
| D.E. Publicado em 30/05/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, conforme certidão de julgamento, dar parcial provimento à remessa oficial e às apelações, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal Relatora
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0035966-63.2009.4.03.9999/MS
VOTO-VISTA
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de apelações interpostas em face de sentença que julgou procedente o pedido da parte autora, para condenar o INSS a lhe conceder benefício assistencial, desde o ajuizamento, discriminando os consectários e confirmando a tutela já concedida.
A parte autora requer retroação da DIB e majoração dos honorários advocatícios.
Já, o INSS pugna pela improcedência e insurge-se quanto ao termo inicial do benefício e consectários.
O DD. Órgão do Ministério Público Federal sugere o provimento parcial da apelação do INSS e desprovimento da apelação da parte autora.
Na sessão de 13/03/2016, a Relatora deu parcial provimento à apelação da parte autora, para fixar termo inicial do benefício, e parcial provimento à remessa oficial e ao apelo autárquico, para demarcar o termo final, bem como estabelecer critérios dos consectários e honorários advocatícios.
Pedi vista destes autos para melhor exame da questão.
Assim, após compulsar os autos, tenho por irretocáveis os argumentos expendidos, razão pela qual acompanho, integralmente, o voto da Relatora.
Rodrigo Zacharias
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0035966-63.2009.4.03.9999/MS
RELATÓRIO
Trata-se de apelações interpostas pela parte autora e pelo INSS em face da r. sentença, submetida ao reexame necessário, que julgou procedente o pedido deduzido na inicial, condenando a Autarquia Previdenciária a conceder, àquela, o benefício assistencial ao idoso, a partir do ajuizamento da demanda (27/4/2006), discriminados os consectários, ratificada a tutela jurídica concedida initio litis (fls. 251/255).
Visa, a promovente, a retroação da DIB à data do requerimento administrativo (10/3/2004, fl. 24), bem assim a majoração dos honorários advocatícios para 15% do valor devido desde o termo inicial até a efetiva implantação da benesse (fls. 267/272).
Por sua vez, o INSS requer seja reformada a sentença quanto ao mérito, sustentando a ausência dos requisitos à outorga do beneplácito. Insurge-se, outrossim, quanto à data de início do benefício, verba honorária, correção monetária, juros de mora e custas processuais (fls. 278/298).
Intimadas as partes acerca dos recursos interpostos, apenas a autora apresentou contrarrazões (fls. 267 verso e 303/313).
Subindo os autos a este Tribunal, o Ministério Público Federal noticiou a concessão administrativa, à vindicante, em 02/4/2015, de pensão pela morte do cônjuge, no valor de um salário mínimo, com DIB retroativa à data do óbito, ocorrido em 05/4/2007 (CNIS a fls. 328/332). Em seu parecer, o Órgão Ministerial opinou pelo parcial provimento do apelo autárquico, para que o termo final do Benefício de Prestação Continuada seja fixado na data em que a promovente passou a receber a aludida pensão e, ainda, para que os consectários legais sejam calculados nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, manifestando-se, alfim, pelo desprovimento do apelo autoral (fls. 316/327).
Em síntese, o relatório.
VOTO
Inicialmente, afigura-se correta a submissão da r. sentença à remessa oficial.
De fato, o artigo 475, § 2º, do CPC/1973, com redação dada pelo art. 1º da Lei nº 10.352/2001, que entrou em vigor em 27 de março de 2002, dispõe que não está sujeita ao reexame necessário a sentença em ações cujo direito controvertido não exceda a 60 (sessenta) salários mínimos.
Nesse sentido, segue o entendimento do e. Superior Tribunal de Justiça:
"AGRAVO REGIMENTAL. PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. REEXAME NECESSÁRIO. SENTENÇA ILÍQUIDA. PERDA DA AUDIÇÃO. AUXÍLIO-ACIDENTE. PRESSUPOSTOS. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. IMPOSSIBILIDADE. |
1. A sentença ilíquida proferida contra a União, o Estado, o Distrito Federal, o Município e as respectivas autarquias e fundações de direito público está sujeita ao duplo grau de jurisdição, exceto quando se tratar de valor certo não excedente de 60 (sessenta) salários mínimos. |
2. Afastado, na origem, o direito ao auxílio-acidente, em razão de inexistirem os pressupostos à sua concessão, impede o reexame da matéria, em âmbito especial, o enunciado 7 da Súmula desta Corte. |
3. Agravo interno ao qual se nega provimento." |
(STJ, AgRg no Ag 1274996/SP, Rel. Min. Celso Limongi, 6ª Turma, DJe 22.06.2010) |
Considerando as datas do termo inicial do benefício (27/4/2006, fl. 02) e da prolação da sentença, quando houve a ratificação da tutela antecipada (24/10/2014, fls. 251/255), bem como o valor da benesse, de um salário mínimo, verifico que a hipótese em exame excede os 60 salários mínimos, sendo, pois, o caso de submeter o decisum de primeiro grau à remessa oficial.
