.13.000619-8/SP
RELATOR:Desembargador Federal ANDRE NABARRETE
APELANTE:IOLANDA APARECIDA SCORSATO INACIO
ADVOGADO:SP159340 ZELIA DA SILVA FOGACA LOURENCO e outro
APELADO(A):Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
ADVOGADO:SP265924 SILVIO MARQUES GARCIA e outro
:SP000030 HERMES ARRAIS ALENCAR

VOTO

De início, não conheço do agravo retido de fls. 110/111, à vista de que não foi reiterado nas contrarrazões (artigo 523, § 1º, do CPC).


I - DOS FATOS NARRADOS NA INICIAL


A autora pleiteia indenização por danos morais, que, segundo alega, foram causados em razão de cancelamento indevido de auxílio-doença a que seu falecido cônjuge fazia jus, conforme restou demonstrado por meio de perícia-médica realizada nos autos de ação ordinária, na qual pleiteava aposentadoria por invalidez, que constatou a incapacidade total e definitiva dele para trabalhos remunerados. Aduz que o grupo familiar dependia dos rendimentos do marido para o seu sustento e que a consequente ausência de renda causada pelo corte do benefício causou-lhes, além de séria crise financeira, vergonha, humilhação, visto que ficaram sem dinheiro para pagar as contas da casa, bem como para comprar os remédios do de cujus, que acabou por falecer em decorrência da doença.


II - DA RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL DO ESTADO


A Constituição Federal de 1988 impõe ao Estado o dever de indenizar os danos causados a terceiros por seus servidores, independentemente da prova do dolo ou culpa, verbis:


Art. 37 § 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Tal norma firmou, em nosso sistema jurídico, o postulado da responsabilidade civil objetiva do poder público, sob a modalidade do risco administrativo. A doutrina é pacífica no que toca à sua aplicação em relação aos atos comissivos, contudo, diverge em relação aos atos omissivos. Prevalece no Supremo Tribunal Federal o entendimento de que o referido princípio constitucional se refere tanto à ação quanto à omissão, o qual encontra apoio na doutrina de Hely Lopes Meirelles, dentre outros. Segundo esse autor:


"Desde que a Administração defere ou possibilita ao servidor a realização de certa atividade administrativa, a guarda de um bem ou a condução de uma viatura, assume o risco de sua execução e responde civilmente pelos danos que esse agente venha a causar injustamente a terceiros. Nessa substituição da responsabilidade individual do servidor pela responsabilidade genérica do Poder Público, cobrindo o risco da sua ação ou omissão, é que assenta a teoria da responsabilidade objetiva da Administração, vale dizer, da responsabilidade sem culpa, pela só ocorrência da falta anônima do serviço, porque esta falta está, precisamente, na área dos riscos assumidos pela Administração para a consecução de seus fins". (Direito Administrativo Brasileiro, 36ª atual. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 687)

Nesse sentido, confiram-se julgados das cortes superiores: STF, RE 495740 AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 15/04/2008, DJe-152 DIVULG 13-08-2009 PUBLIC 14-08-2009 EMENT VOL-02369-07 PP-01432 RTJ VOL-00214- PP-00516; STF, AI 693628 AgR, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 01/12/2009, DJe-237 DIVULG 17-12-2009 PUBLIC 18-12-2009 EMENT VOL-02387-13 PP-02452 LEXSTF v. 32, n. 373, 2010, p. 91-96; STJ, REsp 1103840/PE, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/04/2009, DJe 07/05/2009.


Frise-se o ensinamento do Ministro Celso de Mello, expresso em precedentes da corte suprema de sua relatoria, como o citado, o qual sumariza de forma bastante didática os elementos caracterizadores desse dever do Estado de indenizar em razão de danos causados por seus agentes, verbis:


Os elementos que compõem a estrutura e delineiam o perfil da responsabilidade civil objetiva do Poder Público compreendem (a) a alteridade do dano, (b) a causalidade material entre o "eventus damni" e o comportamento positivo (ação) ou negativo (omissão) do agente público, (c) a oficialidade da atividade causal e lesiva imputável a agente do Poder Público que tenha, nessa específica condição, incidido em conduta comissiva ou omissiva, independentemente da licitude, ou não, do comportamento funcional e (d) a ausência de causa excludente da responsabilidade estatal.

