Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5002286-21.2017.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal ANA LUCIA JORDAO PEZARINI
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
06/12/2017
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 15/12/2017
Ementa
E M E N T A
CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL. CABIMENTO. ART. 475, § 2º,
CPC/1973. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ARTIGO 203, CAPUT, DA CR/88, E
LEI Nº 8.742/1993. CONCESSÃO DO BENEPLÁCITO NO CURSO DA AÇÃO. INTERESSE DE
AGIR DA PARTE AUTORA NA VIA JUDICIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO
CONCEDIDO. JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA. RE 870.947.
- Considerando as datas do termo inicial do benefício concedido e da prolação da sentença, bem
como o valor da benesse, verifica-se que a hipótese em exame não excede os 60 salários
mínimos, sendo incabível a remessa oficial, nos termos do art. 475, § 2º, do CPC/1973.
- A concessão de amparo assistencial na via administrativa não afasta o interesse de agir da
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
parte autora no átrio judicial, pois há de se perquirir se são devidas as parcelas vencidas entre o
termo inicial do benefício fixado na sentença e eventuais parcelas decorrentes até a data da sua
implantação na senda administrativa, além dos consectários legais e verba honorária.
- Atrelam-se, cumulativamente, à concessão do benefício de prestação continuada, o implemento
de requisito etário ou a detecção de deficiência, demonstrada por exame pericial, e a verificação
da ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da benesse, ou de tê-
la suprida pela família.
- Constatadas, pelos laudos periciais, a deficiência e a hipossuficiência econômica, é devido o
amparo assistencial à autora desde a data da citação até a data da implantação do benefício na
seara administrativa. Precedentes.
- Juros de mora e correção monetária explicitados em conformidade com a decisão final do STF
no RE 870.947, com repercussão geral.
- Honorários advocatícios mantidos em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da
prolação da decisão concessiva do benefício, consoante art. 20, § 3º, CPC/1973, Súmula n. 111
do Superior Tribunal de Justiçae jurisprudência desta 9ª Turma, sendo incabível a aplicação da
regra prevista no art. 85, §§ 1º e 11, do NCPC.
- As custas processuais deverão ser pagas pelo INSS ao final do processo, nos termos da Lei
Estadual n. 3.779/09, que revogou a isenção concedida na legislação pretérita, e artigo 91 do
NCPC, não se eximindo, contudo, a Autarquia Previdenciária, do pagamento das custas e
despesas processuais em restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de
pagamento prévio.
- Preliminar rejeitada.
- Remessa oficial, tida por interposta, e apelação do INSS, improvidas.
- Juros e correção monetária explicitados.
Acórdao
APELAÇÃO (198) Nº 5002286-21.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - DES. FED. ANA PEZARINI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, PROCURADORIA-
REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: ROSA MARIA DA CONCEICAO SILVA
Advogado do(a) APELADO: HERICO MONTEIRO BRAGA - MS2008000A
APELAÇÃO (198) Nº 5002286-21.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - DES. FED. ANA PEZARINI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, PROCURADORIA-
REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: ROSA MARIA DA CONCEICAO SILVA
Advogado do(a) APELADO: HERICO MONTEIRO BRAGA - MS2008000A
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação do INSS interposta em face da r. sentença, não submetida ao reexame
necessário, que julgou procedente o pedido deduzido na inicial, condenando a Autarquia
Previdenciária a conceder, à parte autora, o benefício assistencial a pessoa deficiente, a partir da
citação (29/9/2009, doc. 741624, pág. 3), com incidência de correção monetária pelos índices
constantes do Manual de Cálculos da Justiça Federal, a partir da data em que cada parcela
deveria ter sido paga; juros moratórios à ordem de 0,5% ao mês, desde a citação; custas
processuais (art. 24, §§ 1º e 2º, da Lei Estadual n.º 3.779, de 11/11/2009) e verba honorária
fixada em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a publicação da sentença
(Súmula 111 do STJ), antecipada a tutela jurídica provisória (doc. 741638, págs. 8/15).
Sustenta, o apelante, preliminarmente, falta de interesse de agir superveniente, face à concessão
administrativa, no curso da lide, do benefício ora postulado. Insurge-se, outrossim, quanto ao
termo inicial do benefício.
