Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0004869-80.2020.4.03.6306
Relator(a)
Juiz Federal LEANDRO GONSALVES FERREIRA
Órgão Julgador
3ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
14/12/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 28/12/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. DECLARAÇÃO DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO ORIUNDO DE
ACUMULAÇÃO DE AUXÍLIO-ACIDENTE E APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. TEMA
979/STJ. NÃO CABIMENTO DE DEVOLUÇÃO DE VERBA PREVIDENCIÁRIA RECEBIDA DE
BOA FÉ, POR FORÇA DE INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA, MÁ APLICAÇÃO DA LEI OU ERRO
EXCLUSIVO DA ADMINISTRAÇÃO. RECURSO DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
3ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0004869-80.2020.4.03.6306
RELATOR:7º Juiz Federal da 3ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: ISABEL CRISTINA CASARANO
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
REPRESENTANTE: PATRICIA MONTEIRO
Advogado do(a) RECORRIDO: ANDRE LUIZ DOMINGUES TORRES - SP273976-A,
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0004869-80.2020.4.03.6306
RELATOR:7º Juiz Federal da 3ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: ISABEL CRISTINA CASARANO
REPRESENTANTE: PATRICIA MONTEIRO
Advogado do(a) RECORRIDO: ANDRE LUIZ DOMINGUES TORRES - SP273976-A,
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso interposto pela parte ré, em face da sentença que julgou procedente o
pedido da parte autora, resolvendo o mérito na forma do artigo 487, I, do Código de Processo
Civil, para o fim de declarar inexigível o débito imputado à parte autora por força da acumulação
dos benefícios NB 94/171.327.940-9 e NB 32/617.536.777-8, condenando o réu a restituir
eventuais valores descontados administrativamente, com correção monetária desde o desconto
de cada parcela e juros de mora a partir da citação.
Sustenta, em síntese, não ser aplicável a tese fixada no tema 979/STJ, sob o argumento de que
ao ter concedido o benefício o segurado é informado sobre seus requisitos. Logo, no seu
entender, não há falar no presente caso em boa-fé objetiva, nem em impossibilidade de
constatação do pagamento indevido.
Contrarrazões juntadas.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0004869-80.2020.4.03.6306
RELATOR:7º Juiz Federal da 3ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: ISABEL CRISTINA CASARANO
REPRESENTANTE: PATRICIA MONTEIRO
Advogado do(a) RECORRIDO: ANDRE LUIZ DOMINGUES TORRES - SP273976-A,
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O artigo 46 cc § 5º do art. 82, ambos da Lei nº 9099/95, facultam à Turma Recursal dos
Juizados especiais a remissão aos fundamentos adotados na sentença.
Ademais a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de que a adoção
dos fundamentos contidos na sentença pela Turma Recursal não contraria o art. 93, inciso IX,
da Constituição Federal, vejamos, por exemplo, o seguinte julgado:
EMENTA - AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. MATÉRIA
INFRACONSTITUCIONAL. OFENSA INDIRETA. JUIZADO ESPECIAL. REMISSÃO AOS
FUNDAMENTOS DA SENTENÇA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. INOCORRÊNCIA.
1. Controvérsia decidida à luz de legislações infraconstitucionais. Ofensa indireta à Constituição
do Brasil.
2. O artigo 46 da Lei nº 9.099/95 faculta ao Colégio Recursal do Juizado Especial a remissão
aos fundamentos adotados na sentença, sem que isso implique afronta ao artigo 93, IX ,da
Constituição do Brasil.
Agravo Regimental a que se nega provimento. ( AI 726.283-7-AgR, Rel. Min. Eros Grau, 2ª
Turma, DJe nº 227, Publicação 28/11/2008).
O parágrafo 5º do artigo 82 da Lei nº 9.099/95, dispõe “se a sentença for confirmada pelos
próprios fundamentos, a súmula do julgamento servirá de acórdão.”
O dispositivo legal prevê, expressamente, a possibilidade de o órgão revisor adotar como razão
de decidir os fundamentos do ato impugnado, o que não implica violação do artigo 93, IX, da
Constituição Federal.
Colaciono excerto do r. julgado recorrido, que bem elucida a questão, “in verbis”:
[...]
