Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5001471-14.2018.4.03.6111
Relator(a)
Juiz Federal Convocado VANESSA VIEIRA DE MELLO
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
05/03/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 09/03/2020
Ementa
E M E N T A
CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL. NÃO CABIMENTO. ART. 496,
§ 3º, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART.
203, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E LEI Nº 8.742/1993. REQUISITOS NÃO
PREENCHIDOS. BENEFÍCIO INDEVIDO.
- A hipótese em exame não excede os 1.000 salários mínimos, sendo incabível a remessa oficial,
nos termos do art. 496, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil.
- Atrelam-se, cumulativamente, à concessão do benefício de prestação continuada, o implemento
de requisito etário ou a detecção de deficiência, demonstrada por exame pericial, e a verificação
da ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da benesse, ou de tê-
la suprida pela família.
- Não comprovada situação de hipossuficiência, de rigor o indeferimento do benefício.
- Apelação do INSS provida. Sentença reformada para julgar improcedente o pedido. Tutela
antecipada de mérito revogada.
- Suspensão do feito no que tange à possibilidade de devolução dos valores recebidos a título da
tutela antecipada concedida na sentença, no aguardo do desfecho dos recursos especiais
repetitivos 1.734.627/SP, 1.734.641/SP, 1.734.647/SP, 1.734.656/SP, 1.734.685/SP e
1.734.698/SP.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001471-14.2018.4.03.6111
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA VANESSA MELLO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: GENI MORILHA DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: DORILU SIRLEI SILVA GOMES - SP174180-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001471-14.2018.4.03.6111
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA VANESSA MELLO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: GENI MORILHA DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: DORILU SIRLEI SILVA GOMES - SP174180-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso de apelação, interposto pelo INSS, em face da r. sentença, não submetida ao
reexame necessário, que julgou procedente o pedido deduzido na inicial, condenando a Autarquia
Previdenciária a conceder, à parte autora, o benefício assistencial ao idoso, desde a data de
entrada do requerimento administrativo, em 27/09/2016, com atualização monetária de acordo
com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal e verba
honorária arbitrada em 10% do valor da condenação, incidente sobre as parcelas vencidas até a
sentença, nos termos da Súmula nº 111 do c. Superior Tribunal de Justiça, antecipados os efeitos
da tutela de mérito.
Postulao INSS, preambularmente, a recepção do apelo no duplo efeito. No mérito, pretende que
seja reformado o julgado, sustentando, em síntese, a ausência de comprovação de
miserabilidade. Requer, ainda, a restituição dos valores recebidos a título de antecipação de
tutela. Suscita, por fim, o prequestionamento legal para efeito de interposição de recursos.
Decorrido, “in albis”, o prazo para as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
O Ministério Público Federal ofertou parecer. Opinoupelo provimento do recurso deapelação.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001471-14.2018.4.03.6111
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA VANESSA MELLO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: GENI MORILHA DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: DORILU SIRLEI SILVA GOMES - SP174180-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Afigura-se correta a não submissão da r. sentença à remessa oficial.
De fato, o art. 496, § 3º, inciso I do Código de Processo Civil atual, que entrou em vigor em 18 de
março de 2016, dispõe que a sentença não será submetida ao reexame necessário quando a
condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a 1.000
(mil) salários mínimos, em desfavor da União ou das respectivas autarquias e fundações de
direito público.
No caso dos autos, considero as datas do termo inicial do benefício e da prolação da sentença,
quando houve a antecipação dos efeitos da tutela, em 14/07/2017 (doc. 94389000). Atenho-me
ao valor da benesse, de um salário mínimo. Verifico que a hipótese em exame não excede os mil
salários mínimos.
Não sendo, pois, o caso de submeter o decisum de primeiro grau à remessa oficial, passo à
análise do recurso em seus exatos limites, uma vez cumpridos os requisitos de admissibilidade
previstos no Código de Processo Civil atual.
Previsto no art. 203, caput, da Constituição Federal e disciplinado pela Lei nº 8.742/1993, de
natureza assistencial e não previdenciária, o benefício de prestação continuada tem sua
concessão desvinculada do cumprimento dos quesitos de carência e de qualidade de segurado,
atrelando-se, cumulativamente, ao implemento de requisito etário ou à detecção de deficiência,
nos termos do art. 20, §2º, da Lei n° 8.742/93, demonstrada por exame pericial; à verificação da
ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da benesse, ou de tê-lo
suprido pela família; e, originalmente, à constatação de renda mensal per capita não superior a ¼
(um quarto) do salário mínimo. Recorde-se, a este passo, da sucessiva redução da idade mínima,
primeiramente de 70 para 67 anos, pelo art. 1º da Lei nº 9.720/98 e, ao depois, para 65 anos,
conforme art. 34 da Lei nº 10.741/ 2003.
No que diz respeito ao critério da deficiência, as sucessivas alterações legislativas ocorridas na
redação do § 2º, do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social demonstram a evidente
evolução na sua conceituação.
Em sua redação originária, a Lei 8.742/1993 definia a pessoa portadora de deficiência, para efeito
de concessão do benefício assistencial, aquela incapacitada para a vida independente e para o
trabalho.
Posteriormente, a Lei n. 12.435/2011 promoveu modificação ao dispositivo legal, ampliando o
conceito de deficiência, com base no Decreto n. 6.949/2009, que promulgou a Convenção
Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
O § 2º da art. 20 da Lei n. 8.742 passou então a vigorar com a seguinte redação:
"Art. 20
(...)
§ 2º - para efeito de concessão deste benefício, considera-se:
I - pessoa com deficiência, aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir
sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas.
II - impedimentos de longo prazo: aqueles que incapacitam a pessoa com deficiência para a vida
independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos."
Vê-se, portanto, que ao fixar o entendimento da expressão "impedimentos de longo prazo", a Lei
n. 12.435/2011 optou por restringir a concessão do benefício exclusivamente às pessoas com
deficiência que apresentem incapacidade para a vida independente e para o trabalho pelo prazo
mínimo de 2 (dois) anos.
Atualmente, o dispositivo em exame encontra-se vigendo com a redação conferida pelo Estatuto
da Pessoa com Deficiência, Lei n. 13.146/2015, a qual explicitou a definição legal de pessoa com
deficiência:
"Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com
deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou
sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e
efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas."
De se registrar que o § 10 do mesmo dispositivo, incluído pela Lei n. 12.470/2011, considera de
longo prazo o impedimento cujos efeitos perduram pelo prazo mínimo de 02 (dois) anos.
Acerca do derradeiro pressuposto, o C. STF, no âmbito da Reclamação nº 4374 e dos Recursos
Extraordinários nºs. 567985 e 580963, submetidos à sistemática da repercussão geral, reputou
defasado esse método aritmético de aferição de contexto de miserabilidade, suplantando, assim,
o que outrora restou decidido na ADI 1.232-DF, ajuizada pelo Procurador-Geral da República e
em cujo âmbito se declarara a constitucionalidade do §3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93. A
motivação empregada pela Excelsa Corte, no RE nº 580963, reside no fato de terem sido
"editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para concessão de outros benefícios
assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que
instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa
Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a municípios
que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas".
À vista disso, a mensuração da hipossuficiência não mais se restringe ao parâmetro da renda
familiar, devendo, sim, aflorar da análise desse requisito e das demais circunstâncias concretas
de cada caso, na linha do que já preconizava a jurisprudência majoritária, no sentido de que a
diretiva do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93 não consistiria em singular meio para se verificar a
condição de miserabilidade preceituada na Carta Magna, cuidando-se, tão-apenas, de critério
objetivo mínimo, a revelar a impossibilidade de subsistência do portador de deficiência e do idoso,
não empecendo a utilização, pelo julgador, de outros fatores igualmente capazes de denotar a
condição de precariedade financeira da parte autora. Veja-se, a exemplo, STJ: REsp nº
314264/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Félix Fischer, j. 15/05/2001, v.u., DJ 18/06/2001, p. 185;
EDcl no AgRg no REsp 658705/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Felix Fischer, j. 08/03/2005, v.u., DJ
04/04/2005, p. 342; REsp 308711/SP, Sexta Turma, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 19/09/2002,
v.u., DJ 10/03/2003, p. 323.
Em plena sintonia com o acima esposado, o c. STJ, quando da apreciação do RESP n.
1.112.557/MG, acentuou que o art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93 comporta exegese tendente ao
amparo do cidadão vulnerável, donde concluir-se que a delimitação do valor de renda familiar per
capita não pode ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado.
Em substituição à diretriz inicialmente estampada na lei, a jurisprudência vem evoluindo para
eleger a renda mensal familiar per capita inferior à metade do salário mínimo como indicativo de
situação de precariedade financeira, tendo em conta que outros programas sociais, dentre eles o
bolsa família, o Programa Nacional de Acesso à Alimentação e o bolsa escola, instituídos pelas
Leis nºs 10.836/04, 10.689/03 e 10.219/01, nessa ordem, contemplam esse patamar.