Cuida-se, na espécie, de ação ajuizada em 27/4/2006, que busca a concessão de Benefício de Prestação Continuada, desde a data do requerimento administrativo formulado em 10/3/2004 (fl. 24).
Com processamento regular, o Órgão Ministerial informou a concessão administrativa, em 19/4/2015, de pensão pela morte do cônjuge da parte autora, no valor de um salário mínimo, retroativa à data do óbito, ocorrido em 05/4/2007 (NB 1690156551, cf. fls. 321 verso e 332/333).
Consoante extrato do CNIS coligido a fls. 328/332, aludido beneplácito foi requerido em 02/4/2015 e deriva da aposentadoria por idade titularizada pelo consorte da proponente desde 22/11/1989, até a data do passamento (fls. 333/338). O Benefício de Prestação Continuada, postulado na presente demanda, vinha sendo pago desde 22/5/2006, por força de antecipação de tutela (fls. 27/28 e 39), e foi cessado em 31/3/2015 (fl. 329).
Nos ditames do art. 20, § 4º, da Lei nº 8.742/93, o benefício assistencial não pode ser acumulado, pelo beneficiário, com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória.
Destarte, e sem olvidar da necessária compensação dos valores recebidos a título de Benefício de Prestação Continuada, em período coincidente à pensão por morte, há de se perquirir sobre a presença dos requisitos à outorga da benesse postulada neste feito, no lapso temporal debatido no apelo autoral (10/3/2004, cf. fl. 24), até a data de início do benefício de pensão por morte (05/4/2007), eventuais parcelas decorrentes do amparo assistencial, além dos consectários legais e verba honorária.
Previsto no artigo 203, caput, da CR/88 e disciplinado pela Lei nº 8.742/1993, de natureza assistencial e não previdenciária, o benefício de prestação continuada tem sua concessão desvinculada do cumprimento dos quesitos de carência e de qualidade de segurado, atrelando-se, cumulativamente, ao implemento de requisito etário (recordando-se, a este passo, da sucessiva redução da idade mínima, primeiramente de 70 para 67 anos, pelo art. 1º da Lei nº 9.720/98 e, ao depois, para 65 anos, conforme art. 34 da Lei nº 10.741/ 2003) ou à detecção de deficiência, nos termos do art. 20, §2º, da Lei n° 8.742/93, demonstrada por exame pericial; à verificação da ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da benesse, ou de tê-lo suprido pela família; e, originalmente, à constatação de renda mensal per capita não superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo.
No que diz respeito ao critério da deficiência, as sucessivas alterações legislativas ocorridas na redação do § 2º, do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social demonstram a evidente evolução na sua conceituação.
Em sua redação originária, a Lei 8.742/1993 definia a pessoa portadora de deficiência, para efeito de concessão do benefício assistencial, aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho.
Posteriormente, a Lei n. 12.435/2011 promoveu modificação ao dispositivo legal, ampliando o conceito de deficiência, com base no Decreto n. 6.949/2009, que promulgou a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
O § 2º da art. 20 da Lei n. 8.742 passou então a vigorar com a seguinte redação:
"Art. 20 |
(...) |
§ 2º - para efeito de concessão deste benefício, considera-se: |
I - pessoa com deficiência, aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas. |
II - impedimentos de longo prazo: aqueles que incapacitam a pessoa com deficiência para a vida independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos." |
Vê-se, portanto, que ao fixar o entendimento da expressão "impedimentos de longo prazo", a Lei n. 12.435/2011 optou por restringir a concessão do benefício exclusivamente às pessoas com deficiência que apresentem incapacidade para a vida independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.
Atualmente, o dispositivo em exame encontra-se vigendo com a redação conferida pela Lei n. 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), a qual explicitou a definição legal de pessoa com deficiência:
"Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas." |
De se registrar que o § 10 do mesmo dispositivo, incluído pela Lei n. 12.470/2011, considera de longo prazo o impedimento cujos efeitos perduram pelo prazo mínimo de 02 (dois) anos.
