Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5002010-53.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal ANA LUCIA JORDAO PEZARINI
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
02/10/2018
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 04/10/2018
Ementa
E M E N T A
CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL. NÃO CABIMENTO. ART. 496,
§ 3º, I, NCPC. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ARTIGO 203, CAPUT, DA CR/88, E
LEI Nº 8.742/1993. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO CONCEDIDO.
- A hipótese em exame não excede os 1.000 salários mínimos, sendo incabível a remessa oficial,
nos termos do art. 496, § 3º, inciso I, do NCPC.
- Atrelam-se, cumulativamente, à concessão do benefício de prestação continuada, o implemento
de requisito etário ou a detecção de deficiência, demonstrada por exame pericial, e a verificação
da ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da benesse, ou de tê-
la suprida pela família.
- Constatadas, pelos laudos periciais, a deficiência e a hipossuficiência econômica, é devido o
Benefício de Prestação Continuada a partir da data de entrada do requerimento administrativo.
Precedentes.
- Juros e correção monetária em conformidade com o decidido pelo STF no RE 870.947.
- Honorários advocatícios a cargo do INSS em percentual mínimo a ser definido na fase de
liquidação.
- Custas processuais pelo INSS.
- Apelações da parte autora e do INSS parcialmente providas.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Acórdao
APELAÇÃO (198) Nº 5002010-53.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - DES. FED. ANA PEZARINI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: DAVID MALAQUIAS LOPES
Advogados do(a) APELADO: SINGARA LETICIA GAUTO KRAIEVSKI - MS9726-A, ARNO
ADOLFO WEGNER - MS12714-A
APELAÇÃO (198) Nº 5002010-53.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - DES. FED. ANA PEZARINI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: DAVID MALAQUIAS LOPES
Advogado do(a) APELADO: ARNO ADOLFO WEGNER - MS1271400A
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelações interpostas pela parte autora e pelo INSS em face da r. sentença, não
submetida ao reexame necessário, que julgou procedente o pedido deduzido na inicial,
condenando a Autarquia Previdenciária a conceder, àquela, o benefício assistencial a pessoa
deficiente, desde a data de entrada do requerimento administrativo (25/10/2013, doc. 1879069,
pág. 10), acrescido de correção monetária pelo IGPM-FGV e juros remuneratórios mensais de
0,5%, além de juros de mora de 1% ao mês, desde a citação válida do réu, considerando como
termo inicial para a incidência de tais encargos a data em que cada pagamento deveria ter sido
realizado; custas e despesas processuais, bem como honorários sucumbenciais ao patrono do
autor, fixados em R$ 1.500,00 (CPC, art. 85, §8º), antecipada a tutela jurídica provisória (doc.
1879069, págs. 112/122).
Visa, o promovente, a majoração dos honorários advocatícios para 20% sobre o valor econômico
obtido na condenação ou, subsidiariamente, 20% sobre as parcelas vencidas até a data da
sentença, prequestionando a matéria para fins recursais (doc. 1879069, págs. 127/134).
Por sua vez, postula, o INSS, preambularmente, o recebimento do recurso no duplo efeito. No
mérito, sustenta a ausência dos requisitos à outorga da benesse. Insurge-se, outrossim, quanto
ao termo inicial do benefício e às custas processuais, pugnando, ainda, pela aplicabilidade da Lei
n. 11.960/2009 quanto aos juros de mora e correção monetária. Requer o enfrentamento dos
pontos discutidos, para fins de prequestionamento (doc. 1879069, págs. 138/154).
Com contrarrazões da parte autora, subiram os autos a este Tribunal (doc. 1879069, págs.
162/165).
O Ministério Público Federal ofertou parecer opinando pelo desprovimento da apelação
autárquica, deixando de manifestar-se quanto ao apelo autoral (doc 2042836).
Em síntese, o relatório.
APELAÇÃO (198) Nº 5002010-53.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - DES. FED. ANA PEZARINI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: DAVID MALAQUIAS LOPES
Advogado do(a) APELADO: ARNO ADOLFO WEGNER - MS1271400A
V O T O
A teor do disposto no artigo 1.011 do NCPC, conheço dos recursos de apelação, uma vez
cumpridos os requisitos de admissibilidade.
Ainda, afigura-se correta a não submissão da r. sentença à remessa oficial.
De fato, o artigo 496, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil, que entrou em vigor em 18 de
março de 2016, dispõe que não está sujeita ao reexame necessário a sentença em ações cujo
direito controvertido não exceda mil salários mínimos.