Aduz, também, que a declaração de inconstitucionalidade decidida nas ADI`s 4357 e 4425 não
afetaram o art. 1º-F da Lei n. 9.494/97, no que diz respeito à correção monetária do débito até a
expedição do precatório, conforme já reconheceu o próprio Plenário do STF ao admitir a
Repercussão Geral no RE n. 870.947.
Pleiteia, ainda redução da verba honorária e prequestiona a matéria para fins recursais.
Com contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal (doc. 741640, págs. 28/30).
O Ministério Público Federal ofertou parecer opinando pela rejeição da preliminar suscitada pelo
INSS e, no mérito, pelo desprovimento do seu apelo, deixando de manifestar-se quanto aos
índices de correção monetária, verba honorária e custas processuais, por ausência de interesse
público (doc. 1079561, pág. 9).
Em síntese, o relatório.
APELAÇÃO (198) Nº 5002286-21.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - DES. FED. ANA PEZARINI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, PROCURADORIA-
REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: ROSA MARIA DA CONCEICAO SILVA
Advogado do(a) APELADO: HERICO MONTEIRO BRAGA - MS2008000A
V O T O
Afigura-se incorreta a não submissão da r. sentença à remessa oficial.
De fato, o artigo 475, § 2º, do CPC/1973, com redação dada pelo art. 1º da Lei nº 10.352/2001,
que entrou em vigor em 27 de março de 2002, dispõe que não está sujeita ao reexame
necessário a sentença em ações cujo direito controvertido não exceda a 60 (sessenta) salários
mínimos.
Nesse sentido, segue o entendimento do e. Superior Tribunal de Justiça:
"AGRAVO REGIMENTAL. PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. REEXAME
NECESSÁRIO. SENTENÇA ILÍQUIDA. PERDA DA AUDIÇÃO. AUXÍLIO-ACIDENTE.
PRESSUPOSTOS. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. IMPOSSIBILIDADE. 1. A sentença ilíquida
proferida contra a União, o Estado, o Distrito Federal, o Município e as respectivas autarquias e
fundações de direito público está sujeita ao duplo grau de jurisdição, exceto quando se tratar de
valor certo não excedente de 60 (sessenta) salários mínimos. 2. Afastado, na origem, o direito ao
auxílio-acidente, em razão de inexistirem os pressupostos à sua concessão, impede o reexame
da matéria, em âmbito especial, o enunciado 7 da Súmula desta Corte. 3. Agravo interno ao qual
se nega provimento." (STJ, AgRg no Ag 1274996/SP, Rel. Min. Celso Limongi, 6ª Turma, DJe
22.06.2010).
No caso dos autos, considerando as datas do termo inicial do benefício (29/9/2009, doc. 741624,
pág. 3) e da prolação da sentença (14/10/2015), bem como o valor da benesse, de um salário
mínimo, verifico que a hipótese em exame excede os 60 salários mínimos, sendo, pois, o caso de
submeter o decisum de primeiro grau à remessa oficial.
Cuida-se de ação ajuizada em 21/9/2009 (doc. 741623, pág. 01), que busca a concessão de
benefício de prestação continuada ao deficiente.
Com processamento regular, o INSS informou, nas razões do apelo (doc. 741640, págs. 1/6), que
houve concessão administrativa do benefício postulado (NB 600601535-1), o que se deu a partir
de 07/02/2013, conforme extrato do CNIS coligido aos autos (doc. 741640, págs. 22/23).
Ora, o fato de a benesse ser concedida na via administrativa não afasta o interesse de agir da
parte autora no átrio judicial, pois há de se perquirir sobre a presença dos requisitos à sua
outorga, entre o termo inicial do benefício fixado na sentença e eventuais parcelas decorrentes
até a data da sua implantação na senda administrativa, além dos consectários legais e verba
honorária.
Nesse sentido é o entendimento desta E. Corte, tirado de situação parelha:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. CONCESSÃO NA VIA
ADMINISTRATIVA. INTERESSE DE AGIR. PARCELAS VENCIDAS. RECONHECIMENTO DO
PEDIDO. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. TERMO INICIAL. CORREÇÃO
MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. I. O fato do benefício de
aposentadoria por invalidez ser concedido na via administrativa não afasta o interesse de agir da
parte autora na via judicial, pois são devidas as parcelas vencidas entre eventual termo inicial e
implantação na via administrativa, além dos consectários legais e verbas honorárias. II. Afastada
a superveniente da ação, o feito encontra-se em termos para ser julgado com a análise do mérito,
nos termos do disposto no artigo 515, §3º, do CPC. III. São devidas as parcelas vencidas, a título
de auxílio-doença, desde a data imediatamente posterior ao cancelamento indevido do benefício
até a data imediatamente anterior à efetiva implantação do benefício de aposentadoria por
invalidez. IV. Correção monetária sobre os valores em atraso deve seguir o disposto no
Provimento n.º 26/01 da E. Corregedoria-Geral da Justiça Federal da 3ª Região, observando-se a
Súmula nº 08 desta Corte Regional e a Súmula nº 148 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça. V.
