
| D.E. Publicado em 07/05/2018 |
EMENTA
| CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. REQUISITOS LEGAIS COMPROVADOS. LEI 8.742/93, ART. 20, §3º. DEFICIÊNCIA. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO E. STF. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. |
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à remessa oficial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | SERGIO DO NASCIMENTO:10045 |
| Nº de Série do Certificado: | 11A21703174550D9 |
| Data e Hora: | 24/04/2018 18:56:00 |
REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL Nº 0000579-16.2011.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Sérgio Nascimento (Relator): Trata-se de remessa oficial de sentença pela qual foi julgado procedente o pedido da parte autora para condenar o réu a conceder-lhe o benefício de prestação continuada, a partir da data da citação (17.06.2015; fl. 99). Sobre as prestações atrasadas deverá incidir correção monetária e juros de mora na forma da Lei n. 11.960/09. O réu foi condenado, ainda, ao pagamento de honorários advocatícios em percentual a ser apurado em liquidação do julgado, nos termos do art. 85, §3º, do CPC (art. 85, §4º, inc. II, do CPC), observada a Súmula nº 111 do STJ. Isento de custas processuais. Implantado o benefício pelo réu, consoante informação de fl. 173.
Em parecer de fls. 182, o i. representante do Ministério Público Federal, opinou pelo não conhecimento da remessa oficial.
É o relatório.
Desembargador Federal Relator
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | SERGIO DO NASCIMENTO:10045 |
| Nº de Série do Certificado: | 11A21703174550D9 |
| Data e Hora: | 24/04/2018 18:55:53 |
REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL Nº 0000579-16.2011.4.03.9999/SP
VOTO
Observo, de início, que se aplica ao presente caso o Enunciado da Súmula 490 do E. STJ, que assim dispõe: A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica às sentenças ilíquidas.
O benefício pretendido pela parte autora está previsto no artigo 203, V, da Constituição da República, que dispõe:
A regulamentação legislativa do dispositivo constitucional restou materializada com o advento da Lei 8.742/93, que dispõe na redação atualizada do caput do seu artigo 20:
Assim, para fazer jus ao amparo constitucional, o postulante deve ser portador de deficiência ou ser idoso (65 anos ou mais) e ser incapaz de prover a própria manutenção ou tê-la provida por sua família.
Quanto ao requisito relativo à deficiência, a Lei 8.742/93, que regulamentou a concessão do dispositivo constitucional acima, dispunha no § 2º do seu artigo 20, em sua redação original:
Nesse ponto, cumpre salientar que o texto constitucional garante o pagamento de um salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência, sem exigir, como fez a norma regulamentadora, em sua redação original, a existência de incapacidade para a vida independente e para o trabalho.
Nota-se, portanto, que ao definir os contornos da expressão pessoa portadora de deficiência constante do dispositivo constitucional, a norma infraconstitucional reduziu a sua abrangência, limitando o seu alcance aos casos em que a deficiência é geradora de incapacidade laborativa.
Todavia, observa-se que, em 10.07.2008, o Congresso Nacional promulgou o Decreto Legislativo 186/2008, aprovando, pelo rito previsto no artigo 5º, § 3º, da Constituição da República, o texto da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com deficiência e de seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova Iorque, em 30 de março de 2007, e conferindo à referida Convenção status normativo equivalente ao das emendas constitucionais.
A Convenção, aprovada pelo Decreto Legislativo 186/2008, já no seu Artigo 1, cuidou de tratar do conceito de "pessoa com deficiência", definição ora constitucionalizada pela adoção do rito do artigo 5º, § 3º, da Carta, a saber:
Em coerência à alteração promovida em sede constitucional, o artigo 20, § 2º, da Lei 8.742/93, viria a ser alterado pela Lei 12.470/11, passando a reproduzir em seu texto a definição de "pessoa com deficiência" constante da norma superior. Dispõe a LOAS, em sua redação atualizada:
Não há dúvida, portanto, de que o conceito de 'deficiência' atualmente albergado é mais extenso do que aquele outrora estabelecido, vez que considera como tal qualquer impedimento, inclusive de natureza sensorial, que tenha potencialidade para a obstrução da participação social do indivíduo em condições de igualdade.
Coerente com esta nova definição de 'deficiência' para fins de concessão do benefício constitucional, a mencionada Lei 12.470/11 acrescentou à Lei 8.742/93 o artigo 21-A, com a seguinte redação:
Verifica-se, portanto, que a legislação ordinária, em deferência às alterações promovidas em sede constitucional, não apenas deixou de identificar os conceitos de 'incapacidade laborativa' e 'deficiência', como passou a autorizar expressamente que a pessoa com deficiência elegível à concessão do amparo assistencial venha a exercer atividade laborativa - seja como empregada, seja como microempreendedora - sem que tenha sua condição descaracterizada pelo trabalho, ressalvada tão somente a suspensão do benefício enquanto este for exercido.
