Processo
ApReeNec - APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO / SP
5070272-55.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal SERGIO DO NASCIMENTO
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
25/04/2019
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 29/04/2019
Ementa
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. PROCESSO CIVIL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA.
REQUISITOS LEGAIS COMPROVADOS. LEI 8.742/93, ART. 20, §3º. DEFICIÊNCIA.
INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO E. STF. HIPOSSUFICIÊNCIA
ECONÔMICA. VERBAS ACESSÓRIAS.
I- Não se olvida que o conceito de "pessoa portadora de deficiência" para fins de proteção estatal
e de concessão do benefício assistencial haja sido significativamente ampliado com as alterações
trazidas após a introdução no ordenamento pátrio da Convenção sobre os Direitos das Pessoas
com Deficiência e de seu Protocolo Facultativo, aprovada pelo Decreto Legislativo 186/2008, na
forma do artigo 5º, § 3º, da Constituição da República, "in casu" tratando-se de autora
incapacitada de forma total e temporária para o trabalho.
II- Quanto à hipossuficiência econômica, à luz da jurisprudência consolidada no âmbito do E. STJ
e do posicionamento usual desta C. Turma, no sentido de que o art. 20, §3º, da Lei 8.742/93
define limite objetivo de renda per capita a ser considerada, mas não impede a comprovação da
miserabilidade pela análise da situação específica de quem pleiteia o benefício. (Precedente do
E. STJ).
III- Em que pese a improcedência da ADIN 1.232-DF, em julgamento recente dos Recursos
Extraordinários 567.985-MT e 580.983-PR, bem como da Reclamação 4.374, o E. Supremo
Tribunal Federal modificou o posicionamento adotado anteriormente, para entender pela
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
inconstitucionalidade do disposto no art. 20, §3º, da Lei 8.742/93.
IV - O entendimento que prevalece atualmente no âmbito do E. STF é os de que as significativas
alterações no contexto socioeconômico desde a edição da Lei 8.742/93 e o reflexo destas nas
políticas públicas de assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios para
aferição da miserabilidade previstos na LOAS e aqueles constantes no sistema de proteção.
V-A correção monetária e os juros de mora deverão ser calculados de acordo com a lei de
regência, observando-se as teses firmadas pelo E.STF no julgamento do RE 870.947, realizado
em 20.09.2017. Quanto aos juros de mora será observado o índice de remuneração da caderneta
de poupança a partir de 30.06.2009.
VI- Tendo em vista o trabalho adicional do patrono da parte autora em grau recursal, nos termos
do artigo 85, § 11, do Novo Código de Processo Civil de 2015, fixo os honorários advocatícios em
10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data até a data do presente
julgamento, eis que de acordo com o entendimento da 10ª Turma desta E. Corte.
VII- Remessa Oficial e Apelação do réu improvidas.
Acórdao
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 5070272-55.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANTONIA FABIA CARNEIRO XAVIER
REPRESENTANTE: ALESSANDRA DO LAGO CARNEIRO
Advogado do(a) APELADO: MARIANA OLIVEIRA DOS SANTOS - SP255541-N,
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 5070272-55.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANTONIA FABIA CARNEIRO XAVIER
REPRESENTANTE: ALESSANDRA DO LAGO CARNEIRO
Advogado do(a) APELADO: MARIANA OLIVEIRA DOS SANTOS - SP255541-N,
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo Sr Desembargador Federal Sérgio Nascimento (Relator): Trata-se de remessa oficial e
apelação de sentença pela qual foi julgado procedente o pedido para condenar o réu a conceder
à autora o benefício assistencial de prestação continuada, no valor de um salário mínimo, a partir
da data da citação (09/10/2017). Sobre as prestações atrasadas deverá incidir correção
monetária, consoante dispõem as Súmulas nº 148 do Colendo STJ e 8 do E. TRF da 3ª Região,
bem como a Resolução nº 134, de 21-12-2010, do CJF, que aprovou o Manual de Orientação de
Procedimentos para Cálculos na Justiça Federal e juros de mora, a partir da citação, de forma
global para as parcelas eventualmente anteriores a tal ato processual e de forma decrescente
para as parcelas posteriores até a data da conta de liquidação, que der origem ao precatório ou à
requisição de pequeno valor – RPV e juros de mora, nos termos da Lei nº 11.960/09. O réu foi
condenado, ainda, ao pagamento de honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por cento)
sobre o total da condenação, excluídas as parcelas vincendas, considerando-se as prestações
vencidas as compreendidas entre o termo inicial do benefício e a data da sentença (Súmula n.º
111 do STJ. Determinada a imediata implantação do benefício, tendo sido cumprida a decisão
judicial pelo réu.
