Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5366210-25.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal JOAO BATISTA GONCALVES
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
23/09/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 27/09/2021
Ementa
E M E N T A
CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART.
203, CAPUT, DA CR/88, E LEI Nº 8.742/1993. PARCELAS NÃO RECEBIDAS EM VIDA PELO
BENEFICIÁRIO. TRANSMISSÃO CAUSA MORTIS. POSSIBILIDADE, NA FORMA DA LEI.
PERÍCIAS MÉDICA E SOCIAL INDIRETAS. IMPRESCINDIBILIDADE.
- As parcelas eventualmente devidas a título de benefício de prestação continuada, não recebidas
em vida pelo beneficiário, são passíveis de transmissão causa mortis, na forma da lei.
Precedentes.
- A prova técnica é essencial nas causas que versem sobre a concessão de benefício de
prestação continuada.
- Preliminar acolhida. Sentença anulada, determinando o retorno dos autos ao Juízo de origem,
com vistas à realização de perícias médica e social indiretas e posterior julgamento em Primeiro
Grau.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5366210-25.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES
APELANTE: DINORA MELO SERPA
Advogados do(a) APELANTE: MARIA CECILIA DE OLIVEIRA MARCONDES - SP367764-N,
ANA BEATRIS MENDES SOUZA GALLI - SP266570-N, CRISTINA PAULA DE SOUZA -
SP245450-N, ANA MARTA SILVA MENDES SOUZA - SP199301-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5366210-25.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES
APELANTE: DINORA MELO SERPA
Advogados do(a) APELANTE: MARIA CECILIA DE OLIVEIRA MARCONDES - SP367764-N,
ANA BEATRIS MENDES SOUZA GALLI - SP266570-N, CRISTINA PAULA DE SOUZA -
SP245450-N, ANA MARTA SILVA MENDES SOUZA - SP199301-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de demanda voltada à obtenção de benefício de prestação continuada.
A sentença prolatada nestes autos extinguiu o feito, sem resolução do mérito, na forma do art.
485, IX, do Código de Processo Civil, visto que a autora falecera anteriormente à realização das
perícias médica e social.
Sobreveio apelação dos sucessores da parte autora, suscitando, em preliminar, a nulidade da
sentença, por cerceamento de defesa. Requerem a reabertura da instrução processual, ante a
vislumbrada possibilidade de realização de perícia indireta. No mérito, sustentam a presença
dos requisitos à outorga do beneplácito, desde a data de entrada do requerimento
administrativo, até a data do óbito.
Decorrido, “in albis”, o prazo para as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
O Ministério Público Federal ofertou parecer opinando pelo desprovimento do apelo.
É o Relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5366210-25.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES
APELANTE: DINORA MELO SERPA
Advogados do(a) APELANTE: MARIA CECILIA DE OLIVEIRA MARCONDES - SP367764-N,
ANA BEATRIS MENDES SOUZA GALLI - SP266570-N, CRISTINA PAULA DE SOUZA -
SP245450-N, ANA MARTA SILVA MENDES SOUZA - SP199301-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A teor do disposto no art. 1.011 do Código de Processo Civil, conheço do recurso de apelação,
uma vez que cumpridos os requisitos de admissibilidade.
Dispõe o art. 21, §1º, da Lei nº 8.742/93:
"Art. 21. O benefício de prestação continuada deve ser revisto a cada 2 (dois) anos para
avaliação da continuidade das condições que lhe deram origem.
§ 1º O pagamento do benefício cessa no momento em que forem superadas as condições
referidas no caput, ou em caso de morte do beneficiário."
Por sua vez, o Decreto nº 6.214/2007, que regulamenta o benefício de prestação continuada da
assistência social devido à pessoa com deficiência e ao idoso de que trata a Lei nº 8.742/93,
estabelece em seu art. 23:
"Art. 23. O Benefício de Prestação Continuada é intransferível, não gerando direito à pensão
por morte aos herdeiros ou sucessores.
Parágrafo único. O valor do resíduo não recebido em vida pelo beneficiário será pago aos seus
herdeiros ou sucessores, na forma da lei civil."
Resulta, assim, evidente, que o benefício de prestação continuada tem caráter personalíssimo e
intransferível, destinando-se, exclusivamente, a prover o postulante das necessidades básicas à
sua sobrevivência, e tampouco gera direito à pensão por morte em caso de óbito deste.
Contudo, as parcelas eventualmente devidas a esse título, não recebidas em vida pelo
beneficiário, são passíveis de transmissão causa mortis, nos termos da lei.
Em consonância com esse preceito, o entendimento consolidado pela jurisprudência desta C.
