Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0007802-10.2017.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
08/06/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 15/06/2021
Ementa
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA EXTRA PETITA.
NULIDADE. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA
TESTEMUNHAL. COMPROVAÇÃO DO EXERCÍCIO DE LABOR RURAL. TEMPO DE SERVIÇO
URBANO INCONTROVERSO. BENEFÍCIO CONCEDIDO. TERMO INICIAL. CORREÇÃO
MONETÁRIA. JUROS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CUSTAS. PEDIDO JULGADO
PARCIALMENTE PROCEDENTE. PRELIMINAR DE APELAÇÃO DO INSS ACOLHIDA.
APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E APRECIAÇÃO DO MÉRITO DA APELAÇÃO DO INSS
PREJUDICADAS.
1 - A sentença é extra petita, eis que julgou procedente pedido de benefício não pleiteado na
inicial, considerando que a parte autora requerera o benefício de aposentadoria por idade híbrida.
Portanto, ao extrapolar os limites do pedido, restou violado o princípio da congruência insculpido
no art. 460 do CPC/73, atual art. 492 do CPC/2015.
2 - O caso, entretanto, não é de remessa dos autos à 1ª instância, uma vez que a legislação
autoriza expressamente o julgamento imediato do processo quando presentes as condições para
tanto. É o que se extrai do art. 1.013, § 3º, II, do Código de Processo Civil. Considerando que a
causa encontra-se madura para julgamento - presentes os elementos necessários ao seu
deslinde - e que o contraditório e a ampla defesa restaram assegurados - com a citação válida do
ente autárquico - e, ainda, amparado pela legislação processual aplicável, passa-se ao exame do
mérito da demanda.
3 - Tendo implementado a idade mínima de 60 anos em 04 de março de 2001, deveria a autora
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
comprovar a carência de 120 (cento e vinte) meses, ônus do qual, de fato, se desincumbiu.
4 - Conforme disposição expressa do § 3º, do art. 55 da Lei n. 8.213/91, a distinção entre a
aposentadoria por idade rural e a de caráter híbrido, além do cômputo do exercício de atividade
rural e de períodos de contribuição sob outras categorias conjuntamente, reside no requisito
etário.
5 - Por sua vez, os critérios para apreciação do conjunto probatório referente ao exercício de
atividade rural são idênticos em ambas as modalidades de aposentadorias por idade. Assim
sendo, é necessária apenas a comprovação do efetivo exercício de labor rural para efeito de
carência.
6 - A controvérsia cinge-se ao período de exercício de labor rural, de 06/05/1967 a 1º/08/1982.
7 - Foram coligidas aos autos, dentre outros documentos, cópias da certidão de casamento,
realizado em 06/05/1967; e de certidão de nascimento de filho da autora, ocorrido em 1970, na
qual o marido foi qualificado como lavrador. Tais documentos constituem suficiente início de
prova material do alegado labor rural.
8 - De outra parte, é pacífico o entendimento jurisprudencial no sentido de que a prova
testemunhal possui a capacidade de ampliar o período do labor documentalmente demonstrado,
como ocorre no caso dos autos.
9 - Contudo, os extratos do CNIS apontam que o marido da autora iniciou o labor urbano em
09/06/1976, junto ao Município de São José do Rio Preto.
10 - Dado que os documentos que se consubstanciam em início de prova material do labor rural
estão em nome do marido, é possível o reconhecimento do exercício de trabalho nas lides
campesinas, apenas no período de 06/05/1967 a 08/06/1976.
11 - Os demais períodos laborativos da autora restam incontroversos.
12 - Diante do preenchimento da carência exigida em lei, mediante o somatório dos períodos de
atividades rurais e urbanas, de rigor a concessão do benefício de aposentadoria por idade, na
modalidade híbrida.
13 - Termo inicial do benefício fixado na data do requerimento administrativo.
14 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de Orientação
de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a
partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da
repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E,
tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
15 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
16 - Arbitro os honorários advocatícios no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de
acordo com o inciso correspondente ao valor da condenação, após a devida liquidação,
consideradas as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (Súmula 111, STJ), uma
vez que, sendo as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária suportadas por toda a
sociedade, a verba honorária deve, por imposição legal (art. 85, §2º, do CPC), ser fixada
moderadamente.
17 - Isento o INSS de custas processuais.
