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CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL. NÃO CABIMENTO. ART. 496, § 3º, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. DECLARAÇÃO DE IMPOSTO DE RENDA. QUEBRA DE S...

Data da publicação: 08/08/2024, 16:40:54

CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL. NÃO CABIMENTO. ART. 496, § 3º, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. DECLARAÇÃO DE IMPOSTO DE RENDA. QUEBRA DE SIGILO FISCAL. IMPERTINÊNCIA. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART. 203, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E LEI Nº 8.742/1993. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. BENEFÍCIO INDEVIDO. - A hipótese em exame não excede os 1.000 salários mínimos, sendo incabível a remessa oficial, nos termos do art. 496, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil. - A concessão do Benefício de Prestação Continuada ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de impedimento, por exame multidisciplinar conduzido por médicos peritos e por assistentes sociais, na forma da Lei. - No caso, o laudo social foi elaborado por perito de confiança do juízo e traz elementos suficientes à aquilatação da controvérsia trazida a Juízo, não se vislumbrando, no mais, situação excepcional que permita o acesso à declaração do Imposto de Renda da parte autora, ou, mesmo, de seu cônjuge, cujos dados são protegidos pelo sigilo, na forma do art. 5º, XII, da Constituição Federal, c/c o § 4º do art. 1º da Lei Complementar nº 105/2001. - Atrelam-se, cumulativamente, à concessão do benefício de prestação continuada, o implemento de requisito etário ou a detecção de deficiência, demonstrada por exame pericial, e a verificação da ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da benesse, ou de tê-la suprida pela família. - Não comprovada situação de hipossuficiência, de rigor o indeferimento do benefício. - Honorários advocatícios fixados em 10% do valor atualizado da causa, observado o disposto no art. 98, § 3º, do Código de Processo Civil, que manteve a sistemática da Lei n. 1.060/50, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita. - Apelação do INSS provida. Sentença reformada para julgar improcedente o pedido. (TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5887182-90.2019.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal JOAO BATISTA GONCALVES, julgado em 30/04/2021, Intimação via sistema DATA: 04/05/2021)



Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP

5887182-90.2019.4.03.9999

Relator(a)

Desembargador Federal JOAO BATISTA GONCALVES

Órgão Julgador
9ª Turma

Data do Julgamento
30/04/2021

Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 04/05/2021

Ementa


E M E N T A



CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL. NÃO CABIMENTO. ART. 496, §
3º, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. DECLARAÇÃO DE IMPOSTO DE RENDA. QUEBRA
DE SIGILO FISCAL. IMPERTINÊNCIA. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART. 203,
CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E LEI Nº 8.742/1993. REQUISITOS NÃO
PREENCHIDOS. BENEFÍCIO INDEVIDO.
- Ahipótese em exame não excede os 1.000 salários mínimos, sendo incabível a remessa oficial,
nos termos do art. 496, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil.
- A concessão do Benefício de Prestação Continuada ficará sujeita à avaliação da deficiência e do
grau de impedimento, por exame multidisciplinar conduzido por médicos peritos e por assistentes
sociais, na forma da Lei.
- No caso, o laudo social foi elaborado por perito de confiança do juízo e traz elementos
suficientes à aquilatação da controvérsia trazida a Juízo, não se vislumbrando, no mais, situação
excepcional que permita o acesso à declaração do Imposto de Renda da parte autora, ou,
mesmo, de seu cônjuge, cujos dados são protegidos pelo sigilo, na forma do art. 5º, XII, da
Constituição Federal, c/c o § 4º do art. 1º da Lei Complementar nº 105/2001.
- Atrelam-se, cumulativamente, à concessão do benefício de prestação continuada, o implemento
de requisito etário ou a detecção de deficiência, demonstrada por exame pericial, e a verificação
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos

da ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da benesse, ou de tê-
la suprida pela família.
- Não comprovada situação de hipossuficiência, de rigor o indeferimento do benefício.
- Honorários advocatícios fixados em 10% do valor atualizado da causa, observado o disposto no
art. 98, § 3º, do Código de Processo Civil,que manteve a sistemática da Lei n. 1.060/50, por ser a
parte autora beneficiária da justiça gratuita.
- Apelação do INSS provida. Sentença reformada para julgar improcedente o pedido.