De acordo com o art. 69 da Lei nº 8.212/91, é dever da Autarquia proceder à revisão de
concessões e manutenções de benefícios, apurando irregularidades e falhas existentes, sendo
este corolário legal do poder de autotutela da Administração Pública, que tem o dever de rever
seus atos, quando eivados de vícios, com observância a ampla defesa e o contraditório.
E sendo constatado pagamento indevido, há previsão legal para que os valores sejam
restituídos aos cofres públicos (art. 115, II, da Lei nº 8.213/1991), pois os recursos são da
coletividade e não da autarquia.
No entanto, quanto à possibilidade de devolução dos valores recebidos indevidamente, a
Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) analisou a questão em julgamento sob o
rito dos recursos repetitivos ( tema 979), sendo fixada a seguinte tese: Com relação aos
pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou
operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração,
são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) de valor
do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante
do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe
era possível constatar o pagamento indevido.
Houve modulação dos efeitos do julgamento nos seguintes termos: "Tem-se de rigor a
modulação dos efeitos definidos neste representativo da controvérsia, em respeito à segurança
jurídica e considerando o inafastável interesse social que permeia a questão sub examine, e a
repercussão do tema que se amolda a centenas de processos sobrestados no Judiciário. Desse
modo somente deve atingir os processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a
partir da publicação deste acórdão." (Acórdão publicado no DJe de 23/4/2021).
Feitas tais premissas, passo à análise do caso concreto.
A controvérsia da presente demanda cinge-se somente à possibilidade de o INSS efetuar a
cobrança de valores recebidos em razão da manutenção irregular de benefício previdenciário.
Quando da concessão da aposentadoria, já estava em vigor a lei que impossibilitava a
percepção conjunta de auxílio-acidente e aposentadoria. Assim, não há dúvidas de que a
cumulação foi indevida.
Inconteste também que a continuidade no pagamento do benefício, quando superada uma das
condições para manutenção do benefício, é hipótese de erro material ou operacional por parte
da Administração previdenciária, sendo cabível o ressarcimento ao erário dos valores recebidos
indevidamente, exceto na hipótese de boa-fé objetiva do segurado, conforme decidido pelo STJ.
No caso concreto, não há qualquer elemento que demonstre existência de má-fé por parte da
parte autora, uma vez que competia ao INSS cessar o auxílio suplementar quando da
concessão da aposentadoria. Assim, não há dúvidas de que houve descumprimento por parte
da Autarquia de seu dever legal de fiscalizar o benefício em tempo hábil.
Destaco, ainda, que por muito tempo houve divergência sobre a possibilidade de acumular o
benefício de auxílio-acidente com aposentadoria, na hipótese do benefício acidentário ter sido
concedido antes do ano de 1997 e o benefício de aposentadoria, depois. Após várias oscilações
nos posicionamentos, a questão foi sumulada pelo Superior Tribunal de Justiça, no enunciado
n. 507, in verbis: “A acumulação de auxílio-acidente com aposentadoria pressupõe que a lesão
incapacitante e a aposentadoria sejam anteriores a 11/11/1997, observado o critério do art. 23
da Lei n. 8.213/1991 para definição do momento da lesão nos casos de doença profissional ou
do trabalho”.
Diante de tal cenário, com divergência sobre a questão, inclusive na jurisprudência, entendo
que a parte autora recebeu as aludidas verbas imbuída da legítima crença de que eram
legítimas.
Afasto ainda a alegação do INSS de que a autora tinha conhecimento da impossibilidade de
recebimento conjunto dos benefícios, pelo fato de, no processo judicial que concedeu o auxílio-
acidente à autora (arquivo 2, fl. 46), haver determinação expressa de cessação do benefício em
caso de concessão de qualquer aposentadoria. Primeiro, porque a determinação de cessação
do benefício foi direcionada ao INSS; segundo, porque é relatado na inicial que a autora sofreu
AVC em 2016, com sequelas neurológicas, tanto que foi aposentada por invalidez em razão de
tais problemas e, desde 23/10/2018, possui curadora (anexo 2, fl.05).
Assim, não se pode esperar que a titular do benefício, nem mesmo sua curadora, tivesse o
discernimento necessário para compreender a ilegalidade da acumulação. grifei
Pelo exposto, entendo que não é hipótese de devolução dos valores recebidos indevidamente,
sendo devida, por consequência, a devolução de eventuais valores descontados
administrativamente.