O réu recorre, aduzindo não restarem preenchidos os requisitos para a concessão do benefício
em comento, posto que o estudo social produzido nos autos demonstra que o padrasto da autora
perceberia remuneração variável em torno de R$ 2.800,00 (dois mil e oitocentos reais), não
restando caracterizada a hipossuficência econômica. Subsidiariamente, requer que a correção
monetária seja computada nos moldes da Lei nº 11.960/09.
Contrarrazões da parte autora.
O i. representante do Ministério Público Federal opinou pelo provimento da apelação do réu.
É o relatório.
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 5070272-55.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANTONIA FABIA CARNEIRO XAVIER
REPRESENTANTE: ALESSANDRA DO LAGO CARNEIRO
Advogado do(a) APELADO: MARIANA OLIVEIRA DOS SANTOS - SP255541-N,
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Nos termos do art. 1011 do CPC, recebo a apelação do réu.
O benefício pretendido pela parte autora está previsto no artigo 203, V, da Constituição da
República, que dispõe:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de
contribuição à seguridade social, e tem por objetivo:
(...)
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou tê-la provida por sua
família, conforme dispuser a lei.
A regulamentação legislativa do dispositivo constitucional restou materializada com o advento da
Lei 8.742/93, que dispõe na redação atualizada do caput do seu artigo 20:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa
com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
Assim, para fazer jus ao amparo constitucional, o postulante deve ser portador de deficiência ou
ser idoso (65 anos ou mais) e ser incapaz de prover a própria manutenção ou tê-la provida por
sua família.
Quanto ao requisito relativo à deficiência, a Lei 8.742/93, que regulamentou a concessão do
dispositivo constitucional acima, dispunha no § 2º do seu artigo 20, em sua redação original:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à
pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais e que comprovem não
possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
(...)
§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela
incapacitada para a vida independente e para o trabalho.
Nesse ponto, cumpre salientar que o texto constitucional garante o pagamento de um salário
mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência, sem exigir, como fez a norma
regulamentadora, em sua redação original, a existência de incapacidade para a vida
independente e para o trabalho.
Nota-se, portanto, que ao definir os contornos da expressão pessoa portadora de deficiência
constante do dispositivo constitucional, a norma infraconstitucional reduziu a sua abrangência,
limitando o seu alcance aos casos em que a deficiência é geradora de incapacidade laborativa.
Todavia, observa-se que, em 10.07.2008, o Congresso Nacional promulgou o Decreto Legislativo
186/2008, aprovando, pelo rito previsto no artigo 5º, § 3º, da Constituição da República, o texto da
Convenção sobre os Direitos das Pessoas com deficiência e de seu Protocolo Facultativo,
assinados em Nova Iorque, em 30 de março de 2007, e conferindo à referida Convenção status
normativo equivalente ao das emendas constitucionais.
A Convenção, aprovada pelo Decreto Legislativo 186/2008, já no seu Artigo 1, cuidou de tratar do
conceito de "pessoa com deficiência", definição ora constitucionalizada pela adoção do rito do
artigo 5º, § 3º, da Carta, a saber:
Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir
sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais
pessoas.
Em coerência à alteração promovida em sede constitucional, o artigo 20, § 2º, da Lei 8.742/93,
viria a ser alterado pela Lei 12.470/11, passando a reproduzir em seu texto a definição de
"pessoa com deficiência" constante da norma superior. Dispõe a LOAS, em sua redação
atualizada:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa
com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
(...)
§ 2o Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que
tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais,
em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº
12.470, de 2011).
Não há dúvida, portanto, de que o conceito de 'deficiência' atualmente albergado é mais extenso
do que aquele outrora estabelecido, vez que considera como tal qualquer impedimento, inclusive
de natureza sensorial, que tenha potencialidade para a obstrução da participação social do
indivíduo em condições de igualdade.