Segundo a doutrina, para fazer jus ao ressarcimento em juízo, cabe à vítima provar o nexo causal entre o fato ofensivo, que, segundo a orientação citada, pode ser comissivo ou omissivo, e o dano, assim como o seu montante. De outro lado, o poder público somente se desobrigará se provar a culpa exclusiva do lesado.


III - DA LESÃO


A fim de comprovar suas alegações, a requerente apresentou cópia dos seguintes documentos:


a) certidão de óbito de SEBASTIÃO INÁCIO, a qual dá conta de que ele faleceu em 26.10.2005, vítima de pneumonia, insuficiência hepática, desnutrição, alcoolismo e taquicardia supraventricular (fl. 13);


b) certidão de nascimento do filho do casal - LUIZ FELIPE SCORSATO INÁCIO -, nascido em 15.05.1995 (fl. 14);


c) CTPS do marido (fls. 14/23), em que consta uma série de registros de vínculos empregatícios;


d) cartas de concessão de auxílio-doença com vigências nos seguintes períodos: 06/05/2004 a 01/11/2004 e 16/02/2005 a 01/07/2005 (fls. 24/27).


e) comunicações de resultado de exame médico, datadas de 024/05/2004 e 21/09/2004, que noticiaram incapacidade para o trabalho (fls. 28/29)


f) comunicação de resultado de exame médico, datada de 06/07/2005, que concluiu que não existia incapacidade para o trabalho (fl. 30);


g) laudo do serviço de radiologia da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Ipuã, datado de 17/11/2004, cujo relatório indicou a existência de espondiloartrose cervical com discopatias na coluna cervical - C5, C6 e C7, bem como discreta espondiloartrose lombar (fls. 31/32);


h) atestado médico, datado de 25/01/2005, em que consta que o falecido estava sob cuidados e encontrava-se impossibilitado de trabalhar por tempo indeterminado (fl. 33);


i) relatório de ultrassonografia abdominal, datada de 02/02/2005, no qual restou consignado que o paciente estava acometido de hepatopatia difusa de natureza a esclarecer (fl. 34);


j) atestado médico, datado de 23/02/2005, no qual se assevera que o falecido estava em tratamento e encontrava-se impossibilitado de trabalhar por tempo indeterminado (fl. 35);


k) atestado médico, datado de 13/07/2005, em que se afirma a submissão do falecido a cuidados médicos, incapacitado para o trabalho por tempo indeterminado (fl. 37);


l) petição inicial de ação proposta em 07/03/2004 contra o INSS para o fim de obter aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença (fls. 39/44);


m) laudo médico pericial realizado em juízo, que concluiu, verbis (fls. 45/51):


O autor é portador de DISTURBIOS COMPORTAMENTAIS CRÔNICOS e apresentou CRISE CONVULSIVA TÔNICO CRÔNICA na sala de espera do setor de perícias. Estes dados, complementados pelas informação em entrevista e os achados de exame clínico indicam diagnóstico de ALCOOLISMO CRÔNICO EM CRISE DE ABSTINÊNCIA.
Outrossim, documentação médica apresentada e evidências de exame médico pericial indicam quadro de ESPONDILOARTROSE DE COLUNA VERTEBRAL.
A somatória dos achados configura uma INCAPACIDA TOTAL E PERMANENTE PARA TRABALHOS REMUNERADOS que exijam regularidade e responsabilidade na execução

n) sentença do juízo estadual, proferida em 13/12/2005, que julgou procedente o pedido feito por JOÃO INÁCIO, para condenar a autarquia ré ao pagamento do benefício de aposentadoria por invalidez (fls. 52/55).


A testemunha REGINALDO DE OLIVEIRA declarou (fl. 177):


Conhece a autora e seu marido, falecido, Sebastião Inácio. Sabe que o INSS negou um benefício ao marido da autora. Eles tinham uma criança pequena e passaram por dificuldades. A família dependia da renda do falecido.

A testemunha FELICIANO FERREIRA DE MORAIS afirmou (fl. 178):


Conhece a autora e seu marido, falecido, Sebastião Inácio. Sabe que o INSS negou um benefício ao marido da autora. Eles tinham uma criança pequena e passaram por dificuldades financeiras. Inclusive o depoente conseguiu uma cesta básica para a família. A família dependia da renda do falecido. O depoente chegou a trabalhar com o falecido marido da autora.