Acerca do derradeiro pressuposto, o C. STF, no âmbito da Reclamação nº 4374 e dos Recursos Extraordinários nºs. 567985 e 580963, submetidos à sistemática da repercussão geral, reputou defasado esse método aritmético de aferição de contexto de miserabilidade, suplantando, assim, o que outrora restou decidido na ADI 1.232-DF, ajuizada pelo Procurador-Geral da República e em cujo âmbito se declarara a constitucionalidade do §3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93. A motivação empregada pela Excelsa Corte reside no fato de terem sido "editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas" (RE nº 580963).
À vista disso, a mensuração da hipossuficiência não mais se restringe ao parâmetro da renda familiar, devendo, sim, aflorar da análise desse requisito e das demais circunstâncias concretas de cada caso, na linha do que já preconizava a jurisprudência majoritária, no sentido de que a diretiva do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93 não consistiria em singular meio para se verificar a condição de miserabilidade preceituada na Carta Magna, cuidando-se, tão-apenas, de critério objetivo mínimo, a revelar a impossibilidade de subsistência do portador de deficiência e do idoso, não empecendo a utilização, pelo julgador, de outros fatores igualmente capazes de denotar a condição de precariedade financeira da parte autora (v., a exemplo, STJ: REsp nº 314264/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Félix Fischer, j. 15/05/2001, v.u., DJ 18/06/2001, p. 185; EDcl no AgRg no REsp 658705/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Felix Fischer, j. 08/03/2005, v.u., DJ 04/04/2005, p. 342; REsp 308711/SP, Sexta Turma, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 19/09/2002, v.u., DJ 10/03/2003, p. 323).
Em plena sintonia com o acima esposado, o c. STJ, quando da apreciação do RESP n. 1.112.557/MG, acentuou que o art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93 comporta exegese tendente ao amparo do cidadão vulnerável, donde concluir-se que a delimitação do valor de renda familiar per capita não pode ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado.
Em substituição à diretriz inicialmente estampada na lei, a jurisprudência vem evoluindo para eleger a renda mensal familiar per capita inferior à metade do salário mínimo como indicativo de situação de precariedade financeira, tendo em conta que outros programas sociais, dentre eles o bolsa família (Lei nº 10.836/04), o Programa Nacional de Acesso à Alimentação (Lei nº 10.689/03) e o bolsa escola (Lei nº 10.219/01), contemplam esse patamar.
Consultem-se arestos da Terceira Seção nesse diapasão:
"AGRAVO LEGAL EM EMBARGOS INFRINGENTES. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA IDOSA. PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. AGRAVO IMPROVIDO (...) 3 - Da análise do sistema CNIS/DATAPREV, verifica-se que o filho da autora possui apenas pequenos vínculos de trabalho, na maioria inferior a 03 meses, sendo que na maior parte do tempo esteve desempregado. Desse modo, mesmo incluindo a aposentadoria do marido da autora, a renda familiar per capita corresponde a pouco mais de R$ 300,00, ou seja, inferior a meio salário mínimo. 4 - Restou demonstrada, quantum satis, no caso em comento, situação de miserabilidade, prevista no art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993, a ensejar a concessão do benefício assistencial. 5 - Agravo improvido." |
(EI 00072617120124036112, Relator Desembargador Federal Toru Yamamoto, TRF3, j. 22/10/2015, e-DJF3 05/11/2015) |
"PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (LOAS). EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO LEGAL. CARÁTER INFRINGENTE. IMPOSSIBILIDADE. CONTRADIÇÃO INEXISTENTE. (...)- No caso em exame, não há omissão a ser sanada, sendo o benefício indeferido pelo fato da renda familiar "per capita" ser superior a 1/2 salário mínimo. (...) 5- Embargos de declaração rejeitados." |
(AR 00082598120084030000, Relator Juiz Convocado Silva Neto, TRF3, j. 25/09/2014, e-DJF3 08/10/2014) |
Nesse exercício de sopesamento do conjunto probatório, importa averiguar a necessidade, na precisão da renda familiar, de abatimento do benefício de valor mínimo percebido por idoso ou deficiente, pertencente à unidade familiar. Nesta quadra, há, inclusive, precedente do egrégio STF, submetido à sistemática da repercussão geral, em que se consagrou a inconstitucionalidade por omissão do artigo 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso, considerando a "inexistência de justificativa plausível para discriminação dos portadores de deficiência em relação aos idosos, bem como dos idosos beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de benefícios previdenciários no valor de até um salário mínimo." (RE nº 580.963/PR, DJe 14.11.2013).
