Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5001038-54.2016.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal DAVID DINIZ DANTAS
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
14/08/2017
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 08/09/2017
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. DECISÃO MONOCRÁTICA. AGRAVO INTERNO. MANUTENÇÃO DO
JULGADO AGRAVADO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. ATIVIDADE URBANA EM
CTPS. DESCARACTERIZAÇÃO DA CONDIÇÃO DE SEGURADA ESPECIAL.
- A requerente apresentou os seguintes documentos: cópia da CTPS de seu marido com diversos
vínculos em atividades de natureza rural.
- No entanto, observo, que a CTPS da parte autora atesta a existência de vínculo empregatício,
como empregada doméstica, no interregno de 16/01/03 a 04/09/11.
- Apontado dado infirma o início de prova material colacionado pela requerente.
- O exercício de atividade urbana pela autora descaracteriza a condição de trabalhadora rural em
regime de economia familiar, assim entendido aquele em que o trabalho dos membros da família
é indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e
colaboração (entendimento pacífico no STJ).- Agravo interno improvido.
Acórdao
APELAÇÃO (198) Nº 5001038-54.2016.4.03.9999
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RELATOR: Gab. 28 - DES. FED. DAVID DANTAS
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE:
APELADO: FATIMA MARIA DA COSTA
Advogado do(a) APELADO: CLAUDEVANO CANDIDO DA SILVA - MS1818700A
APELAÇÃO (198) Nº 5001038-54.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 28 - DES. FED. DAVID DANTAS
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE:
APELADO: FATIMA MARIA DA COSTA
Advogado do(a) APELADO: CLAUDEVANO CANDIDO DA SILVA - MS1818700A
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Trata-se de agravo interno interposto pela parte autora contra decisão monocrática terminativa
que deu provimento à apelação do INSS, para julgar improcedente o pedido e revogar a tutela
antecipada.
Nas razões recursais, a parte agravante aduz que em que pese constar na CTPS da Agravante
vínculo empregatício como empregada doméstica, tal vinculo não tem o condão de
descaracterizar a condição de segurada especial da mesma, pelo que pleiteia a reforma do
decisum.
Sem manifestação do INSS.
É O RELATÓRIO.
APELAÇÃO (198) Nº 5001038-54.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 28 - DES. FED. DAVID DANTAS
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE:
APELADO: FATIMA MARIA DA COSTA
Advogado do(a) APELADO: CLAUDEVANO CANDIDO DA SILVA - MS1818700A
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Proferi decisão monocrática nos seguintes termos:
"Cuida-se de ação previdenciária, com vistas à concessão de aposentadoria por idade rural.
Documentos.
Deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita.
Citação.
Prova testemunhal.
A r. sentença concedeu a tutela antecipada e julgou o pedido. Deferida procedente a concessão
do
benefício sub judice, no valor de um salário-mínimo mensal, desde a data do requerimento
administrativo. Dispensado o reexame oficial.
O INSS pleiteia a reforma total da sentença em virtude da ausência de comprovação do labor
rural
pelo tempo exigido.
Contrarrazões.
Subiram os autos a este Egrégio Tribunal.
Inicialmente no tocante à aplicabilidade do artigo 932 do Código de Processo Civil adoto como
razão
de decidir os argumentos expendidos pelo Desembargador Federal Gilberto Jordan nos autos da
Apelação Cível n. 2011.61.83.011496-7, in verbis:
“Entendo que nesta hipótese é perfeitamente cabível a decisão unipessoal do relator, tal como se
posicionou o e. Desembargador Federal Johonsom di Salvo, com muita propriedade, nos autos
da
apelação nº 0016045-44.2010.4.03.6100/SP, in verbis:
"Deve-se recordar que o recurso é regido pela lei processual vigente ao tempo da publicação da
decisão recorrida. Nesse sentido firmou-se a jurisprudência da Corte Especial do Superior
Tribunal
de Justiça:
PROCESSO CIVIL. EMBARGOS INFRINGENTES. RECURSO ESPECIAL. ENTRADA EM
VIGOR
DA LEI 11.352/01. JUNTADA DOS VOTOS AOS AUTOS EM MOMENTO POSTERIOR. DIREITO
INTERTEMPORAL. LEI APLICÁVEL. VIGENTE À ÉPOCA DA PUBLICAÇÃO. INCIDÊNCIA DA
NOVA REDAÇÃO DO ART. 530 DO CPC. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. INOCORRÊNCIA.