18 – Preliminar de apelação do INSS acolhida. Apelação do INSS, no mérito, e apelação da parte
autora prejudicadas.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0007802-10.2017.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: JORDECY DE ALMEIDA CICONE, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
- INSS
Advogado do(a) APELANTE: KLEBER ELIAS ZURI - SP294631-N
APELADO: JORDECY DE ALMEIDA CICONE, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL -
INSS
Advogado do(a) APELADO: KLEBER ELIAS ZURI - SP294631-N
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0007802-10.2017.4.03.9999
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- INSS
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INSS
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OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Trata-se de apelações interpostas pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e
pela parte autora, em ações ajuizadas por JORDECY DE ALMEIDA CICONE, objetivando a
concessão do benefício de aposentadoria por idade híbrida, mediante o reconhecimento do
exercício de labor rural, no período de 06/05/1967 a 1º/08/1982.
A r. sentença (ID 99433747, p. 110-114) julgou parcialmente procedente o pedido e condenou o
INSS à concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, a partir da data da citação,
com correção monetária e juros de mora. Fixou os honorários advocatícios em 10% sobre o
valor atualizado das parcelas vencidas até a sentença.
Em razões recursais (ID 99433747, p. 129-139), alega o INSS, preliminarmente, que se trata de
sentença “extra petita”, dado que determinou a concessão de benefício diverso do pretendido.
No mérito, aduz que não há nos autos suficiente início de prova material do labor rural.
Por sua vez, a parte autora, em sua apelação (ID 99433747, p. 118-128), pede que o termo
inicial do benefício seja fixado na data do requerimento administrativo, bem como a majoração
dos honorários advocatícios.
O INSS apresentou contrarrazões (ID 99433747, p. 144-147).
Devidamente processados os recursos, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional
Federal.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0007802-10.2017.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: JORDECY DE ALMEIDA CICONE, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
- INSS
Advogado do(a) APELANTE: KLEBER ELIAS ZURI - SP294631-N
APELADO: JORDECY DE ALMEIDA CICONE, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL -
INSS
Advogado do(a) APELADO: KLEBER ELIAS ZURI - SP294631-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Trata-se de pedido de concessão de aposentadoria por idade híbrida.
Fixados os limites da lide pela parte autora, veda-se ao magistrado decidir além (ultra petita),
aquém (citra petita) ou diversamente do pedido (extra petita), consoante o art. 492 do
CPC/2015.
Todavia, verifico que o magistrado a quo não se ateve aos termos do pedido ao apreciar a
possibilidade de concessão do benefício previdenciário de aposentadoria idade rural.
Logo, a sentença é extra petita, eis que julgou procedente pedido de benefício não pleiteado na
inicial, considerando que a parte autora requerera o benefício de aposentadoria por idade
híbrida. Portanto, ao extrapolar os limites do pedido, restou violado o princípio da congruência
insculpido no art. 460 do CPC/73, atual art. 492 do CPC/2015.
O caso, entretanto, não é de remessa dos autos à 1ª instância, uma vez que a legislação
autoriza expressamente o julgamento imediato do processo quando presentes as condições
para tanto. É o que se extrai do art. 1.013, § 3º, II, do Código de Processo Civil:
"A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada.
(...)
§ 3º. Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde
logo o mérito quando:
(...)
II - Decretar a nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limites do pedido ou da
causa de pedir".
Considerando que a causa encontra-se madura para julgamento - presentes os elementos
necessários ao seu deslinde - e que o contraditório e a ampla defesa restaram assegurados -
com a citação válida do ente autárquico - e, ainda, amparado pela legislação processual
aplicável, passo ao exame do mérito da demanda.
A aposentadoria por idade, na modalidade híbrida, encontra previsão no art. 48, § 3º, da Lei nº
8.213/91, in verbis:
"Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida
nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se
mulher.
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinquenta e cinco anos no caso
de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea "a" do inciso I,
na alínea "g" do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11.
§ 2o Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o
efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição
correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os
incisos III a VIII do § 9o do art. 11 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 11.718, de 2008)
§ 3o Os trabalhadores rurais de que trata o § 1o deste artigo que não atendam ao disposto no §
2o deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de
contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65
(sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher."
Nos termos do dispositivo supramencionado, incluído pela Lei 11.718/2008, o segurado terá
direito à aposentadoria por idade, na forma híbrida, isto é, como trabalhador rural e urbano,
quando atingir 65 (homens) ou 60 (mulheres) anos, desde que tenha cumprido a carência
exigida, devendo ser considerados ambos os períodos (urbano e rural) para efeitos de se
cômputo da carência exigida no art. 27, inc. II, da Lei 8.213/91.