Quanto à questão da composição da renda familiar per capita, o C. STJ, no julgamento do RESP n. 1.355.052/SP, exarado na sistemática dos recursos representativos de controvérsia, assentou, no mesmo sentido, a aplicação analógica do parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso, com vistas à exclusão do benefício previdenciário recebido por idoso ou por deficiente, no valor de um salário mínimo, no cálculo da renda per capita prevista no art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93
De se realçar que a jurisprudência - antes, mesmo, do aludido recurso repetitivo - já se firmara no sentido da exclusão de qualquer benefício de valor mínimo recebido por idoso com mais de 65 anos, por analogia ao disposto no art. 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/2003, preceito esse que, na origem, limitava-se a autorizar a desconsideração de benefício de prestação continuada percebido pelos referidos idosos.
Note-se que os precedentes não autorizam o descarte do benefício de valor mínimo recebido por qualquer idoso (assim compreendidas pessoas com idade superior a 60 anos), mas, sim, pelos idosos com idade superior a 65 anos.
Essa é a inteligência reinante na jurisprudência. A propósito, os seguintes julgados: STJ, AGP 8479, Rel. Des. Convocada Marilza Maynard, 3ª Seção, DJE 03/02/2014; STJ, AGP 8609, Rel. Min. Assusete Magalhães, 3ª Seção, DJE 25/11/2013; STJ, AGRESP 1178377, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6ª Turma, DJE 19/3/2012. E da atenta leitura da íntegra do acórdão do recurso representativo de controvérsia - nº 1.355.052/SP - chega-se à idêntica conclusão.
Outro dado sobremodo relevante diz respeito à acepção de família, para a finalidade da Lei nº 8.742/1993, cujo conceito experimentou modificação ao longo do tempo. Num primeiro lanço, o art. 20, § 1º, do citado diploma nomeava família "a unidade mononuclear, vivendo sob o mesmo teto, cuja economia é mantida pela contribuição de seus integrantes". Ao depois, a Lei nº 9.720, em 30/11/98, fruto de conversão da Medida Provisória nº 1.473-34, de 11/08/97, passou a compreendê-la como o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei nº 8.213/91, dês que conviventes sob mesmo teto. Finalmente, na vigência da Lei nº 12.435/2011, é havida como o núcleo integrado pelo requerente, cônjuge ou companheiro, os pais, ou, na ausência destes, pela madrasta ou padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, todos, também, sob o mesmo teto.
No caso vertente, a postulante nasceu em 25/12/1928 (cf. fl. 12), o que descortina o implemento do requisito etário, quando do ajuizamento da ação, em que contava com 78 anos de idade.
Além disso, ressai, do laudo médico realizado em 28/11/2006 (fl. 78), que é portadora de glaucoma, perda auditiva bilateral, artrose e obesidade, com claudicação rastejante, sem possibilidade de reabilitação, patologia estas que impossibilitam o exercício de atividade laborativa e a vida independente.
Quanto à hipossuficiência, muito embora não tenha sido realizado estudo social antes do falecimento do cônjuge da requerente (05/4/2007), eis que os laudos socioeconômicos juntados a fls. 198/202 e 216/217 vieram a juízo em 2012 e 2013, o conjunto probatório produzido autoriza concluir pela precariedade financeira do casal, já por ocasião do requerimento administrativo, aviado em 10/3/2004 (fl. 24).
Com efeito, haure-se, dos autos, que, nessa época, a renda familiar da parte autora advinha, unicamente, da aposentadoria por idade de valor mínimo titularizada pelo consorte desde 22/11/1989 (fls. 17/18 e 333/338).
Os depoimentos testemunhais, colhidos em 11/02/2008 (fls. 100/102), foram uníssonos no sentido de que, após o falecimento deste, ocorrido em 05/4/2007 (fl. 333), a autora ficou sem qualquer renda, passando a sobreviver, tão-somente, do Benefício de Prestação Continuada concedido em 19/5/2006, por força de antecipação de tutela (fls. 27/28).
A propósito, cabe lembrar que, na contabilização da renda familiar, torna-se imperiosa a exclusão da mencionada aposentação, à conta da informação de tratar-se de idoso e por não ultrapassar o valor de um salário mínimo, em aplicação analógica ao art. 34 do Estatuto do Idoso, nos moldes do citado precedente do Excelso Pretório. Portanto, mesmo antes do óbito do cônjuge, não restaria como passível de consideração jurídica qualquer valor percebido pela autoria, situação que denota miserabilidade, como recomenda a jurisprudência.
