Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5073696-08.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal SERGIO DO NASCIMENTO
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
10/04/2019
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 10/04/2019
Ementa
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. REMESSA OFICIAL TIDA POR INTERPOSTA. BENEFÍCIO DE
PRESTAÇÃO CONTINUADA. ARTIGO 203, V, CF. REQUISITOS LEGAIS COMPROVADOS. LEI
8.742/93, ART. 20, §3º. DEFICIÊNCIA. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO E.
STF. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. I- Aplica-se ao
presente caso o Enunciado da Súmula 490 do E. STJ, que assim dispõe: A dispensa de reexame
necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta
salários mínimos, não se aplica às sentenças ilíquidas.II - Não se olvida que o conceito de
"pessoa portadora de deficiência" para fins de proteção estatal e de concessão do benefício
assistencial haja sido significativamente ampliado com as alterações trazidas após a introdução
no ordenamento pátrio da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu
Protocolo Facultativo, aprovada pelo Decreto Legislativo 186/2008, na forma do artigo 5º, § 3º, da
Constituição da República. No caso dos autos, a parte autora apresenta 'impedimentos de longo
prazo' de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas
barreiras, podem 'obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de
condições com as demais pessoas'.III - Quanto à hipossuficiência econômica, à luz da
jurisprudência consolidada no âmbito do E. STJ e do posicionamento usual desta C. Turma, no
sentido de que o art. 20, §3º, da Lei 8.742/93 define limite objetivo de renda per capita a ser
considerada, mas não impede a comprovação da miserabilidade pela análise da situação
específica de quem pleiteia o benefício. (Precedente do E. STJ).IV- Em que pese a
improcedência da ADIN 1.232-DF, em julgamento recente dos Recursos Extraordinários 567.985-
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
MT e 580.983-PR, bem como da Reclamação 4.374, o E. Supremo Tribunal Federal modificou o
posicionamento adotado anteriormente, para entender pela inconstitucionalidade do disposto no
art. 20, §3º, da Lei 8.742/93.V - O entendimento que prevalece atualmente no âmbito do E. STF é
os de que as significativas alterações no contexto socioeconômico desde a edição da Lei
8.742/93 e o reflexo destas nas políticas públicas de assistência social, teriam criado um
distanciamento entre os critérios para aferição da miserabilidade previstos na LOAS e aqueles
constantes no sistema de proteção social que veio a se consolidar.VI - Tendo em vista o trabalho
adicional do patrono da parte autora em grau recursal, nos termos do § 11 do artigo 85 do
CPC/2015, mantidos os honorários advocatícios em 10% (dezpor cento), esclarecendo que
incidem sobre o valor das prestações vencidas até a data do acórdão, nos termos da Súmula 111
do STJ e de acordo com entendimento firmado por esta 10ª Turma.VII - Apelação do réu e
remessa oficial tida por interposta improvidas.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5073696-08.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: HENZON YHAN COSLOPE DE SOUSA
REPRESENTANTE: CLAUDINEI SANTOS DE SOUSA
Advogados do(a) APELADO: ROGERIO PASCHOALOTTO - SP152653-N, EDSON LUIS
PASCHOALOTTO - SP156928-N,
APELAÇÃO (198) Nº 5073696-08.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: HENZON YHAN COSLOPE DE SOUSA
REPRESENTANTE: CLAUDINEI SANTOS DE SOUSA
Advogados do(a) APELADO: EDSON LUIS PASCHOALOTTO - SP156928-N, ROGERIO
PASCHOALOTTO - SP152653-N,
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Sérgio Nascimento (Relator): Trata-se de apelação de
sentença pela qual foi julgado procedente o pedido do autor para condenar o réu a conceder-lhe o
benefício de prestação continuada previsto no art. 203, V, da Constituição da República, no valor
mensal de um salário mínimo, desde a data do requerimento administrativo (28.11.2016). As
parcelas vencidas deverão ser corrigidas monetariamente pelo IPCA-E e acrescidas de juros
moratórios na forma da Lei n. 11.960/09.Pela sucumbência, o réu foi condenado ao pagamento
de honorários advocatícios fixados em 10% (dezpor cento) sobre o valor das prestações vencidas
até a data da sentença. Sem custas. Concedida a antecipação da tutela, para a implantação
imediata do benefício.
Noticiada pelo réu a implantação do benefício.
Em sua apelação, busca o réu a reforma da sentença alegando, em síntese, que o autor não faz
jus à concessão do benefício, vez que possui rendimento familiar mensal per capita bastante
superior ao limite estabelecido no art. 20, §3º, da Lei 8.742/93. Prequestiona a matéria para
acesso às instâncias recursais superiores.
Com a apresentação de contrarrazões de apelação do autor, vieram os autos a este Tribunal.
Em parecer, o i. representante do Parquet Federal, opinou pelo provimento do recurso de
apelação do INSS, com a cassação do benefício.
É o relatório.
APELAÇÃO (198) Nº 5073696-08.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: HENZON YHAN COSLOPE DE SOUSA
REPRESENTANTE: CLAUDINEI SANTOS DE SOUSA
Advogados do(a) APELADO: EDSON LUIS PASCHOALOTTO - SP156928-N, ROGERIO
PASCHOALOTTO - SP152653-N,
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Da remessa oficial tida por interpostaAplica-se ao presente caso o Enunciado da Súmula 490 do
E. STJ, que assim dispõe: A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou
do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica às sentenças
ilíquidas.Do méritoO benefício pretendido pela parte autora está previsto no artigo 203, V, da
Constituição da República, que dispõe:Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela
necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivo:(...)V - a
garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso
que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou tê-la provida por sua
família, conforme dispuser a lei.
A regulamentação legislativa do dispositivo constitucional restou materializada com o advento da
Lei 8.742/93, que dispõe na redação atualizada do caput do seu artigo 20:Art. 20. O benefício de
prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao
idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a
própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.Assim, para fazer jus ao amparo
constitucional, o postulante deve ser portador de deficiência ou ser idoso (65 anos ou mais) e ser
incapaz de prover a própria manutenção ou tê-la provida por sua família.Quanto ao requisito
relativo à deficiência, a Lei 8.742/93, que regulamentou a concessão do dispositivo constitucional
acima, dispunha no § 2º do seu artigo 20, em sua redação original:Art. 20. O benefício de
prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à pessoa portadora de
deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais e que comprovem não possuir meios de
prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.(...)§ 2º Para efeito de
concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida
independente e para o trabalho.Nesse ponto, cumpre salientar que o texto constitucional garante
o pagamento de um salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência, sem exigir, como
fez a norma regulamentadora, em sua redação original, a existência de incapacidade para a vida
independente e para o trabalho.Nota-se, portanto, que ao definir os contornos da expressão
pessoa portadora de deficiência constante do dispositivo constitucional, a norma
infraconstitucional reduziu a sua abrangência, limitando o seu alcance aos casos em que a
deficiência é geradora de incapacidade laborativa.Todavia, observa-se que, em 10.07.2008, o
Congresso Nacional promulgou o Decreto Legislativo 186/2008, aprovando, pelo rito previsto no
artigo 5º, § 3º, da Constituição da República, o texto da Convenção sobre os Direitos das
Pessoas com Deficiência e de seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova Iorque, em 30 de
março de 2007, e conferindo à referida Convenção status normativo equivalente ao das emendas
constitucionais.A Convenção, aprovada pelo Decreto Legislativo 186/2008, já no seu Artigo 1,
cuidou de tratar do conceito de "pessoa com deficiência", definição ora constitucionalizada pela
adoção do rito do artigo 5º, § 3º, da Carta, a saber:Pessoas com deficiência são aquelas que têm
impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em
interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade
em igualdades de condições com as demais pessoas.Em coerência à alteração promovida em
sede constitucional, o artigo 20, § 2º, da Lei 8.742/93, viria a ser alterado pela Lei 12.470/11,
passando a reproduzir em seu texto a definição de "pessoa com deficiência" constante da norma
superior. Dispõe a LOAS, em sua redação atualizada:Art. 20. O benefício de prestação
continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com
65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria
manutenção nem de tê-la provida por sua família.(...)§ 2o Para efeito de concessão deste
benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de
natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras,
podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as
demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011).Não há dúvida, portanto, de que o
conceito de 'deficiência' atualmente albergado é mais extenso do que aquele outrora
estabelecido, vez que considera como tal qualquer impedimento, inclusive de natureza sensorial,
que tenha potencialidade para a obstrução da participação social do indivíduo em condições de
igualdade.Coerente com esta nova definição de 'deficiência' para fins de concessão do benefício
constitucional, a mencionada Lei 12.470/11 acrescentou à Lei 8.742/93 o artigo 21-A, com a
seguinte redação:Art. 21-A. O benefício de prestação continuada será suspenso pelo órgão
concedente quando a pessoa com deficiência exercer atividade remunerada, inclusive na
condição de microempreendedor individual. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011).§ 1o Extinta a
relação trabalhista ou a atividade empreendedora de que trata o caput deste artigo e, quando for
o caso, encerrado o prazo de pagamento do seguro-desemprego e não tendo o beneficiário
adquirido direito a qualquer benefício previdenciário, poderá ser requerida a continuidade do
pagamento do benefício suspenso, sem necessidade de realização de perícia médica ou
reavaliação da deficiência e do grau de incapacidade para esse fim, respeitado o período de
revisão previsto no caput do art. 21.Verifica-se, portanto, que a legislação ordinária, em
deferência às alterações promovidas em sede constitucional, não apenas deixou de identificar os
conceitos de 'incapacidade laborativa' e 'deficiência', como passou a autorizar expressamente que
a pessoa com deficiência elegível à concessão do amparo assistencial venha a exercer atividade
laborativa - seja como empregada, seja como microempreendedora - sem que tenha sua
condição descaracterizada pelo trabalho, ressalvada tão somente a suspensão do benefício
enquanto este for exercido.Observados estes parâmetros para a aferição da deficiência, no caso
dos autos, de acordo com o laudo médico pericial elaborado em 16.05.2017, o demandante,
atualmente com três anos de idade, é portador de meningoencefalite herpética, que cursou com
encefalopatia crônica, apresentando retardo no desenvolvimento motor e provavelmente também
intelectual. Necessita de cuidados intensos de seus genitores, bem como de médicos e outros
profissionais.Faz-se mister, aqui, observar o que dispõe o art. 4º, §1º, do Decreto 6.214/2007:Art.
4o Para os fins do reconhecimento do direito ao benefício, considera-se:§ 1o Para fins de
reconhecimento do direito ao Benefício de Prestação continuada às crianças e adolescentes
menores de dezesseis anos de idade, deve ser avaliada a existência da deficiência e o seu
impacto na limitação do desempenho de atividade e restrição da participação social, compatível
com a idade.
Neste passo, em se tratando de criança/adolescente, não há que se perquirir quanto à sua
capacidade laborativa, mas deve-se ter em conta as limitações que a deficiência de que é
portadora impõem ao seu desenvolvimento e a atenção especial de que necessita.
Há que se reconhecer, portanto, que a parte autora fará jus ao benefício assistencial, caso
preencha o requisito socioeconômico, haja vista possuir 'impedimentos de longo prazo', com
potencialidade para 'obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade, em igualdade de
condições com outras pessoas'.No que toca ao requisito socioeconômico, cumpre observar que o
§3º do artigo 20 da Lei 8.742/93 estabeleceu para a sua aferição o critério de renda familiar per
capita, observado o limite de um quarto do salário mínimo, que restou mantido na redação dada
pela Lei 12.435/11, acima transcrita.A questão relativa à constitucionalidade do critério de renda
per capita não excedente a um quarto do salário mínimo para que se considerasse o idoso ou
pessoa com deficiência aptos à concessão do benefício assistencial, foi analisada pelo E.
Supremo Tribunal Federal em sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 1.232/DF), a
qual foi julgada improcedente, por acórdão que recebeu a seguinte ementa:CONSTITUCIONAL.
IMPUGNA DISPOSITIVO DE LEI FEDERAL QUE ESTABELECE O CRITÉRIO PARA RECEBER
O BENEFÍCIO DO INCISO V DO ART. 203, DA CF. INEXISTE A RESTRIÇÃO ALEGADA EM
FACE AO PRÓPRIO DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL QUE REPORTA À LEI PARA FIXAR OS
CRITÉRIOS DE GARANTIA DO BENEFÍCIO DE SALÁRIO MÍNIMO À PESSOA PORTADORA
DE DEFICIÊNCIA FÍSICA E AO IDOSO. ESTA LEI TRAZ HIPÓTESE OBJETIVA DE
PRESTAÇÃO ASSISTENCIAL DO ESTADO. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE.(STF. ADI
1.232-DF. Rel. p/ Acórdão Min. Nelson Jobim. J. 27.08.98; D.J. 01.06.2001).Todavia, conquanto
reconhecida a constitucionalidade do §3º do artigo 20, da Lei 8.742/93, a jurisprudência evoluiu
no sentido de que tal dispositivo estabelecia situação objetiva pela qual se deve presumir pobreza
de forma absoluta, mas não impedia o exame de situações subjetivas tendentes a comprovar a
condição de miserabilidade do requerente e de sua família. Tal interpretação seria consolidada
pelo E. Superior Tribunal de Justiça em recurso especial julgado pela sistemática do artigo 543-C
do Código de Processo Civil (STJ - Resp. 1.112.557-MG; Terceira Seção; Rel. Min. Napoleão
Nunes Maia Filho; j. 28.10.2009; DJ 20.11.2009).O aparente descompasso entre o
desenvolvimento da jurisprudência acerca da verificação da miserabilidade dos postulantes ao
benefício assistencial e o entendimento assentado por ocasião do julgamento da ADI 1.232-DF
levaria a Corte Suprema a voltar ao enfrentamento da questão, após o reconhecimento da
existência da sua repercussão geral, no âmbito da Reclamação 4374 - PE, julgada em
18.04.2013.Naquela ocasião, prevaleceu o entendimento de que "ao longo de vários anos desde
a sua promulgação, o §3º do art. 20 da LOAS passou por um processo de inconstitucionalizarão".
Com efeito, as significativas alterações no contexto socioeconômico desde então e o reflexo
destas nas políticas públicas de assistência social, teriam criado um distanciamento entre os
critérios para aferição da miserabilidade previstos na Lei 8.742/93 e aqueles constantes no
sistema de proteção social que veio a se consolidar. Verifique-se:Benefício assistencial de
prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da Constituição. (...)4. Decisões
judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de inconstitucionalizarão
dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993.(...)Verificou-se a ocorrência do processo de
inconstitucionalizarão decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e
jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como
critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro).5.
Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei
8.742/1993.6. Reclamação constitucional julgada improcedente.(Cl 4374, Relator Ministro Gilmar
Mendes, Tribunal Pleno, j. 18.04.2013, DJe-173 03.09.2013).
Destarte, é de se reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação
específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência
é através da própria natureza dos males que a assolam, do seu grau e intensidade, que poderão
ser mensuradas suas necessidades. Não há, pois, que se enquadrar todos os indivíduos em um
mesmo patamar e entender que somente aqueles que contam com menos de um quarto do
salário-mínimo possam fazer jus ao benefício assistencial.No caso dos autos, o relatório de
estudo social realizado em 23.05.2017 atesta que o núcleo familiar do autor é composto por ele
eseus genitores. Residem em casa popular, de alvenaria, piso frio, composta por dois quartos,
sala, cozinha e banheiro, sendo que a área externa ainda não foi concluída, com condições de
acesso precárias à pessoa com deficiência ou idosa. Osmóveis que guarnecem a residência são
simples, básicos e usados e foram doados por amigos e vizinhos. A família paga prestação
mensal da moradia no valor de R$ 183,58, cuja residência localiza-se na periferia da cidade, não
possuem veículo. A renda mensal familiar é proveniente dos rendimentos percebidos pelo genitor
do autor, no valor aproximado de R$ 1.513,00, atualmente R$ 2.300,00, conforme dados do
CNIS. Também são beneficiários do Programa "BolsaFamília" no valor de R$ 160,00. A genitora
não trabalha, em virtude dos cuidados intensivos com o filho. Relata que o autor faz uso contínuo
de medicação e acompanhamento neurológico na cidade de Marília/SP, tendo que se deslocar
para lá duas vezes por mês. Também frequenta a APAE, onde passa por atendimentos de
psicologia, terapia ocupacional, fonoaudiologia e fisioterapia. A assistente social concluiu seu
relatório afirmando que o autor está apto a receber o benefício pleiteado (art. 21 do LOAS).