No caso dos autos, considerando as datas do termo inicial do benefício (25/10/2013, doc.
1879069, pág. 10) e da prolação da sentença (04/4/2017), bem como o valor da benesse, de um
salário mínimo, verifico que a hipótese em exame não excede os mil salários-mínimos.
Não sendo, pois, o caso de submeter o decisum de primeiro grau à remessa oficial, passo à
análise dos recursos interpostos pelas partes, em seus exatos limites.
Previsto no artigo 203, caput, da CR/88 e disciplinado pela Lei nº 8.742/1993, de natureza
assistencial e não previdenciária, o benefício de prestação continuada tem sua concessão
desvinculada do cumprimento dos quesitos de carência e de qualidade de segurado, atrelando-
se, cumulativamente, ao implemento de requisito etário (recordando-se, a este passo, da
sucessiva redução da idade mínima, primeiramente de 70 para 67 anos, pelo art. 1º da Lei nº
9.720/98 e, ao depois, para 65 anos, conforme art. 34 da Lei nº 10.741/ 2003) ou à detecção de
deficiência, nos termos do art. 20, §2º, da Lei n° 8.742/93, demonstrada por exame pericial; à
verificação da ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da
benesse, ou de tê-lo suprido pela família; e, originalmente, à constatação de renda mensal per
capita não superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo.
No que diz respeito ao critério da deficiência, as sucessivas alterações legislativas ocorridas na
redação do § 2º, do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social demonstram a evidente
evolução na sua conceituação.
Em sua redação originária, a Lei 8.742/1993 definia a pessoa portadora de deficiência, para efeito
de concessão do benefício assistencial, aquela incapacitada para a vida independente e para o
trabalho.
Posteriormente, a Lei n. 12.435/2011 promoveu modificação ao dispositivo legal, ampliando o
conceito de deficiência, com base no Decreto n. 6.949/2009, que promulgou a Convenção
Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
O § 2º da art. 20 da Lei n. 8.742 passou então a vigorar com a seguinte redação:
"Art. 20
(...)
§ 2º - para efeito de concessão deste benefício, considera-se:
I - pessoa com deficiência, aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir
sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas.
II - impedimentos de longo prazo: aqueles que incapacitam a pessoa com deficiência para a vida
independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos."
Vê-se, portanto, que ao fixar o entendimento da expressão "impedimentos de longo prazo", a Lei
n. 12.435/2011 optou por restringir a concessão do benefício exclusivamente às pessoas com
deficiência que apresentem incapacidade para a vida independente e para o trabalho pelo prazo
mínimo de 2 (dois) anos.
Atualmente, o dispositivo em exame encontra-se vigendo com a redação conferida pela Lei n.
13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), a qual explicitou a definição legal de pessoa
com deficiência:
"Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com
deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou
sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e
efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas."
De se registrar que o § 10 do mesmo dispositivo, incluído pela Lei n. 12.470/2011, considera de
longo prazo o impedimento cujos efeitos perduram pelo prazo mínimo de 02 (dois) anos.
Acerca do derradeiro pressuposto, o C. STF, no âmbito da Reclamação nº 4374 e dos Recursos
Extraordinários nºs. 567985 e 580963, submetidos à sistemática da repercussão geral, reputou
defasado esse método aritmético de aferição de contexto de miserabilidade, suplantando, assim,
o que outrora restou decidido na ADI 1.232-DF, ajuizada pelo Procurador-Geral da República e
em cujo âmbito se declarara a constitucionalidade do §3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93. A
motivação empregada pela Excelsa Corte reside no fato de terem sido "editadas leis que
estabeleceram critérios mais elásticos para concessão de outros benefícios assistenciais, tais
como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa
Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que
autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a municípios que instituírem programas
de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas" (RE nº 580963).
À vista disso, a mensuração da hipossuficiência não mais se restringe ao parâmetro da renda
familiar, devendo, sim, aflorar da análise desse requisito e das demais circunstâncias concretas
de cada caso, na linha do que já preconizava a jurisprudência majoritária, no sentido de que a
diretiva do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93 não consistiria em singular meio para se verificar a
condição de miserabilidade preceituada na Carta Magna, cuidando-se, tão-apenas, de critério
objetivo mínimo, a revelar a impossibilidade de subsistência do portador de deficiência e do idoso,
não empecendo a utilização, pelo julgador, de outros fatores igualmente capazes de denotar a
condição de precariedade financeira da parte autora (v., a exemplo, STJ: REsp nº 314264/SP,
Quinta Turma, Rel. Min. Félix Fischer, j. 15/05/2001, v.u., DJ 18/06/2001, p. 185; EDcl no AgRg
no REsp 658705/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Felix Fischer, j. 08/03/2005, v.u., DJ 04/04/2005, p.