Em relação ao ponto, restou assentado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, por ocasião
do julgamento do REsp nº 1.674.221/SP, submetido ao rito dos recursos representativos de
controvérsia repetitiva (Tema nº 1.007), o entendimento segundo o qual é permitido ao
segurado mesclar os períodos de atividade rural e urbana, para a obtenção do benefício de
aposentadoria por idade híbrida, sendo indiferente a qual regime pertencia (rural ou urbano) por
ocasião do requerimento do benefício, desde que respeitada a exigência etária, conforme se
verifica in verbis
"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. RECURSO ESPECIAL SUBMETIDO AO RITO
DOS RECURSOS REPETITIVOS. OBSERVÂNCIA DO ARTIGO 1.036, § 5o. DO CÓDIGO FUX
E DOS ARTS. 256-E, II, E 256-I DO RISTJ. APOSENTADORIA HÍBRIDA. ART. 48, §§ 3o. E 4o.
DA LEI 8.213/1991. PREVALÊNCIA DO PRINCÍPIO DE ISONOMIA A TRABALHADORES
RURAIS E URBANOS. MESCLA DOS PERÍODOS DE TRABALHO URBANO E RURAL.
EXERCÍCIO DE ATIVIDADE RURAL, REMOTO E DESCONTÍNUO, ANTERIOR À LEI
8.213/1991 A DESPEITO DO NÃO RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÃO. CÔMPUTO DO
TEMPO DE SERVIÇO PARA FINS DE CARÊNCIA. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO
DO LABOR CAMPESINO POR OCASIÃO DO IMPLEMENTO DO REQUISITO ETÁRIO OU DO
REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. TESE FIXADA EM HARMONIA COM O PARECER
MINISTERIAL. RECURSO ESPECIAL DA SEGURADA PROVIDO.
1. A análise da lide judicial que envolve a proteção do Trabalhador Rural exige do julgador
sensibilidade, e é necessário lançar um olhar especial a esses trabalhadores para compreender
a especial condição a que estão submetidos nas lides campesinas.
2. Como leciona a Professora DANIELA MARQUES DE MORAES, é preciso analisar quem é o
outro e em que este outro é importante para os preceitos de direito e de justiça. Não obstante o
outro possivelmente ser aqueles que foi deixado em segundo plano, identificá-lo pressupõe um
cuidado maior. Não se pode limitar a apontar que seja o outro. É preciso tratar de tema
correlatos ao outro, com alteridade, responsabilidade e, então, além de distinguir o outro, incluí-
lo (mas não apenas de modo formal) ao rol dos sujeitos de direito e dos destinatários da justiça
(A Importância do Olhar do Outro para a Democratização do Acesso à Justiça, Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2015, p. 35).
3. A Lei 11.718/2008, ao incluir a previsão dos §§ 3o. e 4o. no art.
48 da lei 8.213/1991, abrigou, como já referido, aqueles Trabalhadores Rurais que passaram a
exercer temporária ou permanentemente períodos em atividade urbana, já que antes da
inovação legislativa o mesmo Segurado se encontrava num paradoxo jurídico de desamparo
previdenciário: ao atingir idade avançada, não podia receber a aposentadoria rural porque
exerceu trabalho urbano e não tinha como desfrutar da aposentadoria urbana em razão de o
curto período laboral não preencher o período de carência (REsp. 1.
407.613/RS, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 28.11.2014).
4. A aposentadoria híbrida consagra o princípio constitucional de uniformidade e equivalência
dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais, conferindo proteção àqueles
Trabalhadores que migraram, temporária ou definitivamente, muitas vezes acossados pela
penúria, para o meio urbano, em busca de uma vida mais digna, e não conseguiram
implementar os requisitos para a concessão de qualquer aposentadoria, encontrando-se em
situação de extrema vulnerabilidade social.
5. A inovação legislativa objetivou conferir o máximo aproveitamento e valorização ao labor
rural, ao admitir que o Trabalhador que não preenche os requisitos para concessão de
aposentadoria rural ou aposentadoria urbana por idade possa integrar os períodos de labor rural
com outros períodos contributivos em modalidade diversa de Segurado, para fins de
comprovação da carência de 180 meses para a concessão da aposentadoria híbrida, desde que
cumprido o requisito etário de 65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher.