Destaco, no caso, que em virtude da gravidade da patologia do autor,totalmente dependentedos
cuidados de terceiros, os rendimentos do genitor são insuficientes para manter a família com
dignidade, pois mesmo considerada sua remuneração atual, a renda "per capita" é inferior a um
salário mínimo.
Portanto, o conjunto probatório existente nos autos, demonstra que o autor preenche o requisito
referente à deficiência e comprovou sua hipossuficiência econômica, fazendo jus à concessão do
benefício assistencial.
Mantido o termo inicial do benefício na data do requerimento administrativo (28.11.2016),tendo
em vista que restou incontroverso.
A correção monetária e os juros de mora deverão ser calculados de acordo com a lei de regência.
Tendo em vista o trabalho adicional do patrono da parte autora em grau recursal, nos termos do §
11 do artigo 85 do CPC/2015, mantidos os honorários advocatícios em 10% (dezpor cento),
esclarecendo que incidem sobre o valor das prestações vencidas até a data do acórdão, nos
termos da Súmula 111 do STJ e de acordo com entendimento firmado por esta 10ª Turma.
No tocante às custas processuais, as autarquias são isentas destas (artigo 4º, inciso I da Lei
9.289/96), porém devem reembolsar, quando vencidas, as despesas judiciais feitas pela parte
vencedora (artigo 4º, parágrafo único).
Diante do exposto, nego provimento à apelação do réu e à remessa oficial tida por interposta. As
prestações em atraso serão resolvidas em fase de liquidação de sentença, compensando-se as
adimplidas por força da tutela antecipada.
É como voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. REMESSA OFICIAL TIDA POR INTERPOSTA. BENEFÍCIO DE
PRESTAÇÃO CONTINUADA. ARTIGO 203, V, CF. REQUISITOS LEGAIS COMPROVADOS. LEI
8.742/93, ART. 20, §3º. DEFICIÊNCIA. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO E.
STF. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. I- Aplica-se ao
presente caso o Enunciado da Súmula 490 do E. STJ, que assim dispõe: A dispensa de reexame
necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta
salários mínimos, não se aplica às sentenças ilíquidas.II - Não se olvida que o conceito de
"pessoa portadora de deficiência" para fins de proteção estatal e de concessão do benefício
assistencial haja sido significativamente ampliado com as alterações trazidas após a introdução
no ordenamento pátrio da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu
Protocolo Facultativo, aprovada pelo Decreto Legislativo 186/2008, na forma do artigo 5º, § 3º, da
Constituição da República. No caso dos autos, a parte autora apresenta 'impedimentos de longo
prazo' de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas
barreiras, podem 'obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de
condições com as demais pessoas'.III - Quanto à hipossuficiência econômica, à luz da
jurisprudência consolidada no âmbito do E. STJ e do posicionamento usual desta C. Turma, no
sentido de que o art. 20, §3º, da Lei 8.742/93 define limite objetivo de renda per capita a ser
considerada, mas não impede a comprovação da miserabilidade pela análise da situação
específica de quem pleiteia o benefício. (Precedente do E. STJ).IV- Em que pese a
improcedência da ADIN 1.232-DF, em julgamento recente dos Recursos Extraordinários 567.985-
MT e 580.983-PR, bem como da Reclamação 4.374, o E. Supremo Tribunal Federal modificou o
posicionamento adotado anteriormente, para entender pela inconstitucionalidade do disposto no
art. 20, §3º, da Lei 8.742/93.V - O entendimento que prevalece atualmente no âmbito do E. STF é
os de que as significativas alterações no contexto socioeconômico desde a edição da Lei
8.742/93 e o reflexo destas nas políticas públicas de assistência social, teriam criado um
distanciamento entre os critérios para aferição da miserabilidade previstos na LOAS e aqueles
constantes no sistema de proteção social que veio a se consolidar.VI - Tendo em vista o trabalho
adicional do patrono da parte autora em grau recursal, nos termos do § 11 do artigo 85 do
CPC/2015, mantidos os honorários advocatícios em 10% (dezpor cento), esclarecendo que
incidem sobre o valor das prestações vencidas até a data do acórdão, nos termos da Súmula 111
do STJ e de acordo com entendimento firmado por esta 10ª Turma.VII - Apelação do réu e
remessa oficial tida por interposta improvidas. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à
apelação do INSS e à remessa oficial tida por interposta, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
