Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5005762-62.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal AUDREY GASPARINI
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
24/11/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 27/11/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ART. 143 DA LEI N.º 8.213/91. APOSENTADORIA POR IDADE A
TRABALHADOR RURAL. EXIGÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE DE RURÍCOLA NO
PERÍODO ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR NÃO
CONFIGURADO. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
- Prevalência da regra geral prevista no caput do art. 1.012 do Código de Processo Civil,
porquanto não configuradas as hipóteses previstas no § 1.º do mesmo dispositivo legal.
- Para o reconhecimento do tempo de serviço de trabalhador rural, mister a conjugação do início
de prova material com prova testemunhal (Artigo 55, § 3º, da Lei n° 8.213/91, Súmula 149 do STJ
e REsp 1.133.863/RN).
- No caso em tela, os documentos coligidos aos autos e a consulta atualizada ao CNIS
descaracterizam o regime de economia familiar (art. 11, VII, § 1.º , da Lei de Benefícios).
- Reconhecimento da improcedência do pedido formulado. Revogada a tutela concedida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5005762-62.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: MARLI OLIVEIRA DA COSTA
Advogado do(a) APELADO: ROBSON QUEIROZ DE REZENDE - MS9350-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5005762-62.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: MARLI OLIVEIRA DA COSTA
Advogado do(a) APELADO: ROBSON QUEIROZ DE REZENDE - MS9350-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Demanda proposta objetivando a concessão de aposentadoria por idade a trabalhadora rural,
prevista no art. 143 da Lei n.º 8.213/91.
O juízo a quo julgou procedente o pedido formulado, reconhecendo à parte autora o direito ao
benefício pretendido, a contar do requerimento administrativo. Concedida a tutela de evidência
prevista no art. 311 do CPC, para determinar a imediata implantação do benefício.
O INSS apela, requerendo, preliminarmente, o recebimento do recurso em seu duplo efeito. No
mérito, pleiteia a reforma da sentença, sustentando, em síntese, o não cumprimento dos
requisitos legais necessários à concessão em questão.
Com contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
AUDREY GASPARINI
Juíza Federal Convocada
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5005762-62.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: MARLI OLIVEIRA DA COSTA
Advogado do(a) APELADO: ROBSON QUEIROZ DE REZENDE - MS9350-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A alegação veiculada pelo INSS, concernente ao recebimento da apelação no duplo efeito, não
se coloca na hipótese dos autos, ante a prevalência da regra geral prevista no caput do art. 1.012
do Código de Processo Civil, segundo o qual a apelação terá efeito suspensivo, e a circunstância
de não se estar a tratar, aqui, de nenhuma das situações previstas no § 1.º desse mesmo
dispositivo legal do CPC, a que se fez menção.
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame
da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
APOSENTADORIA POR IDADE (RURAL)
O benefício de aposentadoria por idade a trabalhador rural encontra-se disciplinado nos arts. 39,
inciso I; 48, §§ 1.º e 2.º; e 143 da Lei n.º 8.213/91.
Antes mesmo do advento da Lei de Benefícios, a Lei Complementar n.º 11, de 25 de maio de
1971, que instituiu o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural, em seu art. 4.º dispunha que
a aposentadoria seria devida quando se completassem 65 anos de idade, cabendo a concessão
do benefício apenas ao respectivo chefe ou arrimo de família (parágrafo único).
Por sua vez, de acordo com o art. 5.º da Lei Complementar n.º 16/73, o trabalhador rural deveria
comprovar a sua atividade pelo menos nos três últimos anos anteriores à data do pedido do
benefício.
Referidos dispositivos não foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988, que passou
para 60 anos, para homens, e 55, para mulheres, a idade mínima exigida para a concessão do
benefício (art. 201, § 7.º, inciso II), excluindo a exigência da condição de chefe de família.
Além do requisito etário (60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher), o trabalhador rural deve
comprovar o exercício de atividade rural, mesmo que descontínua, no período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do benefício.
O dispositivo legal citado deve ser analisado em consonância com o art. 142 da Lei de Benefícios.