Observados estes parâmetros para a aferição da deficiência, no caso dos autos, o laudo médico pericial realizado em 18.11.2016 (fls. 131/136), atesta que a autora (49 anos) é portadora de diabetes mellitus, com sequela ocular grave, necessitando do cuidado permanente de terceiros para as atividades diárias, apresentando, portanto, incapacidade total e permanente para o trabalho.
Preenchido, portanto, o requisito concernente à deficiência física.
No que toca ao requisito socioeconômico, cumpre observar que o §3º do artigo 20 da Lei 8.742/93 estabeleceu para a sua aferição o critério de renda familiar per capita, observado o limite de um quarto do salário mínimo, que restou mantido na redação dada pela Lei 12.435/11, acima transcrita.
A questão relativa à constitucionalidade do critério de renda per capita não excedente a um quarto do salário mínimo para que se considerasse o idoso ou pessoa com deficiência aptos à concessão do benefício assistencial, foi analisada pelo E. Supremo Tribunal Federal em sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 1.232/DF), a qual foi julgada improcedente, por acórdão que recebeu a seguinte ementa:
Todavia, conquanto reconhecida a constitucionalidade do §3º do artigo 20, da Lei 8.742/93, a jurisprudência evoluiu no sentido de que tal dispositivo estabelecia situação objetiva pela qual se deve presumir pobreza de forma absoluta, mas não impedia o exame de situações subjetivas tendentes a comprovar a condição de miserabilidade do requerente e de sua família. Tal interpretação seria consolidada pelo E. Superior Tribunal de Justiça em recurso especial julgado pela sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil (STJ - REsp. 1.112.557-MG; Terceira Seção; Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho; j. 28.10.2009; DJ 20.11.2009).
O aparente descompasso entre o desenvolvimento da jurisprudência acerca da verificação da miserabilidade dos postulantes ao benefício assistencial e o entendimento assentado por ocasião do julgamento da ADI 1.232-DF levaria a Corte Suprema a voltar ao enfrentamento da questão, após o reconhecimento da existência da sua repercussão geral, no âmbito da Reclamação 4374 - PE, julgada em 18.04.2013.
Naquela ocasião, prevaleceu o entendimento de que "ao longo de vários anos desde a sua promulgação, o §3º do art. 20 da LOAS passou por um processo de inconstitucionalização". Com efeito, as significativas alterações no contexto socioeconômico desde então e o reflexo destas nas políticas públicas de assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios para aferição da miserabilidade previstos na Lei 8.742/93 e aqueles constantes no sistema de proteção social que veio a se consolidar. Verifique-se:
Destarte, é de se reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência é através da própria natureza dos males que a assolam, do seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades. Não há, pois, que se enquadrar todos os indivíduos em um mesmo patamar e entender que somente aqueles que contam com menos de um quarto do salário-mínimo possam fazer jus ao benefício assistencial.
No caso dos autos, o estudo social realizado em 15.07.2015 (fls. 58/62), constatou que a autora reside com seu esposo, já idoso (73 anos), em imóvel próprio, localizado em loteamento popular doado pela Prefeitura Municipal às famílias de baixa renda. A residência é simples e guarnecida com móveis e eletrodomésticos de modelos populares, em regular estado de conservação. A renda familiar é proveniente da aposentadoria do marido, o valor de um salário mínimo (R$ 788,00), sendo as despesas declaradas no valor de R$ 866,90. A autora ficou cega em decorrência da enfermidade e depende totalmente do esposo para as atividades da vida diária, inclusive com a higiene pessoal.
Entendo, assim, que o conjunto probatório existente nos autos demonstra que a parte autora preenche o requisito da deficiência física, comprovando sua hipossuficiência econômica, fazendo jus à concessão do benefício assistencial.
O termo inicial do benefício deve ser mantido a partir da data da citação (17.06.2015; fl. 99), ante a ausência de comprovação de prévio requerimento administrativo.
Os juros de mora de mora e a correção monetária deverão ser calculados pela lei de regência.
Honorários advocatícios mantidos na forma da sentença, ou seja, a serem fixados após a liquidação do julgado, nos termos do art. 85, inc. II, §4º, do CPC.
As parcelas pagas a título de antecipação de tutela deverão ser compensadas, quando da liquidação da sentença.
Diante do exposto, nego provimento à remessa oficial.
É como voto.
SERGIO NASCIMENTO
Desembargador Federal Relator
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | SERGIO DO NASCIMENTO:10045 |
| Nº de Série do Certificado: | 11A21703174550D9 |
| Data e Hora: | 24/04/2018 18:55:56 |
