Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5001077-17.2017.4.03.6119
Relator(a)
Desembargador Federal SERGIO DO NASCIMENTO
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
14/03/2019
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 18/03/2019
Ementa
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. PROCESSO CIVIL. REMESSA OFICIAL TIDA POR INTERPOSTA.
PRELIMINAR. PROPOSTA DE ACORDO PREJUDICADA. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO
CONTINUADA. REQUISITOS LEGAIS COMPROVADOS. LEI 8.742/93, ART. 20, §3º.
DEFICIÊNCIA. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO E. STF.
HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. VERBAS ACESSÓRIAS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
I- Prejudicada a preliminar de proposta de acordo, diante da expressa recusa do autor.
II - Aplica-se ao caso o Enunciado da Súmula 490 do E. STJ, que assim dispõe: A dispensa de
reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a
sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas.III - Não se olvida que o conceito
de "pessoa portadora de deficiência" para fins de proteção estatal e de concessão do benefício
assistencial haja sido significativamente ampliado com as alterações trazidas após a introdução
no ordenamento pátrio da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu
Protocolo Facultativo, aprovada pelo Decreto Legislativo 186/2008, na forma do artigo 5º, § 3º, da
Constituição da República, "in casu" tratando-se de autor incapacitado de forma parcial e
permanente para o trabalho, concorra em condições de igualdade no mercado de trabalho.IV-
Quanto à hipossuficiência econômica, à luz da jurisprudência consolidada no âmbito do E. STJ e
do posicionamento usual desta C. Turma, no sentido de que o art. 20, §3º, da Lei 8.742/93 define
limite objetivo de renda per capita a ser considerada, mas não impede a comprovação da
miserabilidade pela análise da situação específica de quem pleiteia o benefício. (Precedente do
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
E. STJ).V - Em que pese a improcedência da ADIN 1.232-DF, em julgamento recente dos
Recursos Extraordinários 567.985-MT e 580.983-PR, bem como da Reclamação 4.374, o E.
Supremo Tribunal Federal modificou o posicionamento adotado anteriormente, para entender pela
inconstitucionalidade do disposto no art. 20, §3º, da Lei 8.742/93.VI - O entendimento que
prevalece atualmente no âmbito do E. STF é os de que as significativas alterações no contexto
socioeconômico desde a edição da Lei 8.742/93 e o reflexo destas nas políticas públicas de
assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios para aferição da
miserabilidade previstos na LOAS e aqueles constantes no sistema de proteção.VII-A correção
monetária e os juros de mora deverão ser calculados de acordo com a lei de regência,
observando-se as teses firmadas pelo E.STF no julgamento do RE 870.947, realizado em
20.09.2017. Quanto aos juros de mora será observado o índice de remuneração da caderneta de
poupança a partir de 30.06.2009.VIII- Tendo em vista o trabalho adicional do patrono da parte
autora em grau recursal, a teor do parágrafo 11 do artigo 85 do CPC, os honorários advocatícios,
fixados em 10% (dezpor cento), devem incidir sobre as prestações que seriam devidas até a data
do presente acórdão, conforme entendimento desta Décima Turma.IX- Preliminar prejudicada.
Remessa Oficial tida por interposta e apelação do réu improvidas.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001077-17.2017.4.03.6119
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOAO FRANCISCO BELORNINO PESSOA
Advogado do(a) APELADO: ADRIANA MOREIRA NUNES GODOI - SP128523-A
APELAÇÃO (198) Nº 5001077-17.2017.4.03.6119
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOAO FRANCISCO BELORNINO PESSOA
Advogado do(a) APELADO: ADRIANA MOREIRA NUNES GODOI - SP128523-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Sérgio Nascimento (Relator): Trata-se de apelação de
sentença pela qual foi julgado procedente o pedido em ação previdenciária para condenar o réu a
conceder à autora o benefício de prestação continuada, no valor de um salário mínimo, a contar
da data do requerimento administrativo efetuado em 26.05.2014. Sobre as prestações atrasadas
deverá incidir correção monetária, calculada com base no INPC e jurosde mora, consoante Lei nº
11.960/09, a partir da data da citação. O réu foi condenado ao pagamento de honorários
advocatícios, fixados em 10% (dezpor cento) sobre o valor das prestações vencidas até a data da
sentença. Sem condenação em custas processuais. Confirmada a tutela antecipada
anteriormente deferida.