Juros de mora à taxa de 12% (doze por cento) ao ano, conforme Enunciado n.º 20, aprovado na
Jornada de Direito Civil promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça
Federal. VI. Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor
da condenação, excluídas as parcelas vincendas, considerando-se as prestações vencidas as
compreendidas entre o termo inicial do benefício e a data deste acórdão (Súmula 111 do STJ).
VII. Apelação da parte autora parcialmente provida." (AC 00384891920074039999, Sétima
Turma, Desembargador Federal Walter do Amaral, DJF3 03/09/2008 (grifos nossos).
Passo, assim, ao exame do apelo autárquico e da remessa oficial.
Previsto no artigo 203, caput, da CR/88 e disciplinado pela Lei nº 8.742/1993, de natureza
assistencial e não previdenciária, o benefício de prestação continuada tem sua concessão
desvinculada do cumprimento dos quesitos de carência e de qualidade de segurado, atrelando-
se, cumulativamente, ao implemento de requisito etário (recordando-se, a este passo, da
sucessiva redução da idade mínima, primeiramente de 70 para 67 anos, pelo art. 1º da Lei nº
9.720/98 e, ao depois, para 65 anos, conforme art. 34 da Lei nº 10.741/ 2003) ou à detecção de
deficiência, nos termos do art. 20, §2º, da Lei n° 8.742/93, demonstrada por exame pericial; à
verificação da ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da
benesse, ou de tê-lo suprido pela família; e, originalmente, à constatação de renda mensal per
capita não superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo.
No que diz respeito ao critério da deficiência, as sucessivas alterações legislativas ocorridas na
redação do § 2º, do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social demonstram a evidente
evolução na sua conceituação.
Em sua redação originária, a Lei 8.742/1993 definia a pessoa portadora de deficiência, para efeito
de concessão do benefício assistencial, aquela incapacitada para a vida independente e para o
trabalho.
Posteriormente, a Lei n. 12.435/2011 promoveu modificação ao dispositivo legal, ampliando o
conceito de deficiência, com base no Decreto n. 6.949/2009, que promulgou a Convenção
Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
O § 2º da art. 20 da Lei n. 8.742 passou então a vigorar com a seguinte redação:
"Art. 20
(...)
§ 2º - para efeito de concessão deste benefício, considera-se:
I - pessoa com deficiência, aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir
sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas.
II - impedimentos de longo prazo: aqueles que incapacitam a pessoa com deficiência para a vida
independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos."
Vê-se, portanto, que ao fixar o entendimento da expressão "impedimentos de longo prazo", a Lei
n. 12.435/2011 optou por restringir a concessão do benefício exclusivamente às pessoas com
deficiência que apresentem incapacidade para a vida independente e para o trabalho pelo prazo
mínimo de 2 (dois) anos.
Atualmente, o dispositivo em exame encontra-se vigendo com a redação conferida pela Lei n.
13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), a qual explicitou a definição legal de pessoa
com deficiência:
"Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com
deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou
sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e
efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas."
De se registrar que o § 10 do mesmo dispositivo, incluído pela Lei n. 12.470/2011, considera de
longo prazo o impedimento cujos efeitos perduram pelo prazo mínimo de 02 (dois) anos.
Acerca do derradeiro pressuposto, o C. STF, no âmbito da Reclamação nº 4374 e dos Recursos
Extraordinários nºs. 567985 e 580963, submetidos à sistemática da repercussão geral, reputou
defasado esse método aritmético de aferição de contexto de miserabilidade, suplantando, assim,
o que outrora restou decidido na ADI 1.232-DF, ajuizada pelo Procurador-Geral da República e
em cujo âmbito se declarara a constitucionalidade do §3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93. A
motivação empregada pela Excelsa Corte reside no fato de terem sido "editadas leis que
estabeleceram critérios mais elásticos para concessão de outros benefícios assistenciais, tais
como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa
Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que
autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a municípios que instituírem programas
de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas" (RE nº 580963).
