Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0004540-05.2020.4.03.6327
Relator(a)
Juiz Federal DAVID ROCHA LIMA DE MAGALHAES E SILVA
Órgão Julgador
3ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
24/01/2022
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 07/02/2022
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. DECLARAÇÃO DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO APURADO EM VIRTUDE
DE RECEBIMENTO CONCOMITANTE DOS BENEFÍCIOS DE AUXÍLIO-ACIDENTE E
APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO, COM CESSAÇÃO DE ATOS DE
COBRANÇA. IRREPETIBILIDADE DOS VALORES RECEBIDOS DE BOA FÉ. ERRO
ADMINISTRATIVO. TEMA 979 DO STJ. MANUTENÇÃO DO JULGAMENTO. APLICAÇÃO DO
ART. 46 DA LEI 9099/95 C/C ART. 1° DA LEI 10.259/2001. NEGADO PROVIMENTO AO
RECURSO DO INSS.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
3ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0004540-05.2020.4.03.6327
RELATOR:9º Juiz Federal da 3ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RECORRIDO: JOSE BENEDICTO EMBOABA
OUTROS PARTICIPANTES:
Relatório dispensado nos termos do art. 38 da Lei n. 9.099/95.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0004540-05.2020.4.03.6327
RELATOR:9º Juiz Federal da 3ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: JOSE BENEDICTO EMBOABA
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
VOTO-EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. DECLARAÇÃO DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO APURADO EM
VIRTUDE DE RECEBIMENTO CONCOMITANTE DOS BENEFÍCIOS DE AUXÍLIO-ACIDENTE
E APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO, COM CESSAÇÃO DE ATOS DE
COBRANÇA. IRREPETIBILIDADE DOS VALORES RECEBIDOS DE BOA FÉ. ERRO
ADMINISTRATIVO. TEMA 979 DO STJ. MANUTENÇÃO DO JULGAMENTO. APLICAÇÃO DO
ART. 46 DA LEI 9099/95 C/C ART. 1° DA LEI 10.259/2001. NEGADO PROVIMENTO AO
RECURSO DO INSS.
1. Trata-se de recurso interposto pelo INSS em face de sentença que julgou procedente o
pedido da parte autora para que seja declarada a inexigibilidade de débito apurado em virtude
do recebimento concomitante dos benefícios de auxílio-acidente NB 169.545.250-7 e
aposentadoria por tempo de contribuição NB 143.131.742-7, com a cessação de atos de
cobrança. Em suas razões recursais alega, em síntese, a legalidade da cobrança de valores
recebidos indevidamente pelo segurado/beneficiário da previdência social, mesmo na hipótese
de recebimento de boa-fé.
2. Não assiste razão à parte recorrente.
3. No essencial a r. sentença está assim fundamentada:
(...) JOSE BENEDICTO EMBOABA, com qualificação nos autos, ajuizou a presente ação em
face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, objetivando a declaração de
inexigibilidade dos valores recebidos de boa-fé.
Aduz, em síntese, que percebia o benefício de auxílio-acidente desde o ano de 2003 (NB:
169.545.250-7), o qual não foi cessado quando da concessão do benefício de aposentadoria
por tempo de contribuição, em 01/03/2007 (NB: 143.131.742-7).
Requer, ainda, a retificação de seus registros, de modo a não constar os benefícios nº
094.242.181-7 e 109.578.225-5. Citado, o INSS apresentou contestação. Pugna pela
improcedência do pedido.
É o relatório. Fundamento e decido.
O feito comporta julgamento imediato na forma do art. 355, inc. I do CPC. Sem preliminares
para análise, passo ao exame do mérito. A legislação anterior ao advento da Lei n. 9.528/97
permitia a percepção simultânea do auxílio-acidente com qualquer outro benefício. Contudo,
com a edição do diploma legal em comento, o art. 86 da Lei n. 8.213/91 passou a ter a seguinte
redação (grifei):
Art. 86. O auxílio -acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após
consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultar sequelas que
impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia.
§1º O auxílio-acidente mensal corresponderá a 50% (cinquenta por cento) do salário de
benefício e será devido, observado o disposto do §5º, até a véspera do início de qualquer
aposentadoria ou até a data do óbito do segurado.
§2º O auxílio-acidente será devido a partir do dia seguinte ao da cessação do auxílio doença,
independentemente de qualquer remuneração ou rendimento auferido pelo acidentado, vedada
sua acumulação com qualquer aposentadoria.
§3º O recebimento de salário ou concessão de outro benefício, exceto de aposentadoria,
observado o disposto no § 5º, não prejudicará a continuidade do recebimento do auxílio-
acidente. (...)
A respeito do tema, a Primeira Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento
do REsp 1.296.673/MG, Rel. Min. Herman Benjamin, submetido ao regime dos recursos
repetitivos (art.543-C do CPC), reiterou o entendimento no sentido de que é possível a
cumulação do auxílio-acidente com proventos de aposentadoria, desde que a lesão
incapacitante e a concessão da aposentadoria sejam anteriores às alterações promovidas pela
Lei n. 9.528/97.
Aliás, tal orientação restou cristalizada pela referida Corte Superior com a edição da Súmula nº
507, com o seguinte teor:
“A acumulação de auxílio-acidente com aposentadoria pressupõe que a lesão incapacitante e a
aposentadoria sejam anteriores a 11/11/1997, observado o critério do art. 23 da Lei n.
8.213/1991 para definição do momento da lesão nos casos de doença profissional ou do
trabalho.”
No caso em apreço, o auxílio-acidente foi concedido em 25/09/2003 e a aposentadoria por
tempo de contribuição em 01/03/2007 (evento 18). Logo, como a concessão do benefício de
aposentadoria foi posterior ao início da vigência da Lei n. 9.528/1997, não é permitido o
recebimento concomitantemente destes benefícios.
De outro lado, em relação à devolução de valores a cujo recebimento indevido o segurado de
boa-fé não deu causa, em face do caráter essencialmente alimentar do benefício, contraria
jurisprudência consolidada:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMULAÇÃO INDEVIDA DE
BENEFÍCIOS. CARÁTER ALIMENTAR. VERBAS RECEBIDAS DE BOA-FÉ.
IMPOSSIBILIDADE DE EFETUAR DESCONTOS NO BENEFÍCIO DO SEGURADO. 1. No
presente caso, houve a suspensão do benefício de auxílio acidente da parte autora, sob o
fundamento de que é vedada sua cumulação com a aposentadoria, sendo efetuada a revisão
deste benefício, ensejando um incremento irrisório - R$ 20,32 (vinte reais e trinta e dois
centavos) - no valor de sua renda mensal, que ainda passou a sofrer desconto, no valor de R$
757,00, a título de devolução dos valores indevidamente recebidos, após a revisão. 2. Ressalte-
se que a devolução dos valores pagos em razão da cumulação indevida do auxílio acidente
com a aposentadoria especial, após a data da revisão da RMI desta, se mostra incabível, uma
vez que importa em repetição de verbas alimentares, percebidas de boa-fé. 3. Não se trata de
propiciar o enriquecimento sem causa ou mesmo de negativa de vigência dos artigos 115 da Lei
nº 8.213/91, 475-O do Código de Processo Civil e 876 do Código Civil, mas, sim, de, em
obediência ao princípio constitucional da proporcionalidade, se render aos ditames do princípio
da dignidade da pessoa humana, em razão do caráter alimentar dos benefícios previdenciários,
uma vez que o INSS tem melhores condições de suportar eventuais prejuízos, notadamente
aqueles causados pela sua própria ineficiência. 4. A aplicação dos mencionados dispositivos
legais não poderá ser aduzida em detrimento dos princípios constitucionais que garantem o
direito fundamental à dignidade. 5. Agravo a que se nega provimento. (TRF3, 10ª Turma, AI
00166695520134030000 DESEMBARGADOR FEDERAL WALTER DO AMARAL e- DJF3
Judicial 1 DATA:23/10/2013). Grifei.
Dessa forma, impõe-se acolher a pretensão, para efeito de declarar a inexigibilidade do débito
previdenciário imputado à parte autora, decorrente das verbas já recebidas a título de auxílio-
acidente de forma indevida, em virtude de acúmulo com aposentadoria por tempo de
contribuição.
Quanto aos benefícios nº nº 094.242.181-7 e 109.578.225-5, o INSS esclareceu na contestação
que o ofício 202000003640 foi redigido com incorreção, uma vez que os benefícios não são de
titularidade do autor, inclusive não constam do extrato do CNIS, razão pela qual nada há a ser
deferido quanto a este ponto.
Demais disso, face ao caráter alimentar do benefício, somado à verossimilhança das alegações
com lastro na fundamentação acima deduzida, concedo tutela antecipada requerida para que o
INSS se abstenha de cobrar os valores oriundos da cumulação citada. (...) (d.n).
4. Aplica-se no presente caso a tese firmada pelo STJ no julgamento do Tema 979, no seguinte
sentido:
Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados, decorrentes de erro administrativo
(material ou operacional) não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela
administração, são repetíveis sendo legítimo o desconto no percentual de 30% do valor do
benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do
caso concreto, comprove sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era
possível constatar o pagamento indevido.
5. Não há elementos que permitam concluir que não houve boa-fé objetiva. A parte autora é
pessoa não alfabetizada, com 75 anos de idade e não tinha condições de perceber que a
cumulação dos benefícios era indevida.
6. Cumpre destacar o princípio geral de direito segundo o qual a boa-fé se presume, sendo
ônus da autarquia comprovar a má-fé do segurado. No caso, não se demonstrou qualquer
irregularidade atribuível à autora. Não procede o argumento do INSS de que é devida a
restituição de valores independentemente de ter havido, ou não, má-fé da parte autora. Quem
detém as informações necessárias para a concessão do benefício é o servidor da autarquia
administrativa, que detém mais e melhores condições de verificar se a documentação está em
termos para o processamento do pedido de aposentadoria e se já estão pagos outros
benefícios de fruição incompatível.
7. Inocorrência de error in judicando que autorize a reforma do julgado.
8. Diante de exposto, nego provimento ao recurso do INSS.
9. Condenação da parte ré-recorrente ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em
10% de acordo com o art. 55 da Lei 9.099/1995 c/c art. 1º da Lei 10.259/2001 e do art. 85, § 3º,
I e art. 1.046, § 2º do Código de Processo Civil/2015, limitados a 06 (seis) salários-mínimos em
razão de este número representar o já mencionado percentual do teto de competência do JEF
(60 salários-mínimos – artigo 3º, caput, Lei 10.259/2001).
É como voto.
São Paulo, 21 de janeiro de 2022 (data do julgamento).
JUIZ FEDERAL RELATOR
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. DECLARAÇÃO DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO APURADO EM
VIRTUDE DE RECEBIMENTO CONCOMITANTE DOS BENEFÍCIOS DE AUXÍLIO-ACIDENTE
E APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO, COM CESSAÇÃO DE ATOS DE
COBRANÇA. IRREPETIBILIDADE DOS VALORES RECEBIDOS DE BOA FÉ. ERRO
ADMINISTRATIVO. TEMA 979 DO STJ. MANUTENÇÃO DO JULGAMENTO. APLICAÇÃO DO
ART. 46 DA LEI 9099/95 C/C ART. 1° DA LEI 10.259/2001. NEGADO PROVIMENTO AO
RECURSO DO INSS. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento ao recurso do INSS., nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
