Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5171645-27.2021.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
03/02/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 09/02/2022
Ementa
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO DE DECLARAÇÃO DE INEXIGIBILIDADE. VALORES
RECEBIDOS A TÍTULO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ALTERAÇÃO DA COMPOSIÇÃO DO
GRUPO FAMILIAR. RESSARCIMENTO INDEVIDO.TEMA 979 DO STJ. BOA FÉ OBJETIVA.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- É assegurada à Administração Pública a possibilidade de revisão dos atos por ela praticados,
com base no seu poder de autotutela, conforme se observa, respectivamente, das Súmulas n.º
346 e 473 do Supremo Tribunal Federal.
- O Superior Tribunal de Justiça, ao analisar o Tema 979 (REsp 1.381.734/RN), fixou a seguinte
tese: "Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados, decorrentes de erro administrativo
(material ou operacional) não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela
administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% do valor do
benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do
caso concreto, comprove sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era
possível constatar o pagamento indevido."
- A respeito especificamente do conceito de boa-fé objetiva, conforme definido pela Exma.
Ministra Nancy Andrighi no julgamento do Recurso Especial nº 803.481/GO, “esta se apresenta
como uma exigência de lealdade, modelo objetivo de conduta, arquétipo social pelo qual impõe o
poder-dever de que cada pessoa ajuste a própria conduta a esse arquétipo, agindo como agiria
uma pessoa honesta, escorreita e leal” (REsp 803.481/GO, Terceira Turma, julgado em
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
28/06/2007).
- O benefício assistencial de prestação continuada ou amparo social encontra assento no art. 203,
V, da Constituição Federal, tendo por objetivo primordial a garantia de renda à pessoa deficiente
e ao idoso com idade igual ou superior a 65 (sessenta e cinco anos) em estado de carência dos
recursos indispensáveis à satisfação de suas necessidades elementares, bem assim de
condições de tê-las providas pela família.
- Cabe à autarquia previdenciária a revisão/avaliação da continuidade das condições que lhe
garantiram a concessão do benefício, nos termos do art. 21 da Lei n.º 8.742/93.
- Efetivamente, nota-se que houve alteração da composição do grupo familiar, porém, não se
vislumbra a ocorrência de má-fé da parte ré, tendo em vista que cabe à autarquia proceder à
revisão bienal do benefício, nos termos da Lei n. 8.742/93, a fim de averiguar se permanecem ou
não satisfeitos os requisitos necessários para a manutenção do benefício.
- Ainda, ressalte-se que ao tempo da concessão do benefício oautor atendia os requisitos legais
exigidos pela legislação previdenciária.
- Com efeito, não há nenhum indício de que a parte autora praticou qualquer ato fraudulento em
detrimento do INSS, razão pela qual ante a ausência de sua comprovação nos autos, não há
como se imputar qualquer conduta ilícita ao recorrido, tampouco má-fé na percepção do
benefício.
- Sendo assim, constatada a boa-fé objetiva da parte autora, nos termos do decidido no Tema
979 pelo STJ, inexigível a cobrança do débito pelo INSS.
- Os honorários advocatícios deverão ser fixados na liquidação do julgado, nos termos do inciso
II, do § 4º, c.c. §11, do artigo 85, do CPC/2015, a incidir, a teor da Súmula 111 do E. STJ sobre
as parcelas vencidas até a sentença de procedência.
- Apelação improvida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5171645-27.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANDRE FOGACA, DIRCE BRANCO FOGACA
Advogado do(a) APELADO: MARCELO BASSI - SP204334-N
Advogado do(a) APELADO: MARCELO BASSI - SP204334-N
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5171645-27.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANDRE FOGACA, DIRCE BRANCO FOGACA
Advogado do(a) APELADO: MARCELO BASSI - SP204334-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação ajuizada por André Fogaça, representado por sua genitora/curadora Dirce
Branco Fogaça, sendo esta também requerente, em face do Instituto Nacional do Seguro
Social, visando a declaração da inexistência de débito, com a cessação dos descontos
efetuados no benefício de pensão por morte recebido por sua genitora e respectiva devolução
dos valores já descontados.
Foi deferida a antecipação da tutela, para determinar que a autarquia requerida se abstenha de
proceder os descontos do benefício recebido pela autora DIRCE BRANCO FOGAÇA, relativa
ao débito em questão, até ordem judicial contrária (id Num. 210199879).
A r. sentença julgou procedente o pedido para declarar a inexigibilidade do débito previdenciário
advindo da cobrança n.º 107.882.796-3 no valor de R$91.895,98 e condenando o INSS a
extinguir as cobranças de 30% feitas sobre o benefício previdenciário de Pensão por Morte da
coautora Dirce Branco Fogaça. Ainda, condenou oINSS também a restituir as parcelas
cobradas erroneamente da autora Dirce Branco Fogaça, acrescidasdos consectários que
especifica. Condenada a autarquia ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10%
(dez) por cento sobre o valor atualizado da condenação, devendo ser observado a Súmula 111,
do E.STJ.
