Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
6075786-35.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal JOAO BATISTA GONCALVES
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
24/07/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 28/07/2020
Ementa
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. PERÍCIA MÉDICA. RENOVAÇÃO.
PRESCINDIBILIDADE. ANÁLISE BIOPSICOSSOCIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA.
INOCORRÊNCIA. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART. 203, CAPUT, DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E LEI Nº 8.742/1993. DEFICIÊNCIA AFASTADA POR LAUDO
PERICIAL. INEXISTÊNCIA DE ELEMENTOS HÁBEIS A ABALAR A CONCLUSÃO DA PROVA
TÉCNICA. ANÁLISE DA HIPOSSUFICIÊNCIA PREJUDICADA. REQUISITOS CUMULATIVOS.
BENEFÍCIO INDEVIDO.
- A concessão do benefício de assistência social para pessoa deficiente pressupõe a
comprovação da existência de impedimentos de longo prazo de natureza física, mental,
intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua
participação plena e efetiva na sociedade em condições de igualdade com as demais pessoas.
- No caso, o laudo médico pericial produzido em Juízo, por especialista em psiquiatria – área
voltada às patologias das quais alega padecer a promovente – traz elementos suficientes para
esquadrinhamento do comprometimento social atual desta, ao lume de suas condições clínicas e
sociais, os quais, consorciados às demais provas dos autos, prescindem da realização de nova
perícia, para aferição do requisito da deficiência.
- Cabe ao Magistrado, no uso do seu poder instrutório, avaliar a suficiência da prova para
formular seu convencimento.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
- Atrelam-se, cumulativamente, à concessão do benefício de prestação continuada, o implemento
de requisito etário ou a detecção de deficiência, demonstrada por exame pericial, e a verificação
da ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da benesse, ou de tê-
la suprida pela família.
- Afastada, no laudo pericial, a existência da deficiência prevista no art. 20, § 2º, da Lei nº
8.742/93 e ausentes elementos probatórios capazes de infirmar esta conclusão, descabe falar-se
em concessão da benesse postulada, restando prejudicada a análise da hipossuficiência, uma
vez que tais pressupostos são cumulativos. Precedentes da Turma.
- Matéria preliminar rejeitada.
- Parecer do Órgão Ministerial desacolhido.
- Apelação da parte autora desprovida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6075786-35.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES
APELANTE: LEONICE DEODATO DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: BRUNO CESAR PEROBELI - SP289655-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6075786-35.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES
APELANTE: LEONICE DEODATO DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: BRUNO CESAR PEROBELI - SP289655-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso de apelação interposto pela parte autora em face da r. sentença que julgou
improcedente o pedido deduzido na inicial, de concessão de benefício assistencial a pessoa
deficiente.
Sustenta, outrossim, resultarem comprovados os requisitos à outorga da benesse.
Subsidiariamente, requer a designação de audiência, com perito diverso daquele nomeado nos
autos, a fim de que informe acerca da sua aptidão psicológica ao labor.
Decorrido, “in albis”, o prazo para as contrarrazões de recurso, subiram os autos a esta Corte.
O Ministério Público Federal ofertou parecer opinando pela conversão do julgamento em
diligência, com vistas à realização de laudo médico complementar, para avaliação biopsicossocial
da proponente, uma vez que a prova documental colacionada à exordial atesta o diagnóstico de
esquizofrenia. Após, requer que os autos sejam, novamente, encaminhados àquele Órgão.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6075786-35.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES
APELANTE: LEONICE DEODATO DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: BRUNO CESAR PEROBELI - SP289655-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A teor do disposto no art. 1.011 do Código de Processo Civil, conheço do recurso de apelação,
uma vez que cumpridos os requisitos de admissibilidade.
Examino, em preliminar, a questão atinente à imprescindibilidade, ou não, de complementação da
prova médico-pericial, para exame do requisito da deficiência, à luz do critério biopsicossocial, por
implicar em nulidade do feito, por cerceamento de defesa, a ser decretada, até mesmo, de ofício.
Nesse contexto, não se pode olvidar do advento de precedente oriundo do c. Superior Tribunal de
Justiça, precisamente o REsp nº 1.404.019/SP, tendo em conta a devolução de feitos dessa
ordem, pela e. Vice-Presidência, para eventual exercício de juízo de retratação.