342; REsp 308711/SP, Sexta Turma, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 19/09/2002, v.u., DJ
10/03/2003, p. 323).
Em plena sintonia com o acima esposado, o c. STJ, quando da apreciação do RESP n.
1.112.557/MG, acentuou que o art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93 comporta exegese tendente ao
amparo do cidadão vulnerável, donde concluir-se que a delimitação do valor de renda familiar per
capita não pode ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado.
Em substituição à diretriz inicialmente estampada na lei, a jurisprudência vem evoluindo para
eleger a renda mensal familiar per capita inferior à metade do salário mínimo como indicativo de
situação de precariedade financeira, tendo em conta que outros programas sociais, dentre eles o
bolsa família (Lei nº 10.836/04), o Programa Nacional de Acesso à Alimentação (Lei nº 10.689/03)
e o bolsa escola (Lei nº 10.219/01), contemplam esse patamar.
Consultem-se arestos da Terceira Seção nesse diapasão:
“AGRAVO LEGAL EM EMBARGOS INFRINGENTES. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL À PESSOA IDOSA. PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO
DO BENEFÍCIO. AGRAVO IMPROVIDO (...) 3 - Da análise do sistema CNIS/DATAPREV,
verifica-se que o filho da autora possui apenas pequenos vínculos de trabalho, na maioria inferior
a 03 meses, sendo que na maior parte do tempo esteve desempregado. Desse modo, mesmo
incluindo a aposentadoria do marido da autora, a renda familiar per capita corresponde a pouco
mais de R$ 300,00, ou seja, inferior a meio salário mínimo. 4 - Restou demonstrada, quantum
satis, no caso em comento, situação de miserabilidade, prevista no art. 20, § 3º, da Lei
8.742/1993, a ensejar a concessão do benefício assistencial. 5 - Agravo improvido." (EI
00072617120124036112, Relator Desembargador Federal Toru Yamamoto, TRF3, j. 22/10/2015,
e-DJF3 05/11/2015).
“PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (LOAS). EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM
AGRAVO LEGAL. CARÁTER INFRINGENTE. IMPOSSIBILIDADE. CONTRADIÇÃO
INEXISTENTE. (...)- No caso em exame, não há omissão a ser sanada, sendo o benefício
indeferido pelo fato da renda familiar "per capita" ser superior a 1/2 salário mínimo. (...) 5-
Embargos de declaração rejeitados." (AR 00082598120084030000, Relator Juiz Convocado Silva
Neto, TRF3, j. 25/09/2014, e-DJF3 08/10/2014).
Nesse exercício de sopesamento do conjunto probatório, importa averiguar a necessidade, na
precisão da renda familiar, de abatimento do benefício de valor mínimo percebido por idoso ou
deficiente, pertencente à unidade familiar. Nesta quadra, há, inclusive, precedente do egrégio
STF, submetido à sistemática da repercussão geral, em que se consagrou a inconstitucionalidade
por omissão do artigo 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso, considerando a "inexistência de
justificativa plausível para discriminação dos portadores de deficiência em relação aos idosos,
bem como dos idosos beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de
benefícios previdenciários no valor de até um salário mínimo." (RE nº 580.963/PR, DJe
14.11.2013).
Quanto à questão da composição da renda familiar per capita, o C. STJ, no julgamento do RESP
n. 1.355.052/SP, exarado na sistemática dos recursos representativos de controvérsia, assentou,
no mesmo sentido, a aplicação analógica do parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso, com
vistas à exclusão do benefício previdenciário recebido por idoso ou por deficiente, no valor de um
salário mínimo, no cálculo da renda per capita prevista no art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93
De se realçar que a jurisprudência - antes, mesmo, do aludido recurso repetitivo - já se firmara no
sentido da exclusão de qualquer benefício de valor mínimo recebido por idoso com mais de 65
anos, por analogia ao disposto no art. 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/2003, preceito esse
que, na origem, limitava-se a autorizar a desconsideração de benefício de prestação continuada
percebido pelos referidos idosos.
Note-se que os precedentes não autorizam o descarte do benefício de valor mínimo recebido por
qualquer idoso (assim compreendidas pessoas com idade superior a 60 anos), mas, sim, pelos
idosos com idade superior a 65 anos.