Inconformada, apela a autarquia, em que alega a legitimidade de desconto no benefício
previdenciário por força do disposto no artigo 115, inciso II da Lei 8.213/91. Aduz restar
demonstrada a legalidade da cobrança, tendo em vista ter sido apurado que o autor não se
enquadrava mais nos termos necessários para a concessão do benefício assistencial, estando
ausente a boa-fé objetiva. Prequestiona a matéria para efeitos recursais.
Subiram os autos a esta instância para decisão.
Parecer do MPF pelo improvimento da apelação do INSS (id Num. 216545535).
É o sucinto relato.
ab
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5171645-27.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANDRE FOGACA, DIRCE BRANCO FOGACA
Advogado do(a) APELADO: MARCELO BASSI - SP204334-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Inicialmente, tempestivo o recurso e respeitados os demais pressupostos de admissibilidade
recursais, passo ao exame da matéria objeto de devolução.
Trata-se de ação visando a declaração de inexigibilidade de débito cobrado pelo INSS, em
decorrência da alteração do grupo familiar, tendo em vista que a representante legal de André
Fogaça obteve a concessão do benefício de pensão por morte NB 21/132.335.189-0 em
05/10/2004, bem como obteve aposentadoria por invalidez NB 32/505.464.181-1 em
20/02/2005, passando a renda do grupo familiar a ultrapassar 1/4 do salário-mínimo,
contrariando o artigo 20, §3° da Lei 8742/93.
Assim, ante a omissão da informação ao INSS de superação das condições que deram origem
ao benefício em tela, pretende a autarquia a devolução referente ao período de 01/03/2006 a
31/12/2015.
PODER DEVER DE AUTOTUTELA DA ADMINISTRAÇÃO.
É assegurada à Administração Pública a possibilidade de revisão dos atos por ela praticados,
com base no seu poder de autotutela, conforme se observa, respectivamente, das Súmulas n.º
346 e 473 do Supremo Tribunal Federal:
"A administração pública pode declarar a nulidade de seus próprios atos".
"A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam
ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou
oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação
judicial".
Também é pacífico o entendimento de que a mera suspeita de irregularidade, sem o regular
procedimento administrativo, não implica suspensão ou cancelamento unilateral do benefício,
por ser um ato perfeito e acabado. Aliás, é o que preceitua o artigo 5º, LV, da Constituição
Federal, ao consagrar como direito e garantia fundamental, o princípio do contraditório e da
ampla defesa, in verbis:
"Aos litigantes em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são
assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes".
Ainda, o art. 115, II, da lei 8213/91 impõe à autarquia a cobrança dos valores pagos
indevidamente, identificados em regular processo administrativo, sem comprovação na CTPS e
no CNIS.
DO ATO ILÍCITO
Todo aquele que cometer ato ilícito, fica obrigado a reparar o dano proveniente de sua conduta
ou omissão.
Confira-se o disposto no art. 186, do Código Civil:
“Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito
e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”
Ainda sobre o tema objeto da ação, dispõem os artigos 876, 884 e 927 do Código Civil de 2002:
“Art. 876. Todo aquele que recebeu o que lhe não era devido fica obrigado a restituir; obrigação
que incumbe àquele que recebe dívida condicional antes de cumprida a condição.”
“Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a
restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.”
“Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187). causar dano a outrem. fica obrigado a
repará-lo.”
No que concerne à Previdência Social, é prevista no artigo 115 da Lei n. 8.213/91 a autorização
do INSS para descontar de benefícios os valores outrora pagos indevidamente:
"Art. 115. Podem ser descontados dos benefícios: [...] II – pagamento de benefício além do
devido; [...] § 1º Na hipótese do inciso II, o desconto será feito em parcelas, conforme dispuser
o regulamento, salvo má-fé”.
Também, no Decreto n. 3.048/99:
“Art. 154. O Instituto Nacional do Seguro Social pode descontar da renda mensal do benefício:
[...] II – pagamentos de benefícios além do devido, observado o disposto nos §§ 2º ao 5º; [...] §
2º A restituição de importância recebida indevidamente por beneficiário da previdência so-cial,
nos casos comprovados de dolo, fraude ou má-fé, deverá ser atualizada nos moldes do art.
175, e feita de uma só vez ou mediante acordo de parcelamento na forma do art. 244,
independentemente de outras penalidades legais. (Redação dada pelo Decreto n. 5.699/06).”
DEVOLUÇÃO OU NÃO DE VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ
O e. Superior Tribunal de Justiça, ao analisar o Tema 979 (REsp 1.381.734/RN), cuja questão
levada a julgamento foi a “Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de
benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da
Administração da Previdência Social”, fixou a seguinte tese:
"Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados, decorrentes de erro administrativo
(material ou operacional) não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela
administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% do valor do
benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do
caso concreto, comprove sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era
possível constatar o pagamento indevido."