No âmbito do aludido recurso, deliberou-se que a concessão do benefício de assistência social
para pessoa deficiente pressupõe a comprovação da existência de impedimentos de longo prazo
de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras,
podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em condições de igualdade com as
demais pessoas, in verbis:
"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA
DEFICIENTE. A LOAS, EM SUA REDAÇÃO ORIGINAL, NÃO FAZIA DISTINÇÃO QUANTO À
NATUREZA DA INCAPACIDADE, SE PERMANENTE OU TEMPORÁRIA, TOTAL OU PARCIAL.
ASSIM NÃO É POSSÍVEL AO INTÉRPRETE ACRESCER REQUISITOS NÃO PREVISTOS EM
LEI PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
ACÓRDÃO QUE MERECE REPAROS. RECURSO ESPECIAL DO SEGURADO PROVIDO
PARA RESTABELECER O BENEFÍCIO CONCEDIDO NA SENTENÇA.
1. A Constituição Federal/1988 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário
mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa com
deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de
tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/1993, em seu art. 20, § 2o., em sua
redação original dispunha que a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a
vida independente e para o trabalho.
3. Em sua redação atual, dada pela Lei 13.146/2015, considera-se pessoa com deficiência aquela
que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual,
em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
4. Verifica-se que em nenhuma de suas edições a lei previa a necessidade de capacidade
absoluta, como fixou o acórdão recorrido, que negou a concessão do benefício ao fundamento de
que o autor deveria apresentar incapacidade total, de sorte que não permita ao requerente do
benefício o desempenho de qualquer atividade da vida diária e para o exercício de atividade
laborativa (fls. 155).
5. Não cabe ao intérprete a imposição de requisitos mais rígidos do que aqueles previstos na
legislação para a concessão do benefício.
6. Recurso Especial do Segurado provido (REsp. 1.404.019/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO
NUNES MAIA FILHO, DJe 3.8.2017).
Sob essa ótica, tenho que o laudo médico pericial produzido em Juízo, por especialista em
psiquiatria – área voltada às patologias das quais alega padecer a promovente – traz elementos
suficientes para esquadrinhamento do comprometimento social atual desta, ao lume de suas
condições clínicas e sociais, como adiante esmiuçado, os quais, consorciados às demais provas
dos autos, prescindem da realização de nova perícia, para aferição do requisito da deficiência.
Acrescente-se caber, ao magistrado, no uso de seu poder instrutório, avaliar a suficiência da
prova para formular seu convencimento (art. 370 do Código de Processo Civil).
Despicienda, portanto, a renovação da perícia médico-judicial, como pretendem a parte autora e o
Órgão Ministerial, rejeitando-se, por decorrência, a matéria preliminar aventada.
No mérito, discute-se o direito da parte autora à concessão de benefício de prestação continuada
a pessoa deficiente.
Previsto no art. 203, caput, da Constituição Federal e disciplinado pela Lei nº 8.742/1993, de
natureza assistencial e não previdenciária, o benefício de prestação continuada tem sua
concessão desvinculada do cumprimento dos quesitos de carência e de qualidade de segurado,
atrelando-se, cumulativamente, ao implemento de requisito etário ou à detecção de deficiência,
nos termos do art. 20, §2º, da Lei n° 8.742/93, demonstrada por exame pericial; à verificação da
ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da benesse, ou de tê-lo
suprido pela família; e, originalmente, à constatação de renda mensal per capita não superior a ¼
(um quarto) do salário mínimo. Recorde-se, a este passo, da sucessiva redução da idade mínima,
primeiramente de 70 para 67 anos, pelo art. 1º da Lei nº 9.720/98 e, ao depois, para 65 anos,
conforme art. 34 da Lei nº 10.741/ 2003.
No que diz respeito ao critério da deficiência, as sucessivas alterações legislativas ocorridas na
redação do § 2º, do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social demonstram a evidente
evolução na sua conceituação.
Em sua redação originária, a Lei 8.742/1993 definia a pessoa portadora de deficiência, para efeito
de concessão do benefício assistencial, aquela incapacitada para a vida independente e para o
trabalho.