O réu recorre, requerendo, preliminarmente, a manifestação do autor sobre proposta de acordo.
Quanto ao mérito, requer a reforma parcial da sentença, a fim de que a correção monetária e os
juros de mora sejam calculados na forma da Lei n. 11.960/09.
Com as contrarrazões da parte autora, os autos vieram a esta E. Corte.O i. representante do
Ministério Público Federal consignou a desnecessidade de intervenção no feito.
É o relatório.
APELAÇÃO (198) Nº 5001077-17.2017.4.03.6119
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOAO FRANCISCO BELORNINO PESSOA
Advogado do(a) APELADO: ADRIANA MOREIRA NUNES GODOI - SP128523-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Nos termos do art. 1011 do CPC, recebo a apelação do réu .
Da remessa oficial tida por interpostaAplica-se ao caso o Enunciado da Súmula 490 do E. STJ,
que assim dispõe:A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do
direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças
ilíquidas.Da preliminar
Diante da expressa discordância do autor, resta prejudicada a preliminar de proposta de acordo
apresentada pela autarquia.
Do méritoO benefício pretendido pela parte autora está previsto no artigo 203, V, da Constituição
da República, que dispõe:Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar,
independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivo:(...)V - a garantia de
um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que
comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou tê-la provida por sua família,
conforme dispuser a lei.A regulamentação legislativa do dispositivo constitucional restou
materializada com o advento da Lei 8.742/93, que dispõe na redação atualizada do caput do seu
artigo 20:Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal
à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem
não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.Assim,
para fazer jus ao amparo constitucional, o postulante deve ser portador de deficiência ou ser
idoso (65 anos ou mais) e ser incapaz de prover a própria manutenção ou tê-la provida por sua
família.Quanto ao requisito relativo à deficiência, a Lei 8.742/93, que regulamentou a concessão
do dispositivo constitucional acima, dispunha no § 2º do seu artigo 20, em sua redação
original:Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo
mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais e que
comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua
família.(...)§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é
aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho.Nesse ponto, cumpre salientar
que o texto constitucional garante o pagamento de um salário mínimo mensal à pessoa portadora
de deficiência, sem exigir, como fez a norma regulamentadora, em sua redação original, a
existência de incapacidade para a vida independente e para o trabalho.Nota-se, portanto, que ao
definir os contornos da expressão pessoa portadora de deficiênciaconstante do dispositivo
constitucional, a norma infraconstitucional reduziu a sua abrangência, limitando o seu alcance aos
casos em que a deficiência é geradora de incapacidade laborativa.Todavia, observa-se que, em
10.07.2008, o Congresso Nacional promulgou o Decreto Legislativo 186/2008, aprovando, pelo
rito previsto no artigo 5º, § 3º, da Constituição da República, o texto da Convenção sobre os
Direitos das Pessoas com deficiência e de seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova Iorque,
em 30 de março de 2007, e conferindo à referida Convenção status normativo equivalente ao das
emendas constitucionais.A Convenção, aprovada pelo Decreto Legislativo 186/2008, já no seu
Artigo 1, cuidou de tratar do conceito de "pessoa com deficiência", definição ora
constitucionalizada pela adoção do rito do artigo 5º, § 3º, da Carta, a saber:Pessoas com
deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental,
intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua
participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais
pessoas.Em coerência à alteração promovida em sede constitucional, o artigo 20, § 2º, da Lei
8.742/93, viria a ser alterado pela Lei 12.470/11, passando a reproduzir em seu texto a definição
de "pessoa com deficiência" constante da norma superior. Dispõe a LOAS, em sua redação
atualizada:Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo
mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que
comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua
família.(...)§ 2o Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência
aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial,
os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº
12.470, de 2011).Não há dúvida, portanto, de que o conceito de 'deficiência' atualmente
albergado é mais extenso do que aquele outrora estabelecido, vez que considera como tal
qualquer impedimento, inclusive de natureza sensorial, que tenha potencialidade para a
obstrução da participação social do indivíduo em condições de igualdade.Coerente com esta nova
definição de 'deficiência' para fins de concessão do benefício constitucional, a mencionada Lei
12.470/11 acrescentou à Lei 8.742/93 o artigo 21-A, com a seguinte redação:Art. 21-A. O
benefício de prestação continuada será suspenso pelo órgão concedente quando a pessoa com
deficiência exercer atividade remunerada, inclusive na condição de microempreendedor
individual. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)§ 1o Extinta a relação trabalhista ou a atividade
empreendedora de que trata o caput deste artigo e, quando for o caso, encerrado o prazo de
pagamento do seguro-desemprego e não tendo o beneficiário adquirido direito a qualquer
benefício previdenciário, poderá ser requerida a continuidade do pagamento do benefício
suspenso, sem necessidade de realização de perícia médica ou reavaliação da deficiência e do
grau de incapacidade para esse fim, respeitado o período de revisão previsto no caput do art.