Quanto aos cálculos, deverão ser elaborados nos exatos termos do Manual de Orientação de
Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente e suas alterações posteriores.
O STF concluiu o julgamento do RE 870.947 (Tema 810 de Repercussão Geral) em que
reconheceu a inconstitucionalidade por arrastamento do artigo 1º-F da Lei 9.494 de 1997, no
que toca à correção monetária pela TR.
A determinação de correção monetária baseada no índice de correção da poupança prevista no
artigo 1º-F da Lei 9.494/97 é inconstitucional, uma vez que não reflete a inflação do período,
ferindo o direito de propriedade dos litigantes (artigo 5º, XXII da CF/88) e proporcionando
enriquecimento sem causa à Fazenda Pública.
De outro lado, em sede de recurso repetitivo (Tema 905), o E. STJ fixou a seguinte tese: “3.2
Condenações judiciais de natureza previdenciária. As condenações impostas à Fazenda
Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção
monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o
art. 41-A na Lei 8.213/91. Quanto aos juros de mora, incidem segundo a remuneração oficial da
caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009)”.
Desta maneira, em linha com o Manual de Cálculos da Justiça Federal, nas condenações
previdenciárias, o índice de correção monetária a ser aplicado é o INPC no período posterior à
vigência da Lei 11.430/2006 (inclusive após a Lei 11.960/2009).
Trata-se do índice previsto no artigo 41-A da Lei 8.213/91 para o reajustamento dos benefícios,
sendo apto a recompor o valor em decorrência do decurso do tempo. Os juros de mora devem
ser calculados nos moldes do artigo 1º-F da Lei 9.494/97.
Friso, no entanto, que eventual alteração do Manual de Cálculos deverá ser observada na fase
de cumprimento, por refletir a jurisprudência dominante sobre o tema.
DISPOSITIVO
Diante do exposto, julgo procedente o pedido da parte autora, resolvendo o mérito na forma do
artigo 487, I, do Código de Processo Civil, para o fim de declarar inexigível o débito imputado à
parte autora por força da acumulação dos benefícios NB 94/171.327.940-9 e NB
32/617.536.777-8, condenando o réu a restituir eventuais valores descontados
administrativamente, com correção monetária desde o desconto de cada parcela e juros de
mora a partir da citação.
[...]
A questão controvertida foi objeto de julgamento pelo Superior Tribunal de Justiça, em regime
de recurso repetitivo, com a fixação da seguinte tese (Tema 979 - REsp 1381734/RN):
Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo
(material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela
Administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% (trinta por
cento) de valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o
segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com
demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido.
Importante o registro de que houve a modulação dos efeitos da referida decisão, conforme
abaixo destacado na transcrição da ementa do respectivo acórdão:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE
CONTROVÉRSIA. TEMA 979. ARTIGO 1.036 DO CPC/2015. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.
PENSÃO POR MORTE. ARTIGOS 884 E 885 DO CÓDIGO CIVIL/2002. AUSÊNCIA DE
PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211 DO STJ. ART. 115, II, DA LEI N. 8.213/1991.
DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA E
MÁ APLICAÇÃO DA LEI. NÃO DEVOLUÇÃO. ERRO MATERIAL DA ADMINISTRAÇÃO.
POSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO SOMENTE NA HIPÓTESE DE ERRO EM QUE OS
ELEMENTOS DO CASO CONCRETO NÃO PERMITAM CONCLUIR PELA INEQUÍVOCA
PRESENÇA DA BOA-FÉ OBJETIVA.
1. Da admissão do recurso especial: Não se conhece do recurso especial quanto à alegada
ofensa aos artigos 884 e 885 do Código Civil, pois não foram prequestionados. Aplica-se à
hipótese o disposto no enunciado da Súmula 211 do STJ. O apelo especial que trata do dissídio
também não comporta conhecimento, pois não indicou as circunstâncias que identifiquem ou
assemelhem os precedentes colacionados e também por ausência de cotejo analítico e
similitude entre as hipóteses apresentadas. Contudo, merece conhecimento o recurso quanto à
suposta ofensa ao art. 115, II, da lei n. 8.213/1991.
2. Da limitação da tese proposta: A afetação do recurso em abstrato diz respeito à seguinte
tese: Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por
força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência
Social.
