
| D.E. Publicado em 07/12/2017 |
EMENTA
| CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. REQUISITOS LEGAIS |
| COMPROVADOS. LEI 8.742/93, ART. 20, §3º. DEFICIÊNCIA. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO E. STF. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. ART. 34, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI N. 10.741/2001. APLICAÇÃO DA ANALOGIA FIRMADA NO RESP N. 1.355.052/SP. RENDA PER CAPITA FAMILIAR SUPERIOR A ¼ DO SALÁRIO MÍNIMO. MISERABILIDADE NÃO CARACTERIZADA. JUSTIÇA GRATUITA. |
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora, termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0014489-03.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Sérgio Nascimento (Relator): Trata-se de apelação de sentença pela qual foi julgado improcedente o pedido em ação previdenciária objetivando a concessão do benefício de prestação continuada. A parte autora foi condenada ao pagamento de honorários advocatícios fixados em R$ 800,00 (oitocentos reais), exigíveis nos termos do disposto no art. 12, da Lei nº 1.060/50.
A parte autora recorre, aduzindo o preenchimento dos requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada.
Sem contrarrazões (fl. 120).
O d. representante do Ministério Público Federal, opina à fl. 126/135, pelo desprovimento do recurso de apelação.
É o relatório.
SERGIO NASCIMENTO
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0014489-03.2017.4.03.9999/SP
VOTO
Nos termos do art. 1011 do CPC/2015, recebo a apelação da parte autora.
O benefício pretendido pela parte autora está previsto no artigo 203, V, da Constituição da República, que dispõe:
Coube à Lei 8.742, de 7 de dezembro de 1993 (LOAS), a instituição do referido benefício, tratando dos critérios para sua concessão em seus artigos 20 e 21. Por sua vez, a Lei 12.435, de 06 de julho de 2011, veio modificar os referidos dispositivos, sendo aplicáveis para os benefícios requeridos a partir de sua edição - caso dos autos - os seguintes requisitos:
Assim, para fazer jus ao amparo constitucional, o postulante deve ser portador de deficiência ou ser idoso (65 anos ou mais) e ser incapaz de prover a própria manutenção ou tê-la provida por sua família.
No caso dos autos, o laudo pericial, elaborado em 23.09.2016 (fl. 57/63), atesta que o autor (54 anos de idade, garçom) foi vítima de acidente de trânsito, portando sequela de trauma crânio-encefálico, sequela de fratura no fêmur esquerdo e hipertensão arterial, estando incapacitado de forma total e permanente para o trabalho.
Há que se reconhecer, portanto, que a parte autora fará jus ao benefício assistencial, caso preencha o requisito socioeconômico, haja vista ter implementado o requisito concernente à deficiência.
No que toca ao requisito socioeconômico, cumpre observar que o §3º do artigo 20 da Lei 8.742/93 estabeleceu para a sua aferição o critério de renda familiar per capita, observado o limite de um quarto do salário mínimo, que restou mantido na redação dada pela Lei 12.435/11, acima transcrita.
A questão relativa à constitucionalidade do critério de renda per capita não excedente a um quarto do salário mínimo para que se considerasse o idoso ou pessoa com deficiência aptos à concessão do benefício assistencial, foi analisada pelo E. Supremo Tribunal Federal em sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 1.232/DF), a qual foi julgada improcedente (STF. ADI 1.232-DF. Rel. p/ Acórdão Min. Nelson Jobim. J. 27.08.98; D.J. 01.06.2001).
Todavia, conquanto reconhecida a constitucionalidade do §3º do artigo 20, da Lei 8.742/93, a jurisprudência evoluiu no sentido de que tal dispositivo estabelecia situação objetiva pela qual se deve presumir pobreza de forma absoluta, mas não impedia o exame de situações subjetivas tendentes a comprovar a condição de miserabilidade do requerente e de sua família. Tal interpretação seria consolidada pelo E. Superior Tribunal de Justiça em recurso especial julgado pela sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil (STJ - REsp. 1.112.557-MG; Terceira Seção; Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho; j. 28.10.2009; DJ 20.11.2009).
O aparente descompasso entre o desenvolvimento da jurisprudência acerca da verificação da miserabilidade dos postulantes ao benefício assistencial e o entendimento assentado por ocasião do julgamento da ADI 1.232-DF levaria a Corte Suprema a voltar ao enfrentamento da questão, após o reconhecimento da existência da sua repercussão geral, no âmbito da Reclamação 4374 - PE, julgada em 18.04.2013.
Naquela ocasião, prevaleceu o entendimento de que "ao longo de vários anos desde a sua promulgação, o §3º do art. 20 da LOAS passou por um processo de inconstitucionalização". Com efeito, as significativas alterações no contexto socioeconômico desde então e o reflexo destas nas políticas públicas de assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios para aferição da miserabilidade previstos na Lei 8.742/93 e aqueles constantes no sistema de proteção social que veio a se consolidar (Rcl 4374, Relator Ministro Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, j. 18.04.2013, DJe-173 03.09.2013).