Corte:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO (ART. 557 DO CPC). BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE
PRESTAÇÃO CONTINUADA (DECRETO 6.214/07). SUBSISTÊNCIA DO INTERESSE DOS
SUCESSORES. REDISCUSSÃO DA MATÉRIA DECIDIDA. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA
DE ILEGALIDADE OU ABUSO DE PODER. (...) 2. Embora se trate de benefício
personalíssimo, subsiste o interesse dos sucessores em receber os valores referentes ao
período precedente ao óbito . (...) 4. Agravo a que se nega provimento." (Terceira Seção, AR
0035256-96.2011.4.03.0000, Relator Desembargador Federal Souza Ribeiro, e-DJF3 Judicial 1
Data: 23/07/2014)
"PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO LEGAL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL.
ÓBITO DA AUTORA. HABILITAÇÃO DE HERDEIROS. POSSIBILIDADE. PERCEPÇÃO DOS
VALORES INCORPORADOS AO PATRIMÔNIO DA FALECIDA ATÉ A DATA DO ÓBITO .
AGRAVO DESPROVIDO. 1. Os sucessores fazem jus ao recebimento dos valores que o titular
teria direito em vida, a despeito do caráter personalíssimo do benefício assistencial, que apenas
pode ser requerido pelo portador de deficiência ou idoso que comprove não possuir meios de
prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. Precedentes desta C. 10ª
Turma. 2. Diante do conjunto probatório, comprovados os requisitos da incapacidade e da
hipossuficiência, deve ser reconhecido o direito ao benefício de prestação continuada,
correspondente a 1 (um) salário mínimo, nos termos do caput, do Art. 20, da Lei 8.742/93,
desde a data do requerimento administrativo até a data do óbito da parte autora. 3. Agravo
desprovido." (Décima Turma, AC 0001977-75.2013.4.03.6103, Relator Desembargador Federal
Baptista Pereira, e-DJF3 Judicial 1 Data: 06/05/2015).
"PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO LEGAL. AÇÃO DE HABILITAÇÃO. DECISÃO MONOCRÁTICA.
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ÓBITO DO AUTOR. ARTIGO 23 DO DECRETO 6.214/2007.
PAGAMENTO AOS SUCESSORES. I - Trata-se de agravo, interposto pelo Instituto Nacional do
Seguro Social - INSS, com apoio no § 1º do art. 557 do CPC, em face da decisão monocrática
que negou seguimento ao seu apelo, interposto em face de sentença que julgou procedente o
pedido de habilitação dos sucessores de Aparecida Moreira Freitas. II - O agravante sustenta
que o benefício assistencial ( LOAS ) tem finalidade muito restrita (a sobrevivência física do seu
titular), possuindo caráter personalíssimo, sendo intransmissível. Afirma que, em ocorrendo o
falecimento do autor no curso da lide, descabe cogitar-se a respeito da percepção de eventuais
diferenças em favor de terceiros, mesmo que dependentes ou sucessores do de cujus, a teor do
artigo 21, § 1º, da Lei nº 8.742/93 e artigo 267, IX, do CPC. Pretende seja rejeitado o pedido de
habilitação, julgando-se extinto o feito sem apreciação do mérito, nos moldes do artigo 267, VI,
do CPC. III - Embora não se discuta acerca do caráter personalíssimo e intransferível do
benefício assistencial de prestação continuada, uma vez reconhecido o direito ao amparo, os
valores devidos e não recebidos em vida pelo beneficiário integram o patrimônio do de cujos e
devem ser pagos aos sucessores na forma da lei civil. IV - O art. 23, do Decreto n.º 6.214/2007,
que regulamenta o benefício de prestação continuada da assistência social devido à pessoa
com deficiência e ao idoso, assim prescreve, no seu Parágrafo único: "O valor do resíduo não
recebido em vida pelo beneficiário será pago aos seus herdeiros ou sucessores, na forma da lei
civil." (...) VII - Agravo improvido." (Oitava Turma, AC 00219847420124039999, Relatora Juíza
Convocada Raquel Perrini, e-DJF3 Judicial 1 Data: 28.06.2013)
"PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL - EMBARGOS À EXECUÇÃO - BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL. CARÁTER PERSONALÍSSIMO. FALECIMENTO DA AUTORA. DIREITO AO
RECEBIMENTO DAS DIFERENÇAS PELOS HERDEIROS. FIXAÇÃO DO VALOR DA
EXECUÇÃO. APELAÇÃO PROVIDA. 1. Ainda que o benefício assistencial tenha caráter
personalíssimo, não afeta as parcelas eventualmente devidas a esse título até a data do óbito,
na medida em que representam crédito constituído pela autora em vida, sendo, portanto,
cabível sua transmissão causa mortis, nos termos da lei civil. 2. Valor da execução fixado na
forma dos cálculos apresentados pelos exeqüentes. 3. Apelação provida." AC
00088611020104036109, Nona Turma, Relator Juiz Convocado Leonardo Safi, e-DJF3 Judicial
1 Data:15/01/2013)
Subsiste, pois, o interesse dos sucessores em receber os valores eventualmente devidos,
referentes ao período precedente ao óbito.