Essa é a inteligência reinante na jurisprudência. A propósito, os seguintes julgados: STJ, AGP
8479, Rel. Des. Convocada Marilza Maynard, 3ª Seção, DJE 03/02/2014; STJ, AGP 8609, Rel.
Min. Assusete Magalhães, 3ª Seção, DJE 25/11/2013; STJ, AGRESP 1178377, Rel. Min. Maria
Thereza de Assis Moura, 6ª Turma, DJE 19/3/2012. E da atenta leitura da íntegra do acórdão do
recurso representativo de controvérsia - nº 1.355.052/SP - chega-se à idêntica conclusão.
Outro dado sobremodo relevante diz respeito à acepção de família, para a finalidade da Lei nº
8.742/1993, cujo conceito experimentou modificação ao longo do tempo. Num primeiro lanço, o
art. 20, § 1º, do citado diploma nomeava família "a unidade mononuclear, vivendo sob o mesmo
teto, cuja economia é mantida pela contribuição de seus integrantes". Ao depois, a Lei nº 9.720,
em 30/11/98, fruto de conversão da Medida Provisória nº 1.473-34, de 11/08/97, passou a
compreendê-la como o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei nº 8.213/91, dês que
conviventes sob mesmo teto. Finalmente, na vigência da Lei nº 12.435/2011, é havida como o
núcleo integrado pelo requerente, cônjuge ou companheiro, os pais, ou, na ausência destes, pela
madrasta ou padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados,
todos, também, sob o mesmo teto.
SITUAÇÃO DOS AUTOS
O laudo médico realizado em 29/10/2015 (doc. 1879069, pág. 95/100) considerou que o autor,
então com 55 anos de idade (nascido em 23/5/1961, doc. 1879069, pág. 08), trabalhador rural e
pedreiro, com ensino fundamental incompleto, vítima de acidente com serra elétrica em outubro
de 1999, com amputação traumática do segundo dedo da mão esquerda e lesão tendínea do
terceiro e quarto dedos da mão esquerda com limitação funcional dos mesmos, encontra-se
incapacitado de forma parcial e permanente, desde então, para o exercício de suas atividades
laborativas habituais.
O expert consignou que o periciado apresenta capacidade laborativa residual para atividades nas
quais não necessite do uso da mão esquerda, no entanto, considerou, ante a idade e grau de
escolaridade do requerente, que o mesmo dificilmente conseguiria encaixar-se no competitivo
mercado de trabalho.
Destarte, as patologias apresentadas, associadas à idade do pretendente, seu grau de instrução,
experiência profissional e as atuais condições do mercado de trabalho demonstram que, a rigor, a
incapacidade revela-se total e permanente, autorizando concluir que obstrui sua participação
plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, por mais de
dois anos, nos termos estabelecidos no art. 20, § 2º, da Lei nº 8.742/93, para fins de
reconhecimento do direito ao Benefício de Prestação Continuada.
Nesse sentido, o seguinte julgado do C. STJ, em situação análoga:
"PROCESSUAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. ACÓRDÃO
EMBASADO EM OUTROS ELEMENTOS ALÉM DO LAUDO PERICIAL. POSSIBILIDADE. 1. Na
análise da concessão da aposentadoria por invalidez, o magistrado não está adstrito ao laudo
pericial, devendo considerar também aspectos socioeconômicos, profissionais e culturais do
segurado a fim de aferir-lhe a possibilidade ou não de retorno ao trabalho. A invalidez laborativa
não decorre de mero resultado de uma disfunção orgânica, mas da somatória das condições de
saúde e pessoais de cada indivíduo. Precedentes. 2. O Tribunal a quo admitiu estar comprovado
que a ora agravada ficou incapacitada de modo permanente e definitivo para exercer suas
atividades laborativas, não obstante o laudo pericial ter concluído pela incapacidade apenas
parcial. Inteligência da Súmula 83/STJ. 3. A revisão do conjunto conjunto fático-probatório dos
autos que levou o Tribunal a quo a conclusão acerca da incapacidade laboral do segurado exige
análise de provas e fatos, o que inviabiliza a realização de tal procedimento pelo STJ, no recurso
especial, nos termos da Súmula 07/STJ. 4. Agravo regimental não provido.” (STJ, AgRg no
AREsp 196053/MG, Segunda Turma, Relator Ministro Castro Meira, Data do Julgamento:
25/09/2012, DJe 04/10/2012).