Consultem-se arestos da Terceira Seção nesse diapasão:
“AGRAVO LEGAL EM EMBARGOS INFRINGENTES. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL À PESSOA IDOSA. PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO
DO BENEFÍCIO. AGRAVO IMPROVIDO (...) 3 - Da análise do sistema CNIS/DATAPREV,
verifica-se que o filho da autora possui apenas pequenos vínculos de trabalho, na maioria inferior
a 03 meses, sendo que na maior parte do tempo esteve desempregado. Desse modo, mesmo
incluindo a aposentadoria do marido da autora, a renda familiar per capita corresponde a pouco
mais de R$ 300,00, ou seja, inferior a meio salário mínimo. 4 - Restou demonstrada, quantum
satis, no caso em comento, situação de miserabilidade, prevista no art. 20, § 3º, da Lei
8.742/1993, a ensejar a concessão do benefício assistencial. 5 - Agravo improvido." (EI
00072617120124036112, Relator Desembargador Federal Toru Yamamoto, TRF3, j. 22/10/2015,
e-DJF3 05/11/2015)
“PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (LOAS). EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM
AGRAVO LEGAL. CARÁTER INFRINGENTE. IMPOSSIBILIDADE. CONTRADIÇÃO
INEXISTENTE. (...)- No caso em exame, não há omissão a ser sanada, sendo o benefício
indeferido pelo fato da renda familiar "per capita" ser superior a 1/2 salário mínimo. (...) 5-
Embargos de declaração rejeitados." (AR 00082598120084030000, Relator Juiz Convocado Silva
Neto, TRF3, j. 25/09/2014, e-DJF3 08/10/2014)
Nesse exercício de sopesamento do conjunto probatório, importa averiguar a necessidade, na
precisão da renda familiar, de abatimento do benefício de valor mínimo percebido por idoso ou
deficiente, pertencente à unidade familiar. Nesta quadra, há, inclusive, precedente do egrégio
STF, no julgamento do RE nº 580.963/PR, disponibilizado no DJe 14.11.2013, submetido à
sistemática da repercussão geral, em que se consagrou a inconstitucionalidade por omissão do
art. 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso, considerando a "inexistência de justificativa
plausível para discriminação dos portadores de deficiência em relação aos idosos, bem como dos
idosos beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de benefícios
previdenciários no valor de até um salário mínimo.".
Quanto à questão da composição da renda familiar per capita, o C. STJ, no julgamento do RESP
n. 1.355.052/SP, exarado na sistemática dos recursos representativos de controvérsia, assentou,
no mesmo sentido, a aplicação analógica do parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso, com
vistas à exclusão do benefício previdenciário recebido por idoso ou por deficiente, no valor de um
salário mínimo, no cálculo da renda per capita prevista no art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93
De se realçar que a jurisprudência - antes, mesmo, do aludido recurso repetitivo - já se firmara no
sentido da exclusão de qualquer benefício de valor mínimo recebido por idoso com mais de 65
anos, por analogia ao disposto no art. 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/2003, preceito esse
que, na origem, limitava-se a autorizar a desconsideração de benefício de prestação continuada
percebido pelos referidos idosos.
Note-se que os precedentes não autorizam o descarte do benefício de valor mínimo recebido por
qualquer idoso, assim compreendidas pessoas com idade superior a 60 anos, mas, sim, pelos
idosos com idade superior a 65 anos.
Essa é a inteligência reinante na jurisprudência. A propósito, os seguintes julgados: STJ, AGP
8479, Rel. Des. Convocada Marilza Maynard, 3ª Seção, DJE 03/02/2014; STJ, AGP 8609, Rel.
Min. Assusete Magalhães, 3ª Seção, DJE 25/11/2013; STJ, AGRESP 1178377, Rel. Min. Maria
Thereza de Assis Moura, 6ª Turma, DJE 19/3/2012. E da atenta leitura da íntegra do acórdão do
recurso representativo de controvérsia - nº 1.355.052/SP - chega-se à idêntica conclusão.
Outro dado sobremodo relevante diz respeito à acepção de família, para a finalidade da Lei nº
8.742/1993, cujo conceito experimentou modificação ao longo do tempo. Num primeiro lanço, o
art. 20, § 1º, do citado diploma nomeava família "a unidade mononuclear, vivendo sob o mesmo
teto, cuja economia é mantida pela contribuição de seus integrantes". Ao depois, a Lei nº 9.720,
em 30/11/98, fruto de conversão da Medida Provisória nº 1.473-34, de 11/08/97, passou a
compreendê-la como o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei nº 8.213/91, dês que
conviventes sob mesmo teto. Finalmente, na vigência da Lei nº 12.435/2011, é havida como o
núcleo integrado pelo requerente, cônjuge ou companheiro, os pais, ou, na ausência destes, pela
madrasta ou padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados,
todos, também, sob o mesmo teto.
