Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0004608-52.2020.4.03.6327
Relator(a)
Juiz Federal FLAVIA DE TOLEDO CERA
Órgão Julgador
1ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
14/12/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 26/12/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. LOAS (DEFICIENTE). SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DO
INSS. REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO PREENCHIDOS. RECURSO DO
INSS IMPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
1ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0004608-52.2020.4.03.6327
RELATOR:2º Juiz Federal da 1ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: DANIEL APARECIDO DE ASSIS
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0004608-52.2020.4.03.6327
RELATOR:2º Juiz Federal da 1ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: DANIEL APARECIDO DE ASSIS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
1. Trata-se de recurso interposto pelo INSS em face da sentença que JULGOU PROCEDENTE
o pedido, condenando o INSS a implantar o benefício assistencial de prestação continuada de
um salário mínimo, previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição da República, e instituído
pela Lei n° 8.742, de 07.12.93.
O INSS alega em apertada síntese o não preenchimento dos requisitos exigidos para a
concessão do benefício e requer a reforma da sentença para improcedência do pedido.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0004608-52.2020.4.03.6327
RELATOR:2º Juiz Federal da 1ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: DANIEL APARECIDO DE ASSIS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
2. Para fins de concessão do benefício assistencial, o conceito de grupo familiar deve ser obtido
mediante interpretação restrita das disposições contidas no § 1º, do art. 20, da Lei 8.742/93
com redação dada pela Lei n. 12.435/2011 para benefícios requeridos após 06.07.2011 e, nos
termos do art. 16, da Lei 8.8213/91 para benefícios requeridos antes de 06.07.2011, desde que
vivam sob o mesmo teto. (TNU – PEDILEF 00858405820064036301).
3. Os julgamentos proferidos na Reclamação n. 4374 e no Recurso Extraordinário n. 567.985,
pelo Supremo Tribunal Federal, permitiram aos juízes e tribunais, o exame do pedido da
concessão do benefício em comento fora dos parâmetros objetivos fixados pelo artigo 20 da
LOAS, podendo-se adotar o critério do valor de meio salário mínimo como referência para
aferição da renda familiar per capita. O critério de um quarto do salário mínimo utilizado pela
LOAS está completamente defasado e inadequado para aferir a miserabilidade das famílias,
que, de acordo com o artigo 203, parágrafo 5º, da Constituição, possuem o direito ao benefício
assistencial.
4. Nesse contexto, a Súmula 21 da Turma Regional de Uniformização prescreve: “Na
concessão do benefício assistencial, deverá ser observado como critério objetivo a renda per
capita de ½ salário mínimo gerando presunção relativa de miserabilidade, a qual poderá ser
infirmada por critérios subjetivos em caso de renda superior ou inferior a ½ salário mínimo."
5. Outrossim, no Recurso Extraordinário n. 580.963, o Supremo Tribunal Federal declarou a
inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 34, parágrafo único, da Lei
10.741/2003, por entender que devem ser descontados do cálculo da renda familiar também os
benefícios referentes ao amparo social ao deficiente e os decorrentes de aposentadoria apenas
no importe e um salário mínimo.
6. Aplica-se, ainda, a Súmula 22 da Turma Regional de Uniformização: “Apenas os benefícios
previdenciários e assistenciais no valor de um salário mínimo recebidos por qualquer membro
do núcleo familiar devem ser excluídos para fins de apuração da renda mensal per capita
objetivando a concessão de benefício de prestação continuada".
7. A despeito do conceito de grupo familiar, deve ser analisado, conforme recente entendimento
consolidado pela TRU o dever legal de prestação de alimentos pelos sucessores da parte
autora. Prescreve a SÚMULA Nº 23:"O benefício de prestação continuada (LOAS) é subsidiário
e para sua concessão não se prescinde da análise do dever legal de prestar alimentos previsto
no Código Civil "
8. Com efeito, o benefício de prestação continuada não se dirige àqueles que se encontram em
posição de pobreza, mas aos submetidos à condição de miséria, indigência ou extrema
pobreza. Isto porque, o benefício de prestação continuada serve para resgatar a pessoa da
miséria e não para complementar sua renda.
