
| D.E. Publicado em 24/10/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar de prescrição e, no mérito, negar provimento à apelação do INSS, e de ofício, determinar que sobre os valores atrasados devidos incidirão correção monetária e juros moratórios nos termos do Manual de Orientação de Procedimento para os Cálculos da Justiça Federal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000959-78.2007.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR JUIZ FEDERAL CONVOCADO CLAUDIO SANTOS (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação ajuizada por MARIA HELENA DE FREITAS SILVEIRA, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, mediante reconhecimento de período laborado em atividade rural.
A r. sentença de fls. 85/89 julgou procedente o pedido inicial, e condenou a autarquia no pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre os valor das parcelas vencidas até a data da decisão proferida, nos termos da Súmula 111 do STJ.
Em razões recursais de fls. 91/95, o INSS alega, preliminarmente, a ocorrência do prazo prescricional de vinte anos, previsto no artigo 177 do Código Civil de 2016. No mérito, pugna pela reforma da sentença, ao fundamento da inexistência de início de prova material, pois o documento apresentado não é contemporâneo aos fatos alegados, sendo também inapto para a prova de todo o período de trabalho defendido. Sustenta, ainda, que o reconhecimento de qualquer atividade agrícola está condicionado ao recolhimento de contribuições. Por fim, prequestiona a matéria.
A parte autora apresentou contrarrazões às fls. 98/101.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXMO. SENHOR JUIZ CONVOCADO CLAUDIO SANTOS (RELATOR):
Em primeiro lugar, rejeito a preliminar de prescrição.
Sustenta o INSS a impossibilidade de reconhecimento do tempo de serviço de trabalho rural anterior ao ano de 1980, tendo em vista a incidência do prazo vintenário previsto no artigo 177 do Código Civil de 1916.
Entretanto, pacificou-se a jurisprudência no sentido de que não incide prescrição quanto ao direito ao benefício, propriamente, porquanto os benefícios decorrentes de leis protetivas e que geram efeitos patrimoniais de natureza alimentar, não prescrevem no seu fundo (AC 68.474-RS, Em. Jur. TFR 37/93). Logo, não há qualquer irregularidade quanto ao pleito de reconhecimento da aposentadoria por tempo de serviço, nos termos como formulado na presente demanda.
Passo ao exame do mérito.
Diz a Autora que trabalhou em atividade rural no período de 1968 até 1985 e que mencionado período não é reconhecido pelo INSS para efeito de concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição.
Tenho provado o tempo de serviço rural alegado na exordial. Com efeito, os documentos juntados pela Autora, corroborados pela prova testemunhal, bem demonstram que exerceu a atividade rural a partir de 1968.
Junta a parte autora: a) cópia de declaração de exercício de atividade rural emitida pelo INSS, emitida com base em fichas e declarações cadastrais dos produtores, ITR e CCIR, na qual consta que a requerente "exerceu atividade rural como "bóia fria", em propriedades" dos Srs. José Castanho de Oliveira e Joaquim Moreira Neto, pelo período de 1968 até 1985; b) cópia de documentos de identidade, CPF, Certificado de Inscrição no Cadastro Rural, cadastros de produtor para fins do ICMS e recibos de entrega de declaração do ITR, todos em nome dos proprietários do sítio que alega trabalhar.
Entendo ser prescindível que a documentação apresentada comprove o desempenho da atividade rurícola ano a ano, visto que há presunção da continuidade do exercício da atividade rural.
Neste sentido, a Súmula nº 14 da Colenda Turma de Uniformização das Decisões das Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais, que, embora dispondo sobre aposentadoria por idade, também é aplicável ao caso dos autos:
Além disso, o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do Resp nº 1.348.633/SP, apreciado em âmbito de recurso representativo de controvérsia repetitiva, assentou a possibilidade de reconhecimento da faina rural em período anterior à data do documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, conforme ementa que segue:
A par destas provas documentais foram ouvidas duas testemunhas (fls. 82/83). Os depoimentos foram convincentes quanto ao trabalho rurícola da Autora na zona rural de Piedade no período questionado.
