Processo
ApReeNec - APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO / SP
5364470-66.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal SERGIO DO NASCIMENTO
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
05/03/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 10/03/2020
Ementa
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. PROCESSO CIVIL. REMESSA OFICIAL NÃO CONHECIDA. BENEFÍCIO
DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. REQUISITOS LEGAIS COMPROVADOS. LEI 8.742/93, ART.
20, §3º. DEFICIÊNCIA. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO E. STF.
HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. TERMO INICIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
I - Remessa oficial tida não conhecida, tendo em vista julgado proferido pelo C. STJ, ao apreciar o
REsp 1.735.097/RS (08/10/2019), Rel. Min. Gurgel de Faria, entendendo que “não obstante a
aparente iliquidez das condenações em causas de natureza previdenciária, a sentença que
defere benefício previdenciário é espécie absolutamente mensurável, visto que pode ser aferível
por simples cálculos aritméticos, os quais são expressamente previstos na lei de regência, e são
realizados pelo próprio INSS”, e observando-se o disposto no artigo 496, §3º, I do CPC.
II - Não se olvida que o conceito de "pessoa portadora de deficiência" para fins de proteção
estatal e de concessão do benefício assistencial haja sido significativamente ampliado com as
alterações trazidas após a introdução no ordenamento pátrio da Convenção sobre os Direitos das
Pessoas com Deficiência e de seu Protocolo Facultativo, aprovada pelo Decreto Legislativo
186/2008, na forma do artigo 5º, § 3º, da Constituição da República,"in casu", tratando-se de
autora incapacitadade forma parcial e permanente para o trabalho, concorra em condições de
igualdade no mercado de trabalho.
III - Quanto à hipossuficiência econômica, à luz da jurisprudência consolidada no âmbito do E.
STJ e do posicionamento usual desta C. Turma, no sentido de que o art. 20, §3º, da Lei 8.742/93
define limite objetivo de renda per capita a ser considerada, mas não impede a comprovação da
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
miserabilidade pela análise da situação específica de quem pleiteia o benefício. (Precedente do
E. STJ).
IV - Em que pese a improcedência da ADIN 1.232-DF, em julgamento recente dos Recursos
Extraordinários 567.985-MT e 580.983-PR, bem como da Reclamação 4.374, o E. Supremo
Tribunal Federal modificou o posicionamento adotado anteriormente, para entender pela
inconstitucionalidade do disposto no art. 20, §3º, da Lei 8.742/93.
V - O entendimento que prevalece atualmente no âmbito do E. STF é os de que as significativas
alterações no contexto socioeconômico desde a edição da Lei 8.742/93 e o reflexo destas nas
políticas públicas de assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios para
aferição da miserabilidade previstos na LOAS e aqueles constantes no sistema de proteção.
VI -O termo inicial do benefício deve ser fixado a partir da data da citação, em razão da
impossibilidade de aferição da hipossuficiência em momento anterior, já que houve alteração da
composição do grupo familiar.
VII - Tendo em vista o parcial provimento do recurso do réu, a teor do parágrafo 11 do artigo 85
do CPC, mantidos os honorários advocatícios, fixados em 15% (quinze por cento), incidentes
sobre o valor das prestações vencidas até a data da sentença, conforme entendimento desta
Décima Turma.
VIII- Remessa Oficial não conhecida. Apelação do INSS parcialmente provida.
Acórdao
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº5364470-66.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CLELIA FERREIRA
CURADOR: SEBASTIAO LUIS FERREIRA
Advogado do(a) APELADO: MILENE DE FARIA CAMARGO - SP168430-N,
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº5364470-66.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CLELIA FERREIRA
CURADOR: SEBASTIAO LUIS FERREIRA
Advogado do(a) APELADO: MILENE DE FARIA CAMARGO - SP168430-N,
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Sérgio Nascimento (Relator): Trata-se de remessa oficial e
apelação interposta em face de sentença pela qual foi julgado procedente o pedido em ação
previdenciária para condenar o réu a conceder à autora o benefício de prestação continuada, no
valor de um salário mínimo, a contar da data do requerimento administrativo (17.06.2015). Sobre
as prestações atrasadas deverá incidir correção monetária pelo INPCejuros de mora nos termos
da Lei nº 11.960/09. O réu foi condenado ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em
15% (quinze por cento) sobre o valor das prestações vencidas até a data da sentença. Sem
condenação em custas processuais. Concedida a tutela antecipada, para a implantação imediata
do benefício.