No mesmo diapasão, a jurisprudência da Terceira Seção deste E. Tribunal:
“PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO
CONTINUADA. ART. 20, §1º, DA LEI N. 8.742/93. COMPOSIÇÃO DO NÚCLEO FAMILIAR.
IRMÃ DO AUTOR, CUNHADO E SOBRINHO. NÚCLEOS FAMILIARES DIVERSOS.
INTERPRETAÇÃO INCONTROVERSA. VIOLAÇÃO A DISPOSITIVO DE LEI. OCORRÊNCIA.
INCAPACIDADE. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. COMPROVAÇÃO. TERMO INICIAL.
CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
(...)
III - O conceito de 'deficiência' atualmente albergado (art. 20, §2º, da Lei n. 8.742/93, com
redação alterada pela Lei n. 12.470/2011) é mais extenso do que aquele outrora estabelecido,
vez que considera como tal qualquer impedimento, inclusive de natureza sensorial, que tenha
potencialidade para a obstrução da participação social do indivíduo em condições de igualdade.
IV - O laudo médico acostado aos autos, realizado em 14.09.2009, atestou que o autor apresenta
deficiência auditiva bilateral, que teria se iniciado na infância. Assinala, outrossim, que houve
"...Perda auditiva neurossensorial de grau profundo bilateral..." , apresentando incapacidade
parcial e permanente para o exercício de atividade laborativa. Consigna, por fim, que o autor
"...não é alfabetizado, nunca realizou nenhum tipo de atividade laboral, situações que determinam
desvantagens e que o impossibilita de pleitear uma vaga no mercado de trabalho..."
V - Com fundamento na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência que se
incorporou no ordenamento jurídico com status constitucional, e em face do disposto no art. 462
do CPC, que impinge ao julgador considerar fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito
ocorrido posteriormente ao ajuizamento da ação (no caso, da ação subjacente), é de se
reconhecer a deficiência do autor, tendo em vista que possui impedimentos de longo prazo de
natureza física. Notadamente, tal condição obstruiu sua participação plena e efetiva na sociedade
em igualdade de condições com as demais pessoas.
(...)
XIV - Ação rescisória cujo pedido se julga procedente. Ação subjacente cujo pedido se julga
procedente.”
(AR 00155670320104030000, Relator para o acórdão Desembargador Federal Sergio
Nascimento, j. 25/06/2015, e-DJF3 15/07/2015).
Portanto, o quadro ajusta-se ao conceito de pessoa com deficiência.
Avançando, então, na análise da hipossuficiência, importa examinar o estudo social coligido aos
autos, produzido em 18/6/2014 (doc. 1879069, págs. 62/65).
Segundo o laudo adrede confeccionado, a parte autora reside no município de Coronel
Sapucaia/MS, com a esposa, paraguaia, de 40 anos, e três filhas, de 17, 12 e cinco anos, idades
correspondentes à data do estudo socioeconômico.
Moram em casa alugada (valor da locação R$ 50,00) e não possuem qualquer bem de valor
economicamente apreciável.
Os ganhos da família advém da transferência de R$ 102,00 pelo Programa Bolsa Família.
A esta altura, cabe lembrar que, na contabilização da renda familiar, torna-se imperiosa a
exclusão dos rendimentos percebidos do Programa Bolsa Família, por força do disposto no
Decreto nº 6.135/2007, que dispõe sobre o Cadastro Único para Programas Sociais do Governo
Federal, de modo que não resta, como passível de consideração jurídica, qualquer valor
percebido pelo núcleo familiar.
Averbe-se que não há qualquer registro de dados laborais no sistema CNIS, concernente aos
membros da família.
Destarte, resta caracterizada conjuntura de miserabilidade, como indicado no paradigma do STF,
exarado em repercussão geral, a autorizar o implante da benesse nos moldes do comando
sentencial.
Reforça mais essa conclusão, a opinião da perita no sentido de que, do ponto de vista
sociológico, justifica-se a concessão do benefício assistencial requerido.
De acordo com o entendimento esposado pela jurisprudência dominante, o termo inicial do
benefício deve ser mantido a partir do requerimento administrativo. Nesse sentido: APELREEX
00122689420114036139, Nona Turma, Relatora Desembargadora Federal Marisa Santos, j.
30/05/2016, e-DJF3 13/06/2016; APELREEX 00331902220114039999, Nona Turma, Relator Juiz
Convocado Rodrigo Zacharias, j. 14/03/2016, e-DJF3 31/03/2016).