À vista disso, a mensuração da hipossuficiência não mais se restringe ao parâmetro da renda
familiar, devendo, sim, aflorar da análise desse requisito e das demais circunstâncias concretas
de cada caso, na linha do que já preconizava a jurisprudência majoritária, no sentido de que a
diretiva do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93 não consistiria em singular meio para se verificar a
condição de miserabilidade preceituada na Carta Magna, cuidando-se, tão-apenas, de critério
objetivo mínimo, a revelar a impossibilidade de subsistência do portador de deficiência e do idoso,
não empecendo a utilização, pelo julgador, de outros fatores igualmente capazes de denotar a
condição de precariedade financeira da parte autora (v., a exemplo, STJ: REsp nº 314264/SP,
Quinta Turma, Rel. Min. Félix Fischer, j. 15/05/2001, v.u., DJ 18/06/2001, p. 185; EDcl no AgRg
no REsp 658705/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Felix Fischer, j. 08/03/2005, v.u., DJ 04/04/2005, p.
342; REsp 308711/SP, Sexta Turma, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 19/09/2002, v.u., DJ
10/03/2003, p. 323).
Em plena sintonia com o acima esposado, o c. STJ, quando da apreciação do RESP n.
1.112.557/MG, acentuou que o art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93 comporta exegese tendente ao
amparo do cidadão vulnerável, donde concluir-se que a delimitação do valor de renda familiar per
capita não pode ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado.
Em substituição à diretriz inicialmente estampada na lei, a jurisprudência vem evoluindo para
eleger a renda mensal familiar per capita inferior à metade do salário mínimo como indicativo de
situação de precariedade financeira, tendo em conta que outros programas sociais, dentre eles o
bolsa família (Lei nº 10.836/04), o Programa Nacional de Acesso à Alimentação (Lei nº 10.689/03)
e o bolsa escola (Lei nº 10.219/01), contemplam esse patamar.
Consultem-se arestos da Terceira Seção nesse diapasão:
“AGRAVO LEGAL EM EMBARGOS INFRINGENTES. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL À PESSOA IDOSA. PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO
DO BENEFÍCIO. AGRAVO IMPROVIDO (...) 3 - Da análise do sistema CNIS/DATAPREV,
verifica-se que o filho da autora possui apenas pequenos vínculos de trabalho, na maioria inferior
a 03 meses, sendo que na maior parte do tempo esteve desempregado. Desse modo, mesmo
incluindo a aposentadoria do marido da autora, a renda familiar per capita corresponde a pouco
mais de R$ 300,00, ou seja, inferior a meio salário mínimo. 4 - Restou demonstrada, quantum
satis, no caso em comento, situação de miserabilidade, prevista no art. 20, § 3º, da Lei
8.742/1993, a ensejar a concessão do benefício assistencial. 5 - Agravo improvido." (EI
00072617120124036112, Relator Desembargador Federal Toru Yamamoto, TRF3, j. 22/10/2015,
e-DJF3 05/11/2015).
“PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (LOAS). EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM
AGRAVO LEGAL. CARÁTER INFRINGENTE. IMPOSSIBILIDADE. CONTRADIÇÃO
INEXISTENTE. (...)- No caso em exame, não há omissão a ser sanada, sendo o benefício
indeferido pelo fato da renda familiar "per capita" ser superior a 1/2 salário mínimo. (...) 5-
Embargos de declaração rejeitados." (AR 00082598120084030000, Relator Juiz Convocado Silva
Neto, TRF3, j. 25/09/2014, e-DJF3 08/10/2014).
Nesse exercício de sopesamento do conjunto probatório, importa averiguar a necessidade, na
precisão da renda familiar, de abatimento do benefício de valor mínimo percebido por idoso ou
deficiente, pertencente à unidade familiar. Nesta quadra, há, inclusive, precedente do egrégio
STF, submetido à sistemática da repercussão geral, em que se consagrou a inconstitucionalidade
por omissão do artigo 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso, considerando a "inexistência de
justificativa plausível para discriminação dos portadores de deficiência em relação aos idosos,
bem como dos idosos beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de
benefícios previdenciários no valor de até um salário mínimo." (RE nº 580.963/PR, DJe
14.11.2013).