Posteriormente, a Lei n. 12.435/2011 promoveu modificação ao dispositivo legal, ampliando o
conceito de deficiência, com base no Decreto n. 6.949/2009, que promulgou a Convenção
Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
O § 2º da art. 20 da Lei n. 8.742 passou então a vigorar com a seguinte redação:
"Art. 20
(...)
§ 2º - para efeito de concessão deste benefício, considera-se:
I - pessoa com deficiência, aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir
sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas.
II - impedimentos de longo prazo: aqueles que incapacitam a pessoa com deficiência para a vida
independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos."
Vê-se, portanto, que ao fixar o entendimento da expressão "impedimentos de longo prazo", a Lei
n. 12.435/2011 optou por restringir a concessão do benefício exclusivamente às pessoas com
deficiência que apresentem incapacidade para a vida independente e para o trabalho pelo prazo
mínimo de 2 (dois) anos.
Atualmente, o dispositivo em exame encontra-se vigendo com a redação conferida pelo Estatuto
da Pessoa com Deficiência, Lei n. 13.146/2015, a qual explicitou a definição legal de pessoa com
deficiência:
"Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com
deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou
sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e
efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas."
De se registrar que o § 10 do mesmo dispositivo, incluído pela Lei n. 12.470/2011, considera de
longo prazo o impedimento cujos efeitos perduram pelo prazo mínimo de 02 (dois) anos.
No caso de crianças e adolescentes menores de dezesseis anos de idade, deve ser avaliada,
para tanto, "a existência da deficiência e o seu impacto na limitação do desempenho de atividade
e restrição da participação social, compatível com a idade", ex vi do art. 4º, inciso II e § 1º, do
Decreto nº 6.214/2007, que regulamenta o benefício de prestação continuada da assistência
social de que trata a Lei n° 8.742/93, tornando-se despiciendo o exame da inaptidão laboral, na
esteira do precedente da Terceira Seção deste E. Tribunal, in verbis:
“PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS INFRINGENTES. BENEFÍCIO DE
PRESTAÇÃO CONTINUADA. MENOR. DEFICIÊNCIA FÍSICA E MENTAL. HIPOSSUFICIÊNCIA
ECONÔMICA. COMPROVAÇÃO. I - As limitações físicas e mentais de que padece o
demandante, apontadas pelo próprio expert e pela fisioterapeuta que o acompanha, impõem-lhe
significativas restrições às atividades típicas de sua idade (correr, participar de brincadeiras,
acompanhar satisfatoriamente a escola), não sendo necessário perquirir quanto à existência ou
não de capacidade laborativa, a teor do art. 4º, §2º, doDecretonº 6.214/2007. (...) V - Embargos
Infringentes do INSS a que se nega provimento.”
(EI 994950, Relator Desembargador Federal Sergio Nascimento, j. 25/08/2011, e-DJF3
14/09/2011)
Ainda, o posicionamento da Nona Turma deste E. Tribunal no mesmo sentido, nos seguintes
julgados: AC 0008758-60.2016.4.03.9999, D.E. 24/11/2016; AC 0002545-37.2013.4.03.6121,
D.E. 04/11/2016; AC 0007387-51.2012.4.03.6103, D.E. 24/11/2016.
Por sua vez, a avaliação da hipossuficiência econômica não mais se restringe ao parâmetro da
renda familiar per capita, não superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo, como diretriz
inicialmente estampada no §3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93, devendo, sim, aflorar da análise
desse requisito e das demais circunstâncias concretas de cada caso, nos moldes dos
precedentes do C. STF, no âmbito da Reclamação nº 4374 e dos Recursos Extraordinários nºs.
567985 e 580963, e do C. STJ, quando da apreciação do RESP n. 1.112.557/MG, submetidos à
sistemática da repercussão geral. De se realçar que a jurisprudência vem evoluindo para eleger a
renda mensal familiar per capita inferior à metade do salário mínimo como indicativo de situação
de precariedade financeira, tendo em conta que outros programas sociais, dentre eles o bolsa
família, o Programa Nacional de Acesso à Alimentação e o bolsa escola, instituídos pelas Leis nºs
10.836/04, 10.689/03 e 10.219/01, nessa ordem, contemplam esse patamar. A propósito,
consultem-se arestos da Terceira Seção nesse diapasão: EI 00072617120124036112, Relator
Desembargador Federal Toru Yamamoto, j. 22/10/2015, e-DJF3 05/11/201; AR
00082598120084030000, Relator Juiz Convocado Silva Neto, j. 25/09/2014, e-DJF3 08/10/2014).
