
| D.E. Publicado em 01/06/2015 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, dar parcial provimento à apelação da parte autora, nos termos do voto do Relator, com quem votou, com ressalva, o Desembargador Federal Newton De Lucca, vencida, parcialmente, a Desembargadora Federal Therezinha Cazerta, que lhe negava provimento.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000825-14.2013.4.03.6128/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Trata-se de apelação interposta pela parte autora em face de sentença que julgou improcedente o pedido de renúncia de benefício previdenciário, a fim de obter a concessão de aposentadoria mais vantajosa, consideradas as contribuições efetuadas posteriormente à benesse, com o aproveitamento do tempo e recolhimentos anteriores, sem a devolução das mensalidades anteriormente pagas.
Alega a parte autora, em síntese, que não existe vedação legal à renúncia de sua aposentadoria, em prol da obtenção de uma nova, mais vantajosa. Destarte, requer a reforma da r. sentença, com a condenação da autarquia, inclusive, ao pagamento de indenização por danos morais.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o relatório.
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Ab initio, não se há falar em decadência, vez que o caput do artigo 103 da Lei 8.213/91 tem aplicação aos casos de revisão de ato de concessão de benefício e, no caso concreto, a desaposentação consiste na renúncia de benefício que a parte autora vem recebendo para a concessão de uma nova aposentadoria mais vantajosa.
Entendo que o segurado da Previdência Social pode renunciar à aposentadoria que aufere e aproveitar o respectivo tempo de filiação para concessão de benefício mais vantajoso.
Explico.
Primeiramente, não há óbice constitucional. Nenhuma regra da Carta Magna é contrariada se aceitarmos a possibilidade de o segurado se desfazer de sua aposentadoria e aproveitar o tempo total de filiação em contagem para novo benefício.
Outrossim, a legislação ordinária não disciplina nem veda a desaposentação, motivo pelo qual o segurado tem o direito de dispor do que lhe pertence, ou seja, de seu próprio patrimônio.
Ad argumentandum tantum, o artigo 5º, inciso XXXVI da Constituição Federal impede apenas que uma lei nova altere ato já consumado, contudo não impede ao titular de direito disponível de renunciar ato jurídico, desfazendo seus efeitos até então produzidos, possibilitando o recebimento de benefício com renda mensal inicial mais favorável.
Observo, apenas, que tendo em vista que a aposentadoria é um direito fundamental, esculpido no art. 7º, inciso XXIV, da Constituição Federal, sua renúncia somente pode ser admitida se implicar em uma situação mais favorável ao segurado, fato que ocorre com a desaposentação, visto que a renúncia ao beneficio tem como fim a imediata obtenção de um novo benefício, porém, mais vantajoso.
Convém lembrar que a irreversibilidade e irrenunciabilidade das aposentadorias por idade e por tempo de contribuição não decorrem de legislação ordinária, mas de Decreto Executivo (artigo 181-B do Decreto 3.048/99, na redação do Decreto 3.265/99). Todavia, Decreto não pode restringir direito, nem impedir exercício de faculdade do titular do direito sem a necessária previsão legal, sob pena de extrapolar o campo normativo a ele reservado. Somente a lei ordinária (artigo 5º, inciso II da Constituição Federal) poderia estabelecer restrições como irreversibilidade ou irrenunciabilidade de benefício concedido. Se a lei previdenciária, como é o caso, não estabelece tais restrições, o benefício não pode ser tido por irrenunciável nem irreversível. Estabelecendo condição não permitida pela lei, o decreto extrapolou os limites da lei que deveria regulamentar e, portanto, não se aplica.
A possibilidade de a parte autora obter sua "desaposentadoria" não é impedida nem pela redação do artigo 18, § 2º da Lei 8.213/91, in verbis: "o aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social - RGPS que permanecer em atividade sujeita a este Regime, ou a ele retornar, não fará jus a prestação alguma da Previdência Social em decorrência do exercício dessa atividade, exceto ao salário-família e à reabilitação profissional, quando empregado".
In casu, apenas quis o legislador esclarecer ao "aposentado" que, caso ele queira permanecer em atividade laboral, não terá acesso a qualquer outro provento do INSS, em função desse trabalho, ressalvadas as exceções supramencionadas.
No que tange à devolução das prestações do benefício antes recebido, é descabida, visto que a renúncia à aposentadoria tem natureza desconstitutiva, apenas produzindo efeitos "ex nunc", de acordo com o Egrégio Superior Tribunal de Justiça (AgRg no RESP nº 328.101/SC, 6ª Turma, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJ 20/10/08; RESP nº 663.336/MG, 5ª Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJ 07/02/08, pág.1).