Acórdao



APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5887182-90.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS


APELADO: RENI DOS REIS FARIA

Advogados do(a) APELADO: EDER DE SOUZA AZEVEDO - MG75012-N, MAURA SIQUEIRA
DE CARVALHO - MG58796-N

OUTROS PARTICIPANTES:






APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5887182-90.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: RENI DOS REIS FARIA
Advogados do(a) APELADO: EDER DE SOUZA AZEVEDO - MG75012-N, MAURA SIQUEIRA
DE CARVALHO - MG58796-N
OUTROS PARTICIPANTES:





R E L A T Ó R I O




Trata-se de recurso de apelação interposto pelo INSS em face da r. sentença, não submetida ao

reexame necessário, que julgou procedente o pedido deduzido na inicial, condenando a Autarquia
Previdenciária a conceder, à parte autora, o benefício de prestação continuada, desde a data de
entrada do requerimento administrativo, em 22/03/2016. O decisum condenou, ainda, o ente
autárquico, ao pagamento dos atrasados, acrescidos de correção monetária pelo IPCA-E, juros
de mora na forma do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, e
verba honorária arbitrada em 10% do valor da condenação, incidente sobre as parcelas vencidas
até a sentença, nos termos da Súmula nº 111 do c. Superior Tribunal de Justiça, observando-se,
ainda, o disposto no §16 do art. 85 do Código de Processo Civil.
Suscita, preliminarmente, a nulidade da sentença, postulando "a quebra do sigilo fiscal da parte
autora, bem como de seu cônjuge, para que sejam encaminhados aos autos as últimas 3
Declarações de Imposto de Renda de ambos", com vistas à real aferição da situação financeira
do núcleo familiar. No mérito, pretende que seja reformada a sentença, sustentando, em síntese,
a ausência de comprovação de miserabilidade. Insurge-se, outrossim, quanto ao termo inicial do
benefício, correção monetária, juros de mora e honorários advocatícios. Requer, ainda, seja
decretada a prescrição quinquenal parcelar. Suscita, por fim, o prequestionamento legal para
efeito de interposição de recursos.
Com as contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal.
O Ministério Público Federal deliberou pela ausência de fundamentos à sua intervenção nos
autos, requerendo a prossecução do feito.
É o relatório.




APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5887182-90.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: RENI DOS REIS FARIA
Advogados do(a) APELADO: EDER DE SOUZA AZEVEDO - MG75012-N, MAURA SIQUEIRA
DE CARVALHO - MG58796-N
OUTROS PARTICIPANTES:





V O T O





Inicialmente, afigura-se correta a não submissão da r. sentença à remessa oficial.
É importante salientar que, de acordo com o art. 496, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil
atual, não será aplicável o duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito
econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos.
Na hipótese dos autos, embora a sentença seja ilíquida, resta evidente que a condenação ou o
proveito econômico obtido na causa não ultrapassa o limite legal previsto, enquadrando-se

perfeitamente à norma insculpida no parágrafo 3º, I, art. 496, da atual lei processual.
Não sendo, pois, o caso de submeter o decisum de primeiro grau à remessa oficial, passo à
análise do recurso em seus exatos limites, uma vez que cumpridos os requisitos de
admissibilidade previstos no Código de Processo Civil atual.
O § 6º do art. 20 da Lei nº 8.742/93 estabelece que a concessão do Benefício de Prestação
Continuada ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de impedimento de que trata o § 2º
do mesmo dispositivo, por exame multidisciplinar conduzido por médicos peritos e por assistentes
sociais, inverbis:

"Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa
com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
(...)
§ 2º Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com
deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou
sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e
efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
(...)
§ 6º A concessão do benefício ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de impedimento
de que trata o § 2º, composta por avaliação médica e avaliação social realizadas por médicos
peritos e por assistentes sociais do Instituto Nacional de Seguro Social - INSS."

No mesmo sentido, o art. 16 do Decreto nº 6.214/2007, que regulamenta o benefício de prestação
continuada da assistência social devido à pessoa com deficiência e ao idoso de que trata a Lei nº
8.742/93:

"Art. 16. A concessão do benefício à pessoa com deficiência ficará sujeita à avaliação da
deficiência e do grau de impedimento, com base nos princípios da Classificação Internacional de
Funcionalidades, Incapacidade e Saúde - CIF, estabelecida pela Resolução da Organização
Mundial da Saúde nº 54.21, aprovada pela 54ª Assembléia Mundial da Saúde, em 22 de maio de
2001.
§1º A avaliação da deficiência e do grau de impedimento será realizada por meio de avaliação
social e avaliação médica.
§2º A avaliação social considerará os fatores ambientais, sociais e pessoais, a avaliação médica
considerará as deficiências nas funções e nas estruturas do corpo, e ambas considerarão a
limitação do desempenho de atividades e a restrição da participação social, segundo suas
especificidades.
§3º As avaliações de que trata o § 1º serão realizadas, respectivamente, pelo serviço social e
pela perícia médica do INSS, por meio de instrumentos desenvolvidos especificamente para este
fim, instituídos por ato conjunto do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e do
INSS."