3. Irrepetibilidade de valores pagos pelo INSS em razão da errônea interpretação e/ou má
aplicação da lei: O beneficiário não pode ser penalizado pela interpretação errônea ou má
aplicação da lei previdenciária ao receber valor além do devido. Diz-se desse modo porque
também é dever-poder da Administração bem interpretar a legislação que deve por ela ser
aplicada no pagamento dos benefícios. Dentro dessa perspectiva, esta Corte Superior evoluiu a
sua jurisprudência passando a adotar o entendimento no sentido de que, para a não devolução
dos valores recebidos indevidamente pelo beneficiário da Previdência Social, é imprescindível
que, além do caráter alimentar da verba e do princípio da irrepetibilidade do benefício, a
presença da boa-fé objetiva daquele que recebe parcelas tidas por indevidas pela
administração. Essas situações não refletem qualquer condição para que o cidadão comum
compreenda de forma inequívoca que recebeu a maior o que não lhe era devido.
4. Repetição de valores pagos pelo INSS em razão de erro material da Administração
previdenciária: No erro material, é necessário que se averigue em cada caso se os elementos
objetivos levam à conclusão de que houve boa-fé do segurado no recebimento da verba. Vale
dizer que em situações em que o homem médio consegue constatar a existência de erro,
necessário se faz a devolução dos valores ao erário.
5. Do limite mensal para desconto a ser efetuado no benefício: O artigo 154, § 3º, do Decreto n.
3.048/1999 autoriza a Administração Previdenciária a proceder o desconto daquilo que pagou
indevidamente; todavia, a dedução no benefício só deverá ocorrer quando se estiver diante de
erro da administração. Nesse caso, caberá à Administração Previdenciária, ao instaurar o
devido processo administrativo, observar as peculiaridades de cada caso concreto, com
desconto no beneficio no percentual de até 30% (trinta por cento).
6. Tese a ser submetida ao Colegiado: Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados
decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação
errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o
seu desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal,
ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé
objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento
indevido.
7. Modulação dos efeitos: Tem-se de rigor a modulação dos efeitos definidos neste
representativo da controvérsia, em respeito à segurança jurídica e considerando o inafastável
interesse social que permeia a questão sub examine, e a repercussão do tema que se amolda a
centenas de processos sobrestados no Judiciário. Desse modo somente deve atingir os
processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação deste
acórdão.
8. No caso concreto: Há previsão expressa quanto ao momento em que deverá ocorrer a
cessação do benefício, não havendo margem para ilações quanto à impossibilidade de se
estender o benefício para além da maioridade da beneficiária. Tratou-se, em verdade, de
simples erro da administração na continuidade do pagamento da pensão, o que resulta na
exigibilidade de tais valores, sob forma de ressarcimento ao erário, com descontos nos
benefícios, tendo em vista o princípio da indisponibilidade do patrimônio público e em razão da
vedação ao princípio do enriquecimento sem causa. Entretanto, em razão da modulação dos
efeitos aqui definidos, deixa-se de efetuar o descontos dos valores recebidos indevidamente
pelo segurado.
9. Dispositivo: Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido.
Acórdão sujeito ao regime previsto no artigo 1.036 e seguintes do CPC/2015.
(REsp 1381734/RN, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em
10/03/2021, DJe 23/04/2021)
(Realcei)
Ademais, para facilitar a compreensão do tema em debate, menciono alguns trechos do voto do
Relator do REsp 1381734/RN:
[...]
6.1. Da repetição de valores pagos pelo INSS em razão da errônea interpretação e/ou má
aplicação da lei
O beneficiário não pode ser penalizado pela interpretação errônea ou má aplicação da lei
previdenciária ao receber valor além do devido. Diz-se desse modo porque também é dever-
poder da Administração bem interpretar a legislação que deve por ela ser aplicada no
pagamento dos benefícios. É regra geral do direito que ao administrado não é permitido alegar
o desconhecimento da legislação, no entanto, não é dado exigir daquele que recebe o valor
acima do devido pela Previdência Social a percepção da interpretação de todo o complexo
legislativo, legal e infralegal utilizado pela Administração para o pagamento do benefício.
