Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5000312-94.2018.4.03.6124
Relator(a)
Juiz Federal Convocado VANESSA VIEIRA DE MELLO
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
17/10/2019
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 22/10/2019
Ementa
E M E N T A
CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL. NÃO CABIMENTO. ART. 496,
§ 3º, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART.
203, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E LEI Nº 8.742/1993. CONCESSÃO DO
BENEPLÁCITO NO CURSO DA AÇÃO. INTERESSE DE AGIR DA PARTE AUTORA NA VIA
JUDICIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO CONCEDIDO.
- Ahipótese em exame não excede os 1.000 salários mínimos, sendo incabível a remessa oficial,
nos termos do art. 496, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil.
- A concessão de amparo assistencial na via administrativa não afasta o interesse de agir da
parte autora no átrio judicial, pois há de se perquirir se são devidas as parcelas vencidas entre o
termo inicial do benefício fixado na sentença e eventuais parcelas decorrentes até a data da sua
implantação na senda administrativa, além dos consectários legais e verba honorária.
- Atrelam-se, cumulativamente, à concessão do benefício de prestação continuada, o implemento
de requisito etário ou a detecção de deficiência, demonstrada por exame pericial, e a verificação
da ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da benesse, ou de tê-
la suprida pela família.
- Benefício de Prestação Continuada devido a partir do implemento do requisito etário, quando
restaram caracterizadas as condicionantes à outorga da benesse.
- Termo final do beneplácito estabelecido na data da implantação do amparo assistencial na
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
seara administrativa.
- Juros de mora e correção monetária fixados na forma explicitada.
- Honorários advocatícios a cargo do INSS em percentual mínimo a ser definido na fase de
liquidação.
- Apelação do INSS parcialmente provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000312-94.2018.4.03.6124
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA VANESSA MELLO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ODETE DIAS
Advogado do(a) APELADO: CELIA ZAFALOM DE FREITAS RODRIGUES - SP98647-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000312-94.2018.4.03.6124
RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA VANESSA MELLO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ODETE DIAS
Advogado do(a) APELADO: CELIA ZAFALOM DE FREITAS RODRIGUES - SP98647-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso de apelação do INSS, interpostoem face da r. sentença, não submetida ao
reexame necessário, que julgou procedente o pedido deduzido na inicial, condenando a Autarquia
Previdenciária a conceder, à parte autora, o benefício assistencial a pessoa deficiente, desde a
data de entrada do requerimento administrativo aviado em 19/06/2012, com consectários fixados
de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal e
verba honorária arbitrada em 10% do valor da condenação.
Postula, o INSS, preambularmente, a recepção do apelo no duplo efeito. No mérito, pretende que
seja reformado o julgado, sustentando a ausência dos requisitos à outorga da benesse. Insurge-
se, outrossim, quanto ao termo inicial do benefício, requerendo seja fixado em 03/12/2017, data
em que a pretendente completou 65 anos de idade, bem como quanto à correção monetária,
juros de mora e honorários advocatícios. Suscita, por fim, o prequestionamento legal para efeito
de interposição de recursos.
Com as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
O Ministério Público Federal ofertou parecer, opinando pelo desprovimento da apelação.
Entendeu ser o caso de fixar-se o termo final da benesse outorgada na sentença, em 19/03/2018,
data em que o INSS concedeu, à vindicante, o benefício de amparo social ao idoso, na via
administrativa, conforme registros do CNIS (doc. 3627728).
Em síntese, o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000312-94.2018.4.03.6124
RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA VANESSA MELLO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ODETE DIAS
Advogado do(a) APELADO: CELIA ZAFALOM DE FREITAS RODRIGUES - SP98647-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Afigura-se correta a não submissão da r. sentença à remessa oficial.
De fato, o art. 496, § 3º, inciso I do Código de Processo Civil atual, que entrou em vigor em 18 de
março de 2016, dispõe que a sentença não será submetida ao reexame necessário quando a
condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a 1.000
(mil) salários mínimos, em desfavor da União ou das respectivas autarquias e fundações de
direito público.
