Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5001439-07.2018.4.03.6144
Relator(a)
Desembargador Federal SERGIO DO NASCIMENTO
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
14/03/2019
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 15/03/2019
Ementa
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA.
REQUISITOS LEGAIS NÃO COMPROVADOS. AUSÊNCIA DE DEFICIÊNCIA E
HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. SUCUMBÊNCIA.I - Não se olvida que o conceito de "pessoa
portadora de deficiência" para fins de proteção estatal e de concessão do benefício assistencial
haja sido significativamente ampliado com as alterações trazidas após a introdução no
ordenamento pátrio da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu
Protocolo Facultativo, aprovada pelo Decreto Legislativo 186/2008, na forma do artigo 5º, § 3º, da
Constituição da República. Todavia, no caso dos autos, não há indicação de que a parte autora
apresente 'impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os
quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas'.II- Observada, ainda, a situação
socioeconômica da parte autora, não restou comprovada a miserabilidade alegada.III-Honorários
advocatícios mantidos na forma fixada pela sentença. A exigibilidade da verba honorária ficará
suspensa por 05 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que
fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, nos termos do artigo
98, §3º, do mesmo estatuto processual.IV - Apelação da parte autora improvida.
Acórdao
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001439-07.2018.4.03.6144
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: CLAUDETE ALVES DA COSTA
Advogados do(a) APELANTE: MARILIA ZUCCARI BISSACOT COLINO - SP259226-A,
GRAZIELLA FERNANDA MOLINA - SP248151-A, ANA CLAUDIA DE MORAES BARDELLA -
SP318500-N, REGINA DE CASTRO CALIXTO LISBOA - SP280091-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELAÇÃO (198) Nº 5001439-07.2018.4.03.6144
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: CLAUDETE ALVES DA COSTA
Advogados do(a) APELANTE: REGINA DE CASTRO CALIXTO LISBOA - SP280091-N, ANA
CLAUDIA DE MORAES BARDELLA - SP318500-N, GRAZIELLA FERNANDA MOLINA -
SP248151-A, MARILIA ZUCCARI BISSACOT COLINO - SP259226-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Senhor Desembargador Federal Sérgio Nascimento (Relator): Trata-se de apelação de
sentença pela qual foi julgado improcedente o pedido da autora em ação em que pleiteia a
concessão de amparo assistencial ao deficiente, sob o fundamento de que não teriam sido
comprovados os requisitos relativos à miserabilidade e deficiência. Pela sucumbência, a parte
autora foi condenada ao pagamento de honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por
cento) sobre o valor da causa, suspensa sua exigibilidade nos termos da gratuidade processual.
Em sua apelação, a parte autora alega, em síntese, que comprovou o preenchimento dos
requisitos necessários à concessão do benefício almejado.Sem as contrarrazões do réu, vieram
os autos a esta E. Corte.
Em seu parecer, o d. representante do Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento da
apelação da parte autora.
É o relatório.
APELAÇÃO (198) Nº 5001439-07.2018.4.03.6144
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: CLAUDETE ALVES DA COSTA
Advogados do(a) APELANTE: REGINA DE CASTRO CALIXTO LISBOA - SP280091-N, ANA
CLAUDIA DE MORAES BARDELLA - SP318500-N, GRAZIELLA FERNANDA MOLINA -
SP248151-A, MARILIA ZUCCARI BISSACOT COLINO - SP259226-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
V O T O
Nos termos do artigo 1.011 do CPC/2015, recebo a apelação interposta pela autora.
O benefício pretendido pela parte autora está previsto no artigo 203, V, da Constituição da
República, que dispõe:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de
contribuição à seguridade social, e tem por objetivo:(...)V - a garantia de um salário mínimo de
benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios
de prover à própria manutenção ou tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
A regulamentação legislativa do dispositivo constitucional restou materializada com o advento da
Lei 8.742/93, que dispõe na redação atualizada do caput do seu artigo 20:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa
com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.Assim, para fazer jus
ao amparo constitucional, o postulante deve ser portador de deficiência ou ser idoso (65 anos ou
mais) e ser incapaz de prover a própria manutenção ou tê-la provida por sua família.