No caso, o laudo social foi elaborado por perito de confiança do juízo e traz elementos suficientes
à aquilatação da controvérsia trazida a Juízo, na forma da Lei, não se vislumbrando, no mais,
situação excepcional que permita o acesso à declaração do Imposto de Renda da parte autora,
ou, mesmo, de seu cônjuge, cujos dados são protegidos pelo sigilo, na forma do art. 5º, XII, da
Constituição Federal, c/c § 4º do art. 1º da Lei Complementar nº 105/2001.
Passo ao exame do mérito.

Previsto no art. 203, caput, da Constituição Federal e disciplinado pela Lei nº 8.742/1993, de
natureza assistencial e não previdenciária, o benefício de prestação continuada tem sua
concessão desvinculada do cumprimento dos quesitos de carência e de qualidade de segurado,
atrelando-se, cumulativamente, ao implemento de requisito etário ou à detecção de deficiência,
nos termos do art. 20, §2º, da Lei n° 8.742/93, demonstrada por exame pericial; à verificação da
ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da benesse, ou de tê-lo
suprido pela família; e, originalmente, à constatação de renda mensal per capita não superior a ¼
(um quarto) do salário mínimo. Recorde-se, a este passo, da sucessiva redução da idade mínima,
primeiramente de 70 para 67 anos, pelo art. 1º da Lei nº 9.720/98 e, ao depois, para 65 anos,
conforme art. 34 da Lei nº 10.741/ 2003.
No que diz respeito ao critério da deficiência, as sucessivas alterações legislativas ocorridas na
redação do § 2º, do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social demonstram a evidente
evolução na sua conceituação.
Em sua redação originária, a Lei 8.742/1993 definia a pessoa portadora de deficiência, para efeito
de concessão do benefício assistencial, aquela incapacitada para a vida independente e para o
trabalho.
Posteriormente, a Lei n. 12.435/2011 promoveu modificação ao dispositivo legal, ampliando o
conceito de deficiência, com base no Decreto n. 6.949/2009, que promulgou a Convenção
Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
O § 2º da art. 20 da Lei n. 8.742 passou então a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 20
(...)
§ 2º - para efeito de concessão deste benefício, considera-se:
I - pessoa com deficiência, aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir
sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas.
II - impedimentos de longo prazo: aqueles que incapacitam a pessoa com deficiência para a vida
independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos."

Vê-se, portanto, que ao fixar o entendimento da expressão "impedimentos de longo prazo", a Lei
n. 12.435/2011 optou por restringir a concessão do benefício exclusivamente às pessoas com
deficiência que apresentem incapacidade para a vida independente e para o trabalho pelo prazo
mínimo de 2 (dois) anos.
Atualmente, o dispositivo em exame encontra-se vigendo com a redação conferida pelo Estatuto
da Pessoa com Deficiência, Lei n. 13.146/2015, a qual explicitou a definição legal de pessoa com
deficiência:

"Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com
deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou
sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e
efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas."

De se registrar que o § 10 do mesmo dispositivo, incluído pela Lei n. 12.470/2011, considera de
longo prazo o impedimento cujos efeitos perduram pelo prazo mínimo de 02 (dois) anos.
Acerca do derradeiro pressuposto, o C. STF, no âmbito da Reclamação nº 4374 e dos Recursos
Extraordinários nºs. 567985 e 580963, submetidos à sistemática da repercussão geral, reputou
defasado esse método aritmético de aferição de contexto de miserabilidade, suplantando, assim,