Quanto à questão da composição da renda familiar per capita, o C. STJ, no julgamento do RESP
n. 1.355.052/SP, exarado na sistemática dos recursos representativos de controvérsia, assentou,
no mesmo sentido, a aplicação analógica do parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso, com
vistas à exclusão do benefício previdenciário recebido por idoso ou por deficiente, no valor de um
salário mínimo, no cálculo da renda per capita prevista no art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93
De se realçar que a jurisprudência - antes, mesmo, do aludido recurso repetitivo - já se firmara no
sentido da exclusão de qualquer benefício de valor mínimo recebido por idoso com mais de 65
anos, por analogia ao disposto no art. 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/2003, preceito esse
que, na origem, limitava-se a autorizar a desconsideração de benefício de prestação continuada
percebido pelos referidos idosos.
Note-se que os precedentes não autorizam o descarte do benefício de valor mínimo recebido por
qualquer idoso (assim compreendidas pessoas com idade superior a 60 anos), mas, sim, pelos
idosos com idade superior a 65 anos.
Essa é a inteligência reinante na jurisprudência. A propósito, os seguintes julgados: STJ, AGP
8479, Rel. Des. Convocada Marilza Maynard, 3ª Seção, DJE 03/02/2014; STJ, AGP 8609, Rel.
Min. Assusete Magalhães, 3ª Seção, DJE 25/11/2013; STJ, AGRESP 1178377, Rel. Min. Maria
Thereza de Assis Moura, 6ª Turma, DJE 19/3/2012. E da atenta leitura da íntegra do acórdão do
recurso representativo de controvérsia - nº 1.355.052/SP - chega-se à idêntica conclusão.
Outro dado sobremodo relevante diz respeito à acepção de família, para a finalidade da Lei nº
8.742/1993, cujo conceito experimentou modificação ao longo do tempo. Num primeiro lanço, o
art. 20, § 1º, do citado diploma nomeava família "a unidade mononuclear, vivendo sob o mesmo
teto, cuja economia é mantida pela contribuição de seus integrantes". Ao depois, a Lei nº 9.720,
em 30/11/98, fruto de conversão da Medida Provisória nº 1.473-34, de 11/08/97, passou a
compreendê-la como o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei nº 8.213/91, dês que
conviventes sob mesmo teto. Finalmente, na vigência da Lei nº 12.435/2011, é havida como o
núcleo integrado pelo requerente, cônjuge ou companheiro, os pais, ou, na ausência destes, pela
madrasta ou padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados,
todos, também, sob o mesmo teto.
SITUAÇÃO DOS AUTOS
O laudo médico produzido em 19/6/2013 (doc. 741634, págs. 3/6) considerou a autora, então com
33 anos de idade (nascida em 04/01/1980, doc. 741623, pág. 5), que completou apenas o
segundo ano do ensino fundamental e sem qualquer qualificação profissional declarada,
portadora de deficiência em decorrência de paralisia flácida de membro inferior esquerdo,
ocorrida na infância, progressiva e insuscetível de recuperação.
O perito consignou que a pretendente poderia desenvolver atividades que dependam de sua
intelectualidade, se houver meios psicossociais. Contudo, o próprio expert registrou o baixo nível
intelectual da promovente, fato que, associado à patologia apresentada, à ausência de
experiência profissional e às atuais condições do mercado de trabalho, demonstram que, a rigor,
a incapacidade se revela total e permanente, sendo forçoso concluir que obstrui a participação
plena e efetiva da parte autora na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas,
nos termos estabelecidos no art. 20, § 2º, da Lei nº 8.742/93, para fins de reconhecimento do
direito ao Benefício de Prestação Continuada.
A corroborar tal raciocício, tem-se, ainda, a constatação do exame médico realizado em
17/7/2015 (doc. 741637, pág. 6/11), o qual, ratificando o diagnóstico inicial e considerando a
doença física, escolaridade e experiência profissional da pretendente, concluiu que a mesma
encontra-se incapacitada de forma total e permanente ao labor, sem possibilidade de reabilitação,
por apresentar-se com exame físico geral fora da normalidade para sexo e idade, aparelho
osteomuscular seriamente comprometido com ausência da mobilidade em membro inferior
esquerdo, diminuição da massa muscular e da mobilidade da articulação coxofemural em lado
esquerdo, encurtamento do comprimento do membro e ausência de sensibilidade local.
Portanto, o quadro ajusta-se ao conceito de pessoa com deficiência, na forma da Lei. Conclusão
esta corroborada pela posterior concessão da benesse na seara administrativa.
