Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0003681-94.2016.4.03.6111
Relator(a)
Desembargador Federal JOAO BATISTA GONCALVES
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
08/10/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 09/10/2020
Ementa
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL. NÃO CABIMENTO. ART. 496, §
3º, I, NCPC. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ARTIGO 203, CAPUT, DA CR/88 E
LEI Nº 8.742/1993. PERÍCIA SOCIAL. IMPRESCINDIBILIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA.
OCORRÊNCIA. NULIDADE DA SENTENÇA.
- Ahipótese em exame não excede os 1.000 salários mínimos, sendo incabível a remessa oficial,
nos termos do art. 496, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil.
- A concessão do benefício de prestação continuada requer a avaliação da deficiência e do grau
de impedimento do postulante do beneplácito, por exame multidisciplinar conduzido por médicos
peritos e por assistentes sociais, na forma da Lei.
- Cerceamento de defesa caracterizado. Precedentes.
- Sentença anulada de ofício, determinando o retorno dos autos à origem para realização de
perícia social, por assistente social, e posterior julgamento do feito em Primeiro Grau.
- Apelação do INSS prejudicada.
- Manutenção do benefício concedido, em sede de antecipação de tutela, até a produção da
prova pericial.
Acórdao
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0003681-94.2016.4.03.6111
RELATOR:Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE LOURENCO DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: CIBELE CRISTINA FIORENTINO FRANCO - SP256569-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0003681-94.2016.4.03.6111
RELATOR:Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE LOURENCO DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: CIBELE CRISTINA FIORENTINO FRANCO - SP256569-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação do INSS interposta em face da r. sentença, não submetida ao reexame
necessário, que julgou parcialmente procedente o pedido deduzido na inicial, condenando a
Autarquia Previdenciária a conceder, à parte autora, o benefício assistencial ao idoso, a partir do
implemento do requisito etário, em 08/10/2017, fixados consectários, antecipados os efeitos da
tutela de mérito.
Postula, o INSS, preambularmente, a recepção do apelo no duplo efeito. No mérito, pretende que
seja reformado o julgado, sustentando, em síntese, a ausência de comprovação de
miserabilidade. Aduz, outrossim, que o estudo social não é fidedigno para fazer prova nos autos,
visto que todas as informações foram prestadas por terceiro, estranho ao feito e sem qualquer
vínculo familiar com o proponente. Insurge-se, por fim, quanto à correção monetária, juros de
mora e honorários advocatícios.
Decorrido, “in albis”, o prazo para as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
O Ministério Público Federal ofertou parecer opinando pelo provimento da apelação.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0003681-94.2016.4.03.6111
RELATOR:Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE LOURENCO DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: CIBELE CRISTINA FIORENTINO FRANCO - SP256569-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Afigura-se incorreta a submissão da r. sentença à remessa oficial.
De fato, o art. 496, § 3º, inciso I do Código de Processo Civil atual, que entrou em vigor em 18 de
março de 2016, dispõe que a sentença não será submetida ao reexame necessário quando a
condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a 1.000
(mil) salários mínimos, em desfavor da União ou das respectivas autarquias e fundações de
direito público.
No caso dos autos, considero as datas do termo inicial do benefício e da prolação da sentença,
quando houve a antecipação dos efeitos da tutela, em 15/03/2018 (doc. 30435032, págs. 79/89).
Atenho-me ao valor da benesse, de um salário mínimo. Verifico que a hipótese em exame não
excede os mil salários mínimos.
Não sendo, pois, o caso de submeter o decisum de primeiro grau à remessa oficial, passo à
análise do recurso em seus exatos limites, uma vez que cumpridos os requisitos de
admissibilidade previstos no Código de Processo Civil atual.
Discute-se o direito da parte autora à concessão do benefício de prestação continuada.
A realização de exame multidisciplinar conduzido por médicos peritos e por assistentes sociais é
essencial nas causas que versem sobre a concessão do aludido beneplácito, ex vi dos §§ 2º e 6º
do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, abaixo reproduzidos:
"Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa
com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
(...)
§ 2º Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com
deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou
sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e
efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
(...)
§ 6º A concessão do benefício ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de impedimento
de que trata o § 2º, composta por avaliação médica e avaliação social realizadas por médicos
peritos e por assistentes sociais do Instituto Nacional de Seguro Social - INSS."
No mesmo sentido, o art. 16 do Decreto nº 6.214/2007, que regulamenta o benefício de prestação
continuada da assistência social devido à pessoa com deficiência e ao idoso de que trata a Lei nº
8.742/93:
"Art. 16. A concessão do benefício à pessoa com deficiência ficará sujeita à avaliação da
deficiência e do grau de impedimento, com base nos princípios da Classificação Internacional de
Funcionalidades, Incapacidade e Saúde - CIF, estabelecida pela Resolução da Organização
Mundial da Saúde nº 54.21, aprovada pela 54ª Assembléia Mundial da Saúde, em 22 de maio de
2001.
§1º. A avaliação da deficiência e do grau de impedimento será realizada por meio de avaliação
social e avaliação médica.
§2º. A avaliação social considerará os fatores ambientais, sociais e pessoais, a avaliação médica
considerará as deficiências nas funções e nas estruturas do corpo, e ambas considerarão a
limitação do desempenho de atividades e a restrição da participação social, segundo suas
especificidades.
