Processo
ApReeNec - APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO / SP
0000273-08.2016.4.03.6140
Data do Julgamento
19/09/2019
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 23/09/2019
Ementa
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL.
TERMO INICIAL. DER ANTIGA. INDEFERIMENTO ADMINISTRATIVO. DEMORA NA
PROPOSITURA DA AÇÃO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA MISERABILIDADE EM TODO
O PERÍODO DE TRÂMITE DO PROCESSO. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. ALTERAÇÃO
JURISPRUDENCIAL. NECESSIDADE DE REVISÃO DO BENEFÍCIO A CADA 2 ANOS. ARTIGO
21 DA LOAS. FRAGILIDADE PROBATÓRIA. DER NA DATA DA CITAÇÃO. CORREÇÃO
MONETÁRIA. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
- Discutiu-se o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício assistencial
de prestação continuada previsto no artigo 20 da Lei n. 8.742/93, regulamentado, atualmente,
pelos Decretos n. 6.214/2007 e 7.617/2011.
- Quanto ao termo inicial, no presente caso, a DER deu-se em 10/9/2009. O recurso
administrativo interposto pela autora foi julgado em 02/10/2012 (f. 45). A propósito, a procuração
foi assinada em 18/11/2015 (f. 19). Todavia, somente em 10/02/2016 (f. 5) a presente ação foi
proposta. Isso significa que a autora conformou-se com a negativa administrativa por muitos
anos.
- Digno de nota que o fato de a autora ter sido diagnosticada como pessoa com deficiência na
perícia médica realizada em 16/12/2016 (f. 137) não significa concluir que já se enquadrava na
condição de pessoa com deficiência na época da DER em 2009. Isso porque a legislação da
época da DER apresentava um conceito bastante diverso do de pessoa portadora de deficiência.
E não há comprovação nos autos de que, na época da DER, a autora encontrava-se incapacitada
para o trabalho e também para a vida independente, como exigia o artigo 20, § 2º, da LOAS com
a redação então vigente.
- Outrossim, o benefício devido deve ser revisto a cada 2 (dois) anos, nos termos do artigo 21 da
Lei n. 8.742/93, não havendo prova alguma da miserabilidade no interstício de 10/9/2009 até
27/11/2016, quando realizado o estudo social.
- Além disso, quando do requerimento administrativo realizado em 2009, o Supremo Tribunal
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Federal ainda não havia declarado a inconstitucionalidade do artigo 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93. A
questão foi levada à apreciação do Pretório Excelso por meio de uma Ação Direta de
Inconstitucionalidade, movida pelo Procurador Geral da República, quando, em meio a
apreciações sobre outros temas, decidiu que o benefício do art. 203, inciso V, da CF só pode ser
exigido a partir da edição da Lei n.° 8.742/93. Trata-se da ADIN 1.232-2, de 27/08/98, publicada
no DJU de 1/6/2001, Pleno, Relator Ministro Maurício Correa, RTJ 154/818, ocasião em que o
STF reputou constitucional a restrição conformada no § 3o do art. 20 da Lei n.° 8.742/93.
- Somente em 2013, o Supremo Tribunal Federal recentemente reviu seu posicionamento ao
reconhecer que o requisito do artigo 20, §3º, da Lei n. 8.742/93 não pode ser considerado
taxativo, acórdão produzido com repercussão geral (STF, RE n. 580963, Tribunal Pleno, rel. Min.
Gilmar Mendes, DJe n. 225, 14/11/2013). Ou seja, na época da DER, não tinha o INSS atribuição
para afastar a incidência de lei até então considerada constitucional pelo Tribunal Supremo do
país.
- Como bem observou a Procuradoria Regional da República, a DER encontra-se
demasiadamente distante da propositura da ação, merecendo o termo inicial ser fixado na data da
citação. Nesse sentido: TRF 3ª Região, OITAVA TURMA – AC 0023670-62.2016.4.03.9999,
Relatora Des. Fed. Tania Marangoni, e-DJ3: 19/06/2016.
