Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5789519-44.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal JOAO BATISTA GONCALVES
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
30/04/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 05/05/2021
Ementa
E M E N T A
CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL. NÃO CABIMENTO. ART. 496,
§ 3º, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART.
203, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E LEI Nº 8.742/1993. REQUISITOS NÃO
PREENCHIDOS. BENEFÍCIO INDEVIDO.
- Ahipótese em exame não excede os 1.000 salários mínimos, sendo incabível a remessa oficial,
nos termos do art. 496, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil.
- Pedido de suspensão do feito, por suposta necessidade de regularização processual da parte
autora, afastado, visto que não há comprovação, nos autos, da incapacidade civil deste.
- Atrelam-se, cumulativamente, à concessão do benefício de prestação continuada, o implemento
de requisito etário ou a detecção de deficiência, demonstrada por exame pericial, e a verificação
da ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da benesse, ou de tê-
la suprida pela família.
- Na linha da jurisprudência desta E. Nona Turma, a propalada separação de corpos é irrelevante,
para fins de concessão do Benefício de Prestação Continuada, se os consortes convivem sob o
mesmo teto.
- Não comprovada situação de hipossuficiência, de rigor o indeferimento do benefício.
- Honorários advocatícios fixados em 10% do valor atualizado da causa, observado o disposto no
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
art. 98, § 3º, do Código de Processo Civil,que manteve a sistemática da Lei n. 1.060/50, por ser a
parte autora beneficiária da justiça gratuita.
- Apelação do INSS provida. Sentença reformada para julgar improcedente o pedido. Tutela
antecipada de mérito revogada.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5789519-44.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VAGNER DE AZEVEDO VIANA
Advogados do(a) APELADO: FELIPE MARQUES VIEIRA MARCELO - SP316455-N, IZADORA
MATTAR MOLINA - SP374869-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5789519-44.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VAGNER DE AZEVEDO VIANA
Advogados do(a) APELADO: FELIPE MARQUES VIEIRA MARCELO - SP316455-N, IZADORA
MATTAR MOLINA - SP374869-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso de apelação interposto pelo INSS em face da r. sentença, não submetida ao
reexame necessário, que julgou procedente o pedido deduzido na inicial, condenando a Autarquia
Previdenciária a conceder, à parte autora, o benefício de prestação continuada, desde a data de
propositura da ação, em 26/01/2017, discriminados os consectários, antecipados os efeitos da
tutela de mérito.
Postula, o INSS, preambularmente, a recepção do apelo no duplo efeito. No mérito, pretende que
seja reformado o julgado, sustentando, em síntese, a ausência de comprovação de
miserabilidade. Suscita, por fim, o prequestionamento legal para efeito de interposição de
recursos.
Com as contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal.
O Ministério Público Federal ofertou parecer opinando, preliminarmente, pela a suspensão do
trâmite processual, nos termos do art. 313, inciso I, do Código de Processo Civil, com vistas à
regularização da representação processual do vindicante, portador, consoante laudo médico, de
retardo mental moderado decorrente de sequela de meningite, que o torna incapaz para o
exercício de quaisquer atividades laborais. No mérito, manifesta-se pelo provimento da apelação.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5789519-44.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VAGNER DE AZEVEDO VIANA
Advogados do(a) APELADO: FELIPE MARQUES VIEIRA MARCELO - SP316455-N, IZADORA
MATTAR MOLINA - SP374869-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Inicialmente, afasto o pedido de suspensão do feito pelo Ministério Público Federal, por suposta
necessidade de regularização processual da parte autora, nos termos do artigo 313, I, do Código
de Processo Civil, visto que não há comprovação, nos autos, da incapacidade civil deste.
Afigura-se, outrossim, correta a não submissão da r. sentença à remessa oficial.
É importante salientar que, de acordo com o art. 496, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil
atual, não será aplicável o duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito
econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos.
Na hipótese dos autos, embora a sentença seja ilíquida, resta evidente que a condenação ou o
proveito econômico obtido na causa não ultrapassa o limite legal previsto, enquadrando-se
perfeitamente à norma insculpida no parágrafo 3º, I, art. 496, da atual lei processual.