SITUAÇÃO DOS AUTOS
Realizada a perícia médica em 12/12/2017, o laudo coligido ao doc. 97801394 considerou a
autora, então, com 31 anos de idade, ensino fundamental completo e que reporta ser "do lar",
portadora de transtorno depressivo recorrente.
Transcrevo, por oportuno, a anamnese:
"Periciada e acompanhante, depois de cientificados da importância de prestarem as informações
com sinceridade e os objetivos desta consulta pericial, informam que:
Apresentou desenvolvimento neuropsicomotor dentro dos parâmetros da normalidade,
apresentou algumas doenças infanto juvenis e virais sem maiores gravidades.
Relata que trabalhava em uma firma, onde os colegas ficavam falando que o seu marido a traia.
Diz que esses comentários foram deixando a mesma irritada, nervosa e que em um dia no ano de
2012 “saiu do ar” e foi encontrada quatro (04) dias depois, andando pelas rodovias. Foi internada
em Hospital Psiquiátrico e após a alta, passou a fazer tratamento no CAPS de sua cidade e fazer
uso de medicamentos.
Diz que depois da internação e seguindo o tratamento não teve mais crises.
Mora com a mãe e o filho, tem tentado trabalho, mas quando descobrem que faz tratamento
psiquiátrico, não aceitam a mesma."
O perito concluiu que a demandante apresentou incapacidade ao labor, no período de sua
internação – o que se deu, ao que se extrai do relatado, por volta do ano de 2012 – contudo,
apesar de sua doença e condições atuais, não há elementos incapacitantes para atividades
trabalhistas ou que caracterizem deficiência.
Salientou que a requerente segue em tratamento médico e medicamentoso e não houve
progressão, agravamento ou desdobramento da patologia, ao longo do tempo.
Refrise-se, a esse respeito, que a própria autora reportou, ao expert que, "seguindo o tratamento,
não teve mais crises".
Transcrevo o resultado dos exames físico e psíquicos realizados, a evidenciar o bom estado geral
da parte autora:
"Exame Físico:
A ectoscopia apresenta-se anictérico,acianótico, afebril, mucosas úmidas e coradas sem outras
alterações de interesse médico psiquiátrico.
Exame Psíquico:
Ao exame, periciada com bom contato, lúcida,vestida adequadamente, afeto deprimido,orientada
no tempo e espaço, fala e pensamento sem conteúdos delirantes, atenta a entrevista e ao meio,
não apresenta déficit intelectual e cultural."
De seu turno, os documentos médicos carreados pela parte autora, antes e ulteriormente à
realização da perícia, não se mostram hábeis a abalar a conclusão da prova técnica, que foi
exposta de forma fundamentada, após o estudo da documentação apresentada e das avaliações
realizadas no momento do exame pericial, analisando as moléstias constantes dos aludidos
documentos. Vide docs. 97801364, pág. 31, e 97801403.
Deveras, trata-se de dois relatórios médicos, emitidos nos anos de 2017 e 2018, que se
restringem a atestar as patologias e medicamentos ministrados à vindicante. O primeiro, mostra o
diagnóstico de transtorno psicótico agudo polimorfo e transtornos específicos da personalidade,
CIDS F23 e F60, no entanto, sem sintomas esquizofrênicos.
O último, reporta transtorno depressivo recorrente, episódio atual grave (CID F33.2), e,
igualmente, transtorno psicótico agudo polimorfo (CID F23), contudo, sem sintomas psicóticos ou
esquizofrênicos.
Há que se pontuar, por fim, o resultado da perícia administrativa realizada pelo INSS, em
24/04/2017, face ao requerimento administrativo agilizado em 13/07/2017.
O laudo produzido naquela senda traz o diagnóstico de transtornos psicóticos agudos e
transitórios (CID F23) e avalia a deficiência e o grau de incapacidade da promovente, pautado
nos domínios da Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde - CIF,
estabelecida pela Resolução da Organização Mundial da Saúde nº 54.21.