Não se exige do trabalhador rural o cumprimento de carência (art. 26, inciso III), como o dever de
verter contribuição por determinado número de meses, senão a comprovação do exercício laboral
durante o período respectivo.
Vale dizer: em relação às contribuições previdenciárias, é assente, desde sempre, o
entendimento de serem desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício de
atividade no meio rural (STJ, REsp n.º 207.425, 5.ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de
25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro Jorge Scartezzini; e STJ, RESP n.º 502.817, 5.ª Turma, j. em
14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003, p. 361, Rel. Ministra Laurita Vaz).
Noutro passo, com relação ao art. 143 da Lei n.º 8.213/91, a regra transitória assegurou aos
rurícolas o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15
(quinze) anos, contados da vigência da referida Lei.
Assim, o referido prazo expiraria em 25/7/2006.
Entretanto, em relação ao trabalhador rural enquadrado como segurado empregado ou como
segurado contribuinte individual, que presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a
uma ou mais empresas, sem relação de emprego, o aludido prazo foi prorrogado por mais 2
(dois) anos, estendendo-se até 25/7/2008, em face do disposto na MP n.º 312/06, convertida na
Lei n.º 11.368/06.
Posteriormente, a Medida Provisória n.º 410/07, convertida na Lei n.º 11.718/08, estabeleceu
nova prorrogação para o prazo previsto no art. 143 da Lei n.º 8.213/91, ao determinar, em seu art.
2.º, que “Para o trabalhador rural empregado, o prazo previsto no art. 43 da Lei n.º 8.213/91, de
24 de julho de 1991, fica prorrogado até o dia 31 de dezembro de 2010” (art. 2.º) e, em seu art.
3.º, que “Na concessão de aposentadoria por idade do empregado rural , em valor equivalente ao
salário mínimo, serão contados para efeito de carência: I - até 31 de dezembro de 2010, a
atividade comprovada na forma do art. 143 da Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991; II - de janeiro
de 2011 a dezembro de 2015, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 3 (três),
limitado a 12 (doze) meses, dentro do respectivo ano civil; e III - de janeiro de 2016 a dezembro
de 2020, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 2 (dois), limitado a 12 (doze)
meses dentro do respectivo ano civil”.
É de observar-se que, para os empregados rurais e contribuintes individuais eventuais, a regra
permanente do art. 48 da Lei n.º 8.213/91 continua a exigir, para concessão de aposentadoria por
idade a rurícolas, apenas a comprovação do efetivo exercício de "atividade rural, ainda que de
forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo
igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido",
consoante §§ 1.º e 2.º do referido dispositivo.
Essa comprovação do labor rural, nos termos dos arts. 48 e 143 da Lei de Benefícios, dar-se-á
por meio de prova documental, ainda que incipiente, e, nos termos do art. 55, § 3.º, da retrocitada
Lei, corroborada por prova testemunhal.
Acrescente-se que a jurisprudência de longa data vem atentando para a necessidade dessa
conjunção de elementos probatórios (início de prova documental e colheita de prova
testemunhal), o que resultou até mesmo na edição do verbete n.º 149 da Súmula da
Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:”
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito
de obtenção do benefício previdenciário".
DO CASO DOS AUTOS
O requisito etário restou satisfeito, pois a parte autora completou a idade mínima em 12/08/2013,
devendo fazer prova do exercício de atividade rural por 180 meses.
A autora alega que “sempre foi trabalhadora rural desde a sua juventude, acompanhando os pais
nos serviços da roça. Em 1977, contraiu matrimônio com o SR. DARCI ALVES DA COSTA,
continuando a exercer o labor rural em regime de economia familiar, motivo pelo qual faria jus ao
benefício de aposentadoria por idade rural.”
Para demonstrar as alegações, juntou documentos, entre os quais destacam-se:
- certidão de casamento, celebrado em 22/01/1977, com DARCI ALVES DA COSTA, qualificado
como "pecuarista";
- matrícula de imóvel rural, comprovando a aquisição da "propriedade da família", no município de
Inocência/MS;
- cópias de notas fiscais de produtor rural em nome do cônjuge da requerente.