No caso dos autos, considero as datas do termo inicial do benefício e da prolação da
sentença,em 18/07/2017 (doc. 3314159, págs. 5/10). Atenho-me ao valor da benesse, de um
salário mínimo. Verifico que a hipótese em exame não excede os mil salários mínimos, não
sendo, pois, o caso de submeter o decisum de primeiro grau à remessa oficial.
Pois bem. Cuida-se de ação ajuizada em 14/01/2013, consoante doc. 3314143, pág. 3, que busca
a concessão de benefício de prestação continuada ao deficiente.
Em seu parecer, o Órgão Ministerial informou que houve concessão administrativa de amparo
social à pretendente, NB 7034780596, o que se deu a partir de 19/03/2018, conforme extrato do
CNIS coligido aos autos (doc. 3627728).
Ora, o fato de a benesse ser concedida na via administrativa não afasta o interesse de agir da
parte autora no átrio judicial, pois há de se perquirir sobre a presença dos requisitos à sua
outorga, entre o termo inicial do benefício fixado na sentença e eventuais parcelas decorrentes
até a data da sua implantação na senda administrativa, além dos consectários legais e verba
honorária.
Nesse sentido é o entendimento desta E. Corte, tirado de situação parelha:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. CONCESSÃO NA VIA
ADMINISTRATIVA. INTERESSE DE AGIR. PARCELAS VENCIDAS. RECONHECIMENTO DO
PEDIDO. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. TERMO INICIAL. CORREÇÃO
MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. I. O fato do benefício de
aposentadoria por invalidez ser concedido na via administrativa não afasta o interesse de agir da
parte autora na via judicial, pois são devidas as parcelas vencidas entre eventual termo inicial e
implantação na via administrativa, além dos consectários legais e verbas honorárias. II. Afastada
a superveniente da ação, o feito encontra-se em termos para ser julgado com a análise do mérito,
nos termos do disposto no artigo 515, §3º, do CPC. III. São devidas as parcelas vencidas, a título
de auxílio-doença, desde a data imediatamente posterior ao cancelamento indevido do benefício
até a data imediatamente anterior à efetiva implantação do benefício de aposentadoria por
invalidez. IV. Correção monetária sobre os valores em atraso deve seguir o disposto no
Provimento n.º 26/01 da E. Corregedoria-Geral da Justiça Federal da 3ª Região, observando-se a
Súmula nº 08 desta Corte Regional e a Súmula nº 148 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça. V.
Juros de mora à taxa de 12% (doze por cento) ao ano, conforme Enunciado n.º 20, aprovado na
Jornada de Direito Civil promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça
Federal. VI. Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor
da condenação, excluídas as parcelas vincendas, considerando-se as prestações vencidas as
compreendidas entre o termo inicial do benefício e a data deste acórdão (Súmula 111 do STJ).
VII. Apelação da parte autora parcialmente provida." (AC 00384891920074039999, Sétima
Turma, Desembargador Federal Walter do Amaral, DJF3 03/09/2008 (grifos nossos).
Passo, assim, ao exame do apelo autárquico.
Previsto no art. 203, caput, da Constituição Federal e disciplinado pela Lei nº 8.742/1993, de
natureza assistencial e não previdenciária, o benefício de prestação continuada tem sua
concessão desvinculada do cumprimento dos quesitos de carência e de qualidade de segurado,
atrelando-se, cumulativamente, ao implemento de requisito etário ou à detecção de deficiência,
nos termos do art. 20, §2º, da Lei n° 8.742/93, demonstrada por exame pericial; à verificação da
ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da benesse, ou de tê-lo
suprido pela família; e, originalmente, à constatação de renda mensal per capita não superior a ¼
(um quarto) do salário mínimo. Recorde-se, a este passo, da sucessiva redução da idade mínima,
primeiramente de 70 para 67 anos, pelo art. 1º da Lei nº 9.720/98 e, ao depois, para 65 anos,
conforme art. 34 da Lei nº 10.741/ 2003.