O resultado das avaliações social e médico-pericial evidenciou, àquela altura, a existência de
barreira moderada quanto aos fatores ambientais, de dificuldade moderada em relação a
atividades e participação e alteração moderada nas funções do corpo, estimando-se que seus
efeitos poderiam se estender por mais de dois anos.
Conquanto seja possível, a partir daí, evocar a existência de limitações do desempenho de
atividades e de restrição da participação social da parte autora, segundo suas condições
pessoais, sabe-se que a doença, por si só, não gera direito à obtenção do benefício assistencial
ora pleiteado, fazendo-se necessário, em casos que tais, a constatação de comprometimento ou
restrições sociais decorrentes da enfermidade verificada, pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos,
inocorrente, na espécie, não havendo, nos autos, elementos probatórios capazes de infirmar esta
conclusão.
Destarte, o caso não se ajusta ao conceito de pessoa com deficiência, estabelecido no art. 20, §
2º, da Lei nº 8.742/93, razão pela qual é indevido o benefício.
Assim vem decidindo a Nona Turma deste E. Tribunal, em casos parelhos, como se colhe dos
seguintes julgados:
“CONSTITUCIONAL. BENEFÍCIO DEPRESTAÇÃO CONTINUADA- ART. 203, V, DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. DEFICIÊNCIA NÃO COMPROVADA. IMPROCEDÊNCIA MANTIDA.
I - O Supremo Tribunal Federal, no RE n. 567.985, reconheceu a inconstitucionalidade parcial,
sem pronúncia de nulidade, do art.20, §3º, da Lei nº 8.742/93, e do art. 34, par. único, da Lei nº
10.741/2003. II - O laudo médico-pericial conclui que "a autora apresenta diagnóstico de
Transtorno Afetivo Bipolar com quadro em remissão. Há incapacidade parcial com restrições para
realizar atividades que causem alto grau de estresse emocional. Apresenta, entretanto,
capacidade laborativa residual para realizar outras atividades que não causem este grau de
estresse como é o caso de atividades de limpeza ou para continuar realizando os afazeres
domésticos na sua casa (que refere executar após 1987)". III - Não há patologia apontada pelo
perito que se ajuste ao conceito de pessoa com deficiência previsto no art. 20, § 2º, I e II. IV -
Apelação improvida.”
(AC 2137061, Relatora Desembargadora Federal Marisa Santos, j. 30/05/2016, e-DJF3
13/06/2016)
“PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. BENEFÍCIOASSISTENCIAL.ART. 203, V, CF/88. LEI N.
8.742/93 E 12.435. NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. DESPROVIMENTO. 1. O
benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência ou idoso que comprove
não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família. 2. No
caso vertente, a parte autora requereu o benefícioassistencialpor ser deficiente. 3. Entretanto, a
parte autora, que conta hoje 31 anos, não se enquadra no conceito de pessoa portadora de
deficiência, conformado no parágrafo 2º do artigo 20 da LOAS. 4. A despeito da
incapacidadelaboral e para os atos da vida civil, total e temporária, por 4 meses a partir de
06/2013, suas limitações não constituem impedimento de longo prazo. O laudo refere melhora
com recuperação laboral e da vida independente. 5. Concluiu, na ocasião, pela ausência de
incapacidade para as atividades da vida independente e pela existência deincapacidadelaboral
parcial. 6. Assim, a parte autora não faz jus ao benefício assistencial. Ainda que se considere a
existência de deficiência, naqueles 4 meses deincapacidadetotal, à míngua de comprovação do
requerimento administrativo, não há de cogitar de parcelas vencidas anteriores à citação
(outubro/2013). Assim, nada seria devido. 7. Para além, o requisito da miserabilidade conduz a
incertezas. 8. Colhe-se da inicial que o autor residia com sua mãe, já do estudo social consta que
morava com sua esposa, e por fim o laudo médico destaca à coabitação dos três. 9. Sua mãe,
nascida aos 18/3/1962, é beneficiária de pensão por morte. Sua companheira, embora
desempregada, encontra-se em idade laborativa. 10. Ademais, a família ainda possui outros bens
móveis e conta com ajuda de familiares. 11. Assim, não identifico, no caso, situação grave a
ponto de merecer a tutelaassistencialdo Estado, seja porque a parte autora pode exercer
determinados serviços, seja porque a família tem prestado assistência à parte autora, dentro das
possibilidades. 12. Considerando que a apelação foi interposta antes da vigência do Novo CPC,
não incide ao presente caso a regra de seu artigo 85, § 1º, que determina a majoração dos
honorários de advogado em instância recursal, devendo o valor permanecer em R$ 500,00, com
as ressalvas da Justiça Gratuita, na forma estabelecida na sentença. 13. Apelação desprovida.”