Dentro dessa perspectiva, esta Corte Superior evoluiu a sua jurisprudência passando a adotar o
entendimento no sentido de que, para a não devolução dos valores recebidos indevidamente
pelo beneficiário da Previdência Social, é imprescindível, além do caráter alimentar da verba e
do princípio da irrepetibilidade do benefício, a presença da boa-fé objetiva daquele que recebe
parcelas tidas por indevidas pela administração. Essas situações não refletem qualquer
condição para que o cidadão compreenda de forma inequívoca que recebeu a maior o que não
lhe era devido.
Assim, nessas circunstâncias, evidencia-se não ser possível exigir-se do beneficiário a
devolução de valores pagos pelo INSS, ainda que indevidamente.
6.2. Da repetição de valores pagos pelo INSS em razão de erro da Administração
Previdenciária
Diferentemente das hipóteses anteriores (interpretação errônea e má aplicação da lei), onde o
elemento objetivo é, por si, suficiente para levar à conclusão de que o segurado recebeu o
benefício de boa-fé, assegurando-lhe o direito da não devolução do valor recebido
indevidamente, a hipótese de erro material ou operacional deve ser analisado caso a caso, de
modo a averiguar se o Superior Tribunal de Justiça beneficiário/segurado tinha condições de
compreender a respeito do não pertencimento dos valores recebidos, de modo a se lhe exigir
comportamento diverso, diante do seu dever de lealdade para com a Administração
Previdenciária.
Nesse contexto, é possível afirmar que há erros materiais ou operacionais que se mostram
incompatíveis com a indispensável boa-fé objetiva, dando ensejo ao ressarcimento do indébito,
situação que foi muito bem retratada no MS n. 19.260/DF, da relatoria do Ministro Herman
Benjamin, DJe 3/9/2014, ao exemplificar uma situação hipotética de um servidor que não possui
filhos e recebeu, por erro da Administração, auxílio natalidade.
Conforme fixado no precedente precitado, "descabe ao receptor da verba alegar que presumiu
o caráter legal do pagamento em hipótese de patente cunho indevido.".
Assim, os erros materiais ou operacionais cometidos pela Administração Previdenciária que não
se enquadrem nas hipóteses de interpretação errônea e má aplicação da lei e não sejam
capazes de despertar no beneficiário inequívoca compreensão da irregularidade do pagamento
abrem a possibilidade do ressarcimento.
Dessa forma, pode-se afirmar com segurança que o caso de erro material ou operacional, para
fins de ressarcimento administrativo do valor pago indevidamente, deve averiguar a presença
da boa-fé do segurado/beneficiário, concernente na sua aptidão para compreender, de forma
inequívoca, a irregularidade do pagamento.
6.2.1. Do limite mensal para desconto a ser efetuado no benefício
Dentro desse contexto, e tendo em conta que a lei fixa apenas o limite máximo para os
descontos, caberá à Administração Previdenciária, ao instaurar o devido processo
administrativo, observar as peculiaridades de cada caso concreto para fixar o percentual para a
devolução dos valores.
[...]
8. Modulação dos efeitos a ser discutida e votada pelo Colegiado
Com efeito, é cediço que o INSS vem buscando judicialmente a repetição dos valores por ele
pagos indevidamente nas hipóteses de errônea interpretação e/ou má aplicação da lei e nos
casos de erro da administração. E, conforme já historiado anteriormente, a jurisprudência desta
Corte vinha caminhando no sentido de indeferir a devolução em todas essas hipóteses.
A alteração da jurisprudência, ainda que para admitir a repetição de valores em uma hipótese,
como está sendo proposta, impõe a observância da modulação dos efeitos conforme autoriza o
CPC/2015. Confira-se, in verbis:
Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão:
[...]
§ 3º Na hipótese de alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos
tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver
modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica.
Tem-se de rigor a modulação dos efeitos definidos neste representativo da controvérsia em
respeito à segurança jurídica e considerando o inafastável interesse social que permeia a
questão sub examine e a repercussão do tema que se amolda a centenas de processos
sobrestados no Judiciário.
Desse modo propõem-se a seguinte modulação:
Os efeitos definidos neste representativo da controvérsia, somente devem atingir os processos
que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação deste acórdão.
[...]
9. Da situação concreta dos autos
[...]