Não se descura que a aposentadoria do cônjuge deu-se na qualidade de empregador/empresário - veja-se, conforme relato da vindicante, à assistente social, que o mesmo "tinha uma marcenaria, contribuía para o INSS" (fl. 199). No entanto, é certo que contava com 80 anos na data do requerimento (fl. 15), presumindo-se, nos termos das alegações inaugurais e à míngua de prova em contrário, que, nessa idade, não mais exercia esse ou qualquer outro afazer que pudesse incrementar a renda do casal. Reportando-me, novamente, à prova oral produzida, os testigos afirmaram, com veemência, que a "autora é pobre".
É preciso considerar, ainda, que o casal não possuía bens, ao menos de valor aferível, tanto que, após o passamento do cônjuge, a solicitante não tinha mais morada.
Veja-se o relato historiado à perita social, no sentido de que um dos filhos construiu uma casa para que a genitora pudesse, então, continuar a residir em Mato Grosso do Sul (fl. 198, item 04).
Em 2010, a requerente passou a morar com uma filha, no estado de Santa Catarina, com a qual, no entanto, não se adaptou, havendo registro, pela assistente social, até mesmo, de maus tratos. O filho, que construiu a casa em Mato Grosso do Sul, "deu fim", em razão dessa mudança, a todos os pertences da pleiteante (fl. 198, ibidem) - de se realçar, por oportuno, que a mesma não possui bens até hoje (fl. 216, item 08).
Nos idos de 2012, foi morar com outro dos filhos no município de Palhoça, Estado de Santa Catarina, com o qual atualmente reside, apesar do cotidiano de dificuldade vivenciado pela família e da falta de condições financeiras favoráveis ao atendimento das necessidades materiais da postulante (fl. 199, item 05; fl. 200, item 08; fls. 201/2012, item 10 e fl. 216, itens 06 a 08), sendo que os demais filhos sequer realizam contato, nem mesmo em datas significativas, tampouco lhe fornecem auxílio financeiro no enfrentamento das despesas domésticas.
Assim, a idade do casal, associada à inexistência de bens apuráveis e à dinâmica familiar percebida como disfuncional, revelam que a autora, que não possuía, ao tempo do requerimento administrativo, meios de prover a própria manutenção, também não podia tê-la provida por sua família.
De se observar, ademais, que o indeferimento do beneplácito na via administrativa deu-se, exclusivamente, pelo entendimento esposado pela autarquia securitária, no sentido da ausência de miserabilidade, renda familiar per capita superior a ¼ do salário mínimo (fl. 24), critério que restou afastado no átrio judicial, após destacar-se, da contabilização da renda familiar, a aposentadoria por idade recebida pelo cônjuge da pretendente, como indicado no sobredito paradigma do C. Supremo Tribunal Federal, exarado em repercussão geral.
Destarte, os elementos probantes amealhados demonstram a precariedade financeira vivenciada pela autora desde o requerimento administrativo, apta a amparar a outorga do benefício pleiteado, na esteira da jurisprudência (nesse sentido: APELREEX 00122689420114036139, Nona Turma, Relatora Desembargadora Federal Marisa Santos, j. 30/05/2016, e-DJF3 13/06/2016; APELREEX 00331902220114039999, Nona Turma, Relator Juiz Convocado Rodrigo Zacharias, j. 14/03/2016, e-DJF3 31/03/2016), cujo contexto fático, com o óbito do cônjuge, só veio a agravar-se.
Entretanto, como se viu, o falecimento deste ocorreu no curso do processo. A promovente, por desinformação (fl. 199, item 04), requereu pensão por morte apenas em 02/4/2015, benefício que lhe foi concedido em 19/4/2015, com data de início de pagamento em 05/4/2007, data do óbito (fls. 332/333). A concessão do referido benefício, conquanto não documentada pela autoria nos presentes autos, é fato incontroverso a respeito do qual, por óbvio, tem conhecimento.
Por sua vez, o recebimento da pensão por morte é fator impeditivo à concessão do Benefício de Prestação Continuada, considerando a vedação de cumulação com qualquer outro benefício pecuniário no âmbito da Seguridade Social ou de outro regime previdenciário, na forma do que dispõe o art. 20, §4º, da Lei nº 8.742/93.
Por conseguinte, há que ser fixado o termo final da benesse na data de início da pensão por morte concedida na senda administrativa (05/4/2007).