6. Analisando o tema, esta Corte é uníssona ao reconhecer a possibilidade de soma de lapsos
de atividade rural, ainda que anteriores à edição da Lei 8.213/1991, sem necessidade de
recolhimento de contribuições ou comprovação de que houve exercício de atividade rural no
período contemporâneo ao requerimento administrativo ou implemento da idade, para fins de
concessão de aposentadoria híbrida, desde que a soma do tempo de serviço urbano ou rural
alcance a carência exigida para a concessão do benefício de aposentadoria por idade.
7. A teste defendida pela Autarquia Previdenciária, de que o Segurado deve comprovar o
exercício de período de atividade rural nos últimos quinze anos que antecedem o implemento
etário, criaria uma nova regra que não encontra qualquer previsão legal. Se revela, assim, não
só contrária à orientação jurisprudencial desta Corte Superior, como também contraria o
objetivo da legislação previdenciária.
8. Não admitir o cômputo do trabalho rural exercido em período remoto, ainda que o Segurado
não tenha retornado à atividade campesina, tornaria a norma do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991
praticamente sem efeito, vez que a realidade demonstra que a tendência desses Trabalhadores
é o exercício de atividade rural quando mais jovens, migrando para o atividade urbana com o
avançar da idade. Na verdade, o entendimento contrário, expressa, sobretudo, a velha posição
preconceituosa contra o Trabalhador Rural, máxime se do sexo feminino.
9. É a partir dessa realidade social experimentada pelos Trabalhadores Rurais que o texto legal
deve ser interpretado, não se podendo admitir que a justiça fique retida entre o rochedo que o
legalismo impõe e o vento que o pensamento renovador sopra. A justiça pode ser cega, mas os
juízes não são. O juiz guia a justiça de forma surpreendente, nos meandros do processo, e ela
sai desse labirinto com a venda retirada dos seus olhos.
10. Nestes termos, se propõe a fixação da seguinte tese: o tempo de serviço rural, ainda que
remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da
carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido
efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991, seja
qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho
exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo.
11. Recurso Especial da Segurada provido, determinando-se o retorno dos autos à origem, a
fim de que prossiga no julgamento do feito analisando a possibilidade de concessão de
aposentadoria híbrida."
(REsp 1674221/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO,
julgado em 14/08/2019, DJe 04/09/2019) (destaque nosso)
Impende salientar que o Colendo Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE
1.281.909, por maioria, reconheceu a inexistência de repercussão geral da questão (Tema
1.104), por não se tratar de matéria constitucional.
Sendo assim, quando da análise do pedido à luz do § 3º do art. 48 da Lei 8.213/91, não incide a
vedação expressa contida no art. 55, § 2º, da referida lei.
Tendo implementado a idade mínima de 60 anos em 04 de março de 2001, deveria a autora
comprovar a carência de 120 (cento e vinte) meses, ônus do qual, de fato, se desincumbiu.
Destaco que de acordo com disposição expressa do § 3º, do art. 55 da Lei n. 8.213/91, a
distinção entre a aposentadoria por idade rural e a de caráter híbrido, além do cômputo do
exercício de atividade rural e de períodos de contribuição sob outras categorias conjuntamente,
reside no requisito etário.
Por sua vez, os critérios para apreciação do conjunto probatório referente ao exercício de
atividade rural são idênticos em ambas as modalidades de aposentadorias por idade. Assim
sendo, é necessária apenas a comprovação do efetivo exercício de labor rural para efeito de
carência.
A controvérsia cinge-se ao período de exercício de labor rural, de 06/05/1967 a 1º/08/1982.
Foram coligidas aos autos, dentre outros documentos, cópias da certidão de casamento,
realizado em 06/05/1967 (152151343, p. 1); e de certidão de nascimento de filho da autora,
ocorrido em 1970, na qual o marido foi qualificado como lavrador (ID 152151345, p. 1).
Tais documentos constituem suficiente início de prova material do alegado labor rural.
De outra parte, é pacífico o entendimento jurisprudencial no sentido de que a prova testemunhal
possui a capacidade de ampliar o período do labor documentalmente demonstrado, como
ocorre no caso dos autos.
Foi produzida prova oral, cujo depoimento foi colhido em audiência realizada em 2015.