- comprovante de que o benefício de aposentadoria por idade rural requerido pela autora (em
03/10/2016) foi indeferido na esfera administrativa, sob a alegação de “falta de período de
carência”.
Na peça contestatória, o INSS alega que a autora “não pode ser enquadrada como trabalhadora
rural, tampouco segurada especial, bem como que seu cônjuge, ainda que praticasse atividade
rural, o fazia distante da qualidade de pequeno produtor rural. Tal fato fica evidente quando se
verifica o valor da propriedade adquirida pela autora e seu cônjuge (R$ 235.000,00), quantia esta
cuja posse é incompatível com a realidade do pequeno produtor rural, qualificado como segurado
especial.” (ID n.º 139329423 - Pág. 36).
A autarquia previdenciária informou que “o cônjuge da parte autora é proprietário de mais de um
imóvel rural, veja que as declarações fls. 17-21 são referentes à FAZENDA NOVA ALIANÇA,
enquanto a declaração fl. 22 diz respeito à FAZENDA BUCAÍNA, fato que, por si só,
descaracteriza o regime de economia familiar, pois, a qualidade de segurado especial.” (ID n.º
139329423 - Pág. 37).
Salientou, outrossim, que o extrato previdenciário do marido da requerente (Sr. DARCI ALVES
DA COSTA) indica que o mesmo laborou para a empresa "BREDA TRANSPORTES E
SERVIÇOS S/A", no período de 01/06/2010 a 04/06/2012, percebendo "valor significativo muito
superior ao salário mínimo, o quedemonstra que a autora e o cônjuge não eram pequenos
produtores rurais que laboravam em regime de economia familiar.” (ID n.º 139329423 - Pág. 37).
Afirmou, ainda, que “o marido da autora sequer reside na alegada propriedade rural”, conforme
informações atualizadas do CNIS, que indicam endereço na “Av. AUGUSTO CORREA DA
COSTA, n.º 1661, CASA – BAIRRO: JARDIM BRASÍLIA – PARANAÍBA/MS” (ID n.º 139329423 -
Págs. 38 e 39).
A autora teve a oportunidade de se manifestar a respeito das alegações do INSS, ocasião em que
apresentou “cópia integral da matrícula imobiliária do pequeno imóvel da família”, em
Paranaíba/MS (ID n.º 139329423 - Págs. 74 a 78).
Cabe destacar a existência de prova oral. A audiência foi realizada no dia 04/11/2019 perante o
MM. Juízo da 1.ª Vara Cível da Comarca de Paranaíba/MS. As testemunhas declaram que
conhecem a parte autora há muitos anos e afirmam o alegado labor rural.
Da oitiva das mídias constantes do processo, é possível verificar que a testemunha RENATA
OLIVEIRA CAIRES declarou conhecer a demandante há "mais ou menos 15 a 20 anos"; que
"Dona Marli mora na fazenda que fica na saída para a cidade de Cassilândia"; que já visitou a
propriedade e que viu que a autora (sic) “matava frango e matava porco para a venda”. A
depoente afirmou que “há mais ou menos oito a dez anos, tem o costume de comprar tais
produtos algumas vezes por mês”; que “a parte requerente ainda reside na zona rural e que
sobrevive da renda que tal propriedade dá, sendo que traz alguns produtos para vender na
cidade." (ID n.º 139329425).
Por sua vez, a testemunha ROSANGELA APARECIDA OLIVEIRA CAIRES afirmou conhecer
Dona Marli há 25 anos; "que a requerente reside em um sitio na cidade de Paranaíba.” Informou
ter adquirido algumas vezes, da parte da autora “ovos, queijo, leite e frango”; que já foi ao local,
para comprar alguns produtos; que a requerente ainda mora atualmente na zona rural e que,
desde que a conhece, ela labora em fazenda. (ID n.º 139329426).