Não sendo, pois, o caso de submeter o decisum de primeiro grau à remessa oficial, passo à
análise do recurso em seus exatos limites, uma vez que cumpridos os requisitos de
admissibilidade previstos no Código de Processo Civil atual.
Previsto no art. 203, caput, da Constituição Federal e disciplinado pela Lei nº 8.742/1993, de
natureza assistencial e não previdenciária, o benefício de prestação continuada tem sua
concessão desvinculada do cumprimento dos quesitos de carência e de qualidade de segurado,
atrelando-se, cumulativamente, ao implemento de requisito etário ou à detecção de deficiência,
nos termos do art. 20, §2º, da Lei n° 8.742/93, demonstrada por exame pericial; à verificação da
ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da benesse, ou de tê-lo
suprido pela família; e, originalmente, à constatação de renda mensal per capita não superior a ¼
(um quarto) do salário mínimo. Recorde-se, a este passo, da sucessiva redução da idade mínima,
primeiramente de 70 para 67 anos, pelo art. 1º da Lei nº 9.720/98 e, ao depois, para 65 anos,
conforme art. 34 da Lei nº 10.741/ 2003.
No que diz respeito ao critério da deficiência, as sucessivas alterações legislativas ocorridas na
redação do § 2º, do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social demonstram a evidente
evolução na sua conceituação.
Em sua redação originária, a Lei 8.742/1993 definia a pessoa portadora de deficiência, para efeito
de concessão do benefício assistencial, aquela incapacitada para a vida independente e para o
trabalho.
Posteriormente, a Lei n. 12.435/2011 promoveu modificação ao dispositivo legal, ampliando o
conceito de deficiência, com base no Decreto n. 6.949/2009, que promulgou a Convenção
Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
O § 2º da art. 20 da Lei n. 8.742 passou então a vigorar com a seguinte redação:
"Art. 20
(...)
§ 2º - para efeito de concessão deste benefício, considera-se:
I - pessoa com deficiência, aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir
sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas.
II - impedimentos de longo prazo: aqueles que incapacitam a pessoa com deficiência para a vida
independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos."
Vê-se, portanto, que ao fixar o entendimento da expressão "impedimentos de longo prazo", a Lei
n. 12.435/2011 optou por restringir a concessão do benefício exclusivamente às pessoas com
deficiência que apresentem incapacidade para a vida independente e para o trabalho pelo prazo
mínimo de 2 (dois) anos.
Atualmente, o dispositivo em exame encontra-se vigendo com a redação conferida pelo Estatuto
da Pessoa com Deficiência, Lei n. 13.146/2015, a qual explicitou a definição legal de pessoa com
deficiência:
"Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com
deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou
sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e
efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas."
De se registrar que o § 10 do mesmo dispositivo, incluído pela Lei n. 12.470/2011, considera de
longo prazo o impedimento cujos efeitos perduram pelo prazo mínimo de 02 (dois) anos.
Acerca do derradeiro pressuposto, o C. STF, no âmbito da Reclamação nº 4374 e dos Recursos
Extraordinários nºs. 567985 e 580963, submetidos à sistemática da repercussão geral, reputou
defasado esse método aritmético de aferição de contexto de miserabilidade, suplantando, assim,
o que outrora restou decidido na ADI 1.232-DF, ajuizada pelo Procurador-Geral da República e
em cujo âmbito se declarara a constitucionalidade do §3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93. A
motivação empregada pela Excelsa Corte, no RE nº 580963, reside no fato de terem sido
"editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para concessão de outros benefícios
assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que
instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa
Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a municípios
que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas".