Noticiada pelo réu a implantação do benefício.
O réu apelante, em suas razões, alega, em síntese, não restarem preenchidos os requisitos para
a concessão do benefício em comento, pela ausência de comprovação de deficiência da autora.
Requer a atribuição de efeito suspensivo à apelação, diante da irreversibilidade do provimento,
bem como seja observada a prescrição quinquenal.
Com as contrarrazões da parte autora, os autos vieram a esta E. Corte.
O i. representante do Ministério Público Federal, em seu parecer,opinou pelo provimento da
apelação do réu, com a improcedência do pedido inicial.
É o Relatório.
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº5364470-66.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CLELIA FERREIRA
CURADOR: SEBASTIAO LUIS FERREIRA
Advogado do(a) APELADO: MILENE DE FARIA CAMARGO - SP168430-N,
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Nos termos do art. 1011 do CPC, recebo a apelação do réu.
Da remessa oficial
Tendo em vista julgado proferido pelo C. STJ, ao apreciar o REsp 1.735.097/RS (08/10/2019),
Rel. Min. Gurgel de Faria, entendendo que “não obstante a aparente iliquidez das condenações
em causas de natureza previdenciária, a sentença que defere benefício previdenciário é espécie
absolutamente mensurável, visto que pode ser aferível por simples cálculos aritméticos, os quais
são expressamente previstos na lei de regência, e são realizados pelo próprio INSS”, e
observando-se o disposto no artigo 496, §3º, I do CPC, não conheço da remessa oficial.
Do mérito
O benefício pretendido pela parte autora está previsto no artigo 203, V, da Constituição da
República, que dispõe:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de
contribuição à seguridade social, e tem por objetivo:
(...)
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou tê-la provida por sua
família, conforme dispuser a lei.
A regulamentação legislativa do dispositivo constitucional restou materializada com o advento da
Lei 8.742/93, que dispõe na redação atualizada do caput do seu artigo 20:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa
com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
Assim, para fazer jus ao amparo constitucional, o postulante deve ser portador de deficiência ou
ser idoso (65 anos ou mais) e ser incapaz de prover a própria manutenção ou tê-la provida por
sua família.
Quanto ao requisito relativo à deficiência, a Lei 8.742/93, que regulamentou a concessão do
dispositivo constitucional acima, dispunha no § 2º do seu artigo 20, em sua redação original:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à
pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais e que comprovem não
possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
(...)
§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela
incapacitada para a vida independente e para o trabalho.
Nesse ponto, cumpre salientar que o texto constitucional garante o pagamento de um salário
mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência, sem exigir, como fez a norma
regulamentadora, em sua redação original, a existência de incapacidade para a vida
independente e para o trabalho.
Nota-se, portanto, que ao definir os contornos da expressão pessoa portadora de deficiência
constante do dispositivo constitucional, a norma infraconstitucional reduziu a sua abrangência,
limitando o seu alcance aos casos em que a deficiência é geradora de incapacidade laborativa.
Todavia, observa-se que, em 10.07.2008, o Congresso Nacional promulgou o Decreto Legislativo
186/2008, aprovando, pelo rito previsto no artigo 5º, § 3º, da Constituição da República, o texto da
Convenção sobre os Direitos das Pessoas com deficiência e de seu Protocolo Facultativo,
assinados em Nova Iorque, em 30 de março de 2007, e conferindo à referida Convenção status
normativo equivalente ao das emendas constitucionais.
A Convenção, aprovada pelo Decreto Legislativo 186/2008, já no seu Artigo 1, cuidou de tratar do
conceito de "pessoa com deficiência", definição ora constitucionalizada pela adoção do rito do
artigo 5º, § 3º, da Carta, a saber:
Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir
sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais
pessoas.
Em coerência à alteração promovida em sede constitucional, o artigo 20, § 2º, da Lei 8.742/93,
viria a ser alterado pela Lei 12.470/11, passando a reproduzir em seu texto a definição de
"pessoa com deficiência" constante da norma superior. Dispõe a LOAS, em sua redação
atualizada:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa
com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
(...)