1. Na ocorrência de sessão de julgamento em data anterior à entrada em vigor da Lei 11.352/01,
mas
tendo o teor dos votos sido juntado aos autos em data posterior, não caracteriza supressão de
instância a não interposição de embargos infringentes, porquanto, na hipótese, a lei vigente à
época
da publicação rege a interposição do recurso.
2. Embargos de divergência providos.
(EREsp 740.530/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, CORTE ESPECIAL, julgado em
01/12/2010,
DJe 03/06/2011)
PROCESSO CIVIL. EMBARGOS INFRINGENTES. RECURSO ESPECIAL. Na linha dos
precedentes
da Corte Especial, a lei vigente na data do julgamento, em que proclamado o resultado (art. 556,
CPC), rege a interposição do recurso. Embargos de divergência conhecidos, mas não providos.
(EREsp 615.226/DF, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, CORTE ESPECIAL, julgado em
01/08/2006,
DJ 23/04/2007, p. 227).
Conforme a lição de Pontes de Miranda, a lei da data do julgamento regula o direito do recurso
cabível, ("Comentários ao Código de Processo Civil", Forense, 1975. T. VII, p. 44). Segue:
"O recurso interponível é aquele que a lei do momento da decisão ou da sentença, ou da
deliberação
do corpo coletivo, aponta como cabível. Se era irrecorrível, não se faz recorrível com a lei
posterior,
porque seria atribuir-se à regra jurídica retroeficácia, infringindo-se princípio constitucional. A
eficácia que se reproduziu tem que ser respeitada (e.g., pode recorrer no prazo 'x'); efeito novo
não é
de admitir-se. Nem se faz recorrível o que não o era; nem irrecorrível o que se sujeitava a
recurso. Se
a lei nova diz caber o recurso 'a' e a lei da data da decisão ou da sentença ou do julgamento
referia-se ao recurso 'b', não se pode interpor 'a' em vez de 'b'. Os prazos são os da data em que
se
julgou".
Cumpre recordar que ao contrário do que ocorre em 1ª instância, o julgamento do recurso não
tem
fases, de modo que, sem desprezar o princípio tempus regit actum, é possível aplicar na
apreciação
do recurso interposto o quanto a lei existente ao tempo da decisão recorrida preconizava em
relação
a ele.
Nesse cenário, não é absurdo considerar que para as decisões publicadas até 17 de março de
2016
seja possível a decisão unipessoal do relator no Tribunal, sob a égide do artigo 557 do Código de
Processo Civil de 1973 , que vigeu até aquela data. Mesmo porque o recurso possível dessa
decisão
monocrática continua sendo o agravo interno sob a égide do CPC/2015, como já era no tempo do
CPC/73 que vigeu até bem pouco tempo.
Anoto inclusive que os Tribunais Superiores vêm aplicando o artigo 557 do CPC/73, mesmo após
a
vigência do CPC/2015, conforme se verifica das seguintes decisões proferidas pelo Supremo
Tribunal
Federal e pelo Superior Tribunal de Justiça: RE 910.502/SP, Relator Min. TEORI ZAVASCKI,
decisão proferida em 18.03.2016, DJE 54/2016 divulgado em 22.03.2016; ED no AG em RESP
820.839/SP, Relator Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, decisão proferida em 18.03.2016,
DJE
1935/2016 publicado em 22.03.2016; RESP 1.248.117/RS, Relator Min. HUMBERTO MARTINS,
decisão proferida em 18.03.2016, DJE 1935/2016 publicado em 22.03.2016; RESP
1.138.252/MG,
Relatora Min. MARIA ISABEL GALLOTTI, decisão proferida em 18.03.2016, DJE 1935/2016
publicado em 22.03.2016; RESP 1.330.910/SP, Relator Min. REYNALDO SOARES DA
FONSECA,
decisão proferida em 18.03.2016, DJE 1935/2016 publicado em 22.03.2016; RESP 1.585.100/RJ,
Relatora Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, decisão proferida em 18.03.2016, DJE
1935/2016 publicado em 22.03.2016."
Por comungar inteiramente dos fundamentos exarados na decisão supramencionada, adoto-os e
passo a decidir o presente recurso seguindo a mesma linha, ou seja, monocraticamente,
mormente
por estarem presentes os requisitos estabelecidos na Súmula/STJ n. 568 e nos limites que se
deflui da
interpretação sistemática das normas fundamentais do processo civil (artigos 1º ao 12) e artigo
932,
todos do Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015), uma vez que esta decisão está
amparada em
súmulas e precedentes dos tribunais superiores, fixados em jurisprudência estabilizada ou em
julgados no regime de recursos repetitivos e de repercussão geral, em mecanismos de controle
de
constitucionalidade (difuso ou concentrado) ou com base em texto de norma jurídica.”
A Lei Complementar nº 11, de 25 de maio de 1971, que instituiu o Fundo de Assistência ao
Trabalhador Rural - FUNRURAL, em seu art. 4º, dispunha ser a aposentadoria por velhice devida
ao
trabalhador rural que completasse 65 (sessenta e cinco) anos. Em 30 de outubro de 1973, foi
publicada a Lei Complementar nº 16, que alterou dispositivos da supracitada lei e fixou, no seu
art. 5º,
que a qualidade de trabalhador rural dependeria da comprovação de sua atividade pelo menos
nos
últimos três anos anteriores à data do pedido do benefício, ainda que de forma descontínua.
Também o Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, que aprovou o Regulamento dos
Benefícios
da Previdência Social dispunha, litteris:
"Art. 297. A aposentadoria por velhice é devida, a contar da data da entrada do requerimento, ao
trabalhador rural que completa 65 (sessenta e cinco) anos de idade e é o chefe ou arrimo de
unidade
familiar, em valor igual ao da aposentadoria por invalidez (artigo 294)".
A Constituição Federal de 1988 trouxe, em sua redação original, o art. 202, I, in verbis:
"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a
média
dos trinta e seis últimos salários de contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês, e
comprovada a regularidade dos reajustes dos salários de contribuição de modo a preservar seus
valores reais e obedecidas as seguintes condições:
I - aos sessenta e cinco anos de idade, para o homem, e aos sessenta, para a mulher, reduzido
em
cinco anos o limite de idade para os trabalhadores rurais de ambos os sexos e para os que
exerçam
suas atividades em regime de economia familiar, neste incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o
pescador artesanal" (grifei).
A partir da edição da Lei nº 8.213/91, tal dispositivo constitucional foi definitivamente
regulamentado
e, portanto, a idade para a concessão da aposentadoria do trabalhador rural diminuída para 60
(sessenta anos), se homem e 55 (cinqüenta e cinco), se mulher.
Enquanto a Lei Complementar nº 16/73 exigia que o beneficiário comprovasse o exercício da
atividade rural por pelo menos 3 (três) anos, o período de carência estabelecido pela Lei nº 8.213,
de
24 de julho de 1991, é aquele a que remete a tabela progressiva constante do seu art. 142.
Também neste sentido preceitua a Lei nº 8.213/91, ao prescrever em seus arts. 39, I, 48, §1º e
143 que
o benefício da aposentadoria por idade dos trabalhadores rurais em regime de economia familiar
é
devido ao segurado especial, assim considerado pelo art. 11, VII, do diploma legal citado, que
completar 60 (sessenta) anos de idade, se homem, ou 55 (cinqüenta e cinco) anos, se mulher e
comprovar o exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período equivalente
à
carência exigida, nos termos dos arts. 26, III, e 142 do referido texto legal.
