
| D.E. Publicado em 23/11/2018 |
EMENTA
| CONSTITUCIONAL. PRELIMINARES PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. TUTELA ANTECIPADA. EFEITO SUSPENSIVO. IRREVERSIBILIDADE. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. REQUISITOS LEGAIS COMPROVADOS. LEI 8.742/93, ART. 20, §3º. DEFICIÊNCIA. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO E. STF. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. COMPROVAÇÃO POR OUTROS MEIOS. TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. |
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar as preliminares arguidas pelo réu e, no mérito, não conhecer de parte do seu apelo e, na parte conhecida, negar-lhe provimento, bem como negar provimento à remessa oficial e dar parcial provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0019001-92.2018.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Sérgio Nascimento (Relator):Trata-se de remessa oficial e apelações de sentença pela qual foi julgado procedente pedido formulado em ação ordinária, para condenar o INSS à concessão de benefício assistencial previsto no art. 203, V, da Constituição da República, equivalente a um salário mínimo mensal, desde a data da citação. Deferida a antecipação dos efeitos da tutela, determinando-se a imediata implantação do benefício em favor do demandante. As parcelas vencidas serão apuradas em liquidação de sentença, observando-se a prescrição quinquenal. A correção monetária dos valores vencidos será pela TR até 25.03.2015 e, a partir desta data, segundo o IPCA-E, considerando a modulação dos efeitos dada às ADINS 3457 e 4425. No tocante aos juros de mora, mantém-se a aplicação do que prevê a Lei 11.960/09, para os débitos da autarquia, no patamar dos juros das cadernetas de poupança, considerando que as ADINS não alcançaram o que prevê a referida Lei. Pela sucumbência, o réu foi condenado a pagar honorários advocatícios no percentual mínimo previsto nos incisos do art. 85, §3º do Código de Processo Civil, a ser apurado quando da liquidação do julgado (art. 85, §4º, inc. II do CPC), observada a Súmula nº 111 do STJ. O INSS é isento de custas (Lei nº 8.620/93).
Em suas razões recursais, requer a parte autora seja o termo inicial do benefício fixado desde o ajuizamento da ação, em 23.08.2013, tendo em vista que a citação ocorreu muito tardia, após quase um ano e meio do ajuizamento da ação, sustentando que naquela época já preenchia os requisitos necessários para a concessão do benefício. Requer, ainda, sejam fixados juros de mora de 1% ao mês nos termos do art. 406 do CC e 161, parágrafo 1º do CTN, bem como sejam fixados os índices de correção monetária de acordo com o Manual de Cálculos da Justiça Federal - Lei nº 6.899/81 desde o termo inicial fixado e, por fim, sejam arbitrados honorários advocatícios de 15% sobre o valor da liquidação e ou majorado em razão do recurso de apelação do INSS.
O réu, a seu turno, apela requerendo, preliminarmente, seja dado efeito suspensivo ao presente recurso e, ao final, seja revogada a tutela antecipada concedida, principalmente pela ausência da reversibilidade. Ainda, preliminarmente, sustenta a ausência de interesse de agir do demandante, em razão de não ter requerido previamente o benefício na esfera administrativa, extinguindo-se o feito sem resolução do mérito. No mérito, ad cautelam, requer desde já o reconhecimento da prescrição em relação a todas as parcelas eventualmente devidas e vencidas antes do quinquênio que antecedeu ao ajuizamento da presente ação. Sustenta, ainda, a ausência de miserabilidade, estando o autor inserido em unidade familiar que se afasta da condição de público alvo da assistência social do Estado. Subsidiariamente, requer a aplicação do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, quanto aos juros de mora e à correção monetária. Por fim, suscita o prequestionamento de toda a matéria ventilada nos autos, para fins recursais.
Com contrarrazões da parte autora, os autos vieram a esta Corte.
Noticiada a implantação do benefício à fl. 153.
O d. representante do Ministério Público Federal opinou pelo não conhecimento da remessa necessária, pelo conhecimento e provimento do recurso de apelação interposto pela parte autora, para conceder o benefício assistencial desde o ajuizamento da presente demanda (21/08/2013) e, por fim, pelo conhecimento e não provimento do recurso de apelação interposto pelo INSS (fl. 157/163).
É o relatório.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0019001-92.2018.4.03.9999/SP
VOTO
Recebo a apelação interposta pela parte autora e pelo INSS, na forma do artigo 1.011 do CPC de 2015.
Da remessa oficial
Aplica-se ao caso o Enunciado da Súmula 490 do E. STJ, que assim dispõe:
A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas.
