Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5262666-55.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal SERGIO DO NASCIMENTO
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
28/11/2019
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 04/12/2019
Ementa
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL TIDA POR INTERPOSTA.
TUTELA DE URGÊNCIA. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ARTIGO 203, V, CF.
REQUISITOS LEGAIS COMPROVADOS. LEI 8.742/93, ART. 20, §3º. DEFICIÊNCIA.
INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO E. STF. HIPOSSUFICIÊNCIA
ECONÔMICA. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. VERBAS ACESSÓRIAS. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS.I-Cumpre assinalar que o entendimento de que não é possível a antecipação de
tutela em face da Fazenda Pública, equiparada no presente feito ao órgão previdenciário, está
ultrapassado, porquanto a antecipação do provimento não importa em pagamento de parcelas
vencidas, o que estaria sujeito ao regime de precatórios. A implantação provisória ou definitiva do
benefício, tanto previdenciário como assistencial, não está sujeita à disciplina do artigo 100 da
Constituição da República, não havendo, portanto, falar-se em impossibilidade de implantação do
benefício perseguido sem o trânsito em julgado da sentença.II - Aplica-se ao caso o Enunciado da
Súmula 490 do E. STJ, que assim dispõe: A dispensa de reexame necessário, quando o valor da
condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a
sentenças ilíquidas.III - Não se olvida que o conceito de "pessoa portadora de deficiência" para
fins de proteção estatal e de concessão do benefício assistencial haja sido significativamente
ampliado com as alterações trazidas após a introdução no ordenamento pátrio da Convenção
sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu Protocolo Facultativo, aprovada pelo
Decreto Legislativo 186/2008, na forma do artigo 5º, § 3º, da Constituição da República. No caso
dos autos, a parte autora apresenta 'impedimentos de longo prazo' de natureza física, mental,
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem 'obstruir sua
participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais
pessoas'.IV- Quanto à hipossuficiência econômica, à luz da jurisprudência consolidada no âmbito
do E. STJ e do posicionamento usual desta C. Turma, no sentido de que o art. 20, §3º, da Lei
8.742/93 define limite objetivo de renda per capita a ser considerada, mas não impede a
comprovação da miserabilidade pela análise da situação específica de quem pleiteia o benefício.
(Precedente do E. STJ).V -Em que pese a improcedência da ADIN 1.232-DF, em julgamento
recente dos Recursos Extraordinários 567.985-MT e 580.983-PR, bem como da Reclamação
4.374, o E. Supremo Tribunal Federal modificou o posicionamento adotado anteriormente, para
entender pela inconstitucionalidade do disposto no art. 20, §3º, da Lei 8.742/93.VI - O
entendimento que prevalece atualmente no âmbito do E. STF é os de que as significativas
alterações no contexto socioeconômico desde a edição da Lei 8.742/93 e o reflexo destas nas
políticas públicas de assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios para
aferição da miserabilidade previstos na LOAS e aqueles constantes no sistema de proteção social
que veio a se consolidar.VII- O termo inicial do benefício deve ser fixado a contar da data da
citação (16.02.2017), tendo em vista a impossibilidade de aferição da hipossuficiência por ocasião
do requerimento administrativo.VIII -A correção monetária e os juros de mora deverão ser
calculados de acordo com a lei de regência, observando-se as teses firmadas pelo E.STF no
julgamento do RE 870.947, realizado em 20.09.2017. Quanto aos juros de mora será observado o
índice de remuneração da caderneta de poupança a partir de 30.06.2009.IX-Tendo em vista o
provimento parcial da remessa oficial, a teor do disposto no artigo 85, § 11, do CPC, os
honorários advocatícios devem ser mantidos em 10% sobre as prestações vencidas até a data da
sentença, eis que de acordo com o entendimento da 10ª Turma desta E. Corte.X- Preliminar
rejeitada. Remessa Oficial tida por interposta parcialmente provida. Apelação do réu improvida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5262666-55.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PAULO FERREIRA
Advogado do(a) APELADO: MARCIA MOREIRA GARCIA DA SILVA - SP176725-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5262666-55.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PAULO FERREIRA
Advogado do(a) APELADO: MARCIA MOREIRA GARCIA DA SILVA - SP176725-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Senhor Desembargador Federal Sergio Nascimento (Relator): Trata-se de apelação de
sentença pela qual foi julgado procedente o pedido do autor, para condenar o réu a conceder-lhe
o benefício de prestação continuada, previsto no art. 203, V, da Constituição da República, a
partir da data do requerimento administrativo (02.09.2015). Sobre as prestações atrasadas deverá
incidir correção monetária, consoante IPCA-E e juros de mora, a partir da citação, segundo índice
de remuneração da caderneta de poupança. O réu foi condenado, ainda, ao pagamento de
honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por cento) sobre as prestações vencidas até a
data da sentença. Isento de custas processuais. Concedida a tutela antecipada, determinando-se
a implantação do benefício no prazo de trinta dias, sob pena de multa diária no valor de R$
300,00, limitada a R$ 20.000,00.