Quanto ao requisito relativo à deficiência, a Lei 8.742/93, que regulamentou a concessão do
dispositivo constitucional acima, dispunha no § 2º do seu artigo 20, em sua redação original:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à
pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais e que comprovem não
possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.(...)§ 2º
Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela
incapacitada para a vida independente e para o trabalho.
Nesse ponto, cumpre salientar que o texto constitucional garante o pagamento de um salário
mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência, sem exigir, como fez a norma
regulamentadora, em sua redação original, a existência de incapacidade para a vida
independente e para o trabalho.Nota-se, portanto, que ao definir os contornos da expressão
pessoa portadora de deficiênciaconstante do dispositivo constitucional, a norma
infraconstitucional reduziu a sua abrangência, limitando o seu alcance aos casos em que a
deficiência é geradora de incapacidade laborativa.Todavia, observa-se que, em 10.07.2008, o
Congresso Nacional promulgou o Decreto Legislativo 186/2008, aprovando, pelo rito previsto no
artigo 5º, § 3º, da Constituição da República, o texto da Convenção sobre os Direitos das
Pessoas com deficiência e de seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova Iorque, em 30 de
março de 2007, e conferindo à referida Convenção status normativo equivalente ao das emendas
constitucionais.A Convenção, aprovada pelo Decreto Legislativo 186/2008, já no seu Artigo 1,
cuidou de tratar do conceito de "pessoa com deficiência", definição ora constitucionalizada pela
adoção do rito do artigo 5º, § 3º, da Carta, a saber:Pessoas com deficiência são aquelas que têm
impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em
interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade
em igualdades de condições com as demais pessoas.Em coerência à alteração promovida em
sede constitucional, o artigo 20, § 2º, da Lei 8.742/93, viria a ser alterado pela Lei 12.470/11,
passando a reproduzir em seu texto a definição de "pessoa com deficiência" constante da norma
superior. Dispõe a LOAS, em sua redação atualizada:Art. 20. O benefício de prestação
continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com
65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria
manutenção nem de tê-la provida por sua família.(...)§ 2o Para efeito de concessão deste
benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de
natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras,
podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as
demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011).
Não há dúvida, portanto, de que o conceito de 'deficiência' atualmente albergado é mais extenso
do que aquele outrora estabelecido, vez que considera como tal qualquer impedimento, inclusive
de natureza sensorial, que tenha potencialidade para a obstrução da participação social do
indivíduo em condições de igualdade.Coerente com esta nova definição de 'deficiência' para fins
de concessão do benefício constitucional, a mencionada Lei 12.470/11 acrescentou à Lei
8.742/93 o artigo 21-A, com a seguinte redação:Art. 21-A. O benefício de prestação continuada
será suspenso pelo órgão concedente quando a pessoa com deficiência exercer atividade
remunerada, inclusive na condição de microempreendedor individual. (Incluído pela Lei nº 12.470,
de 2011)§ 1o Extinta a relação trabalhista ou a atividade empreendedora de que trata o caput
deste artigo e, quando for o caso, encerrado o prazo de pagamento do seguro-desemprego e não
tendo o beneficiário adquirido direito a qualquer benefício previdenciário, poderá ser requerida a
continuidade do pagamento do benefício suspenso, sem necessidade de realização de perícia
médica ou reavaliação da deficiência e do grau de incapacidade para esse fim, respeitado o
período de revisão previsto no caput do art. 21.