§ 2o Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que
tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais,
em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº
12.470, de 2011).
Não há dúvida, portanto, de que o conceito de 'deficiência' atualmente albergado é mais extenso
do que aquele outrora estabelecido, vez que considera como tal qualquer impedimento, inclusive
de natureza sensorial, que tenha potencialidade para a obstrução da participação social do
indivíduo em condições de igualdade.
Coerente com esta nova definição de 'deficiência' para fins de concessão do benefício
constitucional, a mencionada Lei 12.470/11 acrescentou à Lei 8.742/93 o artigo 21-A, com a
seguinte redação:
Art. 21-A. O benefício de prestação continuada será suspenso pelo órgão concedente quando a
pessoa com deficiência exercer atividade remunerada, inclusive na condição de
microempreendedor individual. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 1o Extinta a relação trabalhista ou a atividade empreendedora de que trata o caput deste artigo
e, quando for o caso, encerrado o prazo de pagamento do seguro-desemprego e não tendo o
beneficiário adquirido direito a qualquer benefício previdenciário, poderá ser requerida a
continuidade do pagamento do benefício suspenso, sem necessidade de realização de perícia
médica ou reavaliação da deficiência e do grau de incapacidade para esse fim, respeitado o
período de revisão previsto no caput do art. 21.
Verifica-se, portanto, que a legislação ordinária, em deferência às alterações promovidas em sede
constitucional, não apenas deixou de identificar os conceitos de 'incapacidade laborativa' e
'deficiência', como passou a autorizar expressamente que a pessoa com deficiência elegível à
concessão do amparo assistencial venha a exercer atividade laborativa - seja como empregada,
seja como microempreendedora - sem que tenha sua condição descaracterizada pelo trabalho,
ressalvada tão somente a suspensão do benefício enquanto este for exercido.
Observados estes parâmetros para a aferição da deficiência, no caso dos autos, o laudo médico
pericial realizado em 04.09.2018, atesta que a autora, 47 anos de idade, é portadora de retardo
mental moderado e esquizofrenia, com significativo comprometimento do
comportamento,apresentando dependência de terceiros para as atividades diárias e necessidade
de vigilância e monitoramento,encontrando-se incapacitadade forma total e permanente para o
trabalho.
Resta, pois, preenchido o requisito concernente à deficiência física.
No que toca ao requisito socioeconômico, cumpre observar que o §3º do artigo 20 da Lei
8.742/93 estabeleceu para a sua aferição o critério de renda familiar per capita, observado o limite
de um quarto do salário mínimo, que restou mantido na redação dada pela Lei 12.435/11, acima
transcrita.
A questão relativa à constitucionalidade do critério de renda per capita não excedente a um
quarto do salário mínimo para que se considerasse o idoso ou pessoa com deficiência aptos à
concessão do benefício assistencial, foi analisada pelo E. Supremo Tribunal Federal em sede de
Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 1.232/DF), a qual foi julgada improcedente, por acórdão
que recebeu a seguinte ementa:
CONSTITUCIONAL. IMPUGNA DISPOSITIVO DE LEI FEDERAL QUE ESTABELECE O
CRITÉRIO PARA RECEBER O BENEFÍCIO DO INCISO V DO ART. 203, DA CF. INEXISTE A
RESTRIÇÃO ALEGADA EM FACE AO PRÓPRIO DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL QUE
REPORTA À LEI PARA FIXAR OS CRITÉRIOS DE GARANTIA DO BENEFÍCIO DE SALÁRIO
MÍNIMO À PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA FÍSICA E AO IDOSO. ESTA LEI TRAZ
HIPÓTESE OBJETIVA DE PRESTAÇÃO ASSISTENCIAL DO ESTADO. AÇÃO JULGADA
IMPROCEDENTE.
(STF. ADI 1.232-DF. Rel. p/ Acórdão Min. Nelson Jobim. J. 27.08.98; D.J. 01.06.2001).