O réu apelante, em suas razões de recurso, alega, preliminarmente, a impossibilidade de
antecipação da tutela, diante da irreversibilidade do provimento. Quanto ao mérito, argumenta,
em síntese, não restarem preenchidos os requisitos para a concessão do benefício.
Subsidiariamente, requer sejam observados os critérios de correção monetária previstos na Lei n.
11.960/09.
Com as contrarrazões da parte autora, vieram os autos a esta E. Corte.
O i. representante do Ministério Público Federal, em parecer,opinou pelo parcial provimento da
apelação do réu, no que tange aos critérios de correção monetária.
Noticiada pelo réu a implantação do benefício.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5262666-55.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PAULO FERREIRA
Advogado do(a) APELADO: MARCIA MOREIRA GARCIA DA SILVA - SP176725-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Nos termos do art. 1011 do CPC, recebo a apelação do réu.
Da preliminar
Cumpre assinalar que o entendimento de que não é possível a antecipação de tutela em face da
Fazenda Pública, equiparada no presente feito ao órgão previdenciário, está ultrapassado,
porquanto a antecipação do provimento não importa em pagamento de parcelas vencidas, o que
estaria sujeito ao regime de precatórios. A implantação provisória ou definitiva do benefício, tanto
previdenciário como assistencial, não está sujeita à disciplina do artigo 100 da Constituição da
República, não havendo, portanto, falar-se em impossibilidade de implantação do benefício
perseguido sem o trânsito em julgado da sentença.
Da remessa oficial tida por interposta
Aplica-se ao caso o Enunciado da Súmula 490 do E. STJ, que assim dispõe:
A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for
inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas.Do méritoO benefício
pretendido pela parte autora está previsto no artigo 203, V, da Constituição da República, que
dispõe:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de
contribuição à seguridade social, e tem por objetivo:(...)V - a garantia de um salário mínimo de
benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios
de prover à própria manutenção ou tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
Coube à Lei 8.742, de 7 de dezembro de 1993 (LOAS), a instituição do referido benefício,
tratando dos critérios para sua concessão em seus artigos 20 e 21. Por sua vez, a Lei 12.435, de
06 de julho de 2011, veio modificar os referidos dispositivos, sendo aplicáveis para os benefícios
requeridos a partir de sua edição - caso dos autos - os seguintes requisitos:Art. 20. O benefício de
prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao
idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a
própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.§ 1o Para os efeitos do disposto no
caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência
de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os
menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. § 2o Para efeito de concessão deste
benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de
natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras,
podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as
demais pessoas. § 3o Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência
ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo.