À vista disso, a mensuração da hipossuficiência não mais se restringe ao parâmetro da renda
familiar, devendo, sim, aflorar da análise desse requisito e das demais circunstâncias concretas
de cada caso, na linha do que já preconizava a jurisprudência majoritária, no sentido de que a
diretiva do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93 não consistiria em singular meio para se verificar a
condição de miserabilidade preceituada na Carta Magna, cuidando-se, tão-apenas, de critério
objetivo mínimo, a revelar a impossibilidade de subsistência do portador de deficiência e do idoso,
não empecendo a utilização, pelo julgador, de outros fatores igualmente capazes de denotar a
condição de precariedade financeira da parte autora. Veja-se, a exemplo, STJ: REsp nº
314264/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Félix Fischer, j. 15/05/2001, v.u., DJ 18/06/2001, p. 185;
EDcl no AgRg no REsp 658705/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Felix Fischer, j. 08/03/2005, v.u., DJ
04/04/2005, p. 342; REsp 308711/SP, Sexta Turma, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 19/09/2002,
v.u., DJ 10/03/2003, p. 323.
Em plena sintonia com o acima esposado, o c. STJ, quando da apreciação do RESP n.
1.112.557/MG, acentuou que o art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93 comporta exegese tendente ao
amparo do cidadão vulnerável, donde concluir-se que a delimitação do valor de renda familiar per
capita não pode ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado.
Em substituição à diretriz inicialmente estampada na lei, a jurisprudência vem evoluindo para
eleger a renda mensal familiar per capita inferior à metade do salário mínimo como indicativo de
situação de precariedade financeira, tendo em conta que outros programas sociais, dentre eles o
bolsa família, o Programa Nacional de Acesso à Alimentação e o bolsa escola, instituídos pelas
Leis nºs 10.836/04, 10.689/03 e 10.219/01, nessa ordem, contemplam esse patamar.
Consultem-se arestos da Terceira Seção nesse diapasão:
“AGRAVO LEGAL EM EMBARGOS INFRINGENTES. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL À PESSOA IDOSA. PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO
DO BENEFÍCIO. AGRAVO IMPROVIDO (...) 3 - Da análise do sistema CNIS/DATAPREV,
verifica-se que o filho da autora possui apenas pequenos vínculos de trabalho, na maioria inferior
a 03 meses, sendo que na maior parte do tempo esteve desempregado. Desse modo, mesmo
incluindo a aposentadoria do marido da autora, a renda familiar per capita corresponde a pouco
mais de R$ 300,00, ou seja, inferior a meio salário mínimo. 4 - Restou demonstrada, quantum
satis, no caso em comento, situação de miserabilidade, prevista no art. 20, § 3º, da Lei
8.742/1993, a ensejar a concessão do benefício assistencial. 5 - Agravo improvido." (EI
00072617120124036112, Relator Desembargador Federal Toru Yamamoto, TRF3, j. 22/10/2015,
e-DJF3 05/11/2015)
“PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (LOAS). EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM
AGRAVO LEGAL. CARÁTER INFRINGENTE. IMPOSSIBILIDADE. CONTRADIÇÃO
INEXISTENTE. (...)- No caso em exame, não há omissão a ser sanada, sendo o benefício
indeferido pelo fato da renda familiar "per capita" ser superior a 1/2 salário mínimo. (...) 5-
Embargos de declaração rejeitados." (AR 00082598120084030000, Relator Juiz Convocado Silva
Neto, TRF3, j. 25/09/2014, e-DJF3 08/10/2014)
Nesse exercício de sopesamento do conjunto probatório, importa averiguar a necessidade, na
precisão da renda familiar, de abatimento do benefício de valor mínimo percebido por idoso ou
deficiente, pertencente à unidade familiar. Nesta quadra, há, inclusive, precedente do egrégio
STF, no julgamento do RE nº 580.963/PR, disponibilizado no DJe 14.11.2013, submetido à
sistemática da repercussão geral, em que se consagrou a inconstitucionalidade por omissão do
art. 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso, considerando a "inexistência de justificativa
plausível para discriminação dos portadores de deficiência em relação aos idosos, bem como dos
idosos beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de benefícios
previdenciários no valor de até um salário mínimo.".