21.Verifica-se, portanto, que a legislação ordinária, em deferência às alterações promovidas em
sede constitucional, não apenas deixou de identificar os conceitos de 'incapacidade laborativa' e
'deficiência', como passou a autorizar expressamente que a pessoa com deficiência elegível à
concessão do amparo assistencial venha a exercer atividade laborativa - seja como empregada,
seja como microempreendedora - sem que tenha sua condição descaracterizada pelo trabalho,
ressalvada tão somente a suspensão do benefício enquanto este for exercido.
Observados estes parâmetros para a aferição da deficiência, no caso dos autos, a perícia médica
realizada em 23.06.2017 revela que o autor apresentou uma doença vascular/circulatóriado
membro inferior direito – aneurisma de artéria poplítea, associadamente a uma oclusão desta
mesma artéria. Em março de 2014 realizou procedimento cirúrgico para reconstrução e
desobstrução arterial em resultado parcialmente satisfatório. Devido à gravidade da doença,
evoluiu com prejuízo circulatório definitivo do membro inferior direito, que se manifesta por
dificuldade à marcha com claudicação moderada e redução de sensibilidade cutânea. Possui
diagnóstico, ainda, de hipertensão arterial sistêmica, diabetes mellitus e hipercolesterolemia.
Tudo isto gera a incapacidade total e permanente do autor para o trabalho, desde março de 2014.
Assim, preenchido o requisito concernente à deficiência física.
No que toca ao requisito socioeconômico, cumpre observar que o §3º do artigo 20 da Lei
8.742/93 estabeleceu para a sua aferição o critério de renda familiar per capita, observado o limite
de um quarto do salário mínimo, que restou mantido na redação dada pela Lei 12.435/11, acima
transcrita.
A questão relativa à constitucionalidade do critério de renda per capita não excedente a um
quarto do salário mínimo para que se considerasse o idoso ou pessoa com deficiência aptos à
concessão do benefício assistencial, foi analisada pelo E. Supremo Tribunal Federal em sede de
Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 1.232/DF), a qual foi julgada improcedente, por acórdão
que recebeu a seguinte ementa:
CONSTITUCIONAL. IMPUGNA DISPOSITIVO DE LEI FEDERAL QUE ESTABELECE O
CRITÉRIO PARA RECEBER O BENEFÍCIO DO INCISO V DO ART. 203, DA CF. INEXISTE A
RESTRIÇÃO ALEGADA EM FACE AO PRÓPRIO DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL QUE
REPORTA À LEI PARA FIXAR OS CRITÉRIOS DE GARANTIA DO BENEFÍCIO DE SALÁRIO
MÍNIMO À PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA FÍSICA E AO IDOSO. ESTA LEI TRAZ
HIPÓTESE OBJETIVA DE PRESTAÇÃO ASSISTENCIAL DO ESTADO. AÇÃO JULGADA
IMPROCEDENTE.(STF. ADI 1.232-DF. Rel. p/ Acórdão Min. Nelson Jobim. J. 27.08.98; D.J.
01.06.2001).
Todavia, conquanto reconhecida a constitucionalidade do §3º do artigo 20, da Lei 8.742/93, a
jurisprudência evoluiu no sentido de que tal dispositivo estabelecia situação objetiva pela qual se
deve presumir pobreza de forma absoluta, mas não impedia o exame de situações subjetivas
tendentes a comprovar a condição de miserabilidade do requerente e de sua família. Tal
interpretação seria consolidada pelo E. Superior Tribunal de Justiça em recurso especial julgado
pela sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil (STJ - REsp. 1.112.557-MG;
Terceira Seção; Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho; j. 28.10.2009; DJ 20.11.2009).
O aparente descompasso entre o desenvolvimento da jurisprudência acerca da verificação da
miserabilidade dos postulantes ao benefício assistencial e o entendimento assentado por ocasião
do julgamento da ADI 1.232-DF levaria a Corte Suprema a voltar ao enfrentamento da questão,
após o reconhecimento da existência da sua repercussão geral, no âmbito da Reclamação 4374 -
PE, julgada em 18.04.2013.
Naquela ocasião, prevaleceu o entendimento de que "ao longo de vários anos desde a sua
promulgação, o §3º do art. 20 da LOAS passou por um processo de inconstitucionalização". Com
efeito, as significativas alterações no contexto socioeconômico desde então e o reflexo destas
nas políticas públicas de assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios
para aferição da miserabilidade previstos na Lei 8.742/93 e aqueles constantes no sistema de
proteção social que veio a se consolidar. Verifique-se:
Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição. (...)4. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e
Processo de inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993. (...)Verificou-se a
ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas
(políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares
econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte
do Estado brasileiro). 5. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade,
do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993. 6. Reclamação constitucional julgada improcedente.(Rcl 4374,
Relator Ministro Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, j. 18.04.2013, DJe-173 03.09.2013).
Destarte, é de se reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação
específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência
é através da própria natureza dos males que a assolam, do seu grau e intensidade, que poderão
ser mensuradas suas necessidades. Não há, pois, que se enquadrar todos os indivíduos em um
mesmo patamar e entender que somente aqueles que contam com menos de um quarto do
salário-mínimo possam fazer jus ao benefício assistencial.
No caso dos autos, o estudo social realizado em 28.08.2017constatou que o autor reside sozinho
em um imóvel cedido por um vizinho, o Sr. Neocin Castro de Jesus, desde que sua filha se
mudou para a cidade de Cotia. O autor sobrevive com o benefício assistencial do Bolsa Família,
no valor de R$ 85,00. O vizinho ofereceu-lhe o quarto dos fundos do terreno, que se encontra
inacabado, tendo iniciado a construção de um banheiro, cujas paredes estão incompletas,
faltando as devidas instalações, inclusive porta e janela. Quanto às condições do imóvel, bem
como dos bens que guarnecem o mesmo, a perita informou que: “O quarto foi construído em
alvenaria, situado em região pouco edificada, desprovido de água(tendo que utilizar o da casa do
proprietário), conta com energia elétrica clandestina, através do vizinho, o chamado “gato”, e via
de acesso carente de pavimentação. Para adentrar o quarto existe uma ladeira íngreme, que para
qualquer pessoa se, nenhum problema de locomoção é difícil, imagina para o Senhor João que
deambula com dificuldades, utilizando um cabo de vassoura para se apoiar, pois segundo ele,
não conseguiu uma bengala na prefeitura. No quarto, o referido senhor conta que os objetos ali
existentes todos foram doados, uma cama de solteiro com colchão, uma mesinha pequena, um
fogão a gás, mas ainda sem botijão e um guarda roupas (...)”
Entendo, assim, que o conjunto probatório existente nos autos demonstra que a parte autora
preenche o requisito da deficiência física, comprovando sua hipossuficiência econômica, fazendo
jus à concessão do benefício assistencial.
O termo inicial do benefício deve ser mantido a partir da data do requerimento administrativo
efetuado em 26.05.2014, tendo em vista que restou incontroverso.