Verifica-se, portanto, que a legislação ordinária, em deferência às alterações promovidas em sede
constitucional, não apenas deixou de identificar os conceitos de 'incapacidade laborativa' e
'deficiência', como passou a autorizar expressamente que a pessoa com deficiência elegível à
concessão do amparo assistencial venha a exercer atividade laborativa - seja como empregada,
seja como microempreendedora - sem que tenha sua condição descaracterizada pelo trabalho,
ressalvada tão somente a suspensão do benefício enquanto este for exercido.Observados estes
parâmetros para a aferição da deficiência, no caso dos autos, a perícia médica realizada em
09.01.2014, revela que a autora é portadora de dor na coluna lombar e nos joelhos, de curso
crônico, e também se submete a tratamento de hipertensão arterial. O laudo médico concluiu que
a requerente não apresenta incapacidade laborativa, nem tampouco pode ser enquadrada como
pessoa com deficiência. Consignou o expert: “A avaliação pericial revelou estar em bom estado
geral, sem manifestações por descompensação de doenças, exceto obesidade (índice de massa
corporal de 36 KG/m² – saudável de 20 a 25 Kg/m²). A pressão arterial está controlada, e sem
sinais de repercussão clínica por acometimento de órgãos ditos como alvo, ou seja, susceptíveis
a comprometimento. Não apresenta sinais de dano funcional articular, alterações do tônus ou
trofismo muscular, deformidades, sinais inflamatórios ou outras anormalidades tais como
manifestações de comprometimento medular (medula espinhal) ou de raízes nervosas
(radiculopatia).”
Ademais, o estudo social realizado em 05.01.2017 constatou que a autora vive com o esposo, o
Sr. Erivaldo Lopes da Costa, 66 anos, nascido em 09/12/50. O casal reside em casa própria,
composta por seis cômodos, sendo um deles um estabelecimento comercial (bar) acoplado à
moradia. A casa é construída em alvenaria, guarnecida de móveis e eletrodomésticos essenciais,
inclusive uma televisão moderna, tudo em bom estado de conservação. Arenda familiar mensal é
proveniente do estabelecimento (bar) do esposo da autora, no montante aproximado de R$
600,00. Os gastos declarados são energia elétrica, produtos de limpeza/higiene pessoal e outros,
recarga de celular, alimentação e gás, tudo em torno de R$ 644,00. Os medicamentos utilizados
são retirados na rede SUS. Concluiu a assistente social que a requerente não se encontra em
situação de vulnerabilidade social.
Pelos dados do CNIS, observo que o marido da demandante é beneficiário de amparo social ao
idoso, com DIB em 16.12.2015.
Portanto, o conjunto probatório existente nos autos demonstra que a autora não comprovou a
deficiência nem se encontra em situação de miserabilidade que justifique a concessão do amparo
assistencial.
Cumpre ressalvar que, havendo agravamento de sua situação socioeconômica e de seu estado
de saúde, a autora poderá voltar a pleitear o benefício na esfera administrativa ou judicial.
Honorários advocatícios mantidos conforme fixados pela sentença. A exigibilidade da verba
honorária ficará suspensa por 05 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de
recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, nos
termos do artigo 98, §3º, do mesmo estatuto processual.
Diante do exposto, nego provimento à apelação da parte autora.
É como voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA.
REQUISITOS LEGAIS NÃO COMPROVADOS. AUSÊNCIA DE DEFICIÊNCIA E
HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. SUCUMBÊNCIA.I - Não se olvida que o conceito de "pessoa
portadora de deficiência" para fins de proteção estatal e de concessão do benefício assistencial
haja sido significativamente ampliado com as alterações trazidas após a introdução no
ordenamento pátrio da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu
Protocolo Facultativo, aprovada pelo Decreto Legislativo 186/2008, na forma do artigo 5º, § 3º, da
Constituição da República. Todavia, no caso dos autos, não há indicação de que a parte autora
apresente 'impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os
quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas'.II- Observada, ainda, a situação
socioeconômica da parte autora, não restou comprovada a miserabilidade alegada.III-Honorários
advocatícios mantidos na forma fixada pela sentença. A exigibilidade da verba honorária ficará
suspensa por 05 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que
fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, nos termos do artigo
98, §3º, do mesmo estatuto processual.IV - Apelação da parte autora improvida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à
apelação da autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA