Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5000560-68.2016.4.03.6144
Relator(a)
Desembargador Federal SERGIO DO NASCIMENTO
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
05/12/2018
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 12/12/2018
Ementa
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. REMESSA OFICIAL TIDA POR INTERPOSTA. BENEFÍCIO DE
PRESTAÇÃO CONTINUADA. ARTIGO 203, V, CF. REQUISITOS LEGAIS COMPROVADOS. LEI
8.742/93, ART. 20, §3º. DEFICIÊNCIA. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO E.
STF. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. I- Aplica-se ao
presente caso o Enunciado da Súmula 490 do E. STJ, que assim dispõe: A dispensa de reexame
necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta
salários mínimos, não se aplica às sentenças ilíquidas.II - Não se olvida que o conceito de
"pessoa portadora de deficiência" para fins de proteção estatal e de concessão do benefício
assistencial haja sido significativamente ampliado com as alterações trazidas após a introdução
no ordenamento pátrio da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu
Protocolo Facultativo, aprovada pelo Decreto Legislativo 186/2008, na forma do artigo 5º, § 3º, da
Constituição da República. No caso dos autos, a parte autora apresenta 'impedimentos de longo
prazo' de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas
barreiras, podem 'obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de
condições com as demais pessoas'.III - Quanto à hipossuficiência econômica, à luz da
jurisprudência consolidada no âmbito do E. STJ e do posicionamento usual desta C. Turma, no
sentido de que o art. 20, §3º, da Lei 8.742/93 define limite objetivo de renda per capita a ser
considerada, mas não impede a comprovação da miserabilidade pela análise da situação
específica de quem pleiteia o benefício. (Precedente do E. STJ).IV- Em que pese a
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
improcedência da ADIN 1.232-DF, em julgamento recente dos Recursos Extraordinários 567.985-
MT e 580.983-PR, bem como da Reclamação 4.374, o E. Supremo Tribunal Federal modificou o
posicionamento adotado anteriormente, para entender pela inconstitucionalidade do disposto no
art. 20, §3º, da Lei 8.742/93.V - O entendimento que prevalece atualmente no âmbito do E. STF é
os de que as significativas alterações no contexto socioeconômico desde a edição da Lei
8.742/93 e o reflexo destas nas políticas públicas de assistência social, teriam criado um
distanciamento entre os critérios para aferição da miserabilidade previstos na LOAS e aqueles
constantes no sistema de proteção social que veio a se consolidar.VI - Tendo em vista o trabalho
adicional do patrono da parte autora em grau recursal, nos termos do § 11 do artigo 85 do
CPC/2015, mantidos os honorários advocatícios em 10% (dez por cento), esclarecendo que
incidem sobre o valor das prestações vencidas até a data do acórdão, nos termos da Súmula 111
do STJ e de acordo com entendimento firmado por esta 10ª Turma.VII - Apelação do réu e
remessa oficial tida por interposta improvidas.
Acórdao
APELAÇÃO (198) Nº 5000560-68.2016.4.03.6144
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: DEIVISON ISAQUE BRANDAO FIRMINO
REPRESENTANTE: JUSSARA JOSEFA DOS SANTOS FERREIRA BRANDAO
Advogado do(a) APELADO: LUIS ERIVAN DE SOUSA PINHEIRO - SP314463-A,
Advogado do(a) REPRESENTANTE: LUIS ERIVAN DE SOUSA PINHEIRO - SP314463-A
APELAÇÃO (198) Nº 5000560-68.2016.4.03.6144
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: DEIVISON ISAQUE BRANDAO FIRMINO
REPRESENTANTE: JUSSARA JOSEFA DOS SANTOS FERREIRA BRANDAO
Advogado do(a) APELADO: LUIS ERIVAN DE SOUSA PINHEIRO - SP314463-A,
Advogado do(a) REPRESENTANTE: LUIS ERIVAN DE SOUSA PINHEIRO - SP314463-A
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Sérgio Nascimento (Relator): Trata-se de apelação de
sentença pela qual foi julgado procedente o pedido do autor para condenar o réu a restabelecer o
benefício de prestação continuada previsto no art. 203, V, da Constituição da República, no valor
mensal de um salário mínimo, desde a data da indevida cessação. As parcelas vencidas deverão
ser corrigidas monetariamente e acrescidas de juros moratórios, na forma do Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal. Pela sucumbência, o réu foi
condenado ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o
valor das prestações vencidas até a data da sentença. Sem custas. Confirmada a tutela
antecipada anteriormente deferida.
Em sua apelação, busca o réu a reforma da sentença alegando, em síntese, que o autor não faz
jus à concessão do benefício, vez que possui rendimento familiar mensal per capita superior ao
limite estabelecido no art. 20, §3º, da Lei 8.742/93. Prequestiona a matéria para acesso às
instâncias recursais superiores.
Com a apresentação de contrarrazões de apelação do autor, vieram os autos a este Tribunal.
Em parecer, o i. representante do Parquet Federal, opinou pelo desprovimento do recurso de
apelação do INSS.
É o relatório.
APELAÇÃO (198) Nº 5000560-68.2016.4.03.6144
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: DEIVISON ISAQUE BRANDAO FIRMINO
REPRESENTANTE: JUSSARA JOSEFA DOS SANTOS FERREIRA BRANDAO
Advogado do(a) APELADO: LUIS ERIVAN DE SOUSA PINHEIRO - SP314463-A,
Advogado do(a) REPRESENTANTE: LUIS ERIVAN DE SOUSA PINHEIRO - SP314463-A
V O T O
Nos termos do art. 1011 do CPC/2015, recebo a apelação do réu.
Da remessa oficial tida por interposta Aplica-se ao presente caso o Enunciado da Súmula 490 do
E. STJ, que assim dispõe: A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou
do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica às sentenças
ilíquidas.
Do méritoO benefício pretendido pela parte autora está previsto no artigo 203, V, da Constituição
da República, que dispõe:Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar,
independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivo:(...)V - a garantia de
um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que
comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou tê-la provida por sua família,
conforme dispuser a lei.A regulamentação legislativa do dispositivo constitucional restou
materializada com o advento da Lei 8.742/93, que dispõe na redação atualizada do caput do seu
artigo 20:Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal
à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem
não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.Assim,
para fazer jus ao amparo constitucional, o postulante deve ser portador de deficiência ou ser
idoso (65 anos ou mais) e ser incapaz de prover a própria manutenção ou tê-la provida por sua
família.
Quanto ao requisito relativo à deficiência, a Lei 8.742/93, que regulamentou a concessão do
dispositivo constitucional acima, dispunha no § 2º do seu artigo 20, em sua redação original:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à
pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais e que comprovem não
possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.(...)§ 2º
Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela
incapacitada para a vida independente e para o trabalho.
Nesse ponto, cumpre salientar que o texto constitucional garante o pagamento de um salário
mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência, sem exigir, como fez a norma
regulamentadora, em sua redação original, a existência de incapacidade para a vida
independente e para o trabalho.
Nota-se, portanto, que ao definir os contornos da expressão pessoa portadora de deficiência
constante do dispositivo constitucional, a norma infraconstitucional reduziu a sua abrangência,
limitando o seu alcance aos casos em que a deficiência é geradora de incapacidade laborativa.
Todavia, observa-se que, em 10.07.2008, o Congresso Nacional promulgou o Decreto Legislativo
186/2008, aprovando, pelo rito previsto no artigo 5º, § 3º, da Constituição da República, o texto da
Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu Protocolo Facultativo,
assinados em Nova Iorque, em 30 de março de 2007, e conferindo à referida Convenção status
normativo equivalente ao das emendas constitucionais.
A Convenção, aprovada pelo Decreto Legislativo 186/2008, já no seu Artigo 1, cuidou de tratar do
conceito de "pessoa com deficiência", definição ora constitucionalizada pela adoção do rito do
artigo 5º, § 3º, da Carta, a saber:Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de
longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com
diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades
de condições com as demais pessoas.Em coerência à alteração promovida em sede
constitucional, o artigo 20, § 2º, da Lei 8.742/93, viria a ser alterado pela Lei 12.470/11, passando
a reproduzir em seu texto a definição de "pessoa com deficiência" constante da norma superior.
Dispõe a LOAS, em sua redação atualizada:Art. 20. O benefício de prestação continuada é a
garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e
cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de
tê-la provida por sua família.(...)§ 2o Para efeito de concessão deste benefício, considera-se
pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental,
intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua
participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
(Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011).Não há dúvida, portanto, de que o conceito de
'deficiência' atualmente albergado é mais extenso do que aquele outrora estabelecido, vez que
considera como tal qualquer impedimento, inclusive de natureza sensorial, que tenha
potencialidade para a obstrução da participação social do indivíduo em condições de
igualdade.Coerente com esta nova definição de 'deficiência' para fins de concessão do benefício
constitucional, a mencionada Lei 12.470/11 acrescentou à Lei 8.742/93 o artigo 21-A, com a
seguinte redação:Art. 21-A. O benefício de prestação continuada será suspenso pelo órgão
concedente quando a pessoa com deficiência exercer atividade remunerada, inclusive na
condição de microempreendedor individual. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011).§ 1o Extinta a
relação trabalhista ou a atividade empreendedora de que trata o caput deste artigo e, quando for
o caso, encerrado o prazo de pagamento do seguro-desemprego e não tendo o beneficiário
adquirido direito a qualquer benefício previdenciário, poderá ser requerida a continuidade do
pagamento do benefício suspenso, sem necessidade de realização de perícia médica ou
reavaliação da deficiência e do grau de incapacidade para esse fim, respeitado o período de
revisão previsto no caput do art. 21.Verifica-se, portanto, que a legislação ordinária, em
deferência às alterações promovidas em sede constitucional, não apenas deixou de identificar os
conceitos de 'incapacidade laborativa' e 'deficiência', como passou a autorizar expressamente que
a pessoa com deficiência elegível à concessão do amparo assistencial venha a exercer atividade
laborativa - seja como empregada, seja como microempreendedora - sem que tenha sua
condição descaracterizada pelo trabalho, ressalvada tão somente a suspensão do benefício
enquanto este for exercido.Observados estes parâmetros para a aferição da deficiência, no caso
dos autos, de acordo com o laudo médico pericial elaborado em 19.06.2015, o demandante, com
22anos de idade, é portador de paralisia cerebral e retardo mental grave, bem como cegueira,
desde a infância, necessitando de cuidados constantes de terceiros, para as atividades da vida
diária. Apresenta, portanto, incapacidade total e permanente para o trabalho. Há que se
reconhecer, portanto, que a parte autora fará jus ao benefício assistencial, caso preencha o
requisito socioeconômico, haja vista possuir 'impedimentos de longo prazo', com potencialidade
para 'obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade, em igualdade de condições com
outras pessoas'.No que toca ao requisito socioeconômico, cumpre observar que o §3º do artigo
20 da Lei 8.742/93 estabeleceu para a sua aferição o critério de renda familiar per capita,
observado o limite de um quarto do salário mínimo, que restou mantido na redação dada pela Lei
12.435/11, acima transcrita.
A questão relativa à constitucionalidade do critério de renda per capita não excedente a um
quarto do salário mínimo para que se considerasse o idoso ou pessoa com deficiência aptos à
concessão do benefício assistencial, foi analisada pelo E. Supremo Tribunal Federal em sede de
Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 1.232/DF), a qual foi julgada improcedente, por acórdão
que recebeu a seguinte ementa:CONSTITUCIONAL. IMPUGNA DISPOSITIVO DE LEI FEDERAL
QUE ESTABELECE O CRITÉRIO PARA RECEBER O BENEFÍCIO DO INCISO V DO ART. 203,
DA CF. INEXISTE A RESTRIÇÃO ALEGADA EM FACE AO PRÓPRIO DISPOSITIVO
CONSTITUCIONAL QUE REPORTA À LEI PARA FIXAR OS CRITÉRIOS DE GARANTIA DO
BENEFÍCIO DE SALÁRIO MÍNIMO À PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA FÍSICA E AO
IDOSO. ESTA LEI TRAZ HIPÓTESE OBJETIVA DE PRESTAÇÃO ASSISTENCIAL DO ESTADO.
AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE.(STF. ADI 1.232-DF. Rel. p/ Acórdão Min. Nelson Jobim. J.
27.08.98; D.J. 01.06.2001).
Todavia, conquanto reconhecida a constitucionalidade do §3º do artigo 20, da Lei 8.742/93, a
jurisprudência evoluiu no sentido de que tal dispositivo estabelecia situação objetiva pela qual se
deve presumir pobreza de forma absoluta, mas não impedia o exame de situações subjetivas
tendentes a comprovar a condição de miserabilidade do requerente e de sua família. Tal
interpretação seria consolidada pelo E. Superior Tribunal de Justiça em recurso especial julgado
pela sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil (STJ - Resp. 1.112.557-MG;
Terceira Seção; Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho; j. 28.10.2009; DJ 20.11.2009).O aparente
descompasso entre o desenvolvimento da jurisprudência acerca da verificação da miserabilidade
dos postulantes ao benefício assistencial e o entendimento assentado por ocasião do julgamento
da ADI 1.232-DF levaria a Corte Suprema a voltar ao enfrentamento da questão, após o
reconhecimento da existência da sua repercussão geral, no âmbito da Reclamação 4374 - PE,
julgada em 18.04.2013.
Naquela ocasião, prevaleceu o entendimento de que "ao longo de vários anos desde a sua
promulgação, o §3º do art. 20 da LOAS passou por um processo de inconstitucionalizarão". Com
efeito, as significativas alterações no contexto socioeconômico desde então e o reflexo destas
nas políticas públicas de assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios
para aferição da miserabilidade previstos na Lei 8.742/93 e aqueles constantes no sistema de
proteção social que veio a se consolidar. Verifique-se:Benefício assistencial de prestação
continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da Constituição. (...)4. Decisões judiciais
contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de inconstitucionalizarão dos
critérios definidos pela Lei 8.742/1993.(...)Verificou-se a ocorrência do processo de
inconstitucionalizarão decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e
jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como
critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro).5.
Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei
8.742/1993.6. Reclamação constitucional julgada improcedente.(Cl 4374, Relator Ministro Gilmar
Mendes, Tribunal Pleno, j. 18.04.2013, DJe-173 03.09.2013).
Destarte, é de se reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação
específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência
é através da própria natureza dos males que a assolam, do seu grau e intensidade, que poderão
ser mensuradas suas necessidades. Não há, pois, que se enquadrar todos os indivíduos em um
mesmo patamar e entender que somente aqueles que contam com menos de um quarto do
salário-mínimo possam fazer jus ao benefício assistencial.
No caso dos autos, o relatório de estudo social, datado de 05.06.2015,atesta que o núcleo familiar
do autor é composto por ele, sua genitora e três irmãos menores, estudantes. A residência é
própria, mas não tem documentação. A construção é de alvenaria e tem acabamento nas paredes
e piso. A parede da sala está sem reboque, pois foi feita uma parede para sustentar o muro de
arrimo. O banheiro e cozinha foram construídos no inicio do ano de 2015, por exigência da
Defesa Civil. Em janeiro de 2015 a genitora do autor contraiu um empréstimo e realizou reformas
na moradia, porém ainda é necessário trocar todo telhado, que apresenta goteiras e umidade nas
paredes. Devido ao fato da casa ser construída na parte alta do terreno, sendo necessário subir
vários degraus, a genitora tem dificuldades de sair de casa com o autor, necessitando da ajuda
de vizinhos. O autorrealiza tratamento na Rede Pública de Saúde com equipe interdisciplinar e
faz uso de medicamentos contínuos.
A renda mensal familiar é proveniente do benefício de pensão percebido pela autora, no valor de
R$ 1.355,00, segundo dados atualizados do CNIS.Porém, desde janeiro de 2015, vem sendo
descontado um valor de R$ 234,60 – referente a um empréstimo- com término em fevereiro de
2021. Concluiu a assistente social que o requerente seencontra em situação de pobreza, não
havendo como prover sua manutenção, devido àgravidade da deficiência, necessitandoda
Intervenção Protetiva do Estado.
Portanto, o conjunto probatório existente nos autos, demonstra que o autor preenche o requisito
referente à deficiência e comprovou sua hipossuficiência econômica, fazendo jus à concessão do
benefício assistencial.
Mantido o termo inicial do benefício na data da cessação indevida (01.09.2014).
A correção monetária e os juros de mora deverão ser calculados de acordo com a lei de regência.
Tendo em vista o trabalho adicional do patrono da parte autora em grau recursal, nos termos do §
11 do artigo 85 do CPC/2015, mantidos os honorários advocatícios em 10% (dez por cento),
esclarecendo que incidem sobre o valor das prestações vencidas até a data do acórdão, nos
termos da Súmula 111 do STJ e de acordo com entendimento firmado por esta 10ª Turma.
No tocante às custas processuais, as autarquias são isentas destas (artigo 4º, inciso I da Lei
9.289/96), porém devem reembolsar, quando vencidas, as despesas judiciais feitas pela parte
vencedora (artigo 4º, parágrafo único).
Diante do exposto, nego provimento à apelação do réu e à remessa oficial tida por interposta. As
prestações em atraso serão resolvidas em fase de liquidação de sentença, compensando-se as
adimplidas por força da tutela antecipada.
É como voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. REMESSA OFICIAL TIDA POR INTERPOSTA. BENEFÍCIO DE
PRESTAÇÃO CONTINUADA. ARTIGO 203, V, CF. REQUISITOS LEGAIS COMPROVADOS. LEI
8.742/93, ART. 20, §3º. DEFICIÊNCIA. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO E.
STF. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. I- Aplica-se ao
presente caso o Enunciado da Súmula 490 do E. STJ, que assim dispõe: A dispensa de reexame
necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta
salários mínimos, não se aplica às sentenças ilíquidas.II - Não se olvida que o conceito de
"pessoa portadora de deficiência" para fins de proteção estatal e de concessão do benefício
assistencial haja sido significativamente ampliado com as alterações trazidas após a introdução
no ordenamento pátrio da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu
Protocolo Facultativo, aprovada pelo Decreto Legislativo 186/2008, na forma do artigo 5º, § 3º, da
Constituição da República. No caso dos autos, a parte autora apresenta 'impedimentos de longo
prazo' de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas
barreiras, podem 'obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de
condições com as demais pessoas'.III - Quanto à hipossuficiência econômica, à luz da
jurisprudência consolidada no âmbito do E. STJ e do posicionamento usual desta C. Turma, no
sentido de que o art. 20, §3º, da Lei 8.742/93 define limite objetivo de renda per capita a ser
considerada, mas não impede a comprovação da miserabilidade pela análise da situação
específica de quem pleiteia o benefício. (Precedente do E. STJ).IV- Em que pese a
improcedência da ADIN 1.232-DF, em julgamento recente dos Recursos Extraordinários 567.985-
MT e 580.983-PR, bem como da Reclamação 4.374, o E. Supremo Tribunal Federal modificou o
posicionamento adotado anteriormente, para entender pela inconstitucionalidade do disposto no
art. 20, §3º, da Lei 8.742/93.V - O entendimento que prevalece atualmente no âmbito do E. STF é
os de que as significativas alterações no contexto socioeconômico desde a edição da Lei
8.742/93 e o reflexo destas nas políticas públicas de assistência social, teriam criado um
distanciamento entre os critérios para aferição da miserabilidade previstos na LOAS e aqueles
constantes no sistema de proteção social que veio a se consolidar.VI - Tendo em vista o trabalho
adicional do patrono da parte autora em grau recursal, nos termos do § 11 do artigo 85 do
CPC/2015, mantidos os honorários advocatícios em 10% (dez por cento), esclarecendo que
incidem sobre o valor das prestações vencidas até a data do acórdão, nos termos da Súmula 111
do STJ e de acordo com entendimento firmado por esta 10ª Turma.VII - Apelação do réu e
remessa oficial tida por interposta improvidas.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à
apelação do INSS e à remessa oficial tida por interposta, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
