
| D.E. Publicado em 20/12/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0023817-64.2011.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
VOTO
No caso concreto, há início de prova documental da condição de rurícola dos autores, consistente nas cópias dos títulos de eleitor (fls. 15, 25 e 32) e dos certificados de dispensa de incorporação (fls. 26 e 31), nas quais os autores Arlindo Januário da Silva, José Carlos da Silva e Luiz Januário da Silva estão qualificados profissionalmente como lavradores. Segundo a jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça, tal documentação, em conjunto com a prova testemunhal colhida no curso da instrução processual, é hábil ao reconhecimento de tempo de serviço trabalhado como rurícola, conforme revelam as seguintes ementas de julgados:
"As anotações em certidões de registro civil, a declaração de produtor rural, a nota fiscal de produtor rural, as guias de recolhimento de contribuição sindical e o contrato individual de trabalho em Carteira de Trabalho e Previdência Social - CTPS, todos contemporâneos à época dos fatos alegados, se inserem no conceito de início razoável de prova material." (REsp 280402/SP, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, DJ 10/09/2001, p. 427).
"A jurisprudência desta Corte é uníssona no sentido da validade dos documentos em nome do pai do Autor para fins de comprovação da atividade laborativa rural em regime de economia familiar." (REsp n° 516656/CE, Relatora Ministra LAURITA VAZ, J. 23/09/2003, DJ 13/10/2003 p. 432).
Logo, quanto ao período anterior ao início de vigência da Lei nº 8.213/91, conta-se o tempo de serviço do trabalhador rural, independentemente do recolhimento das contribuições, mas não para efeito de carência e contagem recíproca, sendo que a expressão "trabalhador rural" deve ser entendida no seu sentido genérico, compreendendo o empregado rural e o rurícola que tenha exercido a atividade em regime de economia familiar.
No Superior Tribunal de Justiça se firmou entendimento no sentido de que o tempo de serviço do trabalhador rural, antes da Lei nº 8.213/91, para contagem recíproca, necessita do recolhimento das contribuições previdenciárias correspondentes ao período que se pretende reconhecer. Nesse sentido, vejam-se as seguintes ementas de julgados:
"PREVIDENCIÁRIO - RECURSO ESPECIAL - SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL - CONTAGEM RECÍPROCA - ATIVIDADE RURAL - ART. 96, IV, DA LEI Nº 8.213/91 C/C ART. 202, § 2º DA CF - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO RECOLHIMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES - AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO - IMPOSSIBILIDADE.
1 - Nos termos constitucionais (art. 202, parág. 2º da CF) é assegurado, para fins de aposentadoria, a contagem recíproca do tempo de contribuição na Administração Pública e na atividade Privada, rural ou urbana. Contudo, o Pretório Excelso já asseverou que para contagem recíproca propriamente dita, isto é, aquela que soma o tempo de serviço público ao da atividade privada, não pode ser dispensada a prova de contribuição, pouco importando que determinada categoria profissional houvesse sido anteriormente dispensada de contribuir (ADIN nº 1.664, Rel. Ministro OCTÁVIO GALLOTTI, DJU de 19.12.1997).
2 - Precedentes desta Corte.
3 - Recurso conhecido e provido." (REsp nº 600661/SP, Relator Ministro JORGE SCARTEZZINI, j. 28/04/2004, DJ 02/08/2004, p. 535);
"AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. CONTAGEM RECÍPROCA DE TEMPO DE SERVIÇO. AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO EM ATIVIDADE RURAL PARA FINS DE APOSENTADORIA NO SERVIÇO PÚBLICO. CONTRIBUIÇÃO. NECESSIDADE.
1. "1. "Para efeito de aposentadoria, é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição na administração pública e na atividade privada, rural e urbana, hipótese em que os diversos sistemas de previdência social se compensarão financeiramente, segundo critérios estabelecidos em lei." (artigo 202, parágrafo 2º, da Constituição da República).
2. "(...) para a contagem recíproca corretamente dita, isto é, aquela que soma o tempo de serviço público ao de atividade privada, não pode ser dispensada a prova de contribuição, pouco importando - diante desse explícito requisito constitucional - que de, contribuir, houvesse sido, no passado, dispensada determinada categoria profissional, assim limitada, bem ou mal, quanto ao benefício de reciprocidade pela ressalva estatuída na própria Constituição." (ADIn nº 1.664/UF, Relator Ministro Octavio Gallotti, in DJ 19/12/97).