Da leitura da petição inicial, observa-se que:
a) Francisco Eusébio Galdêncio, aposentado rural, foi representante legal de Rita Kelis
Galdêncio, então beneficiária de pensão por morte deixada por seu avô, Eusébio Galdêncio de
Oliveira;
b) Na condição de representante legal da beneficiária, recebeu benefício NB 01/91.600.641-7,
que cessou em meados do mês de maio de 2009, porque detectada a maioridade da
representada em 16/7/2007.
c) O INSS, a título de ressarcimento dos valores pagos indevidamente no período de 16/7/2007
a 31/5/2009, passou a descontar o equivalente a 30% (trinta por cento) no seu benefício de
aposentadoria por idade rural E/NB 41/146.048.414-0, lançada sob a forma de consignação
mensal; e
d) Em 9/2/2011, porém, a consignação foi excluída em obediência à decisão liminar deferida às
fls. 30-32, e-STJ, estando suspenso o procedimento de cobrança implementado.
[...]
Portanto, dos normativos supratranscritos, verifica-se que há previsão expressa quanto ao
momento em que deverá ocorrer a cessação do benefício, não havendo margem para ilações
quanto à impossibilidade de se estender o benefício para além da maioridade da beneficiária. É
inconteste que o benefício foi mantido pela Administração previdenciária desde 15/6/2007 (data
em que a sua titular alcançou a idade limite 21 anos para manutenção de sua qualidade de
dependente) até maio/2009, quando a falha em sua manutenção foi identificada por ocasião da
revisão administrativa.
Vale dizer: jamais houve dúvida plausível acerca da interpretação ou aplicação da lei. Tratou-
se, em verdade, de simples erro na continuidade do pagamento da pensão. Tem-se então, na
presente hipótese, a ocorrência de erro material por parte da Administração previdenciária, que
desencadeou o pagamento indevido por quase dois anos, o que resulta na exigibilidade de tais
valores, sob forma de ressarcimento ao erário, com desconto no benefício, tendo em vista o
princípio da indisponibilidade do patrimônio público e em razão da vedação ao princípio do
enriquecimento sem causa.
Contudo, a modulação dos efeitos aqui definidos neste representativo da controvérsia aproveita
o ora recorrido, não se permitindo a devolução dos valores indevidamente recebidos.
10. Dispositivo
Ante o exposto, conheço parcialmente do recurso especial do INSS e, nessa extensão, nego-
lhe provimento.
[...]
(Destaquei)
Desse modo, quanto aos processos que, na primeira instância, foram ajuizados até 22/04/2021
(véspera da publicação do acórdão concernente ao REsp 1381734/RN – Tema 979/STJ), não
se admite a devolução dos valores indevidamente recebidos por segurado(a) ou beneficiário(a)
da Seguridade Social, inexistindo, no presente caso, como bem demonstrado na sentença,
provas concretas de que a parte autora desvirtuou-se da boa-fé objetiva.
Como o ingresso da presente demanda ocorreu na data de 25/08/2020, é de ser mantida a r.
sentença pelos fundamentos ora expostos.
Posto isso, nego provimento ao recurso.
Recorrente vencido(a) condenado(a) ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10%
sobre o valor da condenação ou, inexistindo esta, sobre o valor da causa atualizado, no mesmo
percentual, em qualquer caso limitados a 6 salários-mínimos (montante correspondente a 10%
do teto de competência dos Juizados Especiais Federais - art. 3º, “caput”, da Lei 10.259/2001).
Na hipótese de não apresentação de contrarrazões, deixo de condenar o(a) recorrente
vencido(a) ao pagamento de honorários advocatícios, segundo prevê o artigo 55 da Lei
9.099/95 c/c artigo 1º da Lei 10.259/2001 c.c. artigo 1.046, § 2º, do CPC/2015, pois, não tendo
sido apresentadas contrarrazões ao recurso pelo(a) advogado(a) da parte recorrida, inexiste
embasamento de ordem fática para aplicação do artigo 85, “caput” e seu § 1º do NCPC, em
virtude do que dispõe o § 2º deste artigo.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. DECLARAÇÃO DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO ORIUNDO DE
ACUMULAÇÃO DE AUXÍLIO-ACIDENTE E APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. TEMA
979/STJ. NÃO CABIMENTO DE DEVOLUÇÃO DE VERBA PREVIDENCIÁRIA RECEBIDA DE
BOA FÉ, POR FORÇA DE INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA, MÁ APLICAÇÃO DA LEI OU ERRO
EXCLUSIVO DA ADMINISTRAÇÃO. RECURSO DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por
unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