- Como regra geral, a razoabilidade recomenda que não se “premie”, com o pagamento de
atrasados antigos, enriquecidos por juros de mora (naturalmente custeados pelo contribuinte
brasileiro, vítima de um sistema tributário regressivo que penaliza os próprios hipossuficientes) a
demora na propositura da ação judicial, mormente se houver finalidades externas aos interesses
da parte, ou mesmo colidentes com os dela. Tais atrasados transmudam-se de verba alimentar
para poupança à custa do contribuinte.
- Quanto à correção monetária, esta deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/81 e da
legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos
na Justiça Federal, aplicando-se o IPCA-E (Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017,
Relator Ministro Luiz Fux). Contudo, em 24 de setembro de 2018 (DJE n. 204, de 25/9/2018), o
Relator da Repercussão Geral, Ministro Luiz Fux,deferiu, excepcionalmente,efeito suspensivoaos
embargos de declaração opostos em face do referido acórdão, razão pela qual resta obstada a
aplicação imediata da tese pelas instâncias inferiores, antes da apreciação pelo Supremo Tribunal
Federaldo pedido de modulação dos efeitos da tese firmada no RE 870.947. É autorizado o
pagamento de valor incontroverso.
- Apelação parcialmente provida.
Acórdao
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº0000273-08.2016.4.03.6140
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA APARECIDA RAMOS
REPRESENTANTE: LUCIANA CARVALHO DE LIMA RAMOS
Advogado do(a) APELADO: HERMELINDA ANDRADE CARDOSO MANZOLI - SP200343-A,
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 0000273-08.2016.4.03.6140
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA APARECIDA RAMOS
REPRESENTANTE: LUCIANA CARVALHO DE LIMA RAMOS
Advogado do(a) APELADO: HERMELINDA ANDRADE CARDOSO MANZOLI - SP200343-A,
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias:Cuida-se de apelação interposta em face
de sentença que julgou procedente o pedido de concessão de benefício assistencial à parte
autora deficiente, desde a DER realizada em 10/9/2009, discriminando os consectários,
antecipados os efeitos da tutela, submetida ao reexame necessário.
Nas razões recursais, o INSS pugna pela fixação da DIB na data da juntada de perícia médica,
em 16/12/2016, e alteração do índice de correção monetária dos atrasados.
Contrarrazões apresentadas.
Subiram os autos a esta egrégia Corte.
O Ministério Público Federal opina pelo parcial provimento do recurso do INSS, para que o termo
de início do benefício seja fixado na data da citação.
Os números das folhas mencionadas no voto referem-se ao arquivo pdf.
É o relatório.
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 0000273-08.2016.4.03.6140
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA APARECIDA RAMOS
REPRESENTANTE: LUCIANA CARVALHO DE LIMA RAMOS
Advogado do(a) APELADO: HERMELINDA ANDRADE CARDOSO MANZOLI - SP200343-A,
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias:Conheço da apelação, uma vez
presentes os requisitos de admissibilidade.
Discutiu-se, nesta demanda, o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do
benefício assistencial de prestação continuada previsto no artigo 20 da Lei n. 8.742/93,
regulamentado, atualmente, pelos Decretos n. 6.214/2007 e 7.617/2011.
Essa lei deu eficácia ao inciso V do artigo 203 da Constituição Federal, ao estabelecer, em seu
artigo 20, as condições para a concessão do benefício da assistência social, a saber: ser o
postulante portador de deficiência ou idoso e, em ambas as hipóteses, comprovar a
miserabilidade ou a hipossuficiência, ou seja, não possuir meios de prover a própria manutenção
nem de tê-la provida por sua família.
Atenho-me aos limites do pedido recursal, restrito aos consectários.
Quanto ao termo inicial, no presente caso, a DER deu-se em 10/9/2009.
O recurso administrativo interposto pela autora foi julgado em 02/10/2012 (f. 45).
A propósito, a procuração foi assinada em 18/11/2015 (f. 19).
Todavia, somente em 10/02/2016 (f. 5) a presente ação foi proposta.
Isso significa que a autora conformou-se com a negativa administrativa por muitos anos.
Não se pode aceitar que o representante da parte – legal processual – adie a propositura da ação
com finalidades externas aos interesses da parte.