Coerente com esta nova definição de 'deficiência' para fins de concessão do benefício
constitucional, a mencionada Lei 12.470/11 acrescentou à Lei 8.742/93 o artigo 21-A, com a
seguinte redação:
Art. 21-A. O benefício de prestação continuada será suspenso pelo órgão concedente quando a
pessoa com deficiência exercer atividade remunerada, inclusive na condição de
microempreendedor individual. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 1o Extinta a relação trabalhista ou a atividade empreendedora de que trata o caput deste artigo
e, quando for o caso, encerrado o prazo de pagamento do seguro-desemprego e não tendo o
beneficiário adquirido direito a qualquer benefício previdenciário, poderá ser requerida a
continuidade do pagamento do benefício suspenso, sem necessidade de realização de perícia
médica ou reavaliação da deficiência e do grau de incapacidade para esse fim, respeitado o
período de revisão previsto no caput do art. 21.
Verifica-se, portanto, que a legislação ordinária, em deferência às alterações promovidas em sede
constitucional, não apenas deixou de identificar os conceitos de 'incapacidade laborativa' e
'deficiência', como passou a autorizar expressamente que a pessoa com deficiência elegível à
concessão do amparo assistencial venha a exercer atividade laborativa - seja como empregada,
seja como microempreendedora - sem que tenha sua condição descaracterizada pelo trabalho,
ressalvada tão somente a suspensão do benefício enquanto este for exercido.
Observados estes parâmetros para a aferição da deficiência, no caso dos autos, a perícia médica,
datada de 07.11.2017, atesta que a autora, 18 anos de idade, estudante, é portadora de lábio
leporino, tendo sido submetida à cirurgia, necessitando de novo procedimento cirúrgico, que foi
suspenso, entretanto, em razão de ser portadora de hanseníase, em tratamento, portando lesão
na pele escurecida, com manchas claras em grande extensão na região posterior do tórax
esquerdo. Apresenta comprometimento psicológico importante, sofrendo bulling e dificuldade de
relacionamento pessoal e profissional, necessitando permanecer longo tempo internada, devido a
surgimento de lesões na pele. O perito concluiu por sua incapacidade total e temporária para o
trabalho, devendo ser reavaliadano prazo de um ano.
Em que pese o perito concluir pela incapacidade temporária da autora, há que se reconhecer que
as limitações por ela apresentadas, autorizam a concessão do benefício assistencial, caso
preencha o requisito socioeconômico, haja vista possuir 'impedimentos de longo prazo', com
potencialidade para 'obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade, em igualdade de
condições com outras pessoas.
Preenchido, portanto, o requisito concernente à deficiência física.
No que toca ao requisito socioeconômico, cumpre observar que o §3º do artigo 20 da Lei
8.742/93 estabeleceu para a sua aferição o critério de renda familiar per capita, observado o limite
de um quarto do salário mínimo, que restou mantido na redação dada pela Lei 12.435/11, acima
transcrita.
A questão relativa à constitucionalidade do critério de renda per capita não excedente a um
quarto do salário mínimo para que se considerasse o idoso ou pessoa com deficiência aptos à
concessão do benefício assistencial, foi analisada pelo E. Supremo Tribunal Federal em sede de
Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 1.232/DF), a qual foi julgada improcedente, por acórdão
que recebeu a seguinte ementa:
CONSTITUCIONAL. IMPUGNA DISPOSITIVO DE LEI FEDERAL QUE ESTABELECE O
CRITÉRIO PARA RECEBER O BENEFÍCIO DO INCISO V DO ART. 203, DA CF. INEXISTE A
RESTRIÇÃO ALEGADA EM FACE AO PRÓPRIO DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL QUE
REPORTA À LEI PARA FIXAR OS CRITÉRIOS DE GARANTIA DO BENEFÍCIO DE SALÁRIO
MÍNIMO À PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA FÍSICA E AO IDOSO. ESTA LEI TRAZ
HIPÓTESE OBJETIVA DE PRESTAÇÃO ASSISTENCIAL DO ESTADO. AÇÃO JULGADA
IMPROCEDENTE.
(STF. ADI 1.232-DF. Rel. p/ Acórdão Min. Nelson Jobim. J. 27.08.98; D.J. 01.06.2001).