o que outrora restou decidido na ADI 1.232-DF, ajuizada pelo Procurador-Geral da República e
em cujo âmbito se declarara a constitucionalidade do §3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93. A
motivação empregada pela Excelsa Corte, no RE nº 580963, reside no fato de terem sido
"editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para concessão de outros benefícios
assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que
instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa
Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a municípios
que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas".
À vista disso, a mensuração da hipossuficiência não mais se restringe ao parâmetro da renda
familiar, devendo, sim, aflorar da análise desse requisito e das demais circunstâncias concretas
de cada caso, na linha do que já preconizava a jurisprudência majoritária, no sentido de que a
diretiva do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93 não consistiria em singular meio para se verificar a
condição de miserabilidade preceituada na Carta Magna, cuidando-se, tão-apenas, de critério
objetivo mínimo, a revelar a impossibilidade de subsistência do portador de deficiência e do idoso,
não empecendo a utilização, pelo julgador, de outros fatores igualmente capazes de denotar a
condição de precariedade financeira da parte autora. Veja-se, a exemplo, STJ: REsp nº
314264/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Félix Fischer, j. 15/05/2001, v.u., DJ 18/06/2001, p. 185;
EDcl no AgRg no REsp 658705/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Felix Fischer, j. 08/03/2005, v.u., DJ
04/04/2005, p. 342; REsp 308711/SP, Sexta Turma, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 19/09/2002,
v.u., DJ 10/03/2003, p. 323.
Em plena sintonia com o acima esposado, o c. STJ, quando da apreciação do RESP n.
1.112.557/MG, acentuou que o art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93 comporta exegese tendente ao
amparo do cidadão vulnerável, donde concluir-se que a delimitação do valor de renda familiar per
capita não pode ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado.
Em substituição à diretriz inicialmente estampada na lei, a jurisprudência vem evoluindo para
eleger a renda mensal familiar per capita inferior à metade do salário mínimo como indicativo de
situação de precariedade financeira, tendo em conta que outros programas sociais, dentre eles o
bolsa família, o Programa Nacional de Acesso à Alimentação e o bolsa escola, instituídos pelas
Leis nºs 10.836/04, 10.689/03 e 10.219/01, nessa ordem, contemplam esse patamar.
Consultem-se arestos da Terceira Seção nesse diapasão:

“AGRAVO LEGAL EM EMBARGOS INFRINGENTES. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL À PESSOA IDOSA. PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO
DO BENEFÍCIO. AGRAVO IMPROVIDO (...) 3 - Da análise do sistema CNIS/DATAPREV,
verifica-se que o filho da autora possui apenas pequenos vínculos de trabalho, na maioria inferior
a 03 meses, sendo que na maior parte do tempo esteve desempregado. Desse modo, mesmo
incluindo a aposentadoria do marido da autora, a renda familiar per capita corresponde a pouco
mais de R$ 300,00, ou seja, inferior a meio salário mínimo. 4 - Restou demonstrada, quantum
satis, no caso em comento, situação de miserabilidade, prevista no art. 20, § 3º, da Lei
8.742/1993, a ensejar a concessão do benefício assistencial. 5 - Agravo improvido." (EI
00072617120124036112, Relator Desembargador Federal Toru Yamamoto, TRF3, j. 22/10/2015,
e-DJF3 05/11/2015)

“PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (LOAS). EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM
AGRAVO LEGAL. CARÁTER INFRINGENTE. IMPOSSIBILIDADE. CONTRADIÇÃO
INEXISTENTE. (...)- No caso em exame, não há omissão a ser sanada, sendo o benefício
indeferido pelo fato da renda familiar "per capita" ser superior a 1/2 salário mínimo. (...) 5-
Embargos de declaração rejeitados." (AR 00082598120084030000, Relator Juiz Convocado Silva

Neto, TRF3, j. 25/09/2014, e-DJF3 08/10/2014)