A depoente VILMA DOS SANTOS (fl. 82) disse que conhece a Autora há muitos anos. Aduziu que trabalharam juntas para o Sr. José Castanho e o Sr. Joaquim, na roça, como diaristas, no ano de 1968. Embora tenham perdido o contato, falou que se encontravam na cidade quando a requerente confirmava que permanecia exercendo a mesma atividade, o que durou até 1985, quando foi para a cidade.
O Sr. MAURO ROLIM DE GOES (fl.83), igualmente, declarou que a Autora trabalhou na roça até 1985 para o Sr. José Castanho e o Sr. Joaquim Moreira Neto. Como seu vizinho, disse que a via trabalhando na lavoura e que ela fazia de tudo. Ela e o seu marido.
Os testemunhos são consentâneos com o depoimento pessoal e documentos apresentados.
Não se trata, portanto, de prova exclusivamente testemunhal, como quer o INSS. Os depoimentos testemunhais estão confirmados por robusta prova documental, não havendo por que sequer discutir a incidência da ressalva do art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91. Aliás, o caso presente enquadra-se, sim, nesse dispositivo, mas na parte em que admite a prova testemunhal "baseada em início de prova material".
A lei processual atribui ao Juiz no nosso sistema judiciário livre convencimento quanto à prova carreada aos autos. Em princípio, penso que poderia essa disposição ser mitigada por dispositivo de igual hierarquia, como é o caso da Lei nº 8.213/91, vedadas constitucionalmente somente as provas obtidas por meios ilícitos (art. 5º, LVI). O livre convencimento e a exigência de início de prova material podem, de certa forma, ser tidos como não excludentes; conjugam-se ambas disposições, que se integram e complementam no sentido de que, havendo o resquício de prova documental, há plena aplicação do princípio do livre convencimento quanto à prova testemunhal.
De outra parte, em sendo impossível a produção da prova documental, não há dúvida que deverá ela ser dispensada, porquanto não se admite que não se tenha como provado o fato se for a prova testemunhal a única disponível. Negar essa possibilidade afrontaria até o princípio do acesso ao Judiciário (art. 5º, XXXV e LIII a LV). Até porque o dispositivo em tela dispensa a exigência se for decorrente de "força maior ou caso fortuito", não podendo a Lei e o Judiciário fechar os olhos à realidade de que no meio rural muitas são as limitações ao próprio segurado quanto a documentos comprobatórios de sua atividade.
Nem se olvide que o sentido da mencionada norma não é o de um fim em si mesma. Não pode ser outra a exigência legal de início de prova documental senão impedir que a prova testemunhal possa ser forjada, o que afrontaria até mesmo ao Judiciário. No caso, o conjunto dá plena convicção de que os testemunhos são idôneos, mais uma vez levando à sua admissão.
Tenho como provada, assim, a atividade rural invocada.
Pelo conjunto, não há a menor dúvida quanto ao efetivo trabalho desde a década de sessenta, nem à permanência até o ano de 1985, quando deixou o trabalho rural e se mudou para a cidade, para trabalhar na mercearia, como alegado, passando a verter contribuições para a Previdência Social. Pede a Autora reconhecimento do início do ano de 1968, quando contava com quinze anos de idade, ao passo que a legislação trabalhista admitia o trabalho a partir dos doze anos (art. 402, CLT), hoje catorze (nova redação da Lei n° 10.097/2000).
Quanto ao termo final, também prospera o pedido formulado, visto que a Autora passou a contribuir em 01.11.1985 para o Regime da Previdência Social, consoante comprovam os extratos do CNIS de fls. 51/54 e também o documento ora anexado.
Tenho como provada, assim, a atividade rural entre 01º de janeiro de 1968 a 31 de outubro de 1985 (véspera do labor com registro), o que soma 17 anos, 9 meses e 31 dias, na condição de trabalhador rural.