Avançando, então, na análise da hipossuficiência, importa examinar os estudos sociais coligidos
aos autos, elaborados em 27/01/2011 (doc. 741631, págs. 5/6) e 26/3/2013 (doc. 741633, págs. 5
e 10/14).
Segundo os laudos adrede confeccionados, a parte autora residia, em 2011, com o padrasto, de
64 anos, a genitora, de 59 anos, e um irmão, de 15 anos, idades correspondentes à data do
estudo socioeconômico.
Moravam em casa particular, dividida em três cômodos, parte em alvenaria e com cozinha e
banheiro de tábuas, localizados no lado externo.
A renda familiar advinha do trabalho do padrasto na confecção de tijolos, pelo qual recebia um
salário mínimo (à época, de R$ 540,00), perfazendo renda familiar per capita, portanto, inferior à
metade do salário mínimo.
Em 2013, a postulante passou a morar nos fundos do terreno do imóvel de um irmão, em razão
da proximidade do local com os serviços de saúde.
O irmão, que trabalha como servente de pedreiro (recebe cerca de R$ 30,00/dia), reside com a
esposa e dois filhos, de dois e nove anos de idade, em uma casa de dois cômodos, construída
em alvenaria. A vindicante mora em um barraco de madeira, pequeno, coberto com folhas de
amianto, com banheiro nos fundos, contendo instalação sanitária e chuveiro improvisado por uma
mangueira de borracha. A cozinha, que atende toda a família, localiza-se, também, no lado
externo da casa, toda em tábuas, em péssimas condições.
Averbe-se que, de mais a mais, o irmão da promovente não integra o conceito de família, na
acepção da Lei nº 12.435/2011, para efeito de concessão do Benefício de Prestação Continuada,
de modo que já não há, como passível de consideração jurídica, qualquer valor por ela percebido.
Sopesados, então, todos os elementos probantes amealhados, temos que a autora comprova não
possuir meios de prover a própria manutenção, nem de tê-la provida por sua família, a amparar a
outorga do benefício pleiteado.
Assim, restou demonstrada situação de hipossuficiência econômica, como indicado no sobredito
paradigma do C. Supremo Tribunal Federal, exarado em repercussão geral, a acenar à
procedência do pedido deduzido.
Vale ressaltar que tal situação já se fazia presente desde quando a demandante residia com a
genitora e o padrasto, cujo quadro não se alterou quando passou a residir nos fundos da casa de
um irmão, em 2013.
Fixada a procedência da postulação, passo à análise dos consectários.
De acordo com o entendimento esposado pela jurisprudência dominante, o termo inicial do
benefício deve ser mantido a partir da citação (Nesse sentido: AC 00041346520164039999, Nona
Turma, Relatora Desembargadora Federal Marisa Santos, j. 30/05/2016, e-DJF3 13/06/2016; AC
00441740220104039999, Nona Turma, Relator Juiz Convocado Rodrigo Zacharias, j. 30/05/2016,
e-DJF3 13/06/2016).
Averbe-se que o laudo pericial apenas retratou situação ensejadora da outorga da benesse,
preexistente à sua confecção.
De se estabelecer o termo final da benesse em 07/02/2013, data da implantação do amparo
assistencial na seara administrativa (NB 600601535-1).
No que tange aos juros de mora e à correção monetária, cumpre esclarecer que, em 20 de
setembro de 2017, o STF concluiu o julgamento do RE 870.947, definindo as seguintes teses de
repercussão geral: "1) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09,
na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é
inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem
ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito
tributário, em respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput); quanto às
condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o
índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta
extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09; e
2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que
disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a
remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição
desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica
como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a
promover os fins a que se destina.”
Assim, a questão relativa à inconstitucionalidade da Lei n. 11.960/2009, no que se refere à
correção monetária, não comporta mais discussão, cabendo apenas o cumprimento da decisão
exarada pelo STF em sede de repercussão geral, devendo esta fundamentação ser adotada por
todos os órgãos jurisdicionais.
Nesse cenário, sobre os valores em atraso, considerada a prescrição quinquenal nos termos da
Súmula 85 do colendo Superior Tribunal de Justiça, incidirão juros e correção monetária em
conformidade com os critérios legais compendiados no Manual de Orientação de Procedimentos
para os Cálculos na Justiça Federal, observadas as teses fixadas no julgamento final do RE
870.947, de relatoria do Ministro Luiz Fux.