Nesse exercício de sopesamento do conjunto probatório, importa averiguar a necessidade, na
precisão da renda familiar, de abatimento do benefício de valor mínimo percebido por idoso ou
deficiente, pertencente à unidade familiar. Nesta quadra, há, inclusive, precedente do egrégio
STF, no julgamento do RE nº 580.963/PR, disponibilizado no DJe 14.11.2013, submetido à
sistemática da repercussão geral, em que se consagrou a inconstitucionalidade por omissão do
art. 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso, considerando a "inexistência de justificativa
plausível para discriminação dos portadores de deficiência em relação aos idosos, bem como dos
idosos beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de benefícios
previdenciários no valor de até um salário mínimo.".
Quanto à questão da composição da renda familiar per capita, o C. STJ, no julgamento do RESP
n. 1.355.052/SP, exarado na sistemática dos recursos representativos de controvérsia, assentou,
no mesmo sentido, a aplicação analógica do parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso, com
vistas à exclusão do benefício previdenciário recebido por idoso ou por deficiente, no valor de um
salário mínimo, no cálculo da renda per capita prevista no art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93.
De se realçar que a jurisprudência - antes, mesmo, do aludido recurso repetitivo - já se firmara no
sentido da exclusão de qualquer benefício de valor mínimo recebido por idoso com mais de 65
anos, por analogia ao disposto no art. 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/2003, preceito esse
que, na origem, limitava-se a autorizar a desconsideração de benefício de prestação continuada
percebido pelos referidos idosos.
Note-se que os precedentes não autorizam o descarte do benefício de valor mínimo recebido por
qualquer idoso, assim compreendidas pessoas com idade superior a 60 anos, mas, sim, pelos
idosos com idade superior a 65 anos.
Essa é a inteligência reinante na jurisprudência. A propósito, os seguintes julgados: STJ, AGP
8479, Rel. Des. Convocada Marilza Maynard, 3ª Seção, DJE 03/02/2014; STJ, AGP 8609, Rel.
Min. Assusete Magalhães, 3ª Seção, DJE 25/11/2013; STJ, AGRESP 1178377, Rel. Min. Maria
Thereza de Assis Moura, 6ª Turma, DJE 19/3/2012. E da atenta leitura da íntegra do acórdão do
recurso representativo de controvérsia - nº 1.355.052/SP - chega-se à idêntica conclusão.
Outro dado sobremodo relevante diz respeito à acepção de família, para a finalidade da Lei nº
8.742/1993, cujo conceito experimentou modificação ao longo do tempo. Num primeiro lanço, o
art. 20, § 1º, do citado diploma nomeava família "a unidade mononuclear, vivendo sob o mesmo
teto, cuja economia é mantida pela contribuição de seus integrantes". Ao depois, a Lei nº 9.720,
em 30/11/98, fruto de conversão da Medida Provisória nº 1.473-34, de 11/08/97, passou a
compreendê-la como o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei nº 8.213/91, dês que
conviventes sob mesmo teto. Finalmente, na vigência da Lei nº 12.435/2011, é havida como o
núcleo integrado pelo requerente, cônjuge ou companheiro, os pais, ou, na ausência destes, pela
madrasta ou padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados,
todos, também, sob o mesmo teto.

SITUAÇÃO DOS AUTOS

No caso vertente, verifica-se, pelos documentos 81707881, pág. 1, e 81707882, pág. 1, que a
parte autora, nascida em 15/11/1950, possuía 65 anos de idade em 22/03/2016, data de entrada
do requerimento aviado na senda administrativa, restando, pois, implementado o requisito etário.
Avançando, então, na análise da hipossuficiência, importa examinar o estudo social coligido ao
doc. 81707923, produzido em 13/03/2018.
Segundo o laudo adrede confeccionado, a autora reside com o cônjuge, de 70 anos, idade

correspondente à data do estudo socioeconômico.
Transcrevo excerto do laudo, sobre as condições de moradia:

"CONDIÇÕES DE MORADIA E MUDANÇAS AMBIENTAIS
ENDEREÇO: Rua 48, n.º 420, cohab 1.
Possui três dormitórios, uma sala, uma cozinha e dois banheiros. A casa é própria, com laje e
piso frio. Os móveis estão em bom estado de conservação, com eletrodomésticos básicos. Estão
há 25 anos nessa casa."

Segue, também, relato da vindicante, quanto às suas condições de saúde:

"Por orientação medica faz uso de creme hidratante corporal intensivo (Norwegian com glicerina –
Neutrogena) e sabonete neutro, devido a alergia na pele. Alegou que há quatro anos iniciou
tratamento de hepatite e realiza acompanhamento de forma quadrimestral no PSF. Está
aguardando cirurgia de cataratas. Trouxe que possui infecção urinaria que requer tratamento por
seis meses com uso de antibiótico. Esta com acompanhamento pelo urologista. Também trouxe
quadro de labirintite.
Alegou que sofre náuseas, vômitos e fraqueza ocasionada pela labirinte. Esse fator limita que
faça os afazeres domésticos e também restringe o exercício de atividade laborativa,
principalmente no manuseio de uma máquina de costura."