3. A contagem do tempo de serviço prestado na atividade privada, seja ela urbana ou rural, só pode ser aproveitada para fins de aposentadoria no serviço público, quando houver prova de contribuição naquele regime previdenciário, inocorrente, na espécie." (RMS 11.188/SC, da minha Relatoria, in DJ 25/3/2002).
2. Agravo regimental improvido." (AGREsp nº 543614 / SP, Relator Ministro HAMILTON CARVALHIDO, j. 26/05/2004, DJ 02/08/2004, p. 593 ).
Tal orientação já se encontra pacificada no Superior Tribunal de Justiça, respaldada em fundamentos de forte consistência, dos quais comungo inteiramente.
Observo, ainda, que o inciso IV do artigo 96 da Lei nº 8.213/91 chegou a ter questionada sua constitucionalidade, tendo sido objeto da ADIn nº 1.664, juntamente com outros dispositivos legais. Houve deferimento da medida cautelar para, em relação a esse dispositivo, emprestando-lhe interpretação conforme a Constituição, afastar sua aplicação em relação ao tempo de serviço do trabalhador rural, enquanto estava este desobrigado de contribuir, mas não para a contagem recíproca (ADIMC nº 1.664-DF, Pleno, maioria, rel. Min. Octávio Gallotti, j. 13/11/97, D.J.U. de 19/12/97, Seção 1, p. 41)).
Do acórdão do Supremo Tribunal Federal, destaco os seguintes trechos do voto do relator, Ministro Octávio Gallotti:
"Dessas premissas parece lícito extrair que, para a contagem recíproca propriamente dita, isto é, aquela que soma o tempo de serviço público ao de atividade privada, não pode ser dispensada a prova de contribuição, pouco importando - diante desse explícito requisito constitucional - que de, contribuir, houvesse sido, no passado, dispensada determinada categoria profissional, assim limitada, bem ou mal, quanto ao benefício de reciprocidade pela ressalva estatuída na própria Constituição.
O mesmo, entretanto, não sucede com a comunicação dos períodos - ambos de atividade privada - de trabalho urbano e rural, soma que, além de não se subordinar aos pressupostos expressos no citado § 2º do art. 202 (compensação financeira e contribuição), revela-se claramente vinculada aos princípios da uniformidade e da equivalência entre os benefícios às populações urbanas e rurais, resultantes do mandamento constante do parágrafo único do art. 194 da Constituição:
(...)
Resumindo o que foi até aqui enunciado, entendo ser juridicamente relevante a impugnação da proibição de acumular imposta pela nova redação do art. 48 da Lei de Benefícios, bem como, em relação ao teor imprimido aos artigos 55, § 2º, 96, IV, e 107, o ataque à restrição ao cômputo do tempo de atividade rural, anterior à exigibilidade das contribuições, para fins de regime geral de previdência, justificando-se apenas e ao primeiro exame, a limitação à contagem recíproca referente ao tempo de serviço público." (o itálico não consta do original).
Não penso que o artigo 4º da Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, ao dispor que o tempo de serviço considerado pela legislação vigente para efeito de aposentadoria, cumprido até que a lei discipline a matéria, será contado como tempo de contribuição, esteja a dispensar, na contagem recíproca, a comprovação de recolhimento de contribuições, porquanto referido dispositivo traz a ressalva do § 10 do artigo 40 da Constituição Federal, que expressamente veda "qualquer forma de contagem de tempo de contribuição fictício". Para que os diversos regimes de previdência social realizem a compensação financeira, na forma do § 9º do artigo 201 da Carta Constitucional, até mesmo para manutenção do equilíbrio atuarial de cada sistema de previdência social, é indispensável que tenha havido recolhimento ou que se realize a necessária indenização pelo interessado.
Assim, estando a autora Maria de Lourdes da Silva vinculada a regime de previdência do serviço público, considerando sua condição de funcionário público, o tempo de serviço rural ora reconhecido, em regime de economia familiar, pode ser computado, para fins de contagem recíproca, sendo devida, entretanto, a indenização das contribuições sociais correspondentes a este período.
Finalmente, a questão relativa ao quantum devido a título de indenização deve ser discutida em ação própria, não podendo ser obstáculo à expedição de certidão de tempo de serviço. Aliás, o direito de obter certidão é garantia constitucional (artigo 5º, inciso XXXIV, alínea "b", da Constituição Federal), não podendo ser condicionada sua expedição à prévia indenização. Neste sentido, precedente do Tribunal Regional Federal da Quinta Região:
"CONSTITUCIONAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXPEDIÇÃO DE CERTIDÃO POR ÓRGÃO PÚBLICO. TEMPO DE SERVIÇO. CONDICIONAMENTO.
1. É CONSTITUCIONALMENTE ASSEGURADO O DIREITO DE OBTER CERTIDÕES EM REPARTIÇÕES PÚBLICAS, PARA A DEFESA DE DIREITOS OU ESCLARECIMENTO DE SITUAÇÕES DE INTERESSE PESSOAL, INDEPENDENTEMENTE DE QUALQUER CONDIÇÃO, NEM MESMO O PAGAMENTO DE TAXA (ART. 5º, XXXIV, "B", DA CF/88);
2. INDEVIDO O CONDICIONAMENTO IMPOSTO PELO INSS, RELATIVO AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO, PARA A EXPEDIÇÃO DE CERTIDÃO REFERENTE A TEMPO DE SERVIÇO EFETIVAMENTE PRESTADO PELO REQUERENTE;
3. AGRAVO DE INSTRUMENTO IMPROVIDO." (AG nº 28638/CE, Relator Desembargador Federal Paulo Roberto de Oliveira Lima, j. 18/09/2001, DJ 13/11/2002, p. 1224).
Isto não impede, no entanto, que na certidão, a par de constar o tempo de serviço judicialmente declarado, seja também esclarecida a situação específica da segurada Maria de Lourdes da Silva quanto a ter ou não procedido ao recolhimento de contribuições ou efetuado o pagamento de indenização no período.
Por fim, no que tange ao trabalho rural exercido após o advento da Lei nº 8.213/91, sem registro em CTPS, pelo autor Carlos Alberto da Silva, exige-se o recolhimento de contribuições previdenciárias para que seja o respectivo período considerado para fins de aposentadoria por tempo de serviço. É de bom alvitre deixar claro que, em se tratando de segurado especial a que se refere o inciso VII do artigo 11 da Lei nº 8.213/91, tal recolhimento somente é exigível no caso de benefício previdenciário superior à renda mínima, a teor do disposto no artigo 26, inciso III, c.c. o artigo 39, inciso I, da mesma lei previdenciária. A respeito, traz-se à colação os seguintes trechos de julgados:
"O reconhecimento da atividade agrícola exercida no período posterior à edição da Lei n. 8.213/91, necessário ao implemento do intervalo correspondente à carência, não está sujeito ao recolhimento de contribuições previdenciárias, seja porque o inc. I do art. 39 da Lei de Benefícios não exige, para concessão de aposentadoria por idade rural, o respectivo aporte contributivo, seja porque o art. 55, § 2º, da Lei de Benefícios, que determina o recolhimento de contribuições para cômputo de tempo de serviço rural para efeito de carência, destina-se especificamente à aposentadoria por tempo de serviço." (TRF - 4ª Região; REO - Processo nº 200104010599660/PR, Relator Desembargador Federal Celso Kipper, j. 30/11/2004, DJU 12/01/2005, p. 860);
"O reconhecimento do tempo de serviço laborado na atividade rural, no período posterior a vigência da Lei nº 8.213/91, somente dispensa o recolhimento das contribuições previdenciárias se o benefício pleiteado for de renda mínima." (TRF - 5ª Região; AC nº 331859/RN, Relator Desembargador Federal Élio Wanderley de Siqueira Filho, j. 25/11/2004, DJ 28/02/2005, p. 596).
Desta forma, mantém-se o reconhecimento do tempo de serviço, entretanto com o esclarecimento de que somente poderá ser computado o período posterior ao advento da Lei n.º 8.213/91, para fins de aposentadoria por tempo de serviço ou outro benefício de valor superior à renda mínima, mediante o recolhimento das contribuições previdenciárias respectivas.
Em virtude da sucumbência, arcará o INSS com o pagamento dos honorários advocatícios, ora fixados em R$ 1.000,00 (um mil reais), de acordo com a orientação firmada pela 10ª Turma desta Corte Regional Federal.
É o voto.
Desembargadora Federal
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| Data e Hora: | 12/12/2017 19:37:30 |