9. Com relação ao requisito da deficiência, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem
impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em
interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade
em igualdade de condições com as demais pessoas. Ademais, de acordo com a Súmula 48
TNU, a incapacidade não precisa ser permanente, devendo, no entanto, ter duração mínima de
dois anos, conforme determina o § 10 do artigo 20, da Lei n. 8.742/1993.
10. Nesse sentido, é a previsão da Súmula 48 da TNU, com nova redação alterada na sessão
de 25.4.2019 (DJe nº 40. DATA: 29/04/2019):
"Para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada, o conceito de
pessoa com deficiência, que não se confunde necessariamente com situação de incapacidade
laborativa, exige a configuração de impedimento de longo prazo com duração mínima de 2
(dois) anos, a ser aferido no caso concreto, desde o início do impedimento até a data prevista
para a sua cessação."
11.No presente caso, de acordo com o elencado pelo Juízo a quo em sua r. sentença recorrida,
observo que o requisito relativo à deficiência foi dispensado, tendo em vista tratar os autos de
pedido de restabelecimento de benefício e a sua cessação está relacionada unicamente à
renda familiar: “...Dispensada a realização de perícia médica, pois o benefício foi cessado em
razão da renda familiar, não havendo discussão acerca da presença do requisito subjetivo
(deficiência)...”
12. No que respeita à apuração da renda mensal familiar “per capita”, nos termos do acórdão do
Recurso Extraordinário nº 567.985 que declarou incidenter tantum a inconstitucionalidade
parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/1993, o Plenário do
Supremo Tribunal Federal declarou a necessidade de que seja analisado, em concreto e caso a
caso, a efetiva falta de meios para que o deficiente ou o idoso possa prover a própria
manutenção ou tê-la provida por sua família. Desse modo, deve-se analisar a situação concreta
da parte autora, verificando se ela ou a sua família têm condições de prover a subsistência de
forma digna, cabendo o benefício somente nos casos em que essa situação não esteja
presente.
13. Em relação ao requisito da miserabilidade, as informações contidas no laudo
socioeconômico (Documento n. 183006002), permitem verificar que, a parte autora, não possui
meios de prover sua subsistência, nem de tê-la provida pela sua família. Denota-se que, à
época da realização do estudo social, a renda per capita do grupo familiar (autora, pai e irmão)
era inferior a meio salário mínimo (RE 567.985). Assim, com base nas informações contidas no
relatório socioeconômico, verifico que a família é caracterizada como sendo de baixa renda,
público alvo de assistência em situação de risco pessoal e social sendo claramente notável
estado penúria, como bem descrito pelo Juízo a quo em sua r. sentença recorrida, in verbis:
“...Quanto ao requisito objetivo, qual seja, a hipossuficiência, na forma preconizada pela Lei
8.742/93, tenho que restou devidamente demostrada no caso dos autos.
O Laudo socioeconômico informa que o autor reside com a genitora Sueli Aparecida de Assis e
o padrasto Valdecir Francisco Alves, em imóvel locado por R$700,00, com 05 cômodos
contendo 01 banheiro, 02 quartos, 01 sala e 1 cozinha.(evento nº 28).
Consta do laudo que a genitora do autor "olha os netos para filha Ana Claudia de Assis
trabalhar ela ajuda apagar a metade do aluguel no valor de R$350,00 mensal e paga a água no
valor de R$130,00 mensal, o fiho Leandro Salis de Assis ajuda a pagar a luz no valor de
R$210,00 mensal."
As despesas foram orçadas em R$1.730,00 e a renda advém do cuidado dos netos pela
genitora (R$480,00) e do trabalho informal do padrasto (R$600,00)
Desta forma, diante da situação de pobreza em que o requerente vive, resta clara a situação de
hipossuficiente econômica.
Presentes todos os requisitos legais, a parte autora tem direito ao restabelecimento do benefício
de prestação continuada.