(AC 00017060620134036123, Relator Juiz Convocado Rodrigo Zacharias, j. 16/05/2016, e-DJF3
01/06/2016)
Não demonstrada a deficiência, resta prejudicada a análise da hipossuficiência, uma vez que tais
pressupostos, como dito, são cumulativos. Nesse sentido, confiram-se, dentre outros, os
seguintes julgados desta 9ª Turma, proferidos em situações análogas: AC 0003613-
23.2016.4.03.9999, j. 15/7/2016, e-DJF3 30/08/2016, Relatora Desembargadora Federal Ana
Pezarini, e AC 00070109020164039999, j. 15/7/2016, e-DJF3 30/08/2016, Relatora
Desembargadora Federal Ana Pezarini.
Por tudo, deve ser mantida a improcedência do pedido.
Acrescente-se, por fim, que o benefício de prestação continuada é regido pela cláusula "rebus sic
stantibus", de modo que havendo agravamento ou alteração do quadro de saúde da parte autora,
pode ela postular administrativamente a concessão de novo benefício.
Ante o exposto, REJEITO A MATÉRIA PRELIMINAR, DESACOLHENDO, EM DECORRÊNCIA, O
PARECER DO ÓRGÃO MINISTERIAL, E, NO MÉRITO, NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO DA
PARTE AUTORA.
É como voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. PERÍCIA MÉDICA. RENOVAÇÃO.
PRESCINDIBILIDADE. ANÁLISE BIOPSICOSSOCIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA.
INOCORRÊNCIA. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART. 203, CAPUT, DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E LEI Nº 8.742/1993. DEFICIÊNCIA AFASTADA POR LAUDO
PERICIAL. INEXISTÊNCIA DE ELEMENTOS HÁBEIS A ABALAR A CONCLUSÃO DA PROVA
TÉCNICA. ANÁLISE DA HIPOSSUFICIÊNCIA PREJUDICADA. REQUISITOS CUMULATIVOS.
BENEFÍCIO INDEVIDO.
- A concessão do benefício de assistência social para pessoa deficiente pressupõe a
comprovação da existência de impedimentos de longo prazo de natureza física, mental,
intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua
participação plena e efetiva na sociedade em condições de igualdade com as demais pessoas.
- No caso, o laudo médico pericial produzido em Juízo, por especialista em psiquiatria – área
voltada às patologias das quais alega padecer a promovente – traz elementos suficientes para
esquadrinhamento do comprometimento social atual desta, ao lume de suas condições clínicas e
sociais, os quais, consorciados às demais provas dos autos, prescindem da realização de nova
perícia, para aferição do requisito da deficiência.
- Cabe ao Magistrado, no uso do seu poder instrutório, avaliar a suficiência da prova para
formular seu convencimento.
- Atrelam-se, cumulativamente, à concessão do benefício de prestação continuada, o implemento
de requisito etário ou a detecção de deficiência, demonstrada por exame pericial, e a verificação
da ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da benesse, ou de tê-
la suprida pela família.
- Afastada, no laudo pericial, a existência da deficiência prevista no art. 20, § 2º, da Lei nº
8.742/93 e ausentes elementos probatórios capazes de infirmar esta conclusão, descabe falar-se
em concessão da benesse postulada, restando prejudicada a análise da hipossuficiência, uma
vez que tais pressupostos são cumulativos. Precedentes da Turma.
- Matéria preliminar rejeitada.
- Parecer do Órgão Ministerial desacolhido.
- Apelação da parte autora desprovida. ACÓRDÃOVistos e relatados estes autos em que são
partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu rejeitar a matéria preliminar,
desacolhendo, em decorrência, o parecer do Órgão Ministerial e, no mérito, negar provimento à
apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