Todavia, conquanto reconhecida a constitucionalidade do §3º do artigo 20, da Lei 8.742/93, a
jurisprudência evoluiu no sentido de que tal dispositivo estabelecia situação objetiva pela qual se
deve presumir pobreza de forma absoluta, mas não impedia o exame de situações subjetivas
tendentes a comprovar a condição de miserabilidade do requerente e de sua família. Tal
interpretação seria consolidada pelo E. Superior Tribunal de Justiça em recurso especial julgado
pela sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil (STJ - REsp. 1.112.557-MG;
Terceira Seção; Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho; j. 28.10.2009; DJ 20.11.2009).
O aparente descompasso entre o desenvolvimento da jurisprudência acerca da verificação da
miserabilidade dos postulantes ao benefício assistencial e o entendimento assentado por ocasião
do julgamento da ADI 1.232-DF levaria a Corte Suprema a voltar ao enfrentamento da questão,
após o reconhecimento da existência da sua repercussão geral, no âmbito da Reclamação 4374 -
PE, julgada em 18.04.2013.
Naquela ocasião, prevaleceu o entendimento de que "ao longo de vários anos desde a sua
promulgação, o §3º do art. 20 da LOAS passou por um processo de inconstitucionalização". Com
efeito, as significativas alterações no contexto socioeconômico desde então e o reflexo destas
nas políticas públicas de assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios
para aferição da miserabilidade previstos na Lei 8.742/93 e aqueles constantes no sistema de
proteção social que veio a se consolidar. Verifique-se:
Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição. (...)
4. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de
inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993.
(...)
Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças
fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos
patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais
por parte do Estado brasileiro).
5. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei
8.742/1993.
6. Reclamação constitucional julgada improcedente.
(Rcl 4374, Relator Ministro Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, j. 18.04.2013, DJe-173 03.09.2013).
Destarte, é de se reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação
específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência
é através da própria natureza dos males que a assolam, do seu grau e intensidade, que poderão
ser mensuradas suas necessidades. Não há, pois, que se enquadrar todos os indivíduos em um
mesmo patamar e entender que somente aqueles que contam com menos de um quarto do
salário-mínimo possam fazer jus ao benefício assistencial.
No caso dos autos, o estudo social realizado em 27.10.2017, dá conta de que a autora estaria
internada no Instituto Lauro de Souza Lima, em Bauru, na ocasião da visita. A composição
familiar consiste em sua mãe, do lar, sem renda, seu padrasto, trabalhador rural, com renda de
R$ 1.888,86, variável e dois irmãos, estudantes. Residem em imóvel alugado, no valor de R$
500,00, em casa localizadaem região urbana, em condições precárias, guarnecida por móveis e
eletrodomésticos necessários à sobrevivência, não possuindo automóvel. A autora
apresentavários problemas de saúde, possuindo lábio leporino e fenda palatina, realizando
tratamento no Hospital de Reabilitação Craniofacial da Universidade de São Paulo, em Bauru,
tendo sido submetida a cirurgias, apresentando dificuldades para falar, alimentar-se e realizar a
higiene bucal, afetando-lhe a autor-estima, necessitando de alimentação especial, já que tem
dificuldade para ingerir certos alimentos. Realiza, desde 03.10.2016, tratamento para hanseníase
virchowiana, com tratamento de eritema nodoso hansênico, cujo quadro inclui nódulos
subcutâneos dolorosos, acompanhado de febre, dores articulares e mal estar generalizado,
necessitando de cuidados especiaispara alimentação. Restou relatado que a autora necessitava
deslocar-se à cidade de Bauru, com frequência, para realizar o tratamento médico, encontrando-
se internada naquela ocasião. Foi informado, também, que o irmão Antônio também possuía
sérios problemas de saúde, já tendo perdido parte da visão e necessitando de dieta restritiva com
alimentação especial e tratamento fora do Município. A filha mais nova, Maria Clarice, realizava
tratamento para cefaléia crônica e a genitora da autora encontrava-se em tratamento psiquiátrico.
Apresentavavulnerabilidade financeira, devido aos problemas de saúde relatados e àfalta de
recursos financeiros para enfrenta-los.
Os dados do CNIS revelam, por seu turno, que seu padrastro manteve vínculo empregatício até
12/2018, com renda variável em torno de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais).