§ 4o O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer
outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da
pensão especial de natureza indenizatória.§ 5o A condição de acolhimento em instituições de
longa permanência não prejudica o direito do idoso ou da pessoa com deficiência ao benefício de
prestação continuada.§ 6º A concessão do benefício ficará sujeita à avaliação da deficiência e do
grau de impedimento de que trata o § 2o, composta por avaliação médica e avaliação social
realizadas por médicos peritos e por assistentes sociais do Instituto Nacional de Seguro Social -
INSS. § 7o Na hipótese de não existirem serviços no município de residência do beneficiário, fica
assegurado, na forma prevista em regulamento, o seu encaminhamento ao município mais
próximo que contar com tal estrutura.§ 8o A renda familiar mensal a que se refere o § 3o deverá
ser declarada pelo requerente ou seu representante legal, sujeitando-se aos demais
procedimentos previstos no regulamento para o deferimento do pedido.§ 9º A remuneração da
pessoa com deficiência na condição de aprendiz não será considerada para fins do cálculo a que
se refere o § 3o deste artigo.§ 10. Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2o
deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.
Assim, para que alguém faça jus ao benefício pleiteado, deve ser portador de deficiência ou ter
mais de 65 anos e ser incapaz de prover a própria manutenção ou tê-la provida por sua família.
Quanto ao requisito relativo à deficiência, a Lei 8.742/93, que regulamentou a concessão do
dispositivo constitucional acima, dispunha no § 2º do seu artigo 20, em sua redação original:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à
pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais e que comprovem não
possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.(...)§ 2º
Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela
incapacitada para a vida independente e para o trabalho.
Nesse ponto, cumpre salientar que o texto constitucional garante o pagamento de um salário
mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência, sem exigir, como fez a norma
regulamentadora, em sua redação original, a existência de incapacidade para a vida
independente e para o trabalho.
Nota-se, portanto, que ao definir os contornos da expressão pessoa portadora de deficiência
constante do dispositivo constitucional, a norma infraconstitucional reduziu a sua abrangência,
limitando o seu alcance aos casos em que a deficiência é geradora de incapacidade laborativa.
Todavia, observa-se que, em 10.07.2008, o Congresso Nacional promulgou o Decreto Legislativo
186/2008, aprovando, pelo rito previsto no artigo 5º, § 3º, da Constituição da República, o texto da
Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu Protocolo Facultativo,
assinados em Nova Iorque, em 30 de março de 2007, e conferindo à referida Convenção status
normativo equivalente ao das emendas constitucionais.
A Convenção, aprovada pelo Decreto Legislativo 186/2008, já no seu Artigo 1, cuidou de tratar do
conceito de "pessoa com deficiência", definição ora constitucionalizada pela adoção do rito do
artigo 5º, § 3º, da Carta, a saber:
Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir
sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais
pessoas.
Em coerência à alteração promovida em sede constitucional, o artigo 20, § 2º, da Lei 8.742/93,
viria a ser alterado pela Lei 12.470/11, passando a reproduzir em seu texto a definição de
"pessoa com deficiência" constante da norma superior. Dispõe a LOAS, em sua redação
atualizada:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa
com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.(...)§ 2o Para efeito
de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem
impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em
interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade
em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de
2011).
Não há dúvida, portanto, de que o conceito de 'deficiência' atualmente albergado é mais extenso
do que aquele outrora estabelecido, vez que considera como tal qualquer impedimento, inclusive
de natureza sensorial, que tenha potencialidade para a obstrução da participação social do
indivíduo em condições de igualdade.
Coerente com esta nova definição de 'deficiência' para fins de concessão do benefício
constitucional, a mencionada Lei 12.470/11 acrescentou à Lei 8.742/93 o artigo 21-A, com a
seguinte redação:
Art. 21-A. O benefício de prestação continuada será suspenso pelo órgão concedente quando a
pessoa com deficiência exercer atividade remunerada, inclusive na condição de
microempreendedor individual. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 1o Extinta a relação trabalhista ou a atividade empreendedora de que trata o caput deste artigo
e, quando for o caso, encerrado o prazo de pagamento do seguro-desemprego e não tendo o
beneficiário adquirido direito a qualquer benefício previdenciário, poderá ser requerida a
continuidade do pagamento do benefício suspenso, sem necessidade de realização de perícia
médica ou reavaliação da deficiência e do grau de incapacidade para esse fim, respeitado o
período de revisão previsto no caput do art. 21.
Verifica-se, portanto, que a legislação ordinária, em deferência às alterações promovidas em sede
constitucional, não apenas deixou de identificar os conceitos de 'incapacidade laborativa' e
'deficiência', como passou a autorizar expressamente que a pessoa com deficiência elegível à
concessão do amparo assistencial venha a exercer atividade laborativa - seja como empregada,
seja como microempreendedora - sem que tenha sua condição descaracterizada pelo trabalho,
ressalvada tão somente a suspensão do benefício enquanto este for exercido.
Observados estes parâmetros para a aferição da deficiência, no caso dos autos, o laudo médico
pericial, elaborado em 25.07.2017, atesta que o autor, com 59 anos de idade, servente de
pedreiro, é portador de sequelas de pós operatório tardio de revascularização coronariana,
hipertensão arterial e lombalgia, apresentando incapacidade parcial e permanente para atividades
que requeiram esforço físico intenso. Fixou a data de início da incapacidade em 11.10.2008.
Assim, malgrado o perito médico judicial tenha concluído que a incapacidade do autor é parcial,
as limitações apresentadas, aliadas à sua idade e profissão, autorizam a concessão do benefício
assistencial, caso preencha o requisito socioeconômico, haja vista possuir 'impedimentos de
longo prazo', com potencialidade para 'obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade, em
igualdade de condições com outras pessoas.
No que toca ao requisito socioeconômico, cumpre observar que o §3º do artigo 20 da Lei
8.742/93 estabeleceu para a sua aferição o critério de renda familiar per capita, observado o limite
de um quarto do salário mínimo, que restou mantido na redação dada pela Lei 12.435/11, acima
transcrita.
A questão relativa à constitucionalidade do critério de renda per capita não excedente a um
quarto do salário mínimo para que se considerasse o idoso ou pessoa com deficiência aptos à
concessão do benefício assistencial, foi analisada pelo E. Supremo Tribunal Federal em sede de
Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 1.232/DF), a qual foi julgada improcedente, por acórdão
que recebeu a seguinte ementa:
CONSTITUCIONAL. IMPUGNA DISPOSITIVO DE LEI FEDERAL QUE ESTABELECE O
CRITÉRIO PARA RECEBER O BENEFÍCIO DO INCISO V DO ART. 203, DA CF. INEXISTE A
RESTRIÇÃO ALEGADA EM FACE AO PRÓPRIO DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL QUE
REPORTA À LEI PARA FIXAR OS CRITÉRIOS DE GARANTIA DO BENEFÍCIO DE SALÁRIO
MÍNIMO À PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA FÍSICA E AO IDOSO. ESTA LEI TRAZ
HIPÓTESE OBJETIVA DE PRESTAÇÃO ASSISTENCIAL DO ESTADO. AÇÃO JULGADA
IMPROCEDENTE.
(STF. ADI 1.232-DF. Rel. p/ Acórdão Min. Nelson Jobim. J. 27.08.98; D.J. 01.06.2001).
Todavia, conquanto reconhecida a constitucionalidade do §3º do artigo 20, da Lei 8.742/93, a
jurisprudência evoluiu no sentido de que tal dispositivo estabelecia situação objetiva pela qual se
deve presumir pobreza de forma absoluta, mas não impedia o exame de situações subjetivas
tendentes a comprovar a condição de miserabilidade do requerente e de sua família. Tal
interpretação seria consolidada pelo E. Superior Tribunal de Justiça em recurso especial julgado
pela sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil (STJ - REsp. 1.112.557-MG;
Terceira Seção; Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho; j. 28.10.2009; DJ 20.11.2009).
O aparente descompasso entre o desenvolvimento da jurisprudência acerca da verificação da
miserabilidade dos postulantes ao benefício assistencial e o entendimento assentado por ocasião
do julgamento da ADI 1.232-DF levaria a Corte Suprema a voltar ao enfrentamento da questão,
após o reconhecimento da existência da sua repercussão geral, no âmbito da Reclamação 4374 -
PE, julgada em 18.04.2013.
Naquela ocasião, prevaleceu o entendimento de que "ao longo de vários anos desde a sua
promulgação, o §3º do art. 20 da LOAS passou por um processo de inconstitucionalização". Com
efeito, as significativas alterações no contexto socioeconômico desde então e o reflexo destas
nas políticas públicas de assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios
para aferição da miserabilidade previstos na Lei 8.742/93 e aqueles constantes no sistema de
proteção social que veio a se consolidar. Verifique-se:
Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição. (...)4. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e
Processo de inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993. (...)Verificou-se a
ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas
(políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares
econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte
do Estado brasileiro). 5. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade,
do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993. 6. Reclamação constitucional julgada improcedente.(Rcl 4374,
Relator Ministro Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, j. 18.04.2013, DJe-173 03.09.2013).
Destarte, é de se reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação
específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência
é através da própria natureza dos males que a assolam, do seu grau e intensidade, que poderão
ser mensuradas suas necessidades. Não há, pois, que se enquadrar todos os indivíduos em um
mesmo patamar e entender que somente aqueles que contam com menos de um quarto do
salário-mínimo possam fazer jus ao benefício assistencial.
No caso dos autos, o estudo social, realizado em 26.08.2017, junto à residência da sobrinha do
autor, consignou que devido ao agravamento de sua saúde e dificuldade financeira, passou a
viver com o apoio de sua sobrinha, permanecendoalguns dias neste município, nos períodos de
consulta e avaliação médica, e outro período na casa da irmã, em Santa Rosa do Viterbo.
Constatou que o demandante é solteiro, possui 4 (quatro) filhos adultos, com os quais não possui
vínculo afetivo, acreditando que vivam no litoral de São Paulo. Não possui nenhuma renda e não
é beneficiário do programa Bolsa Família, estando em situação de extrema pobreza. Relatou que
os medicamentos são cedidos pela secretaria da saúde e a alimentação é cedida pelos familiares.
Portanto, o conjunto probatório existente nos autos, demonstra que o autor preenche o requisito
referente à deficiência e comprovou sua hipossuficiência econômica, fazendo jus à concessão do
benefício assistencial.
O termo inicial do benefício deve ser fixado a partir da data da citação (16.02.2017), ante a
impossibilidade de aferição da hipossuficiência à época do requerimento administrativo.
A correção monetária e os juros de mora deverão ser calculados de acordo com a lei de regência,
observando-se as teses firmadas pelo E.STF no julgamento do RE 870.947, realizado em
20.09.2017. Quanto aos juros de mora será observado o índice de remuneração da caderneta de
poupança a partir de 30.06.2009.
Tendo em vista o provimento parcial da remessa oficial, a teor do disposto no artigo 85, § 11, do
CPC, os honorários advocatícios devem ser mantidos em 10% sobre as prestações vencidas até
a data da sentença, eis que de acordo com o entendimento da 10ª Turma desta E. Corte.
As parcelas pagas a título de antecipação de tutela deverão ser compensadas, quando da
liquidação da sentença.
Por fim, resta prejudicada a questão relativa à multa diária, ante a ausência de mora na
implantação do benefício.
Diante do exposto, rejeito a preliminar e, no mérito, nego provimento à apelação do INSS e dou
parcial provimento à remessa oficial tida por interposta.
É como voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL TIDA POR INTERPOSTA.
TUTELA DE URGÊNCIA. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ARTIGO 203, V, CF.
REQUISITOS LEGAIS COMPROVADOS. LEI 8.742/93, ART. 20, §3º. DEFICIÊNCIA.
INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO E. STF. HIPOSSUFICIÊNCIA
ECONÔMICA. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. VERBAS ACESSÓRIAS. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS.I-Cumpre assinalar que o entendimento de que não é possível a antecipação de
tutela em face da Fazenda Pública, equiparada no presente feito ao órgão previdenciário, está
ultrapassado, porquanto a antecipação do provimento não importa em pagamento de parcelas
vencidas, o que estaria sujeito ao regime de precatórios. A implantação provisória ou definitiva do
benefício, tanto previdenciário como assistencial, não está sujeita à disciplina do artigo 100 da
Constituição da República, não havendo, portanto, falar-se em impossibilidade de implantação do
benefício perseguido sem o trânsito em julgado da sentença.II - Aplica-se ao caso o Enunciado da
Súmula 490 do E. STJ, que assim dispõe: A dispensa de reexame necessário, quando o valor da
condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a
sentenças ilíquidas.III - Não se olvida que o conceito de "pessoa portadora de deficiência" para
fins de proteção estatal e de concessão do benefício assistencial haja sido significativamente
ampliado com as alterações trazidas após a introdução no ordenamento pátrio da Convenção
sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu Protocolo Facultativo, aprovada pelo
Decreto Legislativo 186/2008, na forma do artigo 5º, § 3º, da Constituição da República. No caso
dos autos, a parte autora apresenta 'impedimentos de longo prazo' de natureza física, mental,
intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem 'obstruir sua
participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais
pessoas'.IV- Quanto à hipossuficiência econômica, à luz da jurisprudência consolidada no âmbito
do E. STJ e do posicionamento usual desta C. Turma, no sentido de que o art. 20, §3º, da Lei
8.742/93 define limite objetivo de renda per capita a ser considerada, mas não impede a
comprovação da miserabilidade pela análise da situação específica de quem pleiteia o benefício.
(Precedente do E. STJ).V -Em que pese a improcedência da ADIN 1.232-DF, em julgamento
recente dos Recursos Extraordinários 567.985-MT e 580.983-PR, bem como da Reclamação
4.374, o E. Supremo Tribunal Federal modificou o posicionamento adotado anteriormente, para
entender pela inconstitucionalidade do disposto no art. 20, §3º, da Lei 8.742/93.VI - O
entendimento que prevalece atualmente no âmbito do E. STF é os de que as significativas
alterações no contexto socioeconômico desde a edição da Lei 8.742/93 e o reflexo destas nas
políticas públicas de assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios para
aferição da miserabilidade previstos na LOAS e aqueles constantes no sistema de proteção social
que veio a se consolidar.VII- O termo inicial do benefício deve ser fixado a contar da data da
citação (16.02.2017), tendo em vista a impossibilidade de aferição da hipossuficiência por ocasião
do requerimento administrativo.VIII -A correção monetária e os juros de mora deverão ser
calculados de acordo com a lei de regência, observando-se as teses firmadas pelo E.STF no
julgamento do RE 870.947, realizado em 20.09.2017. Quanto aos juros de mora será observado o
índice de remuneração da caderneta de poupança a partir de 30.06.2009.IX-Tendo em vista o
provimento parcial da remessa oficial, a teor do disposto no artigo 85, § 11, do CPC, os
honorários advocatícios devem ser mantidos em 10% sobre as prestações vencidas até a data da
sentença, eis que de acordo com o entendimento da 10ª Turma desta E. Corte.X- Preliminar
rejeitada. Remessa Oficial tida por interposta parcialmente provida. Apelação do réu improvida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egregia Decima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3 Regiao, por unanimidade, rejeitar a preliminar e negar
provimento a apelacao do reu e dar parcial provimento a remessa oficial tida por interposta, nos
termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