§3º. As avaliações de que trata o § 1º serão realizadas, respectivamente, pelo serviço social e
pela perícia médica do INSS, por meio de instrumentos desenvolvidos especificamente para este
fim, instituídos por ato conjunto do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e do
INSS."
Não obstante a disposição legal, a r. sentença reconheceu comprovada a hipossuficiência
econômica, amparada no auto de constatação, realizado por oficial de justiça, cujas informações
foram colhidas do locatário de um pequeno cômodo na frente da casa do proponente, "usado
como bar", pelo qual informou pagar R$ 350,00 a título de locação, além das contas de água (R$
112,00) e luz (R$ 110,00). Reporto-me ao doc. 30435032, págs. 38/43.
Averbe-se que há registro de que o autor não fora encontrado nas três ocasiões em que o
meirinho esteve no local.
Além disso, as informações registradas no auto de constatação discrepam daquelas prestadas
pelo demandante, na petição colacionada ao doc. 30435032, págs. 55/56, dando conta de que
"quem atendeu ao estudo social foi seu genro, o qual disse que repassava um dinheiro para o
autor devido ao uso de seu quintal", esclarecendo, ainda, "que em sua casa não existe nenhuma
edícula ou quartinho de fundo", mas, apenas, "um trailer de lanche".
A realização de perícia social, portanto, reveste-se de fundamental importância no caso, para que
esta Corte, no julgamento do recurso autárquico, tenha amplo conhecimento das questões fáticas
indispensáveis à solução da lide e cuja ausência conduz à nulidade do feito, por cerceamento de
defesa.
Nessa trilha, os precedente da Nona Turma desta C. Corte, tirados de situações parelhas:
"CONSTITUCIONAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ARTIGO 203, CAPUT, DA
CR/88 E LEI Nº 8.742/1993. LAUDO MÉDICO PERICIAL. INCOMPLETUDE. ESTUDO SOCIAL.
AUSÊNCIA. CERCEAMENTO DE DEFESA. OCORRÊNCIA. NULIDADE DA SENTENÇA. - O
exame multidisciplinar conduzido por médicos peritos e por assistentes sociais é essencial nas
causas que versem sobre a concessão do Benefício de Prestação Continuada, cuja ausência
conduz à nulidade do feito, por cerceamento de defesa. - Apelação da parte autora parcialmente
provida. Sentença anulada, determinando o retorno dos autos à origem para complementação da
prova médica pericial, bem assim produção de estudo social e posterior julgamento do feito em
Primeiro Grau." (Relatora Desembargadora Federal Ana Pezarini, e-DJF3 Judicial 1
DATA:09/05/2017).
"PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 203, V, CF/88, LEI N. 8.742/93 E
12.435/2011. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA ARGUIDA PELO MINISTÉRIO
PÚBLICO FEDERAL. ACOLHIDA. SENTENÇA ANULADA. I-O julgamento da lide, quando
necessária a produção de provas ao deslinde da causa, implica em cerceamento de defesa,
ensejando a nulidade da sentença proferida. II - Julgamento de improcedência do pedido sem a
realização de estudo social. Cerceamento de defesa caracterizado. III- Preliminar arguida pelo
Ministério Público Federal acolhida. Sentença anulada. Apelação da autora prejudicada." (AC
00363862420164039999, Relator Desembargador Federal Gilberto Jordan, e-DJF3 Judicial 1
DATA:10/04/2017)
Ante o exposto, ANULO, DE OFÍCIO, A SENTENÇA, determinando o retorno dos autos à origem,
para realização de estudo social, por assistente social, e posterior julgamento do feito em
Primeiro Grau, nos termos da fundamentação, restando prejudicada a apelação interposta pelo
INSS.
Ad cautelam, determino, com fundamento no art. 300 do Código de Processo Civil, a manutenção
do benefício em tela até a realização da perícia, em razão do caráter alimentar do amparo
assistencial.
É como voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL. NÃO CABIMENTO. ART. 496, §
3º, I, NCPC. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ARTIGO 203, CAPUT, DA CR/88 E
LEI Nº 8.742/1993. PERÍCIA SOCIAL. IMPRESCINDIBILIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA.
OCORRÊNCIA. NULIDADE DA SENTENÇA.
- Ahipótese em exame não excede os 1.000 salários mínimos, sendo incabível a remessa oficial,
nos termos do art. 496, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil.
- A concessão do benefício de prestação continuada requer a avaliação da deficiência e do grau
de impedimento do postulante do beneplácito, por exame multidisciplinar conduzido por médicos
peritos e por assistentes sociais, na forma da Lei.
- Cerceamento de defesa caracterizado. Precedentes.
- Sentença anulada de ofício, determinando o retorno dos autos à origem para realização de
perícia social, por assistente social, e posterior julgamento do feito em Primeiro Grau.
- Apelação do INSS prejudicada.
- Manutenção do benefício concedido, em sede de antecipação de tutela, até a produção da
prova pericial.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu anular a sentença de ofício, determinando o retorno dos autos à origem
para realização de perícia social e posterior julgamento do feito em Primeiro Grau, mantendo-se o
benefício concedido, em sede de antecipação de tutela, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