Além disso, a aposentadoria anterior, caso não haja prova em contrário, foi concedida através do preenchimento dos requisitos necessários para tanto e de forma lícita e regular, tendo o beneficiário usufruído das respectivas mensalidades com caráter alimentar, próprio do provento de natureza previdenciária.
Assim, se não há legislação que determine a compensação, entendo que esta não pode ser condição necessária para a renúncia almejada e concessão de benefício com valor mais proveitoso.
Ademais, não há de se falar em prejuízo à seguridade social, vez que os valores anteriormente pagos a título de aposentadoria ingressaram regularmente no patrimônio do segurado enquanto esteve aposentado. Não podem ser tidos como enriquecimento sem causa do segurado em detrimento da previdência. Considere-se que a nova aposentadoria será conquistada pelas contribuições do segurado em período posterior à aposentadoria que está renunciando.
O princípio da solidariedade no custeio não justifica que o segurado tenha de devolver as prestações da aposentadoria usufruída. Em maior parte dos casos, é praticamente impossível ao segurado, de modo que sua exigência torna impraticável a efetivação do direito reconhecido judicialmente.
Nesse sentido, trago à colação as seguintes ementas da Corte Especial:
Consigno, ainda, recente julgado da Terceira Seção desta Egrégia Corte:
Cabe, portanto, a renúncia da aposentadoria da parte autora, com aproveitamento de todo o tempo de contribuição, bem como o recálculo e pagamento, pelo INSS, de benefício mais vantajoso (art. 122 da Lei 8.213/91), sem exigência de devolução dos valores percebidos até a data inicial da nova aposentadoria.
Por conseguinte, para que seja alcançada a desaposentação, faz-se necessário o preenchimento cumulativo de alguns requisitos: i) que o segurado esteja em gozo de uma aposentadoria; ii) que o segurado renuncie de forma expressa ao seu direito a essa aposentadoria; iii) que o segurado preencha todos os requisitos para a obtenção de nova aposentadoria, de acordo com a legislação vigente à época de seu pedido.
No caso em testilha, a parte autora demonstrou, por meio da carta de concessão acostada à fl. 26, que lhe foi deferida aposentadoria por tempo de contribuição, em 23.10.1998, tendo permanecido em atividade posteriormente, inclusive, recolhendo periodicamente contribuições previdenciárias, conforme documentos de fls. 28/34.
Assim, uma vez implementados os requisitos, é de se reconhecer o direito da parte autora de renunciar ao primeiro jubilamento, sem a necessidade de devolução dos valores recebidos a esse título, e à concessão de nova aposentadoria, contando-se as contribuições recolhidas após o primeiro ato de aposentação.
Quanto ao termo inicial, à falta de apresentação de requerimento administrativo, a data de início do benefício deve ser a da citação do INSS, sendo esse o entendimento predominante neste Tribunal (AC nº 1999.03.99.027774-9/SP, 2ª Turma, v.u., rel. Des. Fed. Célio Benevides, j. 25.4.2000, DJU 26.7.2000, Seção 2, p. 126).
No que respeita à apuração do valor do benefício e dos seus reajustes, cumpre ao INSS, respeitada a regra do artigo 53 da Lei 8213/91, utilizando-se as contribuições recolhidas após a aposentação.
Os valores percebidos após o termo inicial do novo benefício devem ser compensados.
Com relação às custas processuais, o art. 8º da Lei 8.620, de 05.01.93, assim dispõe:
Apesar do STJ entender que o INSS goza de isenção no recolhimento de custas processuais, perante a Justiça Federal, nos moldes do dispositivo legal supramencionado, a Colenda 5ª Turma deste Egrégio Tribunal tem decidido que, não obstante a isenção da autarquia federal, consoante o art. 9º, I, da Lei 6032/74 e art. 8º, § 1º, da Lei 8620/93, se ocorreu o prévio recolhimento das custas processuais pela parte contrária, o reembolso é devido, a teor do art. 14, § 4º, da Lei 9.289/96, salvo se esta estiver amparada pela gratuidade da Justiça.
De conseguinte, em sendo a parte autora beneficiária da justiça gratuita deixo de condenar o INSS ao reembolso das custas processuais, porque nenhuma verba a esse título foi paga pela parte autora e a autarquia federal é isenta e nada há a restituir.
Quanto à verba honorária, fixo-a em 10% (dez por cento), considerados a natureza, o valor e as exigências da causa, conforme art. 20, §§ 3º e 4º, do CPC, sobre as parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula 111 do STJ.
Com relação à correção monetária e aos juros de mora, determino a observância dos critérios contemplados no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, de acordo com a Resolução nº 267/2013, de 02 de dezembro de 2013, do Conselho da Justiça Federal.
Passo à análise do pedido de danos morais.
Nesse tópico, a questão atém-se à averiguação da existência, ou não, de responsabilidade do Estado pela não concessão da desaposentação ao autor em sede administrativa.
Neste contexto, mister se faz apresentarmos inicialmente as características que cercam a responsabilidade civil do Estado.
A responsabilidade civil do Estado já recebia tratamento constitucional na Carta Política pretérita, assim dispondo:
A Constituição vigente seguiu a mesma orientação, com redação mais abrangente, incluindo-se a responsabilidade das pessoas de direito privado prestadoras de serviços públicos, assim estatuindo:
O dispositivo constitucional em comento adotou a responsabilidade civil objetiva da Administração, sob a modalidade do risco administrativo.
Neste sentido, extraímos da lição de HELY LOPES MEIRELLES que:
Genericamente, os pressupostos da responsabilidade objetiva - independente da natureza dos danos ocasionados, se materiais ou morais - são: i) ação ou omissão de um agente público ou de pessoa de direito privado, prestadoras de serviços públicos, no exercício de suas atribuições ou a pretexto de exercê-las; ii) dano experimentado pela vítima; iii) nexo de causalidade entre a ação ou omissão e o dano provocado.
Verificamos assim que não constitui requisito para configuração da responsabilidade objetiva a culpa ou dolo do agente, bastando a lesão, sem o concurso do lesado.
Devemos ressaltar que, embora em quaisquer das modalidades de dano (material ou moral) o administrado esteja dispensado da produção de prova da culpa do Poder Público pelo fato lesivo, a Administração pode ter sua responsabilidade excluída ou atenuada em função de determinadas causas, conforme veremos no tópico seguinte.
Extraímos do magistério de MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO que "sendo a existência do nexo de causalidade o fundamento da responsabilidade civil do Estado, esta deixará de existir ou incidirá de forma atenuada quando o serviço público não for a causa do dano ou quando estiver aliado a outras circunstâncias, ou seja, quando não for a causa única".
Com efeito, convém observar que o princípio da responsabilidade objetiva do Estado pode ser visto como decorrência do princípio da solidariedade, uma vez que a ideia norteadora do instituto é a de indenizar sempre, sem indagação a respeito da culpa: se a sociedade se beneficia da prestação de um serviço público e esse acaba por lesar o patrimônio pessoal ou econômico do cidadão, nada mais coerente que essa mesma sociedade assuma os danos causados.
Diante desse contexto, as causas excludentes ou atenuantes da responsabilidade pública são:
a) força maior, consistente em "acontecimento imprevisível, inevitável e estranho à vontade das partes, como uma tempestade, um terremoto, um raio"; ou
b) culpa da vítima, exclusiva ou concorrente, o que elide, respectivamente, a responsabilidade total ou parcial do Estado.
Sobre a exclusão ou atenuação da responsabilidade objetiva do Estado, adverte o mestre HELY LOPES MEIRELLES que "a teoria do risco administrativo, embora dispense a prova de culpa da Administração, permite que o Poder Público demonstre a culpa da vítima para excluir ou atenuar a indenização".
Em suma, em se tratando de responsabilidade objetiva, embora não seja necessário que a vítima demonstre culpa da Administração, esta última pode excluir ou reduzir sua responsabilidade pelo evento danoso se demonstrar que o mesmo se deu por caso fortuito ou por culpa exclusiva ou concorrente da vítima.
Perquirindo inicialmente os contornos do dano moral, temos que essa modalidade de dano tem natureza extrapatrimonial, atingindo valores espirituais ou morais, como a honra, a paz, a liberdade física, a tranqüilidade de espírito, a reputação, a beleza etc.
Esse nosso entendimento vem estribado na doutrina de Arnaldo Rizzardo:
Ademais, para a configuração do dano moral, há que existir a dor, o vexame, a humilhação, sendo que não há demonstração de que o autor tenha passado por situações humilhantes ou vexatórias, não bastando ao requerente mencionar que sofreu humilhações em face do benefício ter sido indeferido.
Outrossim, a necessidade de ajuizamento de ação para reconhecimento de seu direito ao benefício pleiteado é uma contingência própria de um direito, que por muitas vezes, se mostra controvertido, não dando ensejo à indenização por dano moral.
Desse modo, não se pode extrair que houve uma conduta irresponsável do INSS, que lhe possa impor uma indenização por dano moral, até mesmo porque, como já afirmamos acima, não se pode considerar qualquer dissabor como dano moral. Ainda mais em se tratando de indeferimento administrativo do pedido em sede administrativa.
Nesse sentido, confiram-se os seguintes julgados:
Em suma, não havendo prova do dano moral sofrido, não faz jus o autor, à indenização por danos morais pretendida.
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.
É o voto.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 19/05/2015 17:10:48 |