Destarte, é de se reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência é através da própria natureza dos males que a assolam, do seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades. Não há, pois, que se enquadrar todos os indivíduos em um mesmo patamar e entender que somente aqueles que contam com menos de um quarto do salário-mínimo possam fazer jus ao benefício assistencial.
No caso dos autos, o estudo social realizado em 18.08.2016 (fl. 44/53) constatou que o núcleo familiar do autor é formado por ele e seus quatro irmãos: Aparecido Rodrigues das Neves, 58 anos de idade, José Rodrigues das Neves, 61 anos de idade, Isaura Rodrigues das Neves, 64 anos de idade, e Alzira Rodrigues das Neves, 67 anos de idade, todos solteiros e aposentados, sendo um deles pensionista. A renda familiar é de R$ 4.400,00 (quatro mil e quatrocentos reais). O autor não exerce atividade laborativa e não possui fonte de renda. De acordo com a informação de seus irmãos, o valor destinado às despesas mensais da família é de R$ 2.380,00 (dois mil, trezentos e oitenta reais), sendo o restante destinado as despesas pessoais. Residem em imóvel próprio, em estado regular de conservação, forro de brasilit e piso cimento queimado. Possuem telefone fixo, sendo seus irmãos proprietários de três terrenos, cada um deles com 300m2 de área. Foi informado, ainda, que o autor deixou de residir com a família, indo para São Paulo aos 22 anos de idade, sem manter contato por 26 anos, quando sofreu acidente por atropelamento, com perda de massa encefálica, apresentando sequelas de memória e dificuldade para deambular, aguardando cirurgia pelo SUS, a ser realizada junto à Santa Casa de Araçatuba, SP.
Faz-se mister, nesse caso, observar o disposto no art. 34, da Lei 10.741/2001:
A Lei determina, portanto, a exclusão da renda proveniente de benefício assistencial ao idoso do cômputo da renda familiar per capita de outro idoso na mesma família. Ainda que tal norma, dado o seu caráter especial, não trate, especificamente, do deficiente físico que recebe benefício assistencial, tem-se que ela estabelece critério objetivo a ser utilizado na aferição da hipossuficiência econômica, que deve ser aplicado analogicamente aos casos de benefício por incapacidade, vez que a equiparação entre idosos e portadores de deficiência para fins de proteção da assistência social é feita pela própria Constituição da República (art. 203, V).
De outra parte, cabe destacar, ainda, o julgamento do Recurso Especial Representativo de Controvérsia - REsp 1355052/SP, cuja ementa abaixo transcrevo:
Destarte, é possível inferir que a aplicação da analogia reportada no julgamento paradigmático tem lugar nas hipóteses em que o titular do benefício previdenciário, no importe de um salário mínimo, apresenta incapacidade total para o trabalho ou conta com 65 anos de idade ou mais.
No caso em tela, anoto que a irmã Alzira Rodrigues das Neves contava com 67 anos de idade por ocasião do ajuizamento da ação (11.07.2016), razão pela qual sua renda não pode ser computada para efeito de cálculo da renda per capita da família. Por sua vez, os irmãos Aparecido Rodrigues das Neves e Isaura Rodrigues das Neves possuíam menos de 65 anos de idade no momento do ajuizamento da ação, de forma que suas rendas devem ser consideradas na apuração da renda per capita familiar, não sendo possível a aplicação da analogia ao art. 34, parágrafo único, da Lei n. 10.741/2001. Da mesma forma, há que se levar em conta uma das pensões auferidas pelo irmão José Rodrigues das Neves, na quantia de um salário mínimo, posto que outra não pode integrar o cálculo, na medida em que o titular é portador de retardo mental, apresentando incapacidade total para o trabalho.
Em síntese, a somatória das rendas aptas a integrarem o montante total percebido pela família equivale a 03 salários mínimos, que dividido pelo número de pessoas componentes do núcleo familiar (autor e mais três irmãos), resulta em valor de renda per capita familiar no importe de ¾ de salário mínimo, superior ao limite de ¼ estabelecido pelo art. 20, §3º, da Lei n. 8.742/93.
Observo, ainda, que há jurisprudência já consolidada no sentido de que o §3º, do art. 20, da Lei 8.742/93 estabelece situação objetiva pela qual se presume pobreza de forma absoluta, mas não impede o exame de situações subjetivas tendentes a comprovar a condição de miserabilidade. Observe-se que o E. STJ já se pronunciou acerca desta questão em decisão de recurso especial repetitivo:
Todavia, avaliados os dados referentes à hipossuficiência econômica do autor, conclui-se que não restou caracterizada a miserabilidade, notadamente pelo fato dele e de seus irmãos residirem em imóvel próprio, em estado regular de conservação.
Diante do exposto, nego provimento à apelação da parte autora. Em se tratando de beneficiário da assistência judiciária gratuita, não há ônus de sucumbência a suportar.
É como voto.
SERGIO NASCIMENTO
Desembargador Federal Relator
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