Averbe-se que o laudo pericial apenas retratou situação ensejadora da outorga da benesse,
preexistente à sua confecção.
Passo à análise dos consectários.
Cumpre esclarecer que, em 20 de setembro de 2017, o STF concluiu o julgamento do RE
870.947, definindo as seguintes teses de repercussão geral: "1) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97,
com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, na parte em que disciplina os juros moratórios
aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos
de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os mesmos juros de mora pelos
quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em respeito ao princípio constitucional
da isonomia (CRFB, art. 5º, caput); quanto às condenações oriundas de relação jurídica não-
tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de
poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei
nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09; e 2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a
redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das
condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de
poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade
(CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação
de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina."
Assim, a questão relativa à aplicação da Lei n. 11.960/2009, no que se refere aos juros de mora e
à correção monetária, não comporta mais discussão, cabendo apenas o cumprimento da decisão
exarada pelo STF em sede de repercussão geral.
Nesse cenário, sobre os valores em atraso incidirão juros e correção monetária em conformidade
com os critérios legais compendiados no Manual de Orientação de Procedimentos para os
Cálculos na Justiça Federal, observadas as teses fixadas no julgamento final do RE 870.947, de
relatoria do Ministro Luiz Fux.
Conquanto imperiosa a mantença da condenação da autarquia em honorários advocatícios, esta
deve ser fixada em percentual mínimo a ser definido na fase de liquidação, nos termos do inciso II
do § 4º do artigo 85 do NCPC, observando-se o disposto nos §§ 3º, 5º e 11 desse mesmo
dispositivo legal e considerando-se as parcelas vencidas até a data da decisão concessiva do
benefício (Súmula n. 111 do STJ).
As custas processuais serão pagas pelo INSS ao final do processo, nos termos da Lei Estadual n.
3.779/09, que revogou a isenção concedida na legislação pretérita e disposições contidas tanto
no artigo 27 do CPC/1973 quanto no artigo 91 do NCPC, não se eximindo do pagamento das
custas e despesas processuais em restituição à parte autora, por força da sucumbência, na
hipótese de pagamento prévio.
Acerca do prequestionamento suscitado, assinalo não haver qualquer infringência à legislação
federal ou a dispositivos constitucionais.
Por fim, tendo em vista o teor da presente decisão, resta prejudicado o pleito de efeito suspensivo
formulado pelo INSS em suas razões recursais.
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ÀS APELAÇÕES para fixar os juros de mora e os
honorários advocatícios nos termos da fundamentação supra, explicitados os critérios de correção
monetária.
É como voto.
VOTO-VISTA
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Na sessão de 01 de agosto de 2018, a
eminente Relatora deu parcial provimento às apelações, para fixar os juros de mora, os
honorários advocatícios e explicitar os critérios de correção monetária, em ação objetivando a
concessão do benefício assistencial.
Pedi vista dos autos para melhor inteirar-me acerca do conjunto probatório e, após a devida
análise, constatei que restaram preenchidos os requisitos ensejadores ao benefício pretendido.
Assim, acompanho o voto da eminente Relatora.
É como voto.
RODRIGO ZACHARIAS
Juiz Federal Convocado
E M E N T A
CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL. NÃO CABIMENTO. ART. 496,
§ 3º, I, NCPC. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ARTIGO 203, CAPUT, DA CR/88, E
LEI Nº 8.742/1993. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO CONCEDIDO.
- A hipótese em exame não excede os 1.000 salários mínimos, sendo incabível a remessa oficial,
nos termos do art. 496, § 3º, inciso I, do NCPC.
- Atrelam-se, cumulativamente, à concessão do benefício de prestação continuada, o implemento
de requisito etário ou a detecção de deficiência, demonstrada por exame pericial, e a verificação
da ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da benesse, ou de tê-
la suprida pela família.
- Constatadas, pelos laudos periciais, a deficiência e a hipossuficiência econômica, é devido o
Benefício de Prestação Continuada a partir da data de entrada do requerimento administrativo.
Precedentes.
- Juros e correção monetária em conformidade com o decidido pelo STF no RE 870.947.
- Honorários advocatícios a cargo do INSS em percentual mínimo a ser definido na fase de
liquidação.
- Custas processuais pelo INSS.
- Apelações da parte autora e do INSS parcialmente providas.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo no
julgamento, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu dar parcial provimento às apelações. O Juiz
Federal Convocado Rodrigo Zacharias, pelo Voto-Vista, acompanhou a Relatora
, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