Diante do exposto, com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil, JULGO
PROCEDENTE o pedido para condenar o réu a restabelecer o benefício assistencial desde a
data da cessação em 02/06/2019...”
14. O parquet federal em seu parecer opinou pela procedência do pedido descrito na exordial
(Documento n. 183006006), nos seguintes termos:
“...De acordo com o estudo socioeconômico realizado, o grupo familiar da autora é composto
por três pessoas: o requerente, Daniel Aparecido; sua genitora e curadora, Sueli Aparecida de
Assis, 51 anos; e seu padrasto, Valdecir Francisco Alves, 55 anos.
Quanto aos meios de sobrevivência, o estudo dá conta de que a única renda familiar advém de
rendimentos informais do padrasto do requerente, no valor de R$ 600,00.
Desta feita, a renda per capita familiar atual é de R$ 200,00.
Todas as despesas apresentadas no estudo socieconômico são essenciais e indispensáveis a
subsistência da parte autora e sua família, não havendo qualquer item que possa ser
desconsiderado ou excluído a fim de adequar a renda.
A mãe do requerente teve que deixar o mercado de trabalho para acompanhar o requerente e,
ainda que os filhos Ana Cláudia e Leandro ajudem nas despesas da família, não são suficientes
para cobrir todas as despesas do grupo familiar.
O laudo social demonstra situação bastante precária da família, relata que reside em uma casa
simples, não possui automóvel, computador e os móveis são antigos.
Logo, patente a situação de miserabilidade da parte autora e de sua família, sendo que no
momento não há meios para proporcionar uma vida digna aos mesmos, bem como suprir suas
necessidades vitais.
Portanto, preenchidos os requisitos legais, de imediato surge a obrigação ao Estado de prestar
assistência ao deficiente.
Ante o exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL oficia pela PROCEDÊNCIA da presente
ação, para que seja concedido o benefício assistencial no valor de um salário mínimo ao
autor...”
Considero, pelo exposto, devidamente comprovado o requisito da hipossuficiência econômica.
15. Desse modo, as informações contidas no levantamento socioeconômico permitem concluir
que a parte autora não possui meios de prover sua manutenção com dignidade, nem de tê-la
provida por sua família. Considero, pelo exposto, devidamente comprovado o requisito da
hipossuficiência econômica.
16. A prestação da assistência social, através do benefício requerido, tem natureza não
contributiva e exige uma análise prévia e rigorosa das reais condições do requerente. O Estado
só deve ser obrigado a prestá-la quando cumpridos os requisitos legais, ou seja, a constatação
da incapacidade do requerente e efetiva comprovação de verdadeiro estado de
hipossuficiência.
17. A decisão de antecipação dos efeitos da tutela encontra-se amparada na legislação
aplicável (art. 4º da Lei 10.259/2001), havendo dano de difícil reparação a ser evitado, no caso,
a privação de recursos indispensáveis à subsistência da parte autora. Nesse caso, não cabe
atribuir efeito suspensivo ao recurso.
18. Ante o exposto, analisando o caso de acordo com os critérios acima delineados, nego
provimento ao recurso do INSS, mantendo a sentença recorrida, por seus próprios
fundamentos, conforme o artigo 46 da Lei nº 9.099/95 c/c artigo 1º, da Lei nº 10.259/01.
19. Condeno a parte ré ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o
valor da condenação, do proveito econômico obtido ou do valor atualizado da causa, conforme
art. 85, §3º, I, c/c §4, III, ambos do Código de Processo Civil/2015.
20. É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. LOAS (DEFICIENTE). SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DO
INSS. REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO PREENCHIDOS. RECURSO DO
INSS IMPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, Vistos, relatados e
discutidos estes autos eletrônicos, em que são partes as acima indicadas, decide a Primeira
Turma Recursal do Juizado Especial Federal Cível de São Paulo Seção Judiciária de São
Paulo, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto da Juíza Federal
Relatora. Participaram do julgamento os Senhores Juízes Federais: Flávia de Toledo Cera,
Fernando Moreira Gonçalves e Tatiana Pattaro Pereira., nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA