
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5079576-68.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: MARLENE COLOMBO FELIX BERNARDINI
Advogados do(a) APELANTE: EDGARD PAGLIARANI SAMPAIO - SP135327-N, LUCAS FIORI CURTI - SP423957-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5079576-68.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: MARLENE COLOMBO FELIX BERNARDINI
Advogados do(a) APELANTE: EDGARD PAGLIARANI SAMPAIO - SP135327-N, LUCAS FIORI CURTI - SP423957-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Demanda proposta objetivando a concessão de aposentadoria por idade a trabalhador rural, prevista no art. 143 da Lei n.º 8.213/91.
O juízo a quo julgou improcedente o pedido formulado.
A parte autora apela, pleiteando a reforma da sentença, sustentando, em síntese, o cumprimento dos requisitos legais necessários à concessão pretendida.
Sem contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5079576-68.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: MARLENE COLOMBO FELIX BERNARDINI
Advogados do(a) APELANTE: EDGARD PAGLIARANI SAMPAIO - SP135327-N, LUCAS FIORI CURTI - SP423957-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
APOSENTADORIA POR IDADE (RURAL)
O benefício de aposentadoria por idade a trabalhador rural encontra-se disciplinado nos arts. 39, inciso I; 48, §§ 1.º e 2.º; e 143 da Lei n.º 8.213/91.
Antes mesmo do advento da Lei de Benefícios, a Lei Complementar n.º 11, de 25 de maio de 1971, que instituiu o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural, em seu art. 4.º dispunha que a aposentadoria seria devida quando se completassem 65 anos de idade, cabendo a concessão do benefício apenas ao respectivo chefe ou arrimo de família (parágrafo único).
Por sua vez, de acordo com o art. 5.º da Lei Complementar n.º 16/73, o trabalhador rural deveria comprovar a sua atividade pelo menos nos três últimos anos anteriores à data do pedido do benefício.
Referidos dispositivos não foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988, que passou para 60 anos, para homens, e 55, para mulheres, a idade mínima exigida para a concessão do benefício (art. 201, § 7.º, inciso II), excluindo a exigência da condição de chefe de família.
Além do requisito etário (60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher), o trabalhador rural deve comprovar o exercício de atividade rural, mesmo que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do benefício.
O dispositivo legal citado deve ser analisado em consonância com o art. 142 da Lei de Benefícios.
Não se exige do trabalhador rural o cumprimento de carência (art. 26, inciso III), como o dever de verter contribuição por determinado número de meses, senão a comprovação do exercício laboral durante o período respectivo.
Vale dizer: em relação às contribuições previdenciárias, é assente, desde sempre, o entendimento de serem desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício de atividade no meio rural (STJ, REsp n.º 207.425, 5.ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de 25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro Jorge Scartezzini; e STJ, RESP n. 502.817, 5.ª Turma, j. em 14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003, p. 361, Rel. Ministra Laurita Vaz).
Noutro passo, com relação ao art. 143 da Lei n.º 8.213/91, a regra transitória assegurou aos rurícolas o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos, contados da vigência da referida Lei.
Assim, o referido prazo expiraria em 25/7/2006.
Entretanto, em relação ao trabalhador rural enquadrado como segurado empregado ou como segurado contribuinte individual, que presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas, sem relação de emprego, o aludido prazo foi prorrogado por mais 2 (dois) anos, estendendo-se até 25/7/2008, em face do disposto na MP n.º 312/06, convertida na Lei n.º 11.368/06.
Posteriormente, a Medida Provisória n.º 410/07, convertida na Lei n.º 11.718/08, estabeleceu nova prorrogação para o prazo previsto no art. 143 da Lei n.º 8.213/91, ao determinar, em seu art. 2.º, que “Para o trabalhador rural empregado, o prazo previsto no art. 43 da Lei n.º 8.213/91, de 24 de julho de 1991, fica prorrogado até o dia 31 de dezembro de 2010” (art. 2.º) e, em seu art. 3.º, que “Na concessão de aposentadoria por idade do empregado rural , em valor equivalente ao salário mínimo, serão contados para efeito de carência: I - até 31 de dezembro de 2010, a atividade comprovada na forma do art. 143 da Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991; II - de janeiro de 2011 a dezembro de 2015, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 3 (três), limitado a 12 (doze) meses, dentro do respectivo ano civil; e III - de janeiro de 2016 a dezembro de 2020, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 2 (dois), limitado a 12 (doze) meses dentro do respectivo ano civil”.
É de observar-se que, para os empregados rurais e contribuintes individuais eventuais, a regra permanente do art. 48 da Lei n.º 8.213/91 continua a exigir, para concessão de aposentadoria por idade a rurícolas, apenas a comprovação do efetivo exercício de "atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido", consoante §§ 1.º e 2.º do referido dispositivo.
Essa comprovação do labor rural, nos termos dos arts. 48 e 143 da Lei de Benefícios, dar-se-á por meio de prova documental, ainda que incipiente, e, nos termos do art. 55, § 3.º, da retrocitada Lei, corroborada por prova testemunhal.
Acrescente-se que a jurisprudência de longa data vem atentando para a necessidade dessa conjunção de elementos probatórios (início de prova documental e colheita de prova testemunhal), o que resultou até mesmo na edição do verbete n.º 149 da Súmula da Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
DO CASO DOS AUTOS
O requisito etário restou satisfeito, pois a parte autora completou a idade mínima em 3/2/2016, devendo fazer prova do exercício de atividade rural por 180 meses.
Para demonstrar as alegações, juntou documentos, entre os quais destacam-se:
- Certidão de casamento da autora e de W. B., celebrado em 15 de setembro de 1986, em que consta a profissão do esposo agropecuarista e da autora balconista;
- CNIS da autora sem vínculos;
- Requerimento de aposentadoria por idade rural, requerido pela autora em 18/3/2019, indeferido em razão da não comprovação do labor rural;
- Declaração de labor rural apresentado pela autora ao INSS em que declara o exercício de trabalho no campo de 25/9/1986 a 18/3/2019;
- Escritura de doação do imóvel rural em que vive com o esposo, datado de 25 de janeiro de 1990;
- Notas fiscais de produtor, no importe de R$ 14.250,00 (3/5/1999), R$ 1.450,00 (24/2/2000), R$ 10.500,00 (2/2/2001), R$ 17.000,00 (17/4/2002), R$ 5.250,00 (12/2/2003); R$ 16.500,00 (14/1/2004); R$ 20.000,00 (24/2/2005), R$ 37.891,00 (27/4/2018), R$ 41.800,00 (7/1/2019);
- CNIS do cônjuge da autora com vínculos entre 1.º/4/1999 a 30/4/1999 (autônomo), 1.º/5/1999 a 30/11/1999 (equiparado a autônomo), 23/9/1999 (segurado especial), 1.º/12/1999 a 30/9/2014 (contribuinte individual), contribuinte individual (1.º/11/2014) a 31/8/2019 (contribuinte individual).
Cabe ressaltar a existência de prova oral.
A testemunha Lourival afirmou que conhece a autora desde o nascimento dela, conheceu os pais dela, eles tinham propriedade e venderam depois. Se recorda que a autora ajudava os pais na propriedade deles e depois que se casou foi ajudar o marido, ela ajuda o marido há 37 anos. Acrescentou que possuem um pouco de lavoura e possuem gado de leite e soja a propriedade deles tem 45 alqueires, possuindo gado de corte, leite e plantio de soja. Disse, ainda, que a propriedade tinha um trator 275 Massey Ferguson, eles tinham vagão para tratar do gado. Na fazenda, trabalham a autora e o esposo e um filho que ajudava, nem a autora e nem o marido exerceram outra atividade.
A testemunha Abel aduziu que conhece a autora, ela é casada, mas não sabe a quanto tempo ela é casada, conhece ela do sítio, são praticamente vizinhos de sítio. O sítio da testemunha tem 7,5 alqueires e a autora tem de 14 a 20 alqueires. A família da autora mexe com leite e gado de corte, além de roça. Acrescentou que a autora possui tanque resfriador e ordenhadeira mecânica, a propriedade possui curral e tem um trator 275 massey ferguson, possui vagão. Relatou que é só o marido e a mulher que trabalham na propriedade, já negociou gado com eles e vendeu bezerro para eles, uns 8 para corte.
Observa-se, no entanto, que as atividades desenvolvidas na propriedade não se enquadram no trabalho em regime de economia familiar.
Consta nos autos, nota fiscal que chega a mais de R$ 40.000,00, além disso, a estrutura e maquinário da fazenda vão além de uma produção de um pequeno grupo familiar.
Deve ser resclarecido também que não é possível que a autora comprove o labor rural por meio dos documentos do esposo, uma vez que consta no CNIS que este é contribuinte individual.
Resta, portanto, descaracterizo o trabalho familiar em auxílio mútuo para fins de subsistência, nos termos do art. 11, inciso VII, § 1.º, da Lei de Benefícios.
Dessa forma, verifica-se que o esposo da autora se equipara a empresário e, neste caso, o reconhecimento do trabalho no período pretendido somente seria possível se comprovado o recolhimento de contribuições.
Em que pese a prova testemunhal confirme a atividade desempenhada pela parte autora em regime de economia familiar, é, por si só, insuficiente para acolher a pretensão da autora, porquanto produzida prova em contrário.
Impossível, portanto, reconhecer o exercício de atividade rural em regime de economia familiar nos termos requeridos pela autora.
Registre-se não ser caso de aplicar o decidido no REsp 1.352.721/SP e extinguir o processo sem resolução do mérito porque, diferentemente da situação em que o inicio de prova documental é inexistente ou frágil, no caso em análise o conjunto probatório foi robusto no sentido de descaracterizar o regime de economia familiar, o que leva ao decreto de improcedência.
Quanto ao prequestionamento suscitado, inexiste contrariedade alguma à legislação federal ou a dispostos constitucionais.
Majoro a condenação ao pagamento de honorários fixados pelo juízo a quo em 2%, com base no art. 85, § 11, do CPC.
Posto isso, nego provimento à apelação.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. DECLARATÓRIA DE TEMPO DE SERVIÇO. TRABALHO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR NÃO CONFIGURADO. IMPOSSIBILIDADE.
- Para o reconhecimento do tempo de serviço de trabalhador rural, mister a conjugação do início de prova material com prova testemunhal (Artigo 55, § 3º, da Lei n° 8.213/91, Súmula 149 do STJ e REsp 1.133.863/RN).
- Os documentos coligidos aos autos descaracterizam o regime de economia familiar (art. 11, VII, § 1. , da Lei de Benefícios).
- Reconhecimento da improcedência do pedido formulado.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADORA FEDERAL