Da tutela antecipada
Cumpre assinalar que o entendimento de que não é possível a antecipação de tutela em face da Fazenda Pública, equiparada no presente feito ao órgão previdenciário, está ultrapassado, porquanto a antecipação do provimento não importa em pagamento de parcelas vencidas, o que estaria sujeito ao regime de precatórios. A implantação provisória ou definitiva do benefício, tanto previdenciário como assistencial, não está sujeita à disciplina do artigo 100 da Constituição da República, não havendo, portanto, falar-se em impossibilidade de implantação do benefício perseguido sem o trânsito em julgado da sentença.
Da preliminar de falta de interesse de agir
Malgrado não tenha havido o prévio requerimento do benefício na via administrativa, o feito foi sentenciado, com análise de mérito concluindo pela procedência do pedido, encontrando-se o benefício implantado por força da tutela antecipada concedida (dados do CNIS em anexo), razão pela qual não se mostra mais razoável tal exigência.
Nesse sentido, trago à colação o seguinte julgado:
Ademais, tendo o réu se manifestado em relação ao mérito em suas razões recursais, considera-se caracterizado o interesse em agir, uma vez que houve resistência ao pedido.
Do mérito.
O benefício pretendido pela parte autora está previsto no artigo 203, V, da Constituição da República, que dispõe:
A regulamentação legislativa do dispositivo constitucional restou materializada com o advento da Lei 8.742/93, que dispõe na redação atualizada do caput do seu artigo 20:
Assim, para fazer jus ao amparo constitucional, o postulante deve ser portador de deficiência ou ser idoso (65 anos ou mais) e ser incapaz de prover a própria manutenção ou tê-la provida por sua família.
Quanto ao requisito relativo à deficiência, a Lei 8.742/93, que regulamentou a concessão do dispositivo constitucional acima, dispunha no § 2º do seu artigo 20, em sua redação original:
Nesse ponto, cumpre salientar que o texto constitucional garante o pagamento de um salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência, sem exigir, como fez a norma regulamentadora, em sua redação original, a existência de incapacidade para a vida independente e para o trabalho.
Nota-se, portanto, que ao definir os contornos da expressão pessoa portadora de deficiência constante do dispositivo constitucional, a norma infraconstitucional reduziu a sua abrangência, limitando o seu alcance aos casos em que a deficiência é geradora de incapacidade laborativa.
Todavia, observa-se que, em 10.07.2008, o Congresso Nacional promulgou o Decreto Legislativo 186/2008, aprovando, pelo rito previsto no artigo 5º, § 3º, da Constituição da República, o texto da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova Iorque, em 30 de março de 2007, e conferindo à referida Convenção status normativo equivalente ao das emendas constitucionais.
A Convenção, aprovada pelo Decreto Legislativo 186/2008, já no seu Artigo 1, cuidou de tratar do conceito de "pessoa com deficiência", definição ora constitucionalizada pela adoção do rito do artigo 5º, § 3º, da Carta, a saber:
Em coerência à alteração promovida em sede constitucional, o artigo 20, § 2º, da Lei 8.742/93, viria a ser alterado pela Lei 12.470/11, passando a reproduzir em seu texto a definição de "pessoa com deficiência" constante da norma superior. Dispõe a LOAS, em sua redação atualizada:
Não há dúvida, portanto, de que o conceito de 'deficiência' atualmente albergado é mais extenso do que aquele outrora estabelecido, vez que considera como tal qualquer impedimento, inclusive de natureza sensorial, que tenha potencialidade para a obstrução da participação social do indivíduo em condições de igualdade.
Coerente com esta nova definição de 'deficiência' para fins de concessão do benefício constitucional, a mencionada Lei 12.470/11 acrescentou à Lei 8.742/93 o artigo 21-A, com a seguinte redação:
Verifica-se, portanto, que a legislação ordinária, em deferência às alterações promovidas em sede constitucional, não apenas deixou de identificar os conceitos de 'incapacidade laborativa' e 'deficiência', como passou a autorizar expressamente que a pessoa com deficiência elegível à concessão do amparo assistencial venha a exercer atividade laborativa - seja como empregada, seja como microempreendedora - sem que tenha sua condição descaracterizada pelo trabalho, ressalvada tão somente a suspensão do benefício enquanto este for exercido.
Observados estes parâmetros para a aferição da deficiência, no caso dos autos, a perícia médica realizada em 10.12.2015 (fl. 63/68), atesta que o autor padece de quadro de poliartralgia e senilidade muscular, patologias crônicas não passíveis de recuperação total e hipertensão arterial, passível de controle clínico, encontrando-se total e permanentemente incapacitado para o desempenho de qualquer atividade profissional.
Ademais, o requerente, nascido em 07.05.1951, completou 65 anos no curso do processo.
Há que se reconhecer, portanto, que a parte autora fará jus ao benefício assistencial, caso preencha o requisito socioeconômico, haja vista possuir 'impedimentos de longo prazo', com potencialidade para 'obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade, em igualdade de condições com outras pessoas'.