Mantenho os honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas
vencidas até a data da prolação da decisão concessiva do benefício, consoante § 3º do artigo 20
do Código de Processo Civil de 1973 (vigente no momento da publicação do decisum), Súmula n.
111 do Superior Tribunal de Justiça e jurisprudência desta 9ª Turma. Cumpre destacar, nesse
ponto, que não se aplica ao caso em análise disposto no artigo 85 do Novo CPC, tendo em vista
que a sentença impugnada foi publicada antes do início de sua vigência.
As custas processuais serão pagas pelo INSS ao final do processo, nos termos da Lei Estadual n.
3.779/09, que revogou a isenção concedida na legislação pretérita e disposições contidas tanto
no artigo 27 do CPC/1973 quanto no artigo 91 do NCPC. Ademais, não se exime a Autarquia
Previdenciária do pagamento das custas e despesas processuais em restituição à parte autora,
por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
Os valores já pagos, seja na via administrativa ou por força de decisão judicial, a título de
quaisquer benefícios previdenciários ou assistenciais não cumuláveis, deverão ser integralmente
abatidos do débito.
Saliente-se que, nos termos do art. 21, caput, da Lei n. 8.742/93, o benefício de prestação
continuada deve ser revisto a cada dois anos,para avaliação da continuidade das condições que
lhe deram origem.
Acerca do prequestionamento suscitado, assinalo não haver qualquer infringência à legislação
federal ou a dispositivos constitucionais.
Ante o exposto, REJEITO A PRELIMINAR SUSCITADA E, NO MÉRITO, NEGO PROVIMENTO À
APELAÇÃO E À REMESSA OFICIAL, TIDA POR INTERPOSTA, explicitados os critérios de juros
de mora e correção monetária.
É como voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL. CABIMENTO. ART. 475, § 2º,
CPC/1973. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ARTIGO 203, CAPUT, DA CR/88, E
LEI Nº 8.742/1993. CONCESSÃO DO BENEPLÁCITO NO CURSO DA AÇÃO. INTERESSE DE
AGIR DA PARTE AUTORA NA VIA JUDICIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO
CONCEDIDO. JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA. RE 870.947.
- Considerando as datas do termo inicial do benefício concedido e da prolação da sentença, bem
como o valor da benesse, verifica-se que a hipótese em exame não excede os 60 salários
mínimos, sendo incabível a remessa oficial, nos termos do art. 475, § 2º, do CPC/1973.
- A concessão de amparo assistencial na via administrativa não afasta o interesse de agir da
parte autora no átrio judicial, pois há de se perquirir se são devidas as parcelas vencidas entre o
termo inicial do benefício fixado na sentença e eventuais parcelas decorrentes até a data da sua
implantação na senda administrativa, além dos consectários legais e verba honorária.
- Atrelam-se, cumulativamente, à concessão do benefício de prestação continuada, o implemento
de requisito etário ou a detecção de deficiência, demonstrada por exame pericial, e a verificação
da ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da benesse, ou de tê-
la suprida pela família.
- Constatadas, pelos laudos periciais, a deficiência e a hipossuficiência econômica, é devido o
amparo assistencial à autora desde a data da citação até a data da implantação do benefício na
seara administrativa. Precedentes.
- Juros de mora e correção monetária explicitados em conformidade com a decisão final do STF
no RE 870.947, com repercussão geral.
- Honorários advocatícios mantidos em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da
prolação da decisão concessiva do benefício, consoante art. 20, § 3º, CPC/1973, Súmula n. 111
do Superior Tribunal de Justiçae jurisprudência desta 9ª Turma, sendo incabível a aplicação da
regra prevista no art. 85, §§ 1º e 11, do NCPC.
- As custas processuais deverão ser pagas pelo INSS ao final do processo, nos termos da Lei
Estadual n. 3.779/09, que revogou a isenção concedida na legislação pretérita, e artigo 91 do
NCPC, não se eximindo, contudo, a Autarquia Previdenciária, do pagamento das custas e
despesas processuais em restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de
pagamento prévio.
- Preliminar rejeitada.
- Remessa oficial, tida por interposta, e apelação do INSS, improvidas.
- Juros e correção monetária explicitados.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nota Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar a preliminar suscitada e, no mérito, negar provimento à apelação e à
remessa oficial, tida por interposta, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