Entendo, entretanto, que o conjunto probatório existente nos autos demonstra que a parte autora
preenche o requisito da deficiência física, comprovando sua hipossuficiência econômica, fazendo
jus à concessão do benefício assistencial, tendo em vista a precariedade da situação econômica
da família, ante os diversos problemas de saúde enfrentados, perfazendo o núcleo familiar renda
per capita correspondente a R$ 480,00 (quatrocentos e oitenta reais) à época da última
remuneração do padrasto em dezembro de 2018.
Mantido o termo inicial do benefício na forma da sentença, ou seja, a contar da data da data da
citação (09/10/2017), devendo ser compensadas as parcelas pagas a título de antecipação de
tutela, quando da liquidação da sentença.
A correção monetária e os juros de mora deverão ser calculados de acordo com a lei de regência,
observando-se as teses firmadas pelo E.STF no julgamento do RE 870.947, realizado em
20.09.2017. Quanto aos juros de mora será observado o índice de remuneração da caderneta de
poupança a partir de 30.06.2009.
Tendo em vista o trabalho adicional do patrono da parte autora em grau recursal, nos termos do
artigo 85, § 11, do Novo Código de Processo Civil de 2015, fixo os honorários advocatícios em
10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data até a data do presente
julgamento, eis que de acordo com o entendimento da 10ª Turma desta E. Corte.
As parcelas pagas a título de antecipação de tutela deverão ser compensadas, quando da
liquidação da sentença
Diante do exposto, nego provimento à remessa oficiale à apelação do réu.
É como voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. PROCESSO CIVIL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA.
REQUISITOS LEGAIS COMPROVADOS. LEI 8.742/93, ART. 20, §3º. DEFICIÊNCIA.
INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO E. STF. HIPOSSUFICIÊNCIA
ECONÔMICA. VERBAS ACESSÓRIAS.
I- Não se olvida que o conceito de "pessoa portadora de deficiência" para fins de proteção estatal
e de concessão do benefício assistencial haja sido significativamente ampliado com as alterações
trazidas após a introdução no ordenamento pátrio da Convenção sobre os Direitos das Pessoas
com Deficiência e de seu Protocolo Facultativo, aprovada pelo Decreto Legislativo 186/2008, na
forma do artigo 5º, § 3º, da Constituição da República, "in casu" tratando-se de autora
incapacitada de forma total e temporária para o trabalho.
II- Quanto à hipossuficiência econômica, à luz da jurisprudência consolidada no âmbito do E. STJ
e do posicionamento usual desta C. Turma, no sentido de que o art. 20, §3º, da Lei 8.742/93
define limite objetivo de renda per capita a ser considerada, mas não impede a comprovação da
miserabilidade pela análise da situação específica de quem pleiteia o benefício. (Precedente do
E. STJ).
III- Em que pese a improcedência da ADIN 1.232-DF, em julgamento recente dos Recursos
Extraordinários 567.985-MT e 580.983-PR, bem como da Reclamação 4.374, o E. Supremo
Tribunal Federal modificou o posicionamento adotado anteriormente, para entender pela
inconstitucionalidade do disposto no art. 20, §3º, da Lei 8.742/93.
IV - O entendimento que prevalece atualmente no âmbito do E. STF é os de que as significativas
alterações no contexto socioeconômico desde a edição da Lei 8.742/93 e o reflexo destas nas
políticas públicas de assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios para
aferição da miserabilidade previstos na LOAS e aqueles constantes no sistema de proteção.
V-A correção monetária e os juros de mora deverão ser calculados de acordo com a lei de
regência, observando-se as teses firmadas pelo E.STF no julgamento do RE 870.947, realizado
em 20.09.2017. Quanto aos juros de mora será observado o índice de remuneração da caderneta
de poupança a partir de 30.06.2009.
VI- Tendo em vista o trabalho adicional do patrono da parte autora em grau recursal, nos termos
do artigo 85, § 11, do Novo Código de Processo Civil de 2015, fixo os honorários advocatícios em
10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data até a data do presente
julgamento, eis que de acordo com o entendimento da 10ª Turma desta E. Corte.
VII- Remessa Oficial e Apelação do réu improvidas.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à remessa
oficial tida por interposta e à apelação do réu, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
