Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5004745-53.2017.4.03.6100
Relator(a)
Desembargador Federal VANESSA VIEIRA DE MELLO
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
26/10/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 29/10/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. DEVOLUÇÃO DE VALORES. CORREÇÃO MONETÁRIA E MULTA DE
MORA. LEI N. 10.522/2002. INAPLICABILIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- Não incide o disposto aos valores cobrados na presente ação o disposto no art. 37-A da Lei n.
10.522/2002, no tocante ao acréscimo de juros e multa de mora, calculados nos termos e na
forma da legislação aplicável aos tributos federais os créditos das autarquias e fundações
públicas federais, de qualquer natureza, não pagos nos prazos previstos na legislação.
- Tal lei dispõe sobre o Cadastro Informativo dos créditos cobrados pela Administração em função
do Poder de Império, não quitados de órgãos e entidades federais e dá outras providências,
sendo certo que o débito objeto de ressarcimento na presente ação não possui natureza
tributária, não relacionado ao inadimplemento de tributo (art. 3º do CTN), ao contrário, traduz
débito de natureza civil decorrente de ato ilícito apurado em regular processo administrativo.
- Pelo princípio da especificidade das leis, de rigor a incidência da Lei n. 8.213/91 que regula
expressamente a matéria correlata aos benefícios previdenciários.
- Fica mantida a condenação do INSS a pagar honorários de advogado, com percentual majorado
para 12% (doze por cento) sobre a condenação, excluindo-se as prestações vencidas após a data
da sentença, consoante Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça e critérios do artigo 85, §§
1º, 2º, 3º, I, e 11, do CPC.
- Apelação desprovida.
Acórdao
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5004745-53.2017.4.03.6100
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANDREIA APARECIDA DE OLIVEIRA
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5004745-53.2017.4.03.6100
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANDREIA APARECIDA DE OLIVEIRA
R E L A T Ó R I O
Cuida-se de apelação interposta em face de sentença que condenou a ré ao pagamento da
importância recebida no períodos de 1º/2/2007 a 31/8/2011, a título de amparo social sob NB
87/131.677.530-2, e fixou os juros de mora a partir da citação e a correção monetária nos termos
do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela
Resolução n. 267 de 2/12/2013.
Em suas razões de apelação, a autarquia federal requer a reforma da sentença, apenas quanto
aos consectários legais, calculados nos termos e na forma da legislação do aplicável aos tributos
federais.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5004745-53.2017.4.03.6100
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANDREIA APARECIDA DE OLIVEIRA
V O T O
Conheço do recurso porque presentes os requisitos de admissibilidade.
Com esteio em processo administrativo regularmente instaurado e embasado no poder-dever de
autotutela, com obediência aos princípios do contraditório e da ampla defesa, em que se apurou
débito e procedeu-se à cobrança administrativa de valores pagos indevidamente nos períodos de
1º/1/2007 a 31/8/2011, a título de benefício de amparo social, o INSS ajuizou a presente ação de
cobrança.
O INSS requereu a declaração de existência do enriquecimento sem causa e o consectário dever
da ré em ressarcir ao Erário a quantia indevidamente percebida, condenando-o ao pagamento do
valor percebido, corrigido monetariamente e acrescido de juros de mora, afastada a prescrição da
pretensão de ressarcimento, haja vista a existência de ato ilícito cometido pela ré, o que justifica a
aplicação da regra imposta pelo art. 37, §5° da Constituição Federal de 1988.
O extrato do Cadastro Nacional de Informações Sociais – CNIS demonstra que a ré, de fato,
iniciou o exercício de atividade laborativa na empresa “URANET PROJETOS E SISTEMAS
LTDA” a partir de 9/3/2006, mesmo se encontrando em gozo, na época, de benefício cuja
concessão pressupunha, além da miserabilidade, a incapacidade para a vida independente e
para o trabalho, nos termos do artigo 20 da Lei n. 8.742/1993, antes da redação dada pela Lei n.
12.435/2011.
Remanesceria à ré comprovar a boa-fé no recebimento das parcelas cobradas. Ocorre que,
embora notificada pelo INSS no processo administrativo que culminou na cobrança do benefício
assistencial, a ré deixou de apresentar defesa.
Sobreveio sentença de procedência do pedido, com atualização dos débitos de conformidade
com o Manual de Cálculos da Justiça Federal.
Os fatos narrados são incontroversos, requerendo o INSS em sua apelação a incidência do art.
37-A da Lei n. 10.522/2002:
“Art. 37-A. Os créditos das autarquias e fundações públicas federais, de qualquer natureza, não
pagos nos prazos previstos na legislação, serão acrescidos de juros e multa de mora, calculados
nos termos e na forma da legislação aplicável aos tributos federais.” (Incluído pela Lei nº 11.941,
de 2009)
O débito objeto de ressarcimento na presente ação não possui natureza tributária, não
relacionado ao inadimplemento de tributo (art. 3º do CTN), ao contrário traduz débito de natureza
civil decorrente de ato ilícito apurado em processo administrativo.
Embora o artigo 37-A da Lei indicada faça menção a créditos de autarquias federais de qualquer
natureza, do cotejo do ordenamento jurídico em vigor e partindo-se de uma interpretação
teleológica da norma, que leva em conta os fins sociais a que ela se dirige e às exigências do
bem comum (art. 5º, LINDB), de rigor seja afastada a incidência da Selic para atualização de
valor de jaez correlato ao objeto de cobrança nesta ação.
Isso porque a Lei 10.522/2002 é lei especial que trata especificamente do CADIN, cadastro
informativo dos créditos não pagos no prazo legal, não podendo revogar lei geral (lei 8.213/1991).
Tais créditos referem-se à prestação obrigatória exigida pelo Estado, no exercício de sua
soberania, em razão do seu poder de império, como são os tributos, conotação à qual não se
amolda o débito objeto dos autos.
Aliás, a Lei n. 11.941/2009, que incluiu o art. 37-A na Lei 10.522/2002, dispõe sobre parcelamento
ordinário de débitos tributários, remissão nos casos em que especifica, institui regime tributário de
transição a partir da instalação do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais e dá outras
providências.
Ou seja, a legislação em comento trata especificamente de créditos de natureza tributária, não
sendo aplicável ao caso.
Pelo princípio da especificidade das leis, de rigor a incidência da Lei 8.213/1991 que regula
expressamente a matéria correlata aos benefícios previdenciários.
Outrossim, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento no sentido da
interpretação sistemática do ordenamento jurídico pátrio, em observância à absoluta simetria de
tratamento entre as partes. Assim, se quando condenado o INSS à concessão de benefício
previdenciário deve atualizar os valores atrasados nos termos do Manual de Orientação para
Cálculos da Justiça Federal, não pode o segurado ser condenado ao pagamento do débito
relativo a valores pagos indevidamente pelo INSS a título de benefício previdenciário por índices
diversos.
De mesmo modo, inaplicável a multa de mora nos moldes impostos pela Lei n. 9.430/1996, que
dispõe sobre a legislação tributária federal, as contribuições para a seguridade social, o processo
administrativo de consulta e dá outras providências.
Confira-se a jurisprudência:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO.
BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO CONCEDIDO MEDIANTE FRAUDE. RESSARCIMENTO DE
VALORES. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. SELIC INDEVIDA. NATUREZA NÃO
TRIBUTÁRIA DO CRÉDITO. JUROS DE MORA A PARTIR DA DATA DO EVENTO DANOSO.
SÚMULA 54 DO STF. I. Em se tratando de ressarcimento, via ação regressiva, de valores
recebidos pelo segurado em concessão fraudulenta de benefício previdenciário, não se aplica o
art.37-A da Lei 10.522/2002. Por não terem natureza de crédito tributário, sobre as parcelas a
serem restituídas ao INSS descabe a incidência da SELIC para atualizar o montante devido. II. A
restituição de valores indevidamente recebidos se enquadra no conceito de responsabilidade civil,
e não de dívida ativa tributária, por estar ausente a "certeza" quanto ao débito. Para o fim de
reaver os valores pretendidos, o INSS deve se valer de ação condenatória para formação do título
executivo, conforme precedentes do STJ. Nesse sentido, o julgamento do RESP 1.350.804-PR,
na sistemática dos recursos representativos de controvérsia. III. Para atualização monetária dos
valores, deve ser aplicado o INPC, na forma do art.175 do Decreto 3.048/1999, de acordo com o
Manual de Orientações e Procedimentos para Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela
Resolução do CJF. IV. Em se tratando de ressarcimento de valores recebidos indevidamente a
título de benefício previdenciário concedido mediante fraude, os juros de mora incidem a partir do
evento danoso, na forma do art.398 do CC/002 e da Súmula 54 do STJ. V. Recurso parcialmente
provido. (TRF 3ª Região, NONA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2095131 - 0015233-
34.2013.4.03.6120, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL MARISA SANTOS, julgado em
27/03/2019, e-DJF3 Judicial 1 DATA:10/04/2019)
“ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE COBRANÇA. INSS. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO.
APOSENTADORIA CONCEDIDA MEDIANTE FRAUDE. RESTITUIÇÃO. CABIMENTO.
CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS. 1. Lide envolvendo a cobrança da quantia relativa ao
benefício previdenciário de aposentadoria, concedido de 07.2005 a 10.2011 ao réu. Alegou o
INSS ter instaurado procedimento administrativo para apuração de irregularidade, asseguradas a
ampla defesa e o contraditório, em que se constatou a utilização de vínculo empregatício fictício e
cômputo de salários inverídicos, razão pela qual concluiu pela cessação do benefício e o
ressarcimento ao erário da quantia indevidamente paga ao beneficiário. 2. Evidenciado o
recebimento indevido do benefício por fraude, constatada a utilização de vínculos empregatícios
fictícios de empresa que se encontrava desde 1994 inapta, inexistindo registros de recolhimento
dessa para a Previdência Social nem qualquer informação de registro de empregados no
Ministério do Trabalho. Ainda, inexistiu qualquer dúvida plausível sobre a interpretação, validade
ou incidência da norma infringida, no momento da edição do ato que determinou a concessão de
aposentadoria por tempo de contribuição, tampouco houve interpretação razoável, embora
errônea, da lei pela Administração, no momento da concessão do benefício de maneira indevida,
com base em vínculos laborais inexistentes. Desse modo, impõe-se o seu ressarcimento pelo réu,
a despeito de se tratar a verba, quando recebida, de natureza alimentar. 3. O art. 154 do Decreto
n. 3.048/99 trata das hipóteses de desconto da renda mensal do benefício do segurado, enquanto
seu § 2º, que determina a atualização dos valores pelo mesmo índice utilizado no reajuste dos
benefícios previdenciários, aplica-se à hipótese prevista no inciso II do referido artigo, relativo aos
"pagamentos de benefícios além do devido, observado o disposto nos§§ 2º ao 5º". Não é esse o
caso dos autos, uma vez que não haverá desconto na renda do réu, por ter sido o benefício
cessado, sendo a hipótese de restituição da totalidade dos valores pagos pela autarquia
previdenciária. 4. O art. 37-Ana Lei n. 10.522/2002 determina que o acréscimo de juros e multa de
mora, em relação aos créditos das autarquias federais, siga a legislação aplicável aos tributos
federais, somente teria aplicação para aqueles valores devidos e não pagos nos prazos legais,
não se enquadrando o ressarcimento de valores pagos de forma indevida ao particular, como
neste feito. Inaplicáveis, pois, os índices pretendidos pelo INSS em sua apelação. (g.n.) 5.
Apelações não providas.” (TRF/2ªR, AC 01489535820154025117, 8ª Turma Especializada, j. 26
de outubro de 2016, Rel. Des. Fed. Marcelo Pereira da Silva)
Com efeito, de rigor a manutenção da sentença que determinou a incidência da correção
monetária e juros de mora nos moldes do Manual da Justiça Federal.
Fica mantida a condenação do INSS a pagar honorários de advogado, cujo percentual majoro
para 12% (doze por cento) sobre a condenação, excluindo-se as prestações vencidas após a data
da sentença, consoante Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça e critérios do artigo 85, §§
1º, 2º, 3º, I, e 11, do CPC.
Todavia, na fase de execução, o percentual deverá ser reduzido se o valor da condenação ou do
proveito econômico ultrapassar 200 (duzentos) salários mínimos (art. 85, § 4º, II, do CPC).
Diante do exposto, nego provimento à apelação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. DEVOLUÇÃO DE VALORES. CORREÇÃO MONETÁRIA E MULTA DE
MORA. LEI N. 10.522/2002. INAPLICABILIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- Não incide o disposto aos valores cobrados na presente ação o disposto no art. 37-A da Lei n.
10.522/2002, no tocante ao acréscimo de juros e multa de mora, calculados nos termos e na
forma da legislação aplicável aos tributos federais os créditos das autarquias e fundações
públicas federais, de qualquer natureza, não pagos nos prazos previstos na legislação.
- Tal lei dispõe sobre o Cadastro Informativo dos créditos cobrados pela Administração em função
do Poder de Império, não quitados de órgãos e entidades federais e dá outras providências,
sendo certo que o débito objeto de ressarcimento na presente ação não possui natureza
tributária, não relacionado ao inadimplemento de tributo (art. 3º do CTN), ao contrário, traduz
débito de natureza civil decorrente de ato ilícito apurado em regular processo administrativo.
- Pelo princípio da especificidade das leis, de rigor a incidência da Lei n. 8.213/91 que regula
expressamente a matéria correlata aos benefícios previdenciários.
- Fica mantida a condenação do INSS a pagar honorários de advogado, com percentual majorado
para 12% (doze por cento) sobre a condenação, excluindo-se as prestações vencidas após a data
da sentença, consoante Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça e critérios do artigo 85, §§
1º, 2º, 3º, I, e 11, do CPC.
- Apelação desprovida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