José Angelo Russo “disse que conheceu Jordecy através dos irmãos dela, sendo que na época
eia morava na fazenda do Jesuato, isso no ano de 1962, 1963; ela trabalhava na roça, na
lavoura, e o pai dela tomava conta e trabalhava na olaria. Sempre via a autora com enxada nas
costas indo carpir café, mexer com arroz, via ela subir em cima de caminhão para trabalhar. A
propriedade era da família. Nessa época tinha aproximadamente 12 anos de idade e morava na
Fazenda São João, sendo que ia até o sítio em que a autora residia a cada 15 dias, contando
que nos finais de semana todos se reuniam para brincar no rio. Acreditou que a autora e sua
família ficaram na propriedade por aproximadamente 12 anos, porque depois se mudou para
Cedral e a autora continuou ali. Depois que Jordecy casou, ela e o esposo foram para Bady
Bassit, e foi várias vezes ao sítio do casal, local em que eles mexiam com roça e café, era um
sítio pequeno. Mesmo quando ia ao sábados Jordecy estava trabalhando com o esposo. O sítio
era do dr. Vicente. Nessa época tinha aproximadamente 20 anos. Não tomou conhecimento se
a autora abandonou a atividade rural e passou a trabalhar em atividade urbana. Acredita que o
casal ficou ali por aproximadamente seis anos, não lembrando se eles saíram em 1983 ou
1985. Não teve certeza, mas afirmou que o marido da autora é aposentado por idade. O marido
da autora posteriormente trabalhou para a prefeitura de São José do Rio Preto dirigindo
ambulância, mas não soube dizer se eles se mudaram para a tal cidade ou se continuaram em
Bady, aduzindo que o esposo de Jordecy pode ter aposentado na prefeitura.” (ID 99433747, p.
111-112).
Como se vê, a prova oral corroborou, de forma satisfatória, o início de prova material da
atividade campesina desempenhada pela requerente.
Contudo, os extratos do CNIS apontam que o marido da autora iniciou o labor urbano em
09/06/1976, junto ao Município de São José do Rio Preto (ID 99433747, p. 53).
Assim sendo, dado que os documentos que se consubstanciam em início de prova material do
labor rural estão em nome do marido, é possível o reconhecimento do exercício de trabalho nas
lides campesinas, apenas no período de 06/05/1967 a 08/06/1976.
Cumpre ressaltar que os demais períodos laborativos da autora restam incontroversos, logo,
desnecessária sua apreciação.
Dessa forma, diante do preenchimento da carência exigida em lei, mediante o somatório dos
períodos de atividades rurais e urbanas, de rigor a concessão do benefício de aposentadoria
por idade, na modalidade híbrida.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo (13/03/2014
– ID 99433747, p. 25).
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo
com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir
as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Arbitro os honorários advocatícios no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de acordo
com o inciso correspondente ao valor da condenação, após a devida liquidação, consideradas
as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (Súmula 111, STJ), uma vez que,
sendo as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária suportadas por toda a
sociedade, a verba honorária deve, por imposição legal (art. 85, §2º, do CPC), ser fixada
moderadamente.
Isento o INSS de custas processuais.
Ante o exposto, acolho a preliminar de apelação do INSS paraanular a r. sentença de 1º grau,
por se tratar de sentença extra petita, e julgo parcialmente procedente o pedido, para condenar
o INSS na implantação do benefício de aposentadoria por idade, a partir da data do
requerimento administrativo, sendo que sobre os valores em atraso incidirá correção monetária
de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal
até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de
variação do IPCA-E, e juros de mora até a expedição do ofício requisitório, de acordo com o
mesmo Manual. Arbitro os honorários advocatícios no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do
CPC, de acordo com o inciso correspondente ao valor da condenação, após a devida
liquidação, consideradas as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, restando
prejudicadas a apelação da parte autora e, no mérito, a apelação do INSS .
É como voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA EXTRA PETITA.
NULIDADE. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA
TESTEMUNHAL. COMPROVAÇÃO DO EXERCÍCIO DE LABOR RURAL. TEMPO DE
SERVIÇO URBANO INCONTROVERSO. BENEFÍCIO CONCEDIDO. TERMO INICIAL.
CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CUSTAS. PEDIDO
JULGADO PARCIALMENTE PROCEDENTE. PRELIMINAR DE APELAÇÃO DO INSS
ACOLHIDA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E APRECIAÇÃO DO MÉRITO DA APELAÇÃO
DO INSS PREJUDICADAS.