Nos memoriais apresentados após a audiência, a demandante reiterou as declarações de que
reside “em sua pequena propriedade rural, de onde provém a subsistência familiar, juntamente
com seu marido, por meio de produção para consumo e venda do excedente como queijo,
requeijão, frangos, leite e ovos”. Juntou novos documentos, a saber: “matrícula da primeira
propriedade da família no município de Inocência/MS, cujo produto da venda foi utilizado para a
aquisição da pequena propriedade onde a requerente reside e; notas fiscais contemporâneas ao
período; certidão de inteiro teor de casamento, no intuito de demonstrar a longevidade da
dedicação da requerente e seu marido à lida campesina como única fonte de garantia do
sustento.” (ID n.º 139329423 - Págs. 81 a 83).
A análise da referida matrícula imobiliária (ID n.º 139329423 - Pág. 85) revela que o “primeiro
imóvel rural da família”, localizado no município de Inocência/MS mede 117,2943 hectares (n.º de
módulos fiscais: 3,55) e foi adquirido em 1991 (com averbação em cartório 1994) pelo Sr.
AURELIANO MARTINS DA COSTA, qualificado como “pecuarista”. Examinando a certidão de
casamento constante dos autos, infere-se que o adquirente é o pai do Sr. DARCI ALVES DA
COSTA (cônjuge da autora).
Há comprovação de que, em 1998, foi vendida parte do referido imóvel (correspondente a 36,30
hectares), que passou a se chamar "FAZENDA BOCAINA", ao Sr. DARCI ALVES COSTA,
também qualificado como “pecuarista” e casado com a requerente, pelo valor de R$ 15.000,00 (ID
n.º 139329423 - Pág. 86).
Posteriormente, foi doada mais uma parte desse imóvel rural da família (correspondente a
42,14,40 hectares), no valor de R$ 40.226,84, ao Sr. DARCI ALVES DA COSTA e sua esposa –
Sra. MARLI OLIVEIRA DA COSTA (ora apelada), com “reserva de usufruto vitalício” aos
doadores (Sr. AURELIANO MARTINS DA COSTA e sua esposa). Outra parte da terra foi doada
ao Sr. ITAMAR ALVES DA COSTA (irmão de DARCI ALVES DA COSTA), também com reserva
de usufruto vitalício aos doadores. Naquela ocasião, o endereço da autora e seu marido foi
consignado como "Viela Estênia Amaro Pereira, no município de Inocência/MS". (ID n.º
139329423 - Págs. 86 a 88).
Tanto na ocasião da venda (em 06/11/1998) quanto da referida doação (em 28/09/2001 - dentro
do período de carência), o endereço da autora e de seu marido foi consignado como "Viela
Estênia Amaro Pereira, no município de Inocência/MS" (ID n.º 139329423 - Pág. 86).
Consta dos autos a declaração de Imposto de Renda - Pessoa Física do Senhor DARCI ALVES
DA COSTA - ano calendário de 1999, indicando atividade na referida "FAZENDA BOCAINA" (ID
n.º 139329424 -Pág. 1).
Não foi apresentada comprovação de que o primeiro imóvel tenha sido vendido para aquisição do
“segundo imóvel pertencente à autora e seu marido”, chamado de "ESTÂNCIA NOVA ALIANÇA",
no município de Paranaíba/MS – cuja escritura de compra e venda foi lavrada em 28/05/2008,
indicando que o Sr. JOÃO D' ARC DA SILVA e sua mulher ROSANGELA APARECIDA DA SILVA
foram transmitentes da propriedade adquirida pela autora e seu cônjuge (Sr. DARCI ALVES DA
COSTA), no valor de R$ 235.000,00 e área total de 105,4 hectares (ID n.º 139329423 - Pág. 15).
Interessante observar que a referida escritura registra como endereço da residência do casal
DARCI ALVES DA COSTA e MARLI OLIVEIRA DA COSTA: “Rua Baldomero Leituga, n.º 1193,
Vila Nova”, na cidade de Três Lagoas/MS”, contradizendo a afirmação da autora no sentido de
que residia no mesmo local em que exercia o labor campesino, em regime de economia familiar,
na 1.ª Fase na "FAZENDA BOCAINA", localizada no município de Inocência/MS.
A autora juntou o certificado de cadastro de imóvel rural referente aos exercícios de 2010 a 2014,
indicando a propriedade denominada "ESTÂNCIA SONHO MEU", em nome do Sr. JOÃO D'ARC
DA SILVA – antigo proprietário do imóvel, que passou a ser chamado de "ESTÂNCIA NOVA
ALIANÇA" (ID n.º 139329424 -Pág. 4).
Também foram anexadas cópias de Declarações Anuais de Produtor Rural – DAP’s, emitidas em
28/01/2009, 03/03/2012, 18/02/2013, 07/02/2014, 09/02/2015 e 27/01/2016, em nome do Sr.
DARCI ALVES DA COSTA, em relação à propriedade rural denominada "ESTÂNCIA NOVA
ALIANÇA" (ID n.º 139329423 - Págs. 17 a 22).
Examinando as notas fiscais juntadas pela demandante para comprovar o alegado trabalho rural,
em regime de economia familiar, merece destaque o documento cadastrado sob o ID n.º
139329424-Pág. 2, que indica a venda de novilhas pelo Sr. DARCI ALVES DA COSTA, no valor
de R$ 48.000,00, bem como a nota fiscal cadastrada no ID n.º 139329424-Pág. 3, registrando a
venda de bezerros pelo Sr. DARCI ALVES DA COSTA, no valor de R$ 95.760,00, ambos
referentes à atividade agropecuária na "FAZENDA BOCAINA".
O endereço indicado na inicial como de residência da autora é "Sítio Estância Nova Aliança",
zona rural - Paranaíba - Mato Grosso do Sul (ID n.º 139329423 - Pág. 10). A consulta ao CNIS
(em 21/08/2020) indica o mesmo endereço e não registra qualquer vínculo empregatício exercido
pela requerente.
Por outro lado, a consulta atualizada ao CNIS em nome do Sr. DARCI ALVES DA COSTA registra
contribuições previdenciárias vertidas como "autônomo" de 01/09/1986 a 31/08/1987, de
01/01/1993 a 30/06/1993, de 01/08/1993 a 31/10/1993, de 01/12/1993 a 28/02/1995, de
01/03/1997 a 30/09/1999 e, a partir de 31/12/2007, a categoria "segurado especial".
Ocorre que a pesquisa ao "Detalhamento da Relação Previdenciária" do cônjuge da autora revela
outra propriedade rural, denominada "FAZENDA VÓ EMILIO", com área total de 91,30 hectares
(1,15 módulos fiscais), no seguinte endereço: “NOVO SÃO JOAQUIM A C. FUMACA KM 25”, no
Município: “Novo São Joaquim”.
Consta do CNIS que, de 01/06/2010 a 04/06/2012 (dentro do "período de carência" para obtenção
do benefício vindicado pela autora), o Sr. DARCI ALVES DA COSTA trabalhou para a
empregadora “BREDA TRANSPORTES E SERVIÇOS SA”. Da consulta pormenorizada à
mencionada relação Previdenciária, infere-se a ocupação na referida empresa, a saber:
"caminhoneiro autônomo (rotas regionais e internacionais) - 7825-05", percebendo salário de R$
1.137,85 (em junho de 2010) e de R$ 2.005,24 (em junho de 2012).
Paralelamente a esses dados, a pesquisa ao cadastro de empresas em nome do Sr. DARCI
ALVES DA COSTA indica cinco registros, conforme se transcreve a seguir:
- CEI n.º 06.063.00467/68 - nome fantasia: "DARCI ALVES DA COSTA" (a partir de 07/08/1989 -
situação: encerrada em 07/12/1989);
- CNPJ n.º 37.543.147/0001-38 - nome fantasia: "MERCADO COSTA" (a partir de 10/12/1992 -
situação: baixada em 10/02/2009);
- CEI n.º 70.002.56070/80 - nome fantasia: "DARCI ALVES DA COSTA" (a partir de 01/01/2010 -
situação: normal);
- CNPJ n.º 37.543.147/0002-19 - nome fantasia: "MERCADO COSTA" (a partir de 02/12/1999 -
situação: baixada em 10/02/2009);
- CNPJ n.º 23.065.833/0001-36 - nome fantasia: "DARCI ALVES DA COSTA" (a partir de
14/08/2015 - situação: ativa);
Nesse diapasão, a pesquisa revela que, além de produtor rural - "criação de bovinos para corte",
o marido da autora é empresário.
Tenha-se presente que o endereço constante do CNPJ n.º 23.065.833/0001-36, referente à
empresa que está ativa é “ROD BR 156 KM, 15, À DIREITA, SEDE A 14 KM, zona rural do
município de Paranaíba/MS”, mas o endereço para correspondência é "Rua Barão do Rio Branco,
n.º 1195, Centro de Paranaíba/MS".
Por sua vez, a empresa com o nome fantasia: "MERCADO COSTA" foi cadastrada como
"comércio varejista de mercadorias em geral, com predominância de produtos alimentícios -
minimercados, mercearias e armazéns", com o seguinte endereço: “Rua João Batista Parreira,
n.º1118, Centro - município de Inocência/MS”.
Em síntese: consoante os dados do CNIS, há duas empresas ativas atualmente em nome do
cônjuge da apelada, sendo uma com endereço em Paranaíba/MS (CEI n.º 70.002.56070/80) e
outra com endereço na "ETN NOVA ALIANCA III SN", no município de Castilho, no estado de
São Paulo (CNPJ n.º 23.065.833/0001-36).
Diante dessas considerações, em que pese a prova testemunhal confirmar genericamente a
atividade desempenhada pela parte autora em regime de economia familiar, é, por si só,
insuficiente para acolher a pretensão da autora, porquanto produzida prova em contrário,
descaracterizando o trabalho familiar em auxílio mútuo para fins de subsistência, nos termos do
art. 11, inciso VII, § 1., da Lei de Benefícios (“entende-se como regime de economia familiar a
atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao
desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua
dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes”).
Registre-se não ser caso de aplicar o decidido no REsp n.º 1.352.721/SP e extinguir o processo
sem resolução do mérito porque, diferentemente da situação em que o inicio de prova documental
é inexistente ou frágil, no caso em análise o conjunto probatório foi robusto no sentido de
descaracterizar o regime de economia familiar, o que leva ao decreto de improcedência.
De rigor, portanto, o indeferimento do benefício, porquanto não comprovado o exercício de
atividade rural pelo período de carência legalmente exigido.
Posto isso, rejeito a matéria preliminar e, no mérito, dou provimento à apelação do INSS, para
reformar a sentença e julgar improcedente o pedido formulado, revogando-se a tutela concedida.
Condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em
10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, suspensa, porém, a exigibilidade, na
forma do art.98, § 3.º, do CPC, por se tratar de beneficiária da gratuidade da justiça.
É o voto.
AUDREY GASPARINI
Juíza Federal Convocada
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ART. 143 DA LEI N.º 8.213/91. APOSENTADORIA POR IDADE A
TRABALHADOR RURAL. EXIGÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE DE RURÍCOLA NO
PERÍODO ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR NÃO
CONFIGURADO. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
- Prevalência da regra geral prevista no caput do art. 1.012 do Código de Processo Civil,
porquanto não configuradas as hipóteses previstas no § 1.º do mesmo dispositivo legal.
- Para o reconhecimento do tempo de serviço de trabalhador rural, mister a conjugação do início
de prova material com prova testemunhal (Artigo 55, § 3º, da Lei n° 8.213/91, Súmula 149 do STJ
e REsp 1.133.863/RN).
- No caso em tela, os documentos coligidos aos autos e a consulta atualizada ao CNIS
descaracterizam o regime de economia familiar (art. 11, VII, § 1.º , da Lei de Benefícios).
- Reconhecimento da improcedência do pedido formulado. Revogada a tutela concedida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar a matéria preliminar e, no mérito, dar provimento à apelação do
INSS, para reformar a sentença e julgar improcedente o pedido formulado, revogando-se a tutela
concedida, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