No que toca ao requisito socioeconômico, cumpre observar que o §3º do artigo 20 da Lei 8.742/93 estabeleceu para a sua aferição o critério de renda familiar per capita, observado o limite de um quarto do salário mínimo, que restou mantido na redação dada pela Lei 12.435/11, acima transcrita.
A questão relativa à constitucionalidade do critério de renda per capita não excedente a um quarto do salário mínimo para que se considerasse o idoso ou pessoa com deficiência aptos à concessão do benefício assistencial, foi analisada pelo E. Supremo Tribunal Federal em sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 1.232/DF), a qual foi julgada improcedente, por acórdão que recebeu a seguinte ementa:
Todavia, conquanto reconhecida a constitucionalidade do §3º do artigo 20, da Lei 8.742/93, a jurisprudência evoluiu no sentido de que tal dispositivo estabelecia situação objetiva pela qual se deve presumir pobreza de forma absoluta, mas não impedia o exame de situações subjetivas tendentes a comprovar a condição de miserabilidade do requerente e de sua família. Tal interpretação seria consolidada pelo E. Superior Tribunal de Justiça em recurso especial julgado pela sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil (STJ - REsp. 1.112.557-MG; Terceira Seção; Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho; j. 28.10.2009; DJ 20.11.2009).
O aparente descompasso entre o desenvolvimento da jurisprudência acerca da verificação da miserabilidade dos postulantes ao benefício assistencial e o entendimento assentado por ocasião do julgamento da ADI 1.232-DF levaria a Corte Suprema a voltar ao enfrentamento da questão, após o reconhecimento da existência da sua repercussão geral, no âmbito da Reclamação 4374 - PE, julgada em 18.04.2013.
Naquela ocasião, prevaleceu o entendimento de que "ao longo de vários anos desde a sua promulgação, o §3º do art. 20 da LOAS passou por um processo de inconstitucionalização". Com efeito, as significativas alterações no contexto socioeconômico desde então e o reflexo destas nas políticas públicas de assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios para aferição da miserabilidade previstos na Lei 8.742/93 e aqueles constantes no sistema de proteção social que veio a se consolidar. Verifique-se:
Destarte, é de se reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência é através da própria natureza dos males que a assolam, do seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades. Não há, pois, que se enquadrar todos os indivíduos em um mesmo patamar e entender que somente aqueles que contam com menos de um quarto do salário-mínimo possam fazer jus ao benefício assistencial.
No caso dos autos, o estudo social realizado em 07.03.2017 (fl. 91/92), relata que o autor reside em uma casa alugada composta por 4 cômodos (uma sala pequena, dois quartos e um banheiro), que divide com uma família de 3 pessoas (um casal com filho), que não são seus parentes. Informa que o demandante era vizinho dessa família e que quando ficou sem condições de pagar aluguel essa família o acolheu. Relata, ainda, que os pais do autor já faleceram e que ele não tem contato com os irmãos, dependendo da família que o acolheu, que também passa por dificuldades financeiras. Conclui a assistente social que o requerente não possui condições financeiras para manter sua sobrevivência.
Portanto, o conjunto probatório existente nos autos demonstra que o autor preenche o requisito referente à deficiência e comprovou sua hipossuficiência econômica, fazendo jus à concessão do benefício assistencial.
O termo inicial do benefício deve ser mantido na data da citação (12.03.2015; fl. 26), momento em que o réu tomou conhecimento da pretensão do autor.
A correção monetária e os juros de mora deverão ser calculados de acordo com a lei de regência, observando-se as teses firmadas pelo E.STF no julgamento do RE 870.947, realizado em 20.09.2017, podendo-se aplicar o critério de correção monetária previsto no manual de orientação de procedimentos para os cálculos na Justiça Federal, com as alterações da resolução 267 /2013, do E. CJF, que se encontra em harmonia com as referidas teses. Não conheço do apelo do réu no que tange aos juros de mora, eis que a sentença dispôs no mesmo sentido da pretensão.
Havendo recurso de ambas as partes, mantidos os honorários advocatícios fixados na forma da sentença.
A autarquia previdenciária está isenta de custas e emolumentos, nos termos do art. 4º, I, da Lei 9.289/96, do art. 24-A da MP 2.180-35/01, e do art. 8º, § 1º da Lei 8.620/92.
Diante do exposto, rejeito as preliminares arguidas pelo réu e, no mérito, não conheço de parte do seu apelo e, na parte conhecida, nego-lhe provimento, bem como nego provimento à remessa oficial. Dou parcial provimento à apelação da parte autora para que as verbas acessórias sejam aplicadas na forma acima estabelecida.
Os valores em atraso serão resolvidos em sede de liquidação, compensando-se aqueles já pagos por força da antecipação dos efeitos da tutela.
É como voto.
SERGIO NASCIMENTO
Desembargador Federal Relator
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