A correção monetária e os juros de mora deverão ser calculados de acordo com a lei de regência,
observando-se as teses firmadas pelo E.STF no julgamento do RE 870.947, realizado em
20.09.2017. Quanto aos juros de mora será observado o índice de remuneração da caderneta de
poupança a partir de 30.06.2009.
Tendo em vista o trabalho adicional do patrono da parte autora em grau recursal, a teor do
parágrafo 11 do artigo 85 do CPC, os honorários advocatícios, fixados em 10% (dezpor cento),
devem incidir sobre as prestações que seriam devidas até a data do presente acórdão, conforme
entendimento desta Décima Turma.
Diante do exposto,julgo prejudicada a preliminar e, no mérito, nego provimento à apelação do réu
e à remessa oficial tida por interposta.As prestações em atraso serão resolvidas em liquidação,
compensando-se as adimplidas por força da tutela antecipada.
É como voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. PROCESSO CIVIL. REMESSA OFICIAL TIDA POR INTERPOSTA.
PRELIMINAR. PROPOSTA DE ACORDO PREJUDICADA. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO
CONTINUADA. REQUISITOS LEGAIS COMPROVADOS. LEI 8.742/93, ART. 20, §3º.
DEFICIÊNCIA. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO E. STF.
HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. VERBAS ACESSÓRIAS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
I- Prejudicada a preliminar de proposta de acordo, diante da expressa recusa do autor.
II - Aplica-se ao caso o Enunciado da Súmula 490 do E. STJ, que assim dispõe: A dispensa de
reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a
sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas.III - Não se olvida que o conceito
de "pessoa portadora de deficiência" para fins de proteção estatal e de concessão do benefício
assistencial haja sido significativamente ampliado com as alterações trazidas após a introdução
no ordenamento pátrio da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu
Protocolo Facultativo, aprovada pelo Decreto Legislativo 186/2008, na forma do artigo 5º, § 3º, da
Constituição da República, "in casu" tratando-se de autor incapacitado de forma parcial e
permanente para o trabalho, concorra em condições de igualdade no mercado de trabalho.IV-
Quanto à hipossuficiência econômica, à luz da jurisprudência consolidada no âmbito do E. STJ e
do posicionamento usual desta C. Turma, no sentido de que o art. 20, §3º, da Lei 8.742/93 define
limite objetivo de renda per capita a ser considerada, mas não impede a comprovação da
miserabilidade pela análise da situação específica de quem pleiteia o benefício. (Precedente do
E. STJ).V - Em que pese a improcedência da ADIN 1.232-DF, em julgamento recente dos
Recursos Extraordinários 567.985-MT e 580.983-PR, bem como da Reclamação 4.374, o E.
Supremo Tribunal Federal modificou o posicionamento adotado anteriormente, para entender pela
inconstitucionalidade do disposto no art. 20, §3º, da Lei 8.742/93.VI - O entendimento que
prevalece atualmente no âmbito do E. STF é os de que as significativas alterações no contexto
socioeconômico desde a edição da Lei 8.742/93 e o reflexo destas nas políticas públicas de
assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios para aferição da
miserabilidade previstos na LOAS e aqueles constantes no sistema de proteção.VII-A correção
monetária e os juros de mora deverão ser calculados de acordo com a lei de regência,
observando-se as teses firmadas pelo E.STF no julgamento do RE 870.947, realizado em
20.09.2017. Quanto aos juros de mora será observado o índice de remuneração da caderneta de
poupança a partir de 30.06.2009.VIII- Tendo em vista o trabalho adicional do patrono da parte
autora em grau recursal, a teor do parágrafo 11 do artigo 85 do CPC, os honorários advocatícios,
fixados em 10% (dezpor cento), devem incidir sobre as prestações que seriam devidas até a data
do presente acórdão, conforme entendimento desta Décima Turma.IX- Preliminar prejudicada.
Remessa Oficial tida por interposta e apelação do réu improvidas. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, julgar prejudicada a
preliminar e, no mérito, negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial tida por
interposta, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