Nesse sentido, a jurisprudência da Nona Turma deste E. Tribunal:
"CONSTITUCIONAL. ASSISTÊNCIA SOCIAL - BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA - ART. 203, INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL - REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFICIÁRIA DE PENSÃO POR MORTE - INACUMULATIVIDADE. ART. 41 DA LEI 8.213/91. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DEVIDO ATÉ A DATA DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DE PENSÃO POR MORTE. I - A decisão proferida pelo Plenário do STF nos autos da Reclamação nº 2303-6/RS, e publicada no DJ de 01/04/05, configura interpretação autêntica da decisão antes proferida na ADIN nº 1232/DF. II - A autora contava com 74 (setenta e quatro) anos quando ajuizou a presente ação, tendo, por isso, a condição de idosa. III - O marido da autora era beneficiário de Aposentadoria por Idade, desde 11.07.1988, no valor de um salário mínimo, cessada em 22.09.2007, por óbito dele, que gerou a Pensão por Morte atualmente percebida pela autora. Por isonomia ao determinado no parágrafo único do artigo 34 da Lei 10.741/03, tal benefício não pode ser computado para fins de apuração da renda per capita familiar. IV - Assim, na época, a autora preencheu todos os requisitos necessários ao deferimento do benefício, sendo o mesmo devido da citação até a data de início da Pensão por Morte - 22.09.2007, em face da inacumulatividade dos benefícios. V - Sendo a autora beneficiária de pensão por morte, não lhe assiste o direito de continuar a receber o benefício de prestação continuada, conforme expressamente dispõe o §4º do artigo 20 da Lei 8.742/93, sendo devido, no entanto, as prestações vencidas até a data de início da pensão por morte. VI - Tendo em vista que se trata de benefício de valor mínimo, inaplicável o disposto no art. 41 da Lei 8.213/91, o qual afasto de ofício. VII - Aplicação do art. 41 da Lei 8.213/91 afastada, de ofício. Apelação do INSS parcialmente provida." |
(AC 00196519120084039999, Relatora Desembargadora Federal Marisa Santos, e-DJF3 Judicial 2 DATA 10/12/2008, p. 539) |
Averbe-se, de outra parte, que o estudo social apenas retratou a situação de hipossuficiência, ensejadora da concessão do benefício pleiteado, preexistente à sua confecção.
Quanto aos valores em atraso, serão corrigidos nos termos da Lei n. 6.899/81 e da legislação superveniente, aplicado o Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal, atendido o disposto na Lei n. 11.960/2009, consoante Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 16/4/2015, Rel. Min. Luiz Fux.
São devidos juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês, nos termos dos artigos 406 do novo CC e 161, § 1º, do CTN, devendo, a partir de julho de 2009, serem fixados no percentual de 0,5% ao mês, observadas as alterações introduzidas no art. 1-F da Lei n. 9.494/97 pelo art. 5º da Lei n. 11.960/09, pela MP n. 567, de 03 de maio de 2012, convertida na Lei n. 12.703, de 07 de agosto de 2012, bem como normas legais ulteriores aplicáveis à questão.
Os honorários advocatícios devem ser mantidos no patamar de 10% (dez por cento), incidentes, entretanto, sobre o valor das parcelas vencidas até o termo final do Benefício de Prestação Continuada, consoante § 3º do artigo 20 do Código de Processo Civil de 1973, Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça e jurisprudência desta 9ª Turma.
No que tange às custas processuais, deverão ser pagas pelo INSS ao final do processo, nos termos da Lei Estadual n. 3.779/09, que revogou a isenção concedida na legislação pretérita, e artigo 91 do NCPC. Contudo, não se exime a Autarquia Previdenciária do pagamento das custas e despesas processuais em restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
O pagamento do Benefício de Prestação Continuada, decorrente da antecipação de tutela (fls. 27/28 e 39), foi cessado em 31/3/2015 (fl. 329). Todavia, os valores já pagos, seja na via administrativa ou por força de decisão judicial, a título de quaisquer benefícios previdenciários ou assistenciais não cumuláveis, deverão ser integralmente abatidos do débito.
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, para fixar termo inicial do benefício na forma explicitada, e PARCIAL PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL E AO APELO AUTÁRQUICO, para demarcar o termo final, conforme acima destacado, bem como estabelecer critérios de correção monetária, juros de mora e honorários advocatícios, abatendo-se do débito eventuais valores já recebidos a título de quaisquer benefícios previdenciários ou assistenciais não cumuláveis.
É como voto.
ANA PEZARINI
Desembargadora Federal Relatora
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