Destarte, está exaustivamente comprovado que o marido da autora teve seu benefício de auxílio-doença cancelado indevidamente, porque estava gravemente doente e impossibilitado para o trabalho, diferentemente do que atestou o INSS.


IV - DO DANO MORAL


O juiz de primeiro grau entendeu inexistir prova do dano moral. No entanto, entendo que os elementos probatórios apresentados nos autos, que demonstram todo o sofrimento do pai, são o bastante para evidenciar tudo o que essa unidade familiar suportou naquele período. É mais do que incontroverso que, se o "arrimo de família" tem seu direito ao benefício previdenciário violado, ainda mais em uma situação de doença em que não é possível exercer qualquer atividade rentável, tal irá refletir diretamente em todos os integrantes que dependem dele não só economicamente, como também emocionalmente. É notória a dor de ficar endividado, não ter o que comer e precisar da ajuda de conhecidos para se alimentar, quando poderia tê-lo feito por suas próprias expensas.


V - DO NEXO CAUSAL


Configurou-se o nexo causal, na medida em que o dano moral foi resultado do cancelamento indevido pelo INSS de benefício a que o segurado fazia jus. É incontroverso o equívoco do profissional da autarquia previdenciária, que atestou a capacidade para o trabalho, embora na realidade não existisse, tanto que o requerente veio a falecer poucos meses depois das causas que o levaram a pleitear o auxílio-doença. Ademais, frise-se que o ente estatal não provou culpa exclusiva da vítima. Assim, é de rigor a reparação à apelante.


Outrossim, a tese de que o perito do INSS estava em exercício regular de direito, razão pela qual não caberia indenização na espécie, não deve prosperar. A ilicitude da conduta do agente público não é pressuposto da responsabilidade estatal, a qual, como visto, é objetiva, de modo que eventual presença de excludente de ilicitude não é suficiente para afastá-la. Poderia sim, em tese, favorecer ao agente em caso de ação regressiva, cuja responsabilidade é subjetiva. Nesse sentido, transcrevo trecho da doutrina de Celso Antônio Bandeira de Mello, segundo o qual:


"Responsabilidade objetiva é a obrigação de indenizar que incumbe a alguém em razão de um procedimento lícito ou ilícito que produziu uma lesão na esfera juridicamente protegida de outrem. Para configurá-la basta, pois, a mera relação causal entre o comportamento e dano" (Curso de Direito Administrativo, 28ª edição, Ed. Malheiros, São Paulo, 2011, p. 1014) - Grifei.

VI - VALOR DA INDENIZAÇÃO


Quanto ao valor da indenização, segundo doutrina e jurisprudência pátrias, tem duplo conteúdo, de sanção e compensação. Certamente, as situações humilhantes e revoltantes às quais a apelante e sua família foram submetidas lhes causaram dor moral passível de reparação. Para fins de fixação, deve ser considerado também o período de privação, que pelo que consta dos autos se estendeu de 06/07/2005 a 13/01/2006, data em que foi deferido benefício de pensão por morte à autora. Diante desse quadro, penso que o montante deve ser de, conforme pleiteado, R$ 30.000,00 (trinta mil reais), como forma de atender aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade e cumprir os critérios mencionados.


VII - CONSECTÁRIOS LEGAIS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS


Sobre o valor da condenação incidirá juros moratórios, a contar da data do evento danoso (Súmula 54 do Superior Tribunal de Justiça), e correção monetária, a partir da presente data (Súmula 362 do Superior Tribunal de Justiça), a serem calculados de acordo com o Manual de Cálculos da Justiça Federal.


Verifico que se trata de ação em que foi vencida a fazenda pública, razão pela qual a fixação dos honorários advocatícios deverá ser feita conforme apreciação equitativa, sem a obrigatoriedade de adoção, como base para o cômputo, do valor da causa ou da condenação, conforme artigo 20, parágrafos 3º e 4º, do CPC. Dessa forma, considerado o trabalho realizado e a natureza da causa, fixo-os em R$ 2.000,00 (dois mil reais), dado que propiciam remuneração adequada e justa ao profissional.


VIII - DISPOSITIVO


Ante o exposto, não conheço do agravo retido e dou provimento à apelação para julgar procedente a ação e condenar o INSS a pagar à autora indenização por danos morais no montante de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) e honorários advocatícios no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais). Os juros de mora e a correção monetária incidirão conforme consignado no voto. Custas na forma da lei.



André Nabarrete
Desembargador Federal


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