1 - A sentença é extra petita, eis que julgou procedente pedido de benefício não pleiteado na
inicial, considerando que a parte autora requerera o benefício de aposentadoria por idade
híbrida. Portanto, ao extrapolar os limites do pedido, restou violado o princípio da congruência
insculpido no art. 460 do CPC/73, atual art. 492 do CPC/2015.
2 - O caso, entretanto, não é de remessa dos autos à 1ª instância, uma vez que a legislação
autoriza expressamente o julgamento imediato do processo quando presentes as condições
para tanto. É o que se extrai do art. 1.013, § 3º, II, do Código de Processo Civil. Considerando
que a causa encontra-se madura para julgamento - presentes os elementos necessários ao seu
deslinde - e que o contraditório e a ampla defesa restaram assegurados - com a citação válida
do ente autárquico - e, ainda, amparado pela legislação processual aplicável, passa-se ao
exame do mérito da demanda.
3 - Tendo implementado a idade mínima de 60 anos em 04 de março de 2001, deveria a autora
comprovar a carência de 120 (cento e vinte) meses, ônus do qual, de fato, se desincumbiu.
4 - Conforme disposição expressa do § 3º, do art. 55 da Lei n. 8.213/91, a distinção entre a
aposentadoria por idade rural e a de caráter híbrido, além do cômputo do exercício de atividade
rural e de períodos de contribuição sob outras categorias conjuntamente, reside no requisito
etário.
5 - Por sua vez, os critérios para apreciação do conjunto probatório referente ao exercício de
atividade rural são idênticos em ambas as modalidades de aposentadorias por idade. Assim
sendo, é necessária apenas a comprovação do efetivo exercício de labor rural para efeito de
carência.
6 - A controvérsia cinge-se ao período de exercício de labor rural, de 06/05/1967 a 1º/08/1982.
7 - Foram coligidas aos autos, dentre outros documentos, cópias da certidão de casamento,
realizado em 06/05/1967; e de certidão de nascimento de filho da autora, ocorrido em 1970, na
qual o marido foi qualificado como lavrador. Tais documentos constituem suficiente início de
prova material do alegado labor rural.
8 - De outra parte, é pacífico o entendimento jurisprudencial no sentido de que a prova
testemunhal possui a capacidade de ampliar o período do labor documentalmente
demonstrado, como ocorre no caso dos autos.
9 - Contudo, os extratos do CNIS apontam que o marido da autora iniciou o labor urbano em
09/06/1976, junto ao Município de São José do Rio Preto.
10 - Dado que os documentos que se consubstanciam em início de prova material do labor rural
estão em nome do marido, é possível o reconhecimento do exercício de trabalho nas lides
campesinas, apenas no período de 06/05/1967 a 08/06/1976.
11 - Os demais períodos laborativos da autora restam incontroversos.
12 - Diante do preenchimento da carência exigida em lei, mediante o somatório dos períodos de
atividades rurais e urbanas, de rigor a concessão do benefício de aposentadoria por idade, na
modalidade híbrida.
13 - Termo inicial do benefício fixado na data do requerimento administrativo.
14 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
15 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
16 - Arbitro os honorários advocatícios no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de
acordo com o inciso correspondente ao valor da condenação, após a devida liquidação,
consideradas as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (Súmula 111, STJ), uma
vez que, sendo as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária suportadas por toda a
sociedade, a verba honorária deve, por imposição legal (art. 85, §2º, do CPC), ser fixada
moderadamente.
17 - Isento o INSS de custas processuais.
18 – Preliminar de apelação do INSS acolhida. Apelação do INSS, no mérito, e apelação da
parte autora prejudicadas. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu acolher a preliminar de apelação do INSS para anular a r. sentença de 1º
grau, por se tratar de sentença extra petita, julgando parcialmente procedente o pedido, para
condenar o INSS na implantação do benefício de aposentadoria por idade, a partir da data do
requerimento administrativo, sendo que sobre os valores em atraso incidirá correção monetária
de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal
até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de
variação do IPCA-E, e juros de mora até a expedição do ofício requisitório, de acordo com o
mesmo Manual, além de condenar o INSS no pagamento de honorários advocatícios os
honorários advocatícios no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de acordo com o
inciso correspondente ao valor da condenação, após a devida liquidação, consideradas as
parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, restando prejudicadas a apelação da
parte autora e, no mérito, a apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