Todavia, conquanto reconhecida a constitucionalidade do §3º do artigo 20, da Lei 8.742/93, a
jurisprudência evoluiu no sentido de que tal dispositivo estabelecia situação objetiva pela qual se
deve presumir pobreza de forma absoluta, mas não impedia o exame de situações subjetivas
tendentes a comprovar a condição de miserabilidade do requerente e de sua família. Tal
interpretação seria consolidada pelo E. Superior Tribunal de Justiça em recurso especial julgado
pela sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil (STJ - REsp. 1.112.557-MG;
Terceira Seção; Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho; j. 28.10.2009; DJ 20.11.2009).
O aparente descompasso entre o desenvolvimento da jurisprudência acerca da verificação da
miserabilidade dos postulantes ao benefício assistencial e o entendimento assentado por ocasião
do julgamento da ADI 1.232-DF levaria a Corte Suprema a voltar ao enfrentamento da questão,
após o reconhecimento da existência da sua repercussão geral, no âmbito da Reclamação 4374 -
PE, julgada em 18.04.2013.
Naquela ocasião, prevaleceu o entendimento de que "ao longo de vários anos desde a sua
promulgação, o §3º do art. 20 da LOAS passou por um processo de inconstitucionalização". Com
efeito, as significativas alterações no contexto socioeconômico desde então e o reflexo destas
nas políticas públicas de assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios
para aferição da miserabilidade previstos na Lei 8.742/93 e aqueles constantes no sistema de
proteção social que veio a se consolidar. Verifique-se:
Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição. (...)
4. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de
inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993.
(...)
Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças
fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos
patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais
por parte do Estado brasileiro).
5. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei
8.742/1993.
6. Reclamação constitucional julgada improcedente.
(Rcl 4374, Relator Ministro Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, j. 18.04.2013, DJe-173 03.09.2013).
Destarte, é de se reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação
específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência
é através da própria natureza dos males que a assolam, do seu grau e intensidade, que poderão
ser mensuradas suas necessidades. Não há, pois, que se enquadrar todos os indivíduos em um
mesmo patamar e entender que somente aqueles que contam com menos de um quarto do
salário-mínimo possam fazer jus ao benefício assistencial.
No caso dos autos, o estudo social realizado em 14.11.2018, constatou que aautora, interditada,
reside, de favor, com uma sobrinha, a Sra. Madalena Ferreira de Oliveira, viúva, e a filha desta,
Michele, em imóvel alugado. Informa que anteriormente vivia com um irmão, Benedito Ferreira,
que faleceu em 2017, e passou a residir com a sobrinha em razão da proximidade com os locais
de tratamento médico. O curador da autora, seu irmão, Sebastião Luís Ferreira, está
desempregado, e reside sozinho.A casa é simples, composta por dois quartos, sala, cozinha,
banheiro e área de serviço, com revestimento de cerâmica e azulejo na cozinha e banheiro,
guarnecida com móveis e eletrodomésticos básico. A autora dorme na sala, em um sofá-cama. A
sobrinha e a filha possuem dois aparelhos celulares e um automóvel C3, ano 2014, financiado. A
renda mensal declarada é proveniente do benefício de pensão por morte da sobrinha, no valor de
R$ 1.800,00, mais os rendimentos que percebe como cuidadora de idosos, no valor de R$ R$
1.600,00, bem como pelo salário de sua filha, como secretária em uma clínica médica, sem
registro em CTPS, no valor de R$ 1.200,00, perfazendo um total de R$ 4.600,00. As despesas
mensais declaradas são na ordem de R$ 3.202,00, compostas por gastos com água, energia
elétrica, gás, alimentação, aluguel, IPTU e financiamento de automóvel.
Importante ressaltar que a demandante reside de favor, sendo que sua sobrinha e a sobrinha-
netanão compõem o seu núcleo familiar, para fins de concessão do benefício, nos termos do
disposto no artigo 20, § 1º, da LOAS, in verbis:
Art. 20.§ 1oPara os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge
ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos
solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo
teto. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
Entendo, assim, que o conjunto probatório existente nos autos demonstra que a parte autora
preenche o requisito da deficiência física, comprovando sua hipossuficiência econômica, fazendo
jus à concessão do benefício assistencial.