Digno de nota que o fato de a autora ter sido diagnosticada com retardo mental leve na perícia
médica realizada em 16/12/2016 (f. 137) não significa concluir que já se enquadrava na condição
de pessoa com deficiência na época da DER em 2009.
Realmente, a legislação da época da DER apresentava um conceito bastante diverso do de
pessoa portadora de deficiência.
Explico.
O conceito jurídico de pessoa portadora de deficiência - previsto no § 2º da Lei n. 8.742/93, com a
redação dada pela Lei nº 13.146/2015 -, passou a ser considerada aquela com impedimentos de
longo prazo, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com
diversas barreiras, possam obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade
de condições com as demais pessoas.
Assim, ratificou-se o entendimento consolidado nesta Corte de que o rol previsto no artigo 4º do
Decreto n. 3.298/99 (regulamentar da Lei n. 7.853/89, que dispõe sobre a Política Nacional da
Pessoa Portadora de Deficiência) não era exaustivo; portanto, constatado que os males sofridos
pelo postulante impedem sua inserção social, restará preenchido um dos requisitos exigidos para
a percepção do benefício.
Menciona-se também o conceito apresentado pela ONU, elaborado por meio da Resolução n.°
XXX/3.447, que conforma a Declaração, em 09/12/1975, in verbis:"1. O termo 'pessoa deficiente'
refere-se a qualquer pessoa incapaz de assegurar a si mesma, total ou parcialmente, as
necessidades de uma vida individual ou social normal, em decorrência de uma deficiência,
congênita ou não, em suas capacidades físicas ou mentais".
Esse conceito dá maior ênfase à necessidade, inclusive da vida individual, ao passo que o
conceito proposto por Luiz Alberto David Araujo prioriza a questão da integração social, como se
verá.
Nair Lemos Gonçalves apresentou os principais requisitos para sua definição: "desvio acentuado
dos mencionados padrões médios e sua relação com o desenvolvimento físico, mental, sensorial
ou emocional, considerados esses aspectos do desenvolvimento separada, combinada ou
globalmente" (Verbete Excepcionais. In: Enciclopédia Saraiva de Direito, n. XXXIV. São Paulo:
Saraiva, 1999).
Luiz Alberto David Araujo, por sua vez, compilou muitos significados da palavra deficiente,
extraídos dos dicionários de Língua Portuguesa. Observa ele que, geralmente, os dicionários
trazem a idéia de que a pessoa deficiente sofre de falta, de carência ou de falha.
Esse autor critica essas noções porque a idéia de deficiência não se apresenta tão simples, à
medida que as noções de falta, de carência ou de falha não abrangem todas as situações de
deficiência, como, por exemplo, o caso dos superdotados, ou de um portador do vírus HIV que
consiga levar a vida normal, sem manifestação da doença, ou ainda de um trabalhador intelectual
que tenha um dedo amputado.
Por ser a noção de falta, carência ou falha insuficiente à caracterização da deficiência, Luiz
Alberto David Araujo propõe um norte mais seguro para se identificar a pessoa protegida, cujo
fator determinante do enquadramento, ou não, no conceito de pessoa portadora de deficiência,
seja o meio social:
"O indivíduo portador de deficiência, quer por falta, quer por excesso sensorial ou motor, deve
apresentar dificuldades para seu relacionamento social. O que define a pessoa portadora de
deficiência não é falta de um membro nem a visão ou audição reduzidas. O que caracteriza a
pessoa portadora de deficiência é a dificuldade de se relacionar, de se integrar na sociedade. O
grau de dificuldade para a sua integração social é o que definirá quem é ou não portador de
deficiência". (A Proteção Constitucional das Pessoas Portadoras de Deficiência. Brasília:
Ministério da Justiça, 1997, p. 18-22).
E quanto mais complexo o meio social, maior rigor se exigirá da pessoa portadora de deficiência
para sua adaptação social. De outra parte, na vida em comunidades mais simples, como nos
meios agrícolas, a pessoa portadora de deficiência poderá integrar-se com mais facilidade.