Quanto à questão da composição da renda familiar per capita, o C. STJ, no julgamento do RESP
n. 1.355.052/SP, exarado na sistemática dos recursos representativos de controvérsia, assentou,
no mesmo sentido, a aplicação analógica do parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso, com
vistas à exclusão do benefício previdenciário recebido por idoso ou por deficiente, no valor de um
salário mínimo, no cálculo da renda per capita prevista no art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93.
De se realçar que a jurisprudência - antes, mesmo, do aludido recurso repetitivo - já se firmara no
sentido da exclusão de qualquer benefício de valor mínimo recebido por idoso com mais de 65
anos, por analogia ao disposto no art. 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/2003, preceito esse
que, na origem, limitava-se a autorizar a desconsideração de benefício de prestação continuada
percebido pelos referidos idosos.
Note-se que os precedentes não autorizam o descarte do benefício de valor mínimo recebido por
qualquer idoso, assim compreendidas pessoas com idade superior a 60 anos, mas, sim, pelos
idosos com idade superior a 65 anos.
Essa é a inteligência reinante na jurisprudência. A propósito, os seguintes julgados: STJ, AGP
8479, Rel. Des. Convocada Marilza Maynard, 3ª Seção, DJE 03/02/2014; STJ, AGP 8609, Rel.
Min. Assusete Magalhães, 3ª Seção, DJE 25/11/2013; STJ, AGRESP 1178377, Rel. Min. Maria
Thereza de Assis Moura, 6ª Turma, DJE 19/3/2012. E da atenta leitura da íntegra do acórdão do
recurso representativo de controvérsia - nº 1.355.052/SP - chega-se à idêntica conclusão.
Outro dado sobremodo relevante diz respeito à acepção de família, para a finalidade da Lei nº
8.742/1993, cujo conceito experimentou modificação ao longo do tempo. Num primeiro lanço, o
art. 20, § 1º, do citado diploma nomeava família "a unidade mononuclear, vivendo sob o mesmo
teto, cuja economia é mantida pela contribuição de seus integrantes". Ao depois, a Lei nº 9.720,
em 30/11/98, fruto de conversão da Medida Provisória nº 1.473-34, de 11/08/97, passou a
compreendê-la como o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei nº 8.213/91, dês que
conviventes sob mesmo teto. Finalmente, na vigência da Lei nº 12.435/2011, é havida como o
núcleo integrado pelo requerente, cônjuge ou companheiro, os pais, ou, na ausência destes, pela
madrasta ou padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados,
todos, também, sob o mesmo teto.
SITUAÇÃO DOS AUTOS
Na espécie, o requisito da deficiência restou incontroverso no átrio judicial.
Apenas, por elucidativo, o laudo médico colacionado ao doc. 73431458, considerou o autor,
então, com 28 anos de idade, portador de retardo mental moderado, que o incapacita para o
desempenho de atividades laborais, de forma total e permanente.
O perito atestou que o quadro clínico retratado gera impedimentos de longo prazo ao autor, apto
à caracterização da deficiência, na forma da Lei.
Avançando, então, na análise da hipossuficiência, importa examinar o estudo social coligido ao
doc. 73431456, produzido em 19/06/2017.
Segundo o laudo adrede confeccionado, o autor reside com os genitores, o pai, de 64 anos, e a
mãe, de 48 anos, e um irmão, de 24 anos, idades correspondentes à data do estudo
socioeconômico.
Embora os genitores "vivam sob o mesmo teto", relatam separação de corpos.
Transcrevo excerto do laudo, sobre as condições de moradia:
"O local de moradia da família é uma casa com 06 cômodos e 01 banheiro/sanitário, de
propriedade dos genitores do requerente, em bom estado de conservação. Possuem o mobiliário
básico que atende a contento a família".
O demandante frequenta a APAE, de segunda a sexta-feira.
As despesas, à época do laudo, consistiam em tarifas de água (R$ 94,00) e energia elétrica (R$
199,00), gás (R$ 180,00), alimentação (R$ 900,00), parcela de compra de móveis (R$ 166,00,
restando duas) e farmácia (R$ 65,00).
Foram reportados, ainda, gastos eventuais com saúde, roupas e calçados.
Consta, mais, da pesquisa acostada pelo Ministério Público Federal, extraída do Sistema
Nacional de Pesquisa e Análise - SNP/SINASSPA, que o genitor da parte autora possui dois
veículos registrados em seu nome, um VW GOL STAR 1998, e um VW GOL BX 1984, ambos em
circulação.
No que diz com a elucidação da renda familiar, conquanto tenha sido apontado, no estudo social,
o importe de R$ 2.815,00, como renda bruta, verifica-se, pelos registros do CNIS, que perfaz R$
3.302,61, ao tempo da feitura do laudo social, advindos da aposentadoria por tempo de
contribuição titularizada pelo genitor (R$ 1.284,73) e dos salários da genitora (R$ 1.109,77) e do
irmão do autor (R$ 908,11).
Além disso, o genitor principiou novo vínculo laboral em agosto de 2017, auferindo salário de R$
1.200,00.
Conquanto a genitora do postulante declare que o cônjuge e o filho mais velho não contribuem no
enfrentamento das despesas domésticas, ambos integram o conceito de família, na acepção da
Lei nº 12.435/2011, para efeito de concessão do Benefício de Prestação Continuada, sendo certo
que a propalada separação de corpos é irrelevante, na acepção da Lei nº 12.435/2011, para
efeito de concessão do Benefício de Prestação Continuada, se os consortes convivem sob o
mesmo teto.
Nesse sentido, a jurisprudência desta E. Nona Turma, in verbis (destaquei):
“PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 203, V, CF/88. LEI
N. 8.742/93 E 12.435. NÃO COMPROVADA A MISERABILIDADE. DESPROVIMENTO. ÔNUS
DA SUCUMBÊNCIA. 1. O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência
ou idoso que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida
por sua família. 2. No caso vertente, a parte autora, que contava mais de 65 (sessenta e cinco)
anos de idade na data do ajuizamento da ação, requereu o benefício assistencial por ser idosa .
3. Quanto ao requisito da miserabilidade, o estudo social, realizado em 15/9/2013, revela que a
parte autora reside com seu marido, de 65 anos, e filha, de 41 anos. 4. Para fins de cálculo da
renda, suposta separação de corpos é irrelevante, se marido e mulher convivem sob o mesmo
teto. 5. A renda familiar é constituída da aposentadoria por tempo de contribuição recebida pelo
marido e do benefício assistencial recebido pela filha, ambos no valor de um salário mínimo. 6.
Decerto, em face do disposto no art. 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso, o montante
recebido a título de benefício assistencial e, por analogia, também benefício previdenciário de
valor equivalente a um salário-mínimo, possa ser desconsiderado para efeito de renda, cabe
ressaltar que, no caso concreto, as circunstâncias fáticas não autorizam o afastamento do critério
objetivo exposto na lei, nem a interpretação extensiva do dispositivo supracitado para contemplar
a parte autora com o benefício assistencial. 7. Com efeito, consoante os autos, a família reside
em imóvel próprio, localizado em região urbanizada com saneamento e infraestrutura básica.
Composto de seis cômodos (dois quartos, duas salas, uma cozinha, um banheiro e duas
varandas), todos mobiliados e em excelente estado de conservação. 8. Tem área total de 242
metros quadrados e área construída de 128 metros quadrados. 9. Outrossim, possuem telefone
fixo, e há duas filhas solteiras que não coabitam com a autora e que desenvolvem atividade
laborativa. 10. O estudo social demonstra que os gastos suportados pelo núcleo familiar não
suplantam o montante dos rendimentos advindos dos benefícios previdenciários auferidos. 11.