SITUAÇÃO DOS AUTOS
No caso vertente, verifica-se, pelo documento 4888302, págs. 1/4, que a parte autora, nascida em
04/08/1951, possuía 65 anos de idade em 27/09/2016, data de entrada do requerimento aviado
na senda administrativa, restando, pois, implementado o requisito etário.
Avançando, então, na análise da hipossuficiência, importa examinar o mandado de constatação
coligido ao doc. 71302907, págs. 26/48, produzido em 28/11/2016.
Segundo o auto adrede confeccionado, a autora reside no município de Marília/SP, com o
cônjuge, de 70 anos, idade correspondente à data do estudo socioeconômico.
Moram em casa própria, edificada em alvenaria, em bom estado geral, interna e externamente,
composta por duas salas, cozinha, dois quartos, um deles, suíte, mais um banheiro e lavanderia.
O imóvel possui uma edícula, atualmente, desocupada.
Transcrevo excerto do auto de constatação, sobre as condições de moradia:
“- Observações acerca do imóvel: Trata-se de uma ampla, confortável e bem acabada construção
de alvenaria, com área edificada estimada em 180,0m2, incluindo a edícula, piso cerâmico e laje
no teto, em todos os cômodos. As paredes de ambos os banheiros contam com revestimento
cerâmico, esta apenas parcial na cozinha, e o quarto do casal é provido de armário embutido
(planejado). Já a lavanderia, anexa à cozinha, tal qual o restante da casa, possui piso cerâmico,
embora seja coberta com telhas de amianto, sem forro ou laje. Os dois banheiros são servidos de
Box de material acrílico.”
A corroborar as boas condições de habitabilidade, há relatório fotográfico no doc. 71302907, pág.
34/48, que confirma a descrição elaborada pelo meirinho.
Na garagem do imóvel, havia dois veículos, tendo sido assegurado, pelo consorte da proponente,
que “são do filho e da esposa dele”.
As despesas, à época do laudo, consistiam em tarifas de água (R$ 25,00) e energia elétrica (R$
80,00), gás (R$ 60,00, a cada 45 dias), IPTU (R$ 33,36), telefone e celular (R$ 39,00),
alimentação (R$ 400,00) e medicamentos para tratamento de saúde da vindicante (R$ 4,07),
portadora de câncer na virilha e depressão.
Os filhos doam vestuário, ocasionalmente, ao casal.
Os ganhos da família advém da aposentadoria de valor mínimo titularizada pelo consorte, à
época, de R$ 880,00.
A esta altura, cabe lembrar que, na contabilização da renda familiar, torna-se imperiosa a
exclusão do mencionado benefício, em aplicação analógica ao art. 34 do Estatuto do Idoso, nos
moldes do citado precedente do Excelso Pretório, de modo que não resta, como passível de
consideração jurídica, qualquer valor percebido pela proponente.
Não obstante, os elementos de convicção coligidos aos autos propiciam intuir estar a requerente
alijada do rol de beneficiários da verba reclamada, até mesmo porque as despesas informadas
mostram-se inferiores à renda total declarada.
Reforça mais essa conclusão, a constatação do oficial de justiça avaliador federal, no sentido de
que a autora tem a sua subsistência provida pela renda proveniente da aposentadoria do cônjuge,
como segue (destaques no original):
“O cenário socioeconômico que exsurge da constatação fática e das informações coligidas no
local traduz um quadro de inegável renda familiar baixa, de parcos recursos – situação vivenciada
pela maioria esmagadora da população brasileira -, mas não de miséria ou hipossuficiência
econômica.
O núcleo familiar é reduzido, formado só pela autora e seu marido, e os dispêndios domésticos
parecem caber, até com certa folga, dentro do orçamento do casal. Logo, a requerente é provida
em suas necessidades mais básicas pela renda adveniente da aposentadoria de seu marido,
garantindo-se-lhe, assim, o mínimo existencial, notadamente alimentação e saúde.
O gasto com o medicamento de que ela necessita para o combate à depressão, de uso contínuo,
é irrisório, além do que não há despesas com tratamento médico especializado ou exames
médicos.
Já as condições de moradia são das melhores. A casa é ampla e muito confortável, contando
ainda em favor da pleiteante o fato de ser ela a dona do imóvel.”
E, como se sabe, dentre os escopos do benefício de prestação continuada, não está o de
suplementar renda ou propiciar maior conforto ao interessado. A propósito: AC
00394229420044039999, Relatora Desembargadora Federal Marisa Santos, TRF3, Nona Turma,
DJU 24/11/2005.
Assim, não restou comprovada situação de hipossuficiência, ainda que por outros meios
probantes, como indicado no sobredito paradigma do C. Supremo Tribunal Federal, exarado em
repercussão geral, razão pela qual é indevido o benefício, inclusive, em sede de antecipação,pelo
magistrado sentenciante, dos efeitos da tutela, que ora revogo.
No mais, debate-se, no apelo autárquico, a possibilidade de devolução dos valores recebidos a
esse título.
Porém, a apreciação da aludida questão encontra-se suspensa, por força do acórdão unânime de
14/11/2018, prolatado na Questão de Ordem nos REsps 1.734.627/SP, 1.734.641/SP,
1.734.647/SP, 1.734.656/SP, 1.734.685/SP e 1.734.698/SP, na qual a Primeira Seção do colendo
Superior Tribunal de Justiça decidiu, com fulcro no art. 927, § 4º, do Código de Processo Civil, e
arts. 256-S e seguintes do Regimento Interno daquela E. Corte, com a redação dada pela
Emenda Regimental nº 24, de 28/09/2016, revisitar o entendimento consolidado em enunciado de
tese repetitiva, alusivo ao Tema 692, assim delimitado: "a reforma da decisão que antecipa a
tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos".
Na oportunidade, o Relator, Ministro Og Fernandes, dentre outras providências, determinou "a
suspensão do processamento de todos os processos ainda sem trânsito em julgado, individuais
ou coletivos, que versem acerca da questão submetida à revisão pertinente ao Tema n. 692/STJ
e tramitem no território nacional, com a ressalva de incidentes, questões e tutelas, que sejam
interpostas a título geral de provimentos de urgência nos processos objeto do sobrestamento.".
Desse modo, tendo em conta a submissão da controvérsia à hipótese de suspensão da marcha
processual, outra solução não colhe, na situação específica aqui versada, senão o sobrestamento
do processo, quanto a este ponto, conforme posicionamento já adotado pela Terceira Seção
deste E. Tribunal, em situação parelha (ação rescisória nº 0015337-82.2015.4.03.0000, Relator
Desembargador Federal Gilberto Jordan, Relatora para o acórdão Desembargadora Federal Ana
Pezarini, D. E. 09/10/2018).
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, para reformar a sentença e julgar
improcedente o pedido, com o consequente cancelamento do benefício implantado por força da
tutela antecipada concedida na sentença, SUSPENDENDO-SE O FEITO no que tange à
possibilidade de devolução dos valores recebidos a esse título, no aguardo do desfecho dos
recursos especiais repetitivos 1.734.627/SP, 1.734.641/SP, 1.734.647/SP, 1.734.656/SP,
1.734.685/SP e 1.734.698/SP.
Independentemente do trânsito em julgado, oficie-se ao INSS para cancelamento do beneplácito,
na forma da fundamentação.
É como voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL. NÃO CABIMENTO. ART. 496,
§ 3º, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART.
203, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E LEI Nº 8.742/1993. REQUISITOS NÃO
PREENCHIDOS. BENEFÍCIO INDEVIDO.
- A hipótese em exame não excede os 1.000 salários mínimos, sendo incabível a remessa oficial,
nos termos do art. 496, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil.
- Atrelam-se, cumulativamente, à concessão do benefício de prestação continuada, o implemento
de requisito etário ou a detecção de deficiência, demonstrada por exame pericial, e a verificação
da ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da benesse, ou de tê-
la suprida pela família.
- Não comprovada situação de hipossuficiência, de rigor o indeferimento do benefício.
- Apelação do INSS provida. Sentença reformada para julgar improcedente o pedido. Tutela
antecipada de mérito revogada.
- Suspensão do feito no que tange à possibilidade de devolução dos valores recebidos a título da
tutela antecipada concedida na sentença, no aguardo do desfecho dos recursos especiais
repetitivos 1.734.627/SP, 1.734.641/SP, 1.734.647/SP, 1.734.656/SP, 1.734.685/SP e
1.734.698/SP. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação do INSS, para reformar a sentença e julgar
improcedente o pedido, com o consequente cancelamento do benefício implantado por força da
tutela antecipada concedida na sentença, suspendendo-se o feito no que tange à possibilidade de
devolução dos valores recebidos a esse título, no aguardo do desfecho dos recursos especiais
repetitivos 1.734.627/SP, 1.734.641/SP, 1.734.647/SP, 1.734.656/SP, 1.734.685/SP e
1.734.698/SP, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