Mas é preciso delimitar a proteção constitucional apenas àquelas pessoas que realmente dela
necessitam, porquanto existem graus de deficiência que apresentam menores dificuldades de
adaptação à pessoa. E tal verificação somente poderá ser feita diante de um caso concreto.
Luiz Alberto David Araujo salienta que os casos-limite podem, desde logo, ser excluídos, como o
exemplo do bibliotecário que perde um dedo ou do operário que perde um artelho; em ambos os
casos, ambos continuam integrados socialmente. Ou ainda pequenas manifestações de retardo
mental (deficiência mental leve) podem passar despercebidas em comunidades simples, pois tal
pessoa poderá "não encontrar problemas de adaptação a sua realidade social (escola, trabalho,
família)", de maneira que não se pode afirmar que tal pessoa deverá receber proteção, "tal como
aquele que sofre restrições sérias em seu meio social" (obra citada, páginas 42/43).
"A questão, assim, não se resolve sob o ângulo da deficiência, mas, sim sob o prisma da
integração social. Há pessoas portadoras de deficiência que não encontram qualquer problema
de adaptação no meio social. Dentro de uma comunidade de doentes, isolados por qualquer
motivo, a pessoa portadora de deficiência não encontra qualquer outro problema de integração,
pois todos têm o mesmo tipo de dificuldade" (obra citada, p. 43).
Enfim, a constatação da existência de graus de deficiência é de fundamental importância para
identificar aqueles que receberão a proteção social prevista no art. 203, V, da Constituição
Federal.
E não há comprovação nos autos de que, na época da DER, a autora encontrava-se incapacitada
para o trabalho e também para a vida independente, como exigia o artigo 20, § 2º, da LOAS com
a redação então vigente.
Outrossim, o benefício devido deve ser revisto a cada 2 (dois) anos, nos termos do artigo 21 da
Lei n. 8.742/93, não havendo prova alguma da miserabilidade no interstício de 10/9/2009 até
27/11/2016, quando realizado o estudo social (f. 122).
Com efeito, quando do requerimento administrativo realizado em 2009, o Supremo Tribunal
Federal ainda não havia declarado a inconstitucionalidade do artigo 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93.
A questão foi levada à apreciação do Pretório Excelso por meio de uma Ação Direta de
Inconstitucionalidade, movida pelo Procurador Geral da República, quando, em meio a
apreciações sobre outros temas, decidiu que o benefício do art. 203, inciso V, da CF só pode ser
exigido a partir da edição da Lei n.° 8.742/93.
Trata-se da ADIN 1.232-2, de 27/08/98, publicada no DJU de 1/6/2001, Pleno, Relator Ministro
Maurício Correa, RTJ 154/818, ocasião em que o STF reputou constitucional a restrição
conformada no § 3o do art. 20 da Lei n.° 8.742/93.
Posteriormente, em controle difuso de constitucionalidade, o Supremo Tribunal Federal manteve
o entendimento (vide RE 213.736-SP, Rel. Min. Marco Aurélio, informativo STF n.° 179; RE
256.594-6, Rel. Min. Ilmar Galvão, DJ 28/4/2000, Informativo STF n.° 186; RE n.° 280.663-3, São
Paulo, j. 06/09/2001, relator Maurício Corrêa).
Somente em 2013, o Supremo Tribunal Federal recentemente reviu seu posicionamento ao
reconhecer que o requisito do artigo 20, §3º, da Lei n. 8.742/93 não pode ser considerado
taxativo, acórdão produzido com repercussão geral (STF, RE n. 580963, Tribunal Pleno, rel. Min.
Gilmar Mendes, DJe n. 225, 14/11/2013).
Ou seja, na época da DER, não tinha o INSS atribuição para afastar a incidência de lei até então
considerada constitucional pelo Tribunal Supremo do país.
Clássica é a lição de Hely Lopes Meirelles:
“Na Administração Pública, não há espaço para liberdades e vontades particulares, deve, o
agente público, sempre agir com a finalidade de atingir o bem comum, os interesses públicos, e
sempre segundo àquilo que a lei lhe impõe, só podendo agir secundum legem. Enquanto no
campo das relações entre particulares é lícito fazer tudo o que a lei não proíbe (princípio da
autonomia da vontade), na Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza. A lei,
define até onde o administrador público poderá atuar de forma lícita, sem cometer ilegalidades,
define como ele deve agir.” (MIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 30. Ed. São
Paulo: Malheiros, 2005).