A lei deu tratamento diferenciado ao rurícola e ao produtor rural em regime de economia familiar,
dispensando-os do período de carência, que é o número mínimo de contribuições mensais
necessárias
para a concessão do benefício, a teor do que preceitua o art. 26, III, c.c. o art. 39, I, ambos da Lei
nº
8.213/91, bastando comprovar, tão-somente, o exercício da atividade rural nos termos da tabela
progressiva, de caráter transitório, prevista no art. 142 da Lei Previdenciária, que varia de acordo
com
o ano de implementação das condições legais.
O benefício de aposentadoria por idade, ao trabalhador rural, encontra-se disciplinado nos artigos
39,
inciso I, 48 e 143, da Lei nº 8.213/91.
Além do requisito etário, o trabalhador rural deve comprovar o exercício de atividade rural, mesmo
que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de
meses idêntico à carência do benefício.
O dispositivo legal citado deve ser analisado em consonância com o artigo 142, que assim
dispõe:
"Art. 142. Para o segurado inscrito na Previdência Social urbana até 24 de julho de 1991, bem
como
para o cobertos pela Previdência Social Rural, trabalhador e empregador rural a carência das
aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial obedecerá a seguinte tabela, levando-
se
em conta o ano em que o segurado implementou todas as condições necessárias à obtenção do
benefício. (...)".
Não se exige do trabalhador rural o cumprimento de carência, como dever de verter contribuição
por
determinado número de meses, senão a comprovação do exercício laboral durante o período
respectivo.
No que se refere à comprovação do labor campesino, algumas considerações se fazem
necessárias,
uma vez que balizam o entendimento deste Relator no que diz com a valoração das provas
comumente apresentadas.
Declarações de Sindicato de Trabalhadores Rurais fazem prova do quanto nelas alegado, desde
que
devidamente homologadas pelo Ministério Público ou pelo INSS, órgãos competentes para tanto,
nos
exatos termos do que dispõe o art. 106, III, da Lei nº 8.213/91, seja em sua redação original, seja
com
a alteração levada a efeito pela Lei nº 9.063/95.
Na mesma seara, declarações firmadas por supostos ex-empregadores ou subscritas por
testemunhas,
noticiando a prestação do trabalho na roça, não se prestam ao reconhecimento então pretendido,
tendo
em conta que equivalem a meros depoimentos reduzidos a termo, sem o crivo do contraditório,
conforme entendimento já pacificado no âmbito desta Corte.
Igualmente não alcançam os fins pretendidos, a apresentação de documentos comprobatórios da
posse
da terra pelos mesmos ex-empregadores, visto que não trazem elementos indicativos da
atividade
exercida pela parte requerente.
Já a mera demonstração, por parte do autor, de propriedade rural, só se constituirá em elemento
probatório válido desde que traga a respectiva qualificação como lavrador ou agricultor. No
mesmo
sentido, a simples filiação a sindicato rural só será considerada mediante a juntada dos
respectivos
comprovantes de pagamento das mensalidades.
Tem-se, por definição, como início razoável de prova material, documentos que tragam a
qualificação
da parte autora como lavrador, v.g., assentamentos civis ou documentos expedidos por órgãos
públicos. Nesse sentido: STJ, 5ª Turma, REsp nº 346067, Rel. Min. Jorge Scartezzini, v.u., DJ de
15.04.2002, p. 248.
Da mesma forma, a qualificação de um dos cônjuges como lavrador se estende ao outro, a partir
da
celebração do matrimônio, consoante remansosa jurisprudência já consagrada pelos Tribunais.
Na atividade desempenhada em regime de economia familiar, toda a documentação
comprobatória,
como talonários fiscais e títulos de propriedade, é expedida, em regra, em nome daquele que faz
frente aos negócios do grupo familiar. Ressalte-se, contudo, que nem sempre é possível
comprovar o exercício da atividade em regime de economia familiar através de documentos.
Muitas vezes o
pequeno produtor cultiva apenas o suficiente para o consumo da família e, caso revenda o pouco
do
excedente, não emite a correspondente nota fiscal, cuja eventual responsabilidade não está sob
análise
nesta esfera. O homem simples, oriundo do meio rural, comumente efetua a simples troca de
parte da
sua colheita por outros produtos de sua necessidade que um sitiante vizinho eventualmente tenha
colhido ou a entrega como forma de pagamento pela parceria na utilização do espaço de terra
cedido
para plantar.
De qualquer forma, é entendimento já consagrado pelo C. Superior Tribunal de Justiça (AG nº
463855, Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, j. 09/09/03) que documentos apresentados em
nome
dos pais, ou outros membros da família, que os qualifiquem como lavradores, constituem início de
prova do trabalho de natureza rurícola dos filhos.
O trabalho urbano de membro da família não descaracteriza, por si só, o exercício de trabalho
rural
em regime de economia familiar de outro. Para ocorrer essa descaracterização, é necessária a
comprovação de que a renda obtida com a atividade urbana é suficiente à subsistência da família.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 apresenta um rol de documentos que não configura numerus
clausus, já
que o "sistema processual brasileiro adotou o princípio do livre convencimento motivado" (AC nº
94.03.025723-7/SP, TRF 3ª Região, Rel. Juiz Souza Pires, 2º Turma, DJ 23.11.94, p. 67691),
cabendo
ao Juízo, portanto, a prerrogativa de decidir sobre a sua validade e a sua aceitação.
Aprecio também a questão, insistentemente trazida à discussão pelo Ente Previdenciário, de que
a
comprovação do exercício da atividade rural deva se referir ao período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício, tal como estabelecido no art. 143 da Lei nº 8.213/91, com redação
alterada
pela Lei nº 9.063/95.
Adoto o entendimento que inexiste a exigência de que o tempo de trabalho rural deva ser
exercido no
período imediatamente anterior ao requerimento. Com efeito, a Lei 10.666/2003 dispõe:
Art. 3º. A perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão das
aposentadorias por tempo de contribuição e especial.
§1º. Na hipótese de aposentadoria por idade, a perda da qualidade de segurado não será
considerada para a concessão desse benefício, desde que o segurado conte com, no mínimo, o
tempo
de contribuição correspondente ao exigido para efeito de carência na data do requerimento do
benefício.
Ora, vê-se que a lei não distinguiu entre trabalhadores urbanos e rurais, ao introduzir o preceito
de
que a perda da qualidade de segurado não infirma o direito à aposentadoria por tempo de
contribuição ou por idade, se os requisitos do tempo de contribuição e da carência foram
adimplidos
em momento anterior.
A circunstância, ainda, de o citado artigo mencionar "tempo de contribuição" não exclui o rurícola,
pois o legislador contentou-se aqui em explicitar o requisito geral, que é o da contribuição, nem
por
isso tencionando afastar de sua abrangência o trabalhador rural que, em alguns casos, por
normaespecial, é dispensado dos recolhimentos; ademais, o raciocínio albergado pela lei é
aplicável do
ponto de vista fático tanto aos urbanos como aos rurais, sendo de invocar-se o brocardo Ubi
eadem
ratio ibi idem jus.
A equiparação dos trabalhadores urbanos e rurais, para fins previdenciários, é garantia da Carta
de
1988 e não pode ser olvidada, sem justificativa plausível, sob pena de ofensa ao princípio da
isonomia
e à previsão contida no seu art. 194, parágrafo único, II.
No entanto, penso que se as lides campesinas foram abandonadas pela parte autora muitos anos
antes
do implemento do requisito etário, já não há porque se aplicar a redução de 5 (cinco) anos
mencionada no art. 48, §1º, da Lei 8.213/1991, uma vez que tal determinação visou proteger o
idoso
que, submetido às penosas condições do trabalho no campo, teria o direito de aposentar-se mais
cedo.
Esse, a meu ver, o raciocínio adotado pelo legislador no art. 48, §3º, da Lei de Benefícios, ao
prever o
afastamento da redução etária se, para completar o tempo de carência, houver contagem de
períodos
sob outras categorias.
No que se refere ao recolhimento das contribuições previdenciárias, destaco que o dever legal de
promover seu recolhimento junto ao INSS e descontar da remuneração do empregado a seu
serviço
compete exclusivamente ao empregador, por ser este o responsável pelo seu repasse aos cofres
da
Previdência, a quem cabe a sua fiscalização, possuindo, inclusive, ação própria para haver o seu
crédito, podendo exigir do devedor o cumprimento da legislação. No caso da prestação de
trabalho em
regime de economia familiar, é certo que o segurado é dispensado do período de carência, nos
termos
do disposto no art. 26, III, da Lei de Benefícios e, na condição de segurado especial, assim
enquadrado pelo art. 11, VII, da legislação em comento, caberia o dever de recolher as
contribuições
tão-somente se houvesse comercializado a produção no exterior, no varejo, isto é, para o
consumidor
final, a empregador rural pessoa física ou a outro segurado especial (art. 30, X, da Lei de
Custeio).
Por fim, outra questão que suscita debates é a referente ao trabalho urbano eventualmente
exercido
pelo segurado ou por seu cônjuge, cuja qualificação como lavrador lhe é extensiva. Perfilho do
entendimento no sentido de que o desempenho de atividade urbana, não de per si, constitui óbice
ao
reconhecimento do direito aqui pleiteado, desde que o mesmo tenha sido exercido por curtos
períodos, especialmente em época de entressafra, quando o humilde campesino se vale de
trabalhos
esporádicos em busca da sobrevivência.
Da mesma forma, o ingresso no mercado de trabalho urbano não impede a concessão da
aposentadoria rural, na hipótese de já restar ultimada, em tempo anterior, a carência exigida
legalmente, considerando não só as datas do início de prova mais remoto e da existência do
vínculo
empregatício fora da área rural, como também que a prova testemunhal, segura e coerente,
enseje a
formação da convicção deste julgador acerca do trabalho campesino exercido no período.
Já a mera demonstração, por parte do autor, de propriedade rural, só se constituirá em elemento
probatório válido desde que traga a respectiva qualificação como lavrador ou agricultor. No
mesmo
sentido, a simples filiação a sindicato rural só será considerada mediante a juntada dos
respectivos
comprovantes de pagamento das mensalidades.
Tem-se, por definição, como início razoável de prova material, documentos que tragam a
qualificação
da parte autora como lavrador, v.g., assentamentos civis ou documentos expedidos por órgãos
públicos. Nesse sentido: STJ, 5ª Turma, REsp nº 346067, Rel. Min. Jorge Scartezzini, v.u., DJ de
15.04.2002, p. 248.
Da mesma forma, a qualificação de um dos cônjuges como lavrador se estende ao outro, a partir
da
celebração do matrimônio, consoante remansosa jurisprudência já consagrada pelos Tribunais.
Na atividade desempenhada em regime de economia familiar, toda a documentação
comprobatória,
como talonários fiscais e títulos de propriedade, é expedida, em regra, em nome daquele que faz
frente aos negócios do grupo familiar. Ressalte-se, contudo, que nem sempre é possível
comprovar o
exercício da atividade em regime de economia familiar através de documentos. Muitas vezes o
pequeno produtor cultiva apenas o suficiente para o consumo da família e, caso revenda o pouco
do
excedente, não emite a correspondente nota fiscal, cuja eventual responsabilidade não está sob
análise
nesta esfera. O homem simples, oriundo do meio rural, comumente efetua a simples troca de
parte da
sua colheita por outros produtos de sua necessidade que um sitiante vizinho eventualmente tenha
colhido ou a entrega como forma de pagamento pela parceria na utilização do espaço de terra
cedido
para plantar.
De qualquer forma, é entendimento já consagrado pelo C. Superior Tribunal de Justiça (AG nº
463855, Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, j. 09/09/03) que documentos apresentados em
nome
dos pais, ou outros membros da família, que os qualifiquem como lavradores, constituem início de
prova do trabalho de natureza rurícola dos filhos.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 apresenta um rol de documentos que não configura numerus
clausus, já
que o "sistema processual brasileiro adotou o princípio do livre convencimento motivado" (AC nº
94.03.025723-7/SP, TRF 3ª Região, Rel. Juiz Souza Pires, 2º Turma, DJ 23.11.94, p. 67691),
cabendo
ao Juízo, portanto, a prerrogativa de decidir sobre a sua validade e a sua aceitação.
Ao caso dos autos.
AA autora implementou o requisito etário em 2011, devendo, portanto, comprovar o exercício de
atividade rural por 180 meses.
Nos termos da Súmula de nº 149 do Superior Tribunal de Justiça, é necessário que a prova
testemunhal venha acompanhada de início razoável de prova documental, in verbis:
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito
de
obtenção do benefício previdenciário".
Ademais, goza de presunção legal e veracidade juris tantum a atividade rural devidamente
registrada
em carteira de trabalho, e prevalece se provas em contrário não são apresentadas. Constitui,
assim,
prova plena, do efetivo exercício de sua atividade rural em tal interregno, nos termos do art. 106,
I, da
Lei de Benefícios, o trabalho rural prestado pela parte autora, conforme anotações em CTPS.
No caso em questão, a requerente apresentou os seguintes documentos: cópia da CTPS de seu
marido com
diversos vínculos em atividades de natureza rural.
É pacífico o entendimento dos Tribunais, considerando as difíceis condições dos trabalhadores
rurais, admitir
a extensão da qualificação do cônjuge ou companheiro à esposa ou companheira.
Os depoimentos testemunhais afirmaram que a parte autora trabalhou na atividade rural.
No entanto, observo, que a CTPS da parte autora atesta a existência de vínculo empregatício,
como
empregada doméstica, no interregno de 16/01/03 a 04/09/11.
Apontado dado infirma o início de prova material colacionado pela requerente.
O exercício de atividade urbana pela autora e pelo seu cônjuge descaracteriza a condição de
trabalhadora
rural em regime de economia familiar, assim entendido aquele em que o trabalho dos membros
da família é
indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e
colaboração.
Neste sentido:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. ATIVIDADE RURAL.
DESCARACTERIZAÇÃO
DO REGIME DE ECONOMIA FAMILAR. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
- A atividade rural deve ser comprovada por meio de início razoável de prova material aliada à
prova
testemunhal.
- A prova testemunhal deve vir acompanhada de início de prova documental, para fins de
comprovar o
efetivo labor no campo (Súmula 149 de STJ).
- Descaracterização do regime de economia familiar. Sem demonstração segura de que autora e
cônjuge
dependiam dessa atividade para subsistência.
- Por se tratar de beneficiária da assistência judiciária gratuita, deixo de condenar a parte autora
ao
pagamento da verba honorária e custas processuais, consoante entendimento firmado pela
Terceira Seção
desta Corte (AR nº 2002.03.00.014510-0/SP, Rel. Des. Fed. Marisa Santos, v.u., j. 10.05.06; AR
nº
96.03.088643-2/SP, Rel. Des. Fed. Vera Jucovsky, v.u., j. 24.05.06).
- Apelação a que se dá provimento para reformar a sentença e julgar improcedente o pedido.
(TRF 3ª Região, OITAVA TURMA, AC 0007904-18.2006.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADORA
FEDERAL THEREZINHA CAZERTA, julgado em 18/01/2010, e-DJF3 Judicial 1 DATA:23/02/2010
PÁGINA: 775)
Verifico que o STJ, em análise de casos similares, de aposentadoria por idade de trabalhador
rural, entende
que resta desqualificado o trabalho rural por quem exerce atividade urbana posterior:
DIREITO PREVIDENCIÁRIO- APOSENTADORIA RURAL POR IDADE REQUISITOS - PROVA
EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL - SÚMULA 149/STJ - ATIVIDADE URBANA -
DESCARACTERIZAÇÃO DO REGIME ESPECIAL.
1. A aposentadoria especial por idade desafia o preenchimento de dois requisitos essenciais: o
etário e o
exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior
ao
requerimento, em número de meses idêntico à carência. 2. "A prova exclusivamente testemunhal
não basta à
comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário". Súmula
149/STJ. 3.
A legislação exclui expressamente da condição de segurado especial o trabalhador que, atuando
no meio
rural, deixa o campo, enquadrando-se em qualquer outra categoria do Regime Geral da
Previdência Social, a
contar do primeiro dia do mês que exerce outra atividade. Precedentes. 4. Hipótese em que a
prova
documental examinada pelo Tribunal de origem indica o exercício de atividade urbana durante o
período de
carência. 5. Recurso especial não provido. (RESP 201200212932, ELIANA CALMON, STJ -
SEGUNDA
TURMA, DJE DATA:18/04/2013.)
portanto, a demandante logrou êxito em demonstrar o preenchimento da condição In casu, etária,
porém, não
o fez quanto à comprovação do labor no meio campesino. O conjunto probatório desarmônico não
permite a
conclusão de que a parte autora exerceu a atividade como rurícola pelo período exigido pela Lei
8.213/91.
Assim, de rigor a reforma da r. sentença.
Consoante entendimento firmado pela Terceira Seção desta Corte, deixo de condenar a parte
autora ao
pagamento de custas, despesas processuais e honorários advocatícios, pois que beneficiária da
assistência
judiciária gratuita (TRF - 3ª Seção, AR n.º 2002.03.00.014510-0/SP, Rel. Des. Fed. Marisa
Santos, j.
10.05.2006, v.u., DJU 23.06.06, p. 460).
Por fim, revogo a tutela antecipada concedida. Expeça-se ofício ao INSS, instruindo-se-o com
cópia da
íntegra desta decisão, para determinar a cessação do pagamento do benefício sub judice, após o
trânsito em
julgado.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO AO APELO DO INSS, para julgar improcedente o pedido.
Tutela
antecipada revogada
Ciência às partes.
Após, remetam-se os autos à vara de origem.
Pois bem.
A requerente apresentou os seguintes documentos: cópia da CTPS de seu marido com diversos
vínculos em atividades de natureza rural.
No entanto, observo, que a CTPS da parte autora atesta a existência de vínculo empregatício,
como empregada doméstica, no interregno de 16/01/03 a 04/09/11.
Apontado dado infirma o início de prova material colacionado pela requerente.
O exercício de atividade urbana pela autora descaracteriza a condição de trabalhadora rural em
regime de economia familiar, assim entendido aquele em que o trabalho dos membros da família
é indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e
colaboração (entendimento pacífico no STJ).
Eventualalegação de que não é cabível o julgamento monocrático no caso presente resta
superada, frente à apresentação do recurso para julgamento colegiado.
Consigno, finalmente, que foram analisadas todas as alegações constantes do recurso capazes
de, em tese, infirmar a conclusão adotada no decisum recorrido.
Desta forma, não merece acolhida a pretensão da parte autora.
Isso posto, NEGO PROVIMENTO AO AGRAVO INTERNO DA PARTE AUTORA.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. DECISÃO MONOCRÁTICA. AGRAVO INTERNO. MANUTENÇÃO DO
JULGADO AGRAVADO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. ATIVIDADE URBANA EM
CTPS. DESCARACTERIZAÇÃO DA CONDIÇÃO DE SEGURADA ESPECIAL.
- A requerente apresentou os seguintes documentos: cópia da CTPS de seu marido com diversos
vínculos em atividades de natureza rural.
- No entanto, observo, que a CTPS da parte autora atesta a existência de vínculo empregatício,
como empregada doméstica, no interregno de 16/01/03 a 04/09/11.
- Apontado dado infirma o início de prova material colacionado pela requerente.
- O exercício de atividade urbana pela autora descaracteriza a condição de trabalhadora rural em
regime de economia familiar, assim entendido aquele em que o trabalho dos membros da família
é indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e
colaboração (entendimento pacífico no STJ).- Agravo interno improvido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, A Oitava Turma, por
unanimidade, negou provimento ao agravo interno., nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