Ainda que o falecimento da parte autora tenha ocorrido antes da produção das perícias médica
e social, mostra-se viável, in casu, a realização das aludidas provas, de maneira indireta, a fim
de que sejam avaliadas as alegadas deficiência e hipossuficiência econômica.
Com efeito, afora os elementos de convicção coligidos aos autos, certo é que houve precedente
processo administrativo, o qual, à evidência, contém subsídios que permitem o amplo
conhecimento das questões fáticas indispensáveis à solução da lide.
Averbe-se que a prova técnica é essencial nas causas que versem sobre a concessão de
benefício de prestação continuada, nos termos dos §§ 2º e 6º do art. 20 da Lei nº 8.742/93 c/c o
art. 16 do Decreto nº 6.214/2007, cuja ausência conduz à nulidade do feito, por cerceamento de
defesa.
Assim, de rigor a anulação da sentença, para que o feito retome seu regular prosseguimento,
com a realização de perícias médica e social indiretas, indispensáveis ao deslinde da causa.
Nesse sentido, os julgados desta E. Nona Turma, tirados de situações parelhas:
“PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. ACRÉSCIMO DE 25% NA APOSENTADORIA POR
INVALIDEZ. ART. 45 DA LEI Nº 8.213/91. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. AUSÊNCIA DE
PROVA PERICIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. NULIDADE DA SENTENÇA. - Necessária a
realização de perícia médica indireta para verificação da eventual necessidade de assistência
permanente de outra pessoa ao autor falecido e da possibilidade de retroação do termo inicial
da aposentadoria por invalidez. - O julgamento antecipado da lide, quando necessária a
produção de provas ao deslinde da causa, implica em cerceamento de defesa, ensejando a
nulidade da sentença proferida. -Apelação Provida.” (Ap 00209119120174039999,
DESEMBARGADOR FEDERAL GILBERTO JORDAN, TRF3 - NONA TURMA, e-DJF3 Judicial
1 DATA:17/11/2017)
“DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE AUXÍLIO-DOENÇA/APOSENTADORIA POR
INVALIDEZ. RURÍCOLA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL PRESENTE. AUSÊNCIA DE
REALIZAÇÃO DE AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO. PRODUÇÃO DE PROVA
TESTEMUNHAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. SENTENÇA ANULADA. I. Necessária a
realização de perícia médica indireta para verificação da eventual incapacidade laboral do(a)
autor(a) falecido(a), bem como o período de acometimento. II. O julgamento antecipado da lide,
quando necessária a produção de provas ao deslinde da causa, implica em cerceamento de
defesa, ensejando a nulidade da sentença proferida. III. Matéria preliminar acolhida. Mérito da
apelação prejudicado.” (AC 00077037420164039999, DESEMBARGADOR FEDERAL
GILBERTO JORDAN, TRF3 - NONA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:13/06/2016)
Do exposto, ACOLHO A PRELIMINAR SUSCITADA, para anular a sentença, determinando o
retorno dos autos ao Juízo de origem, com vistas à realização de perícias médica e social
indiretas e posterior julgamento em Primeiro Grau, nos termos da fundamentação.
Registre-se, por fim, que a habilitação de herdeiros para prosseguimento da demanda deverá
ser realizada em primeira instância, nos termos do art. 296 do Regimento Interno deste E.
Tribunal Regional Federal da Terceira Região.
É como voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA.
ART. 203, CAPUT, DA CR/88, E LEI Nº 8.742/1993. PARCELAS NÃO RECEBIDAS EM VIDA
PELO BENEFICIÁRIO. TRANSMISSÃO CAUSA MORTIS. POSSIBILIDADE, NA FORMA DA
LEI. PERÍCIAS MÉDICA E SOCIAL INDIRETAS. IMPRESCINDIBILIDADE.
- As parcelas eventualmente devidas a título de benefício de prestação continuada, não
recebidas em vida pelo beneficiário, são passíveis de transmissão causa mortis, na forma da lei.
Precedentes.
- A prova técnica é essencial nas causas que versem sobre a concessão de benefício de
prestação continuada.
- Preliminar acolhida. Sentença anulada, determinando o retorno dos autos ao Juízo de origem,
com vistas à realização de perícias médica e social indiretas e posterior julgamento em Primeiro
Grau.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu acolher a preliminar suscitada, para anular a sentença, determinando o
retorno dos autos ao Juízo de origem, com vistas à realização de perícias médica e social
indiretas e posterior julgamento em Primeiro Grau, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