De modo que, como bem observou a Procuradoria Regional da República, a DER encontra-se
demasiadamente distante da propositura da ação, merecendo o termo inicial ser fixado na data da
citação.
Nesse sentido:
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PRESENÇA DOS REQUISITOS LEGAIS NECESSÁRIOS PARA A
CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
(...)
- A sentença deve ser mantida, para que seja concedido o benefício à requerente, tendo
comprovado o requisito etário e a situação de miserabilidade, à luz das decisões referidas, em
conjunto com os demais dispositivos da Constituição Federal de 1988, uma vez que não tem
condições de manter seu próprio sustento nem de tê-lo provido por sua família.
- O termo inicial deve ser mantido na data da citação (04.07.2008), eis que não é possível concluir
pelos elementos constantes dos autos, a hipossuficiência da parte autora no momento em que
pleiteou o benefício junto à via administrativa, em 08.06.2004. Ademais, a ação foi proposta
somente em 30.05.2008.
- Deve haver a revisão a cada dois anos, a fim de avaliar as condições que permitem a
continuidade do benefício, em face da expressa previsão legal (art. 21, da Lei nº 8.742/93).
(...)
- Apelos da parte autora e da Autarquia providos em parte. Mantida a tutela antecipada. (TRF 3ª
Região, OITAVA TURMA – AC 0023670-62.2016.4.03.9999, Relatora Des. Fed. Tania Marangoni,
e-DJ3: 19/06/2016)
Como regra geral, a razoabilidade recomenda que não se “premie”, com o pagamento de
atrasados antigos, enriquecidos por juros de mora (naturalmente custeados pelo contribuinte
brasileiro, vítima de um sistema tributário regressivo que penaliza os próprios hipossuficientes) a
demora na propositura da ação judicial, mormente se houver finalidades externas aos interesses
da parte, ou mesmo colidentes com os dela. Tais atrasados transmudam-se de verba alimentar
para poupança à custa do contribuinte.
Quanto à correção monetária, esta deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/81 e da
legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos
na Justiça Federal, aplicando-se o IPCA-E (Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017,
Relator Ministro Luiz Fux). Contudo, em 24 de setembro de 2018 (DJE n. 204, de 25/9/2018), o
Relator da Repercussão Geral, Ministro Luiz Fux,deferiu, excepcionalmente,efeito suspensivoaos
embargos de declaração opostos em face do referido acórdão, razão pela qual resta obstada a
aplicação imediata da tese pelas instâncias inferiores, antes da apreciação pelo Supremo Tribunal
Federaldo pedido de modulação dos efeitos da tese firmada no RE 870.947. É autorizado o
pagamento de valor incontroverso.
Diante do exposto, conheço da apelação e lhe dou parcial provimento, para fixar o termo inicial na
data da citação e dispor sobre a correção monetária dos atrasados.
É o voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL.
TERMO INICIAL. DER ANTIGA. INDEFERIMENTO ADMINISTRATIVO. DEMORA NA
PROPOSITURA DA AÇÃO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA MISERABILIDADE EM TODO
O PERÍODO DE TRÂMITE DO PROCESSO. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. ALTERAÇÃO
JURISPRUDENCIAL. NECESSIDADE DE REVISÃO DO BENEFÍCIO A CADA 2 ANOS. ARTIGO
21 DA LOAS. FRAGILIDADE PROBATÓRIA. DER NA DATA DA CITAÇÃO. CORREÇÃO
MONETÁRIA. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
- Discutiu-se o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício assistencial
de prestação continuada previsto no artigo 20 da Lei n. 8.742/93, regulamentado, atualmente,
pelos Decretos n. 6.214/2007 e 7.617/2011.