No que diz respeito ao critério da deficiência, as sucessivas alterações legislativas ocorridas na
redação do § 2º, do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social demonstram a evidente
evolução na sua conceituação.
Em sua redação originária, a Lei 8.742/1993 definia a pessoa portadora de deficiência, para efeito
de concessão do benefício assistencial, aquela incapacitada para a vida independente e para o
trabalho.
Posteriormente, a Lei n. 12.435/2011 promoveu modificação ao dispositivo legal, ampliando o
conceito de deficiência, com base no Decreto n. 6.949/2009, que promulgou a Convenção
Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
O § 2º da art. 20 da Lei n. 8.742 passou então a vigorar com a seguinte redação:
"Art. 20
(...)
§ 2º - para efeito de concessão deste benefício, considera-se:
I - pessoa com deficiência, aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir
sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas.
II - impedimentos de longo prazo: aqueles que incapacitam a pessoa com deficiência para a vida
independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos."
Vê-se, portanto, que ao fixar o entendimento da expressão "impedimentos de longo prazo", a Lei
n. 12.435/2011 optou por restringir a concessão do benefício exclusivamente às pessoas com
deficiência que apresentem incapacidade para a vida independente e para o trabalho pelo prazo
mínimo de 2 (dois) anos.
Atualmente, o dispositivo em exame encontra-se vigendo com a redação conferida pelo Estatuto
da Pessoa com Deficiência, Lei n. 13.146/2015, a qual explicitou a definição legal de pessoa com
deficiência:
"Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com
deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou
sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e
efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas."
De se registrar que o § 10 do mesmo dispositivo, incluído pela Lei n. 12.470/2011, considera de
longo prazo o impedimento cujos efeitos perduram pelo prazo mínimo de 02 (dois) anos.
No caso de crianças e adolescentes menores de dezesseis anos de idade, deve ser avaliada,
para tanto, "a existência da deficiência e o seu impacto na limitação do desempenho de atividade
e restrição da participação social, compatível com a idade", ex vi do art. 4º, inciso II e § 1º, do
Decreto nº 6.214/2007, que regulamenta o benefício de prestação continuada da assistência
social de que trata a Lei n° 8.742/93, tornando-se despiciendo o exame da inaptidão laboral, na
esteira do precedente da Terceira Seção deste E. Tribunal, in verbis:
“PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS INFRINGENTES. BENEFÍCIO DE
PRESTAÇÃO CONTINUADA. MENOR. DEFICIÊNCIA FÍSICA E MENTAL. HIPOSSUFICIÊNCIA
ECONÔMICA. COMPROVAÇÃO. I - As limitações físicas e mentais de que padece o
demandante, apontadas pelo próprio expert e pela fisioterapeuta que o acompanha, impõem-lhe
significativas restrições às atividades típicas de sua idade (correr, participar de brincadeiras,
acompanhar satisfatoriamente a escola), não sendo necessário perquirir quanto à existência ou
não de capacidade laborativa, a teor do art. 4º, §2º, doDecretonº 6.214/2007. (...) V - Embargos
Infringentes do INSS a que se nega provimento.” (EI 994950, Relator Desembargador Federal
Sergio Nascimento, j. 25/08/2011, e-DJF3 14/09/2011)
Ainda, o posicionamento da Nona Turma deste E. Tribunal no mesmo sentido, nos seguintes
julgados: AC 0008758-60.2016.4.03.9999, D.E. 24/11/2016; AC 0002545-37.2013.4.03.6121,
D.E. 04/11/2016; AC 0007387-51.2012.4.03.6103, D.E. 24/11/2016.
Acerca do derradeiro pressuposto, o C. STF, no âmbito da Reclamação nº 4374 e dos Recursos
Extraordinários nºs. 567985 e 580963, submetidos à sistemática da repercussão geral, reputou
defasado esse método aritmético de aferição de contexto de miserabilidade, suplantando, assim,
o que outrora restou decidido na ADI 1.232-DF, ajuizada pelo Procurador-Geral da República e
em cujo âmbito se declarara a constitucionalidade do §3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93. A
motivação empregada pela Excelsa Corte, no RE nº 580963, reside no fato de terem sido
"editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para concessão de outros benefícios
assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que
instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa
Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a municípios
que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas".