Por fim, não se pode olvidar da receita esporádica advinda com a venda de bala de coco, e das
conclusões da assistente social: de não estar configurada a situação de vulnerabilidade,
considerando a ausência de relato quanto à situação de privação de necessidades básicas, e as
condições de moradia. 12. Destarte, verifica-se que a família tem acesso aos mínimos sociais e
não desfruta a condição de miserabilidade que enseja a percepção do benefício. 13. Apelação
desprovida. 14. Fica mantida a condenação da parte autora a pagar custas processuais e
honorários de advogado, arbitrados pelo MMº Juízo a quo, mas suspensa a exigibilidade,
segundo a regra do artigo 98, § 3º, do mesmo código, por ser a parte autora beneficiária da
justiça gratuita. Considerando que a apelação foi interposta antes da vigência do Novo CPC, não
incide ao presente caso a regra de seu artigo 85, § 1º, que determina a majoração dos honorários
de advogado em instância recursal.”
(Ap 00061490720164039999, Relator Juiz Convocado Rodrigo Zacharias, e-DJF3 Judicial 1
DATA:29/11/2016)
De qualquer sorte, tão-somente a renda percebida pela genitora já asseguraria, ao autor, renda
per capita superior à metade do salário mínimo, à época, de R$ 937,00.
Destarte, não aflora, dos elementos dos autos, contexto de precariedade financeira tal a justificar
a inclusão da parte autora no elenco de beneficiários da prestação buscada.
E, como se sabe, dentre os escopos do benefício de prestação continuada, não está o de
suplementar renda ou propiciar maior conforto ao interessado. A propósito: AC
00394229420044039999, Relatora Desembargadora Federal Marisa Santos, TRF3, Nona Turma,
DJU 24/11/2005.
Assim, não restou comprovada situação de hipossuficiência, ainda que por outros meios
probantes, como indicado no sobredito paradigma do C. Supremo Tribunal Federal, exarado em
repercussão geral.
Não se descarte a possibilidade de alteração desse cenário, no decorrer do tempo, a ponto de,
eventualmente, justificar-se a concessão do benefício, hipótese em que resta, de todo modo,
franqueado à parte autora deduzir nova postulação quanto à outorga da benesse pleiteada.
Ante o exposto, REJEITO A MATÉRIA PRELIMINAR SUSCITADA PELO ÓRGÃO MINISTERIAL
E, NO MÉRITO, DOU PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, PARA REFORMAR A
SENTENÇA E JULGAR IMPROCEDENTE O PEDIDO.
Independentemente do trânsito em julgado, comunique-se ao INSS para cancelamento do
benefício implantado por força da tutela antecipada concedida na sentença.
Condeno a parte autora em honorários advocatícios fixados em 10% do valor atualizado da
causa, observado o disposto no art. 98, § 3º, do Código de Processo Civil, que manteve a
sistemática da Lei n. 1.060/50, por ser beneficiária da justiça gratuita.
É como voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL. NÃO CABIMENTO. ART. 496,
§ 3º, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART.
203, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E LEI Nº 8.742/1993. REQUISITOS NÃO
PREENCHIDOS. BENEFÍCIO INDEVIDO.
- Ahipótese em exame não excede os 1.000 salários mínimos, sendo incabível a remessa oficial,
nos termos do art. 496, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil.
- Pedido de suspensão do feito, por suposta necessidade de regularização processual da parte
autora, afastado, visto que não há comprovação, nos autos, da incapacidade civil deste.
- Atrelam-se, cumulativamente, à concessão do benefício de prestação continuada, o implemento
de requisito etário ou a detecção de deficiência, demonstrada por exame pericial, e a verificação
da ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da benesse, ou de tê-
la suprida pela família.
- Na linha da jurisprudência desta E. Nona Turma, a propalada separação de corpos é irrelevante,
para fins de concessão do Benefício de Prestação Continuada, se os consortes convivem sob o
mesmo teto.
- Não comprovada situação de hipossuficiência, de rigor o indeferimento do benefício.
- Honorários advocatícios fixados em 10% do valor atualizado da causa, observado o disposto no
art. 98, § 3º, do Código de Processo Civil,que manteve a sistemática da Lei n. 1.060/50, por ser a
parte autora beneficiária da justiça gratuita.
- Apelação do INSS provida. Sentença reformada para julgar improcedente o pedido. Tutela
antecipada de mérito revogada. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação do INSS, para reformar a sentença e julgar
improcedente o pedido, revogando a tutela antecipada de mérito, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