- Quanto ao termo inicial, no presente caso, a DER deu-se em 10/9/2009. O recurso
administrativo interposto pela autora foi julgado em 02/10/2012 (f. 45). A propósito, a procuração
foi assinada em 18/11/2015 (f. 19). Todavia, somente em 10/02/2016 (f. 5) a presente ação foi
proposta. Isso significa que a autora conformou-se com a negativa administrativa por muitos
anos.
- Digno de nota que o fato de a autora ter sido diagnosticada como pessoa com deficiência na
perícia médica realizada em 16/12/2016 (f. 137) não significa concluir que já se enquadrava na
condição de pessoa com deficiência na época da DER em 2009. Isso porque a legislação da
época da DER apresentava um conceito bastante diverso do de pessoa portadora de deficiência.
E não há comprovação nos autos de que, na época da DER, a autora encontrava-se incapacitada
para o trabalho e também para a vida independente, como exigia o artigo 20, § 2º, da LOAS com
a redação então vigente.
- Outrossim, o benefício devido deve ser revisto a cada 2 (dois) anos, nos termos do artigo 21 da
Lei n. 8.742/93, não havendo prova alguma da miserabilidade no interstício de 10/9/2009 até
27/11/2016, quando realizado o estudo social.
- Além disso, quando do requerimento administrativo realizado em 2009, o Supremo Tribunal
Federal ainda não havia declarado a inconstitucionalidade do artigo 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93. A
questão foi levada à apreciação do Pretório Excelso por meio de uma Ação Direta de
Inconstitucionalidade, movida pelo Procurador Geral da República, quando, em meio a
apreciações sobre outros temas, decidiu que o benefício do art. 203, inciso V, da CF só pode ser
exigido a partir da edição da Lei n.° 8.742/93. Trata-se da ADIN 1.232-2, de 27/08/98, publicada
no DJU de 1/6/2001, Pleno, Relator Ministro Maurício Correa, RTJ 154/818, ocasião em que o
STF reputou constitucional a restrição conformada no § 3o do art. 20 da Lei n.° 8.742/93.
- Somente em 2013, o Supremo Tribunal Federal recentemente reviu seu posicionamento ao
reconhecer que o requisito do artigo 20, §3º, da Lei n. 8.742/93 não pode ser considerado
taxativo, acórdão produzido com repercussão geral (STF, RE n. 580963, Tribunal Pleno, rel. Min.
Gilmar Mendes, DJe n. 225, 14/11/2013). Ou seja, na época da DER, não tinha o INSS atribuição
para afastar a incidência de lei até então considerada constitucional pelo Tribunal Supremo do
país.
- Como bem observou a Procuradoria Regional da República, a DER encontra-se
demasiadamente distante da propositura da ação, merecendo o termo inicial ser fixado na data da
citação. Nesse sentido: TRF 3ª Região, OITAVA TURMA – AC 0023670-62.2016.4.03.9999,
Relatora Des. Fed. Tania Marangoni, e-DJ3: 19/06/2016.
- Como regra geral, a razoabilidade recomenda que não se “premie”, com o pagamento de
atrasados antigos, enriquecidos por juros de mora (naturalmente custeados pelo contribuinte
brasileiro, vítima de um sistema tributário regressivo que penaliza os próprios hipossuficientes) a
demora na propositura da ação judicial, mormente se houver finalidades externas aos interesses
da parte, ou mesmo colidentes com os dela. Tais atrasados transmudam-se de verba alimentar
para poupança à custa do contribuinte.
- Quanto à correção monetária, esta deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/81 e da
legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos
na Justiça Federal, aplicando-se o IPCA-E (Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017,
Relator Ministro Luiz Fux). Contudo, em 24 de setembro de 2018 (DJE n. 204, de 25/9/2018), o
Relator da Repercussão Geral, Ministro Luiz Fux,deferiu, excepcionalmente,efeito suspensivoaos
embargos de declaração opostos em face do referido acórdão, razão pela qual resta obstada a
aplicação imediata da tese pelas instâncias inferiores, antes da apreciação pelo Supremo Tribunal
Federaldo pedido de modulação dos efeitos da tese firmada no RE 870.947. É autorizado o
pagamento de valor incontroverso.
- Apelação parcialmente provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu conhecer da apelação e lhe dar parcial provimento, nos termos do relatório
e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