Não há impedimento ao reconhecimento desse tempo rural, devendo ser observado apenas o disposto § 2º do art. 55 da Lei nº. 8.213/91, in verbis:
Trata-se, portanto, de expressa disposição legal quanto à possibilidade de reconhecimento do tempo mesmo sem recolhimento. A alteração promovida no dispositivo em questão pela MP nº 1.523-13/97, que obrigava o recolhimento, não foi reeditada após a liminar concedida na ADIn nº 1.664-0 pelo Supremo Tribunal Federal em 13.11.97 (DJU 25.11.97 - p. 61393), que a declarava inconstitucional exatamente porque o rurícola estava antes desobrigado de contribuir.
Todavia, esse tempo de serviço rural não tem efeito quanto à carência, de modo que para esta há de existir contribuição, já que os únicos benefícios devidos ao rurícola independentemente de contribuição são os previstos no art. 142 e no art. 39, inc. I, da LBPS, entre os quais não está a aposentadoria por tempo de serviço ou contribuição.
Aposentadoria por tempo de serviço
A Autora postula a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, a partir do ajuizamento da demanda.
A aposentadoria por tempo de serviço, diz o art. 52 e o art. 53 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991 (LBPS), é devida ao segurado do sexo masculino que completar 30 anos de trabalho, correspondendo a uma renda equivalente a 70% do salário de benefício, mais 6% a cada ano até atingir 100%.
A Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, estabeleceu em seu artigo 3º:
In casu, o extrato CNIS anexo comprova o recolhimento de contribuições previdenciárias pelo seguinte período: a) 1 ano, 3 meses e 1 dia; b) 3 anos, 11 meses e 28 dias; c) 6 anos, 10 meses e 1 dia; d) 10 meses e 16 dias.
Somando-se a atividade rural reconhecida na presente demanda ao lapso de atividade profissional incontroversa, verifico que a parte Autora conta com 30 anos, 9 meses e 17 dias até 16.12.1998 (EC nº. 20/98) - planilha anexa.
No ano de 1998, o prazo de carência para o benefício em questão era de 102 (cento e dois) meses de contribuição (art. 142 da Lei nº 8.213/91), tempo esse de contribuição que a Autora atende integralmente em atividade urbana (consoante planilha anexa).
Assim, tinha a Autora direito, na data da propositura da ação, à aposentadoria integral, com base na legislação pretérita à Emenda Constitucional nº 20/98.
O valor da aposentadoria por tempo de contribuição consistirá numa renda mensal correspondente a 100% do salário-de-benefício (art. 53, II), a ser calculada nos termos do art. 29 da Lei nº 8.213/91, com redação anterior à Lei nº 9.876/99.
Não há notícia nos autos de requerimento administrativo. Assim, o benefício seria devido, em princípio, a partir da data da citação, quando caracterizada a mora do INSS. Entretanto, observa-se que na petição inicial foi formulado pedido para a concessão da aposentadoria desde a data do ajuizamento. Diante do acolhimento integral do pleito da Autora pela r. sentença, julgando-o procedente, na íntegra, sem qualquer ressalvas, o direito da requerente foi reconhecido a partir da data da propositura da demanda. Em razão da ausência de recurso do INSS sobre o tema, bem como não se tratando de hipótese de remessa oficial, também fica mantida a r. decisão nesse ponto.
Observo que não houve determinação na r. sentença com relação aos valores vencidos devidos. Por se tratar de consectários legais da decisão concessiva proferida, compreendo que o seu exame, nesta esfera, pode ser feito de ofício, razão pela qual determino que sobre os atrasados incidirão correção monetária e juros moratórios nos termos do Manual de Orientação de Procedimento para os Cálculos da Justiça Federal.
Ante o exposto, rejeito a preliminar de prescrição e, no mérito, nego provimento ao recurso de apelação, e de ofício, determino que sobre os valores atrasados devidos incidirão correção monetária e juros moratórios nos termos do Manual de Orientação de Procedimento para os Cálculos da Justiça Federal.
Na fase de cumprimento do julgado, deverão ser descontadas as parcelas recebidas administrativamente a título de benefício inacumulável, ressalvado o direito do segurado de optar pelo benefício mais vantajoso, sem prejuízo do recebimento das parcelas em atraso.
É como voto.
CLÁUDIO SANTOS
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| Data e Hora: | 13/10/2016 16:24:51 |