À vista disso, a mensuração da hipossuficiência não mais se restringe ao parâmetro da renda
familiar, devendo, sim, aflorar da análise desse requisito e das demais circunstâncias concretas
de cada caso, na linha do que já preconizava a jurisprudência majoritária, no sentido de que a
diretiva do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93 não consistiria em singular meio para se verificar a
condição de miserabilidade preceituada na Carta Magna, cuidando-se, tão-apenas, de critério
objetivo mínimo, a revelar a impossibilidade de subsistência do portador de deficiência e do idoso,
não empecendo a utilização, pelo julgador, de outros fatores igualmente capazes de denotar a
condição de precariedade financeira da parte autora. Veja-se, a exemplo, STJ: REsp nº
314264/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Félix Fischer, j. 15/05/2001, v.u., DJ 18/06/2001, p. 185;
EDcl no AgRg no REsp 658705/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Felix Fischer, j. 08/03/2005, v.u., DJ
04/04/2005, p. 342; REsp 308711/SP, Sexta Turma, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 19/09/2002,
v.u., DJ 10/03/2003, p. 323.
Em plena sintonia com o acima esposado, o c. STJ, quando da apreciação do RESP n.
1.112.557/MG, acentuou que o art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93 comporta exegese tendente ao
amparo do cidadão vulnerável, donde concluir-se que a delimitação do valor de renda familiar per
capita não pode ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado.
Em substituição à diretriz inicialmente estampada na lei, a jurisprudência vem evoluindo para
eleger a renda mensal familiar per capita inferior à metade do salário mínimo como indicativo de
situação de precariedade financeira, tendo em conta que outros programas sociais, dentre eles o
bolsa família, o Programa Nacional de Acesso à Alimentação e o bolsa escola, instituídos pelas
Leis nºs 10.836/04, 10.689/03 e 10.219/01, nessa ordem, contemplam esse patamar.
Consultem-se arestos da Terceira Seção nesse diapasão:
“AGRAVO LEGAL EM EMBARGOS INFRINGENTES. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL À PESSOA IDOSA. PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO
DO BENEFÍCIO. AGRAVO IMPROVIDO (...) 3 - Da análise do sistema CNIS/DATAPREV,
verifica-se que o filho da autora possui apenas pequenos vínculos de trabalho, na maioria inferior
a 03 meses, sendo que na maior parte do tempo esteve desempregado. Desse modo, mesmo
incluindo a aposentadoria do marido da autora, a renda familiar per capita corresponde a pouco
mais de R$ 300,00, ou seja, inferior a meio salário mínimo. 4 - Restou demonstrada, quantum
satis, no caso em comento, situação de miserabilidade, prevista no art. 20, § 3º, da Lei
8.742/1993, a ensejar a concessão do benefício assistencial. 5 - Agravo improvido." (EI
00072617120124036112, Relator Desembargador Federal Toru Yamamoto, TRF3, j. 22/10/2015,
e-DJF3 05/11/2015)
“PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (LOAS). EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM
AGRAVO LEGAL. CARÁTER INFRINGENTE. IMPOSSIBILIDADE. CONTRADIÇÃO
INEXISTENTE. (...)- No caso em exame, não há omissão a ser sanada, sendo o benefício
indeferido pelo fato da renda familiar "per capita" ser superior a 1/2 salário mínimo. (...) 5-
Embargos de declaração rejeitados." (AR 00082598120084030000, Relator Juiz Convocado Silva
Neto, TRF3, j. 25/09/2014, e-DJF3 08/10/2014)
Nesse exercício de sopesamento do conjunto probatório, importa averiguar a necessidade, na
precisão da renda familiar, de abatimento do benefício de valor mínimo percebido por idoso ou
deficiente, pertencente à unidade familiar. Nesta quadra, há, inclusive, precedente do egrégio
STF, no julgamento do RE nº 580.963/PR, disponibilizado no DJe 14.11.2013, submetido à
sistemática da repercussão geral, em que se consagrou a inconstitucionalidade por omissão do
art. 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso, considerando a "inexistência de justificativa
plausível para discriminação dos portadores de deficiência em relação aos idosos, bem como dos
idosos beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de benefícios
previdenciários no valor de até um salário mínimo.".
Quanto à questão da composição da renda familiar per capita, o C. STJ, no julgamento do RESP
n. 1.355.052/SP, exarado na sistemática dos recursos representativos de controvérsia, assentou,
no mesmo sentido, a aplicação analógica do parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso, com
vistas à exclusão do benefício previdenciário recebido por idoso ou por deficiente, no valor de um
salário mínimo, no cálculo da renda per capita prevista no art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93
De se realçar que a jurisprudência - antes, mesmo, do aludido recurso repetitivo - já se firmara no
sentido da exclusão de qualquer benefício de valor mínimo recebido por idoso com mais de 65
anos, por analogia ao disposto no art. 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/2003, preceito esse
que, na origem, limitava-se a autorizar a desconsideração de benefício de prestação continuada
percebido pelos referidos idosos.
Note-se que os precedentes não autorizam o descarte do benefício de valor mínimo recebido por
qualquer idoso, assim compreendidas pessoas com idade superior a 60 anos, mas, sim, pelos
idosos com idade superior a 65 anos.
Essa é a inteligência reinante na jurisprudência. A propósito, os seguintes julgados: STJ, AGP
8479, Rel. Des. Convocada Marilza Maynard, 3ª Seção, DJE 03/02/2014; STJ, AGP 8609, Rel.
Min. Assusete Magalhães, 3ª Seção, DJE 25/11/2013; STJ, AGRESP 1178377, Rel. Min. Maria
Thereza de Assis Moura, 6ª Turma, DJE 19/3/2012. E da atenta leitura da íntegra do acórdão do
recurso representativo de controvérsia - nº 1.355.052/SP - chega-se à idêntica conclusão.
Outro dado sobremodo relevante diz respeito à acepção de família, para a finalidade da Lei nº
8.742/1993, cujo conceito experimentou modificação ao longo do tempo. Num primeiro lanço, o
art. 20, § 1º, do citado diploma nomeava família "a unidade mononuclear, vivendo sob o mesmo
teto, cuja economia é mantida pela contribuição de seus integrantes". Ao depois, a Lei nº 9.720,
em 30/11/98, fruto de conversão da Medida Provisória nº 1.473-34, de 11/08/97, passou a
compreendê-la como o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei nº 8.213/91, dês que
conviventes sob mesmo teto. Finalmente, na vigência da Lei nº 12.435/2011, é havida como o
núcleo integrado pelo requerente, cônjuge ou companheiro, os pais, ou, na ausência destes, pela
madrasta ou padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados,
todos, também, sob o mesmo teto.
SITUAÇÃO DOS AUTOS
Realizada a perícia médica em 03/02/2014, o laudo coligido ao doc. 3314154, págs. 3/7,
considerou a autora, então, com 61 anos de idade, segundo grau completo e que atuou como
trabalhadora rural, por 25 anos, empregada doméstica, por cinco anos, e, após, como auxiliar de
cozinha, até 08/2012, parcial e permanentemente incapacitada, desde 10/02/2010, para
atividades que exijam grandes esforços físicos, por ser portadora de discopatia lombar,
apresentando, todavia, capacidade laborativa residual para o desempenho de funções de
natureza mais leve, tais como a de vendedora, atendente, telefonista, cozinheira, bordadeira e
auxiliar de cozinha, última atividade, habitualmente, por ela desempenhada.
O expert consignou que a vindicante encontra-se em tratamento medicamentoso e apresenta
condições físicas satisfatórias. Salientando que a conclusão da períciafoi baseada na natureza
ortopédica da patologia e no risco de agravamento da lesão.
Quanto aos sintomas de depressão, referido pela promovente, a mesma encontra-se em
tratamento médico periódico. Apresentou-sebem vestida e com higiene pessoal preservada,
consciente, orientada no tempo e espaço, comunicativa e com diálogo coerente.
De seu turno, os documentos médicos carreados aos autos pela demandante antes da realização
da perícia, não se mostram hábeis a abalar a conclusão da prova técnica, que foi exposta de
forma fundamentada após o estudo da documentação apresentada e da avaliação física realizada
no momento do exame pericial, analisando as moléstias constantes dos aludidos documentos.
Vide docs. 3314144, págs. 8/10, 3314145, págs. 1/9, 3314154, págs. 7/10, e 3314155, pág. 1.
Assim, o laudo deve prevalecer, uma vez que se trata de prova técnica realizada por profissional
habilitado e sob o crivo do contraditório, sendo certo, ainda, que a doença, por si só, não gera
direito à obtenção do benefício assistencial ora pleiteado, fazendo-se necessário, em casos que
tais, a constatação de comprometimento ou restrições sociais decorrentes da enfermidade
verificada, pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos, inocorrente, na espécie.
Portanto, o quadro apresentado não se ajusta ao conceito de pessoa com deficiência,
estabelecido no art. 20, § 2º, da Lei nº 8.742/93, razão pela qual é indevido o benefício.
Assim vem decidindo a Nona Turma deste E. Tribunal, em casos parelhos, como se colhe dos
seguintes julgados: AC 2137061, Relatora Desembargadora Federal Marisa Santos, j.
30/05/2016, e-DJF3 13/06/2016; AC 00017060620134036123, Relator Juiz Convocado Rodrigo
Zacharias, j. 16/05/2016, e-DJF3 01/06/2016.
Conquanto o conjunto probatório dos autos não demonstre a deficiência, certo é que a
proponente completou 65 anos em 03/12/2017, o que descortina o implemento do requisito etário
no curso da lide, cabendo tomá-lo em consideração, por força do disposto no art. 493 do Código
de Processo Civil.
Avançando, então, na análise da hipossuficiência, importa examinar os estudos sociais coligidos
aos docs. 3314152, págs. 8/9, e 3314156, págs. 7/8, produzidos em 22/8/2013e 24/02/2015.
Segundo os laudos adrede confeccionados, a parte autora, divorciada, reside sozinha, no
município de Populina/SP.
Mora em casa própria, composta por quatro cômodos, em razoável estado de limpeza e
conservação, guarnecidoscom mobília básica eaparentando longo tempo de uso.
A vindicante não aufere qualquer renda, tampouco conta com o auxílio financeiro ou material de
filhos ou irmãos.
Recebe R$ 80,00 mensais, transferidos pelo Programa Renda Cidadã, e, eventualmente, uma
cesta básica de alimentos.
A esta altura, cabe lembrar que, na contabilização da renda familiar, torna-se imperiosa a
exclusão dos rendimentos percebidos do aludido Programa Social, por força do disposto no
Decreto nº 6.135/2007, que dispõe sobre o Cadastro Único para Programas Sociais do Governo
Federal.
Desse modo, não resta, como passível de consideração jurídica, qualquer valor percebido pela
proponente.
Assim, restou demonstrada situação de hipossuficiência econômica, como indicado no sobredito
paradigma do C. Supremo Tribunal Federal, exarado em repercussão geral, a autorizar o implante
da benesse.
No que tange ao termo inicial do benefício, cabe considerar que, segundo a jurisprudência,
inclusive assentada pelo C. Superior Tribunal de Justiça, em sede de repercussão geral (Recurso
Especial nº 1.369.165/SP), os benefícios por incapacidade devem ser concedidos, em regra, a
partir do requerimento administrativo ou, na sua ausência, da citação. Na hipótese vertente,
contudo, o benefício há de ser concedido a partir de 03/12/2017, quando a vindicante completou
65 (sessenta e cinco) anos de idade, restando caracterizadas as condicionantes à outorga da
benesse.
De se estabelecer o termo final do benefício em 19/03/2018, data da implantação do amparo
assistencial na seara administrativa (NB 7034780596).
Passo à análise dos consectários.
Cumpre esclarecer que, em 20 de setembro de 2017, o STF concluiu o julgamento do RE
870.947, definindo as seguintes teses de repercussão geral sobre a incidência da Lei n.
11.960/2009: "1) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na
parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é
inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem
ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito
tributário, em respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput); quanto às
condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o
índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta
extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09; e
2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que
disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a
remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição
desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica
como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a
promover os fins a que se destina."
Assim, a questão relativa à aplicação da Lei n. 11.960/2009, no que se refere aos juros de mora e
à correção monetária, não comporta mais discussão, cabendo apenas o cumprimento da decisão
exarada pelo STF em sede de repercussão geral.
Nesse cenário, sobre os valores em atraso incidirão juros e correção monetária em conformidade
com os critérios legais compendiados no Manual de Orientação de Procedimentos para os
Cálculos na Justiça Federal, observadas as teses fixadas no julgamento final do RE 870.947, de
relatoria do Ministro Luiz Fux.
Quanto à modulação dos efeitos da decisão do citado RE, destaca-se a pendência de apreciação,
pelo STF, de Embargos de Declaração, ficando remarcada, desta forma, a sujeição da questão
da incidência da correção monetária ao desfecho do referido leading case.
Conquanto imperiosa a mantença da condenação da autarquia em honorários advocatícios, esta
deve ser fixada em percentual mínimo a ser definido na fase de liquidação, nos termos do inciso II
do § 4º do art. 85 do Código de Processo Civil, observando-se o disposto nos §§ 3º, 5º e 11
desse mesmo dispositivo legal e considerando-se as parcelas vencidas até a data da decisão
concessiva do benefício, nos termos da Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Acerca do prequestionamento suscitado, assinalo não haver qualquer infringência à legislação
federal ou a dispositivos constitucionais.
Por fim, tendo em vista o teor da presente decisão, resta prejudicado o pleito de efeito suspensivo
formulado pelo INSS em suas razões recursais.
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, para fixar o termo inicial
do benefício em 03/12/2017, data em que a pretendente completou 65 anos de idade,
estabelecendo seu termo final em 19/03/2018, data da implantação do amparo assistencial na
seara administrativa. Explicito o critério de cálculo da verba honorária, na forma delineada.
É como voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL. NÃO CABIMENTO. ART. 496,
§ 3º, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART.
203, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E LEI Nº 8.742/1993. CONCESSÃO DO
BENEPLÁCITO NO CURSO DA AÇÃO. INTERESSE DE AGIR DA PARTE AUTORA NA VIA
JUDICIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO CONCEDIDO.
- Ahipótese em exame não excede os 1.000 salários mínimos, sendo incabível a remessa oficial,
nos termos do art. 496, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil.
- A concessão de amparo assistencial na via administrativa não afasta o interesse de agir da
parte autora no átrio judicial, pois há de se perquirir se são devidas as parcelas vencidas entre o
termo inicial do benefício fixado na sentença e eventuais parcelas decorrentes até a data da sua
implantação na senda administrativa, além dos consectários legais e verba honorária.
- Atrelam-se, cumulativamente, à concessão do benefício de prestação continuada, o implemento
de requisito etário ou a detecção de deficiência, demonstrada por exame pericial, e a verificação
da ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da benesse, ou de tê-
la suprida pela família.
- Benefício de Prestação Continuada devido a partir do implemento do requisito etário, quando
restaram caracterizadas as condicionantes à outorga da benesse.
- Termo final do beneplácito estabelecido na data da implantação do amparo assistencial na
seara administrativa.
- Juros de mora e correção monetária fixados na forma explicitada.
- Honorários advocatícios a cargo do INSS em percentual mínimo a ser definido na fase de
liquidação.
- Apelação do INSS parcialmente provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