O cônjuge não apresenta complicações de saúde.
As despesas, à época do laudo, consistiam em tarifas de água (R$ 40,62) e energia elétrica (R$
79,38), gás (R$ 65,00), alimentação (R$ 500,00) e medicamentos (R$ 200,00), não fornecidos
pela rede pública de saúde.
O casal recebe auxílio dos dois filhos, com alimentação e medicamentos.
Conta, também, com um carro (gol), cedido por um dos filhos, e o cônjuge possui telefone celular.
No mais, conquanto a postulante alegue "a necessidade de em momentos recorrer a consultas
particular, pois a demanda na saúde pública é demorada e ela requer algumas especialidades",
não foi apresentada qualquer documentação comprobatória a respeito.
Os ganhos da família advém da aposentadoria de valor mínimo titularizada pelo consorte, à
época, de R$ 954,00. Além disso, ele realiza atividades esporádicas para complementar a renda.
Informa obter, com isso, em torno de R$ 200,00 mensais. Contudo, dos registros do CNIS
verifica-se que verte contribuições previdenciárias, regularmente, sobre o valor de um salário
mínimo, presumindo-se ser esta, quando menos, a renda complementar por ele obtida.
A proponente faz pequenos consertos em roupas, que lhe geram renda média de R$ 100,00
mensais.
Ainda que seja imperiosa a exclusão, na contabilização da renda familiar, da aposentação
recebida pelo cônjuge da autora, em aplicação analógica ao art. 34 do Estatuto do Idoso, nos
moldes do citado precedente do Excelso Pretório, os elementos de convicção coligidos aos autos
não indicam cotidiano de privações a ponto de justificar a inclusão desta no elenco de
beneficiários da prestação buscada.
E, como se sabe, dentre os escopos do benefício de prestação continuada, não está o de
suplementar renda ou propiciar maior conforto ao interessado. A propósito: AC
00394229420044039999, Relatora Desembargadora Federal Marisa Santos, TRF3, Nona Turma,
DJU 24/11/2005.
Assim, muito embora a perita social opine favoravelmente à concessão do beneplácito requerido,
não restou comprovada situação de hipossuficiência, ainda que por outros meios probantes,

como indicado no sobredito paradigma do C. Supremo Tribunal Federal, exarado em repercussão
geral.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, PARA REFORMAR A SENTENÇA
E JULGAR IMPROCEDENTE O PEDIDO.
Condeno a parte autora em honorários advocatícios fixados em 10% do valor atualizado da
causa, observado o disposto no art. 98, § 3º, do Código de Processo Civil, que manteve a
sistemática da Lei n. 1.060/50, por ser beneficiária da justiça gratuita.
É como voto.


E M E N T A



CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL. NÃO CABIMENTO. ART. 496, §
3º, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. DECLARAÇÃO DE IMPOSTO DE RENDA. QUEBRA
DE SIGILO FISCAL. IMPERTINÊNCIA. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART. 203,
CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E LEI Nº 8.742/1993. REQUISITOS NÃO
PREENCHIDOS. BENEFÍCIO INDEVIDO.
- Ahipótese em exame não excede os 1.000 salários mínimos, sendo incabível a remessa oficial,
nos termos do art. 496, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil.
- A concessão do Benefício de Prestação Continuada ficará sujeita à avaliação da deficiência e do
grau de impedimento, por exame multidisciplinar conduzido por médicos peritos e por assistentes
sociais, na forma da Lei.
- No caso, o laudo social foi elaborado por perito de confiança do juízo e traz elementos
suficientes à aquilatação da controvérsia trazida a Juízo, não se vislumbrando, no mais, situação
excepcional que permita o acesso à declaração do Imposto de Renda da parte autora, ou,
mesmo, de seu cônjuge, cujos dados são protegidos pelo sigilo, na forma do art. 5º, XII, da
Constituição Federal, c/c o § 4º do art. 1º da Lei Complementar nº 105/2001.
- Atrelam-se, cumulativamente, à concessão do benefício de prestação continuada, o implemento
de requisito etário ou a detecção de deficiência, demonstrada por exame pericial, e a verificação
da ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da benesse, ou de tê-
la suprida pela família.
- Não comprovada situação de hipossuficiência, de rigor o indeferimento do benefício.
- Honorários advocatícios fixados em 10% do valor atualizado da causa, observado o disposto no
art. 98, § 3º, do Código de Processo Civil,que manteve a sistemática da Lei n. 1.060/50, por ser a
parte autora beneficiária da justiça gratuita.
- Apelação do INSS provida. Sentença reformada para julgar improcedente o pedido. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


Resumo Estruturado

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