O termo inicial do benefício deve ser fixadoa partir da data da citação (13.04.2018), tendo em
vista a impossibilidade de aferição da hipossuficiência em momento anterior, em razão da
alteração na composição do grupo familiar.
A correção monetária e os juros de mora deverão ser calculados de acordo com a lei de regência.
Tendo em vista o provimento parcial do recurso do réu, a teor do parágrafo 11 do artigo 85 do
CPC, mantidos os honorários advocatícios, fixados em 15% (quinze por cento), incidentes sobre o
valor das prestações vencidas até a data da sentença, conforme entendimento desta Décima
Turma.
As prestações em atraso serão resolvidas em liquidação, compensando-se as adimplidas por
força da tutela antecipada.
Diante do exposto,não conheço da remessa oficial e dou parcial provimento à apelação do INSS,
para alterar o termo inicial do benefício para a data da citação.
Expeça-se e-mail ao INSS, comunicando-lhe a alteração do termo inicial do benefício para
13.04.2018.
É como voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. PROCESSO CIVIL. REMESSA OFICIAL NÃO CONHECIDA. BENEFÍCIO
DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. REQUISITOS LEGAIS COMPROVADOS. LEI 8.742/93, ART.
20, §3º. DEFICIÊNCIA. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO E. STF.
HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. TERMO INICIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
I - Remessa oficial tida não conhecida, tendo em vista julgado proferido pelo C. STJ, ao apreciar o
REsp 1.735.097/RS (08/10/2019), Rel. Min. Gurgel de Faria, entendendo que “não obstante a
aparente iliquidez das condenações em causas de natureza previdenciária, a sentença que
defere benefício previdenciário é espécie absolutamente mensurável, visto que pode ser aferível
por simples cálculos aritméticos, os quais são expressamente previstos na lei de regência, e são
realizados pelo próprio INSS”, e observando-se o disposto no artigo 496, §3º, I do CPC.
II - Não se olvida que o conceito de "pessoa portadora de deficiência" para fins de proteção
estatal e de concessão do benefício assistencial haja sido significativamente ampliado com as
alterações trazidas após a introdução no ordenamento pátrio da Convenção sobre os Direitos das
Pessoas com Deficiência e de seu Protocolo Facultativo, aprovada pelo Decreto Legislativo
186/2008, na forma do artigo 5º, § 3º, da Constituição da República,"in casu", tratando-se de
autora incapacitadade forma parcial e permanente para o trabalho, concorra em condições de
igualdade no mercado de trabalho.
III - Quanto à hipossuficiência econômica, à luz da jurisprudência consolidada no âmbito do E.
STJ e do posicionamento usual desta C. Turma, no sentido de que o art. 20, §3º, da Lei 8.742/93
define limite objetivo de renda per capita a ser considerada, mas não impede a comprovação da
miserabilidade pela análise da situação específica de quem pleiteia o benefício. (Precedente do
E. STJ).
IV - Em que pese a improcedência da ADIN 1.232-DF, em julgamento recente dos Recursos
Extraordinários 567.985-MT e 580.983-PR, bem como da Reclamação 4.374, o E. Supremo
Tribunal Federal modificou o posicionamento adotado anteriormente, para entender pela
inconstitucionalidade do disposto no art. 20, §3º, da Lei 8.742/93.
V - O entendimento que prevalece atualmente no âmbito do E. STF é os de que as significativas
alterações no contexto socioeconômico desde a edição da Lei 8.742/93 e o reflexo destas nas
políticas públicas de assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios para
aferição da miserabilidade previstos na LOAS e aqueles constantes no sistema de proteção.
VI -O termo inicial do benefício deve ser fixado a partir da data da citação, em razão da
impossibilidade de aferição da hipossuficiência em momento anterior, já que houve alteração da
composição do grupo familiar.
VII - Tendo em vista o parcial provimento do recurso do réu, a teor do parágrafo 11 do artigo 85
do CPC, mantidos os honorários advocatícios, fixados em 15% (quinze por cento), incidentes
sobre o valor das prestações vencidas até a data da sentença, conforme entendimento desta
Décima Turma.
VIII- Remessa Oficial não conhecida. Apelação do INSS parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egregia Decima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3 Regiao, por unanimidade, nao conhecer da remessa
oficial e dar parcial provimento a apelacao do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