Extrai-se da tese fixada, portanto, que, para a eventual determinação de devolução de valores
recebidos indevidamente, decorrente de erro administrativo diverso de interpretação errônea ou
equivocada da lei, faz-se necessária a análise da presença, ou não, de boa-fé objetiva em sua
percepção.
A respeito especificamente do conceito de boa-fé objetiva, conforme definido pela Exma.
Ministra Nancy Andrighi no julgamento do Recurso Especial nº 803.481/GO, “esta se apresenta
como uma exigência de lealdade, modelo objetivo de conduta, arquétipo social pelo qual impõe
o poder-dever de que cada pessoa ajuste a própria conduta a esse arquétipo, agindo como
agiria uma pessoa honesta, escorreita e leal” (REsp 803.481/GO, Terceira Turma, julgado em
28/06/2007).
Por seu turno, leciona Carlos Roberto Gonçalves que “Guarda relação com o princípio de direito
segundo o qual ninguém pode beneficiar-se da própria torpeza. Recomenda ao juiz que
presuma a boa-fé, devendo a má-fé, ao contrário, ser provada por quem a alega. Deve este, ao
julgar demanda na qual se discuta a relação contratual, dar por pressuposta a boa-fé objetiva,
que impõe ao contratante um padrão de conduta, de agir com retidão, ou seja, com probidade,
honestidade e lealdade, nos moldes do homem comum, atendidas as peculiaridades dos usos e
costumes do lugar” (Direito Civil Brasileiro, volume 3: contratos e atos unilaterais, Saraiva, 2013,
10ª ed., p. 54/61).
DO CASO DOS AUTOS
Da análise dos autos, se constata que o autor André Fogaça, incapaz, representado por sua
mãe, Dirce Branco Fogaça, requereu e obteve, perante o INSS, o Benefício Assistencial de
Prestação Continuada (LOAS) – NB 87/107.882.796-3, com DIB 13/07/1999.
Através de regular processo administrativo, a equipe de monitoramento de Benefícios da APS
de BOITUVA – GEX SOROCABA, promoveu revisão administrativa, identificando indícios de
irregularidades na manutenção do benefício assistencial, ante a alteração da renda per capita
do grupo familiar, assim resumida:
“ (...)
5. Em consulta aos sistemas para efeito de averiguar renda dos componentes do grupo familiar
do titular, verificamos:
- a Representante legal estava em benefício de auxílio-doença desde 14/11/2002 e que em
01/02/2005 foi concedida a Aposentadoria por Invalidez (fl. 15);
- o genitor do titular – Ismael Fogaça, possuía inscrição como “motorista” desde 31/10/2002 (fl.
23), com recolhimentos no período 10/2002 a 02/2003 (22). Em 08/04/2003 requereu e obteve
auxílio-doença até 25/09/2003 (fl. 21) e, posteriormente, em 09/12/2003 até a data de seu óbito
em 05/10/2004 – NB 131.323.542-0 (fl. 19), que por consequência, gwrou a Pensão Por Morte
21/132.335.189-0 concedida a Representante Legal do titular – Dirce Branco Fogaça;
- a irmã Joyce de Jesus Fogaça possui vínculos em certos períodos (fl. 24);
- a irmã do titular Carin Elen Fogaça possui vínculos até a presente data (fl. 25).
6. Assim, somando-se a renda dos componentes do grupo familiar, constata-se a superação
das condições que deram origem ao benefício, que consiste em renda percapta maior que ¼ do
Salário Mínimo.
(...)
11. Diante do exposto, concluímos que a concessão foi regular, no entanto, a manutenção do
benefício em tela está irregular, sendo indevido desde 31/10/2002 data em que consta atividade
do genitor e recolhimentos em decorrência desta atividade, em face do prazo prescricional, o
objeto de cobrança se dará a partir de 01/03/2006 até 31/12/2015, sendo a última competência
recebida pela Representante Legal do titular e que esta é responsável em face da condição
declarada de ser o titular do benefício incapaz civilmente (fl.43). (id Num. 210199858 - Pág.
71/72).
Assim, pretende a autarquia a restituição dos valores pagos ao réu referente ao período de
01/03/2006 a 31/12/2015, no valor de R$91.895,98 para 09/2016 (id Num. 210199858 - Pág.
68/70).
Passo ao mérito.
O benefício assistencial de prestação continuada ou amparo social encontra assento no art.
203, V, da Constituição Federal, tendo por objetivo primordial a garantia de renda à pessoa
deficiente e ao idoso com idade igual ou superior a 65 (sessenta e cinco anos) em estado de
carência dos recursos indispensáveis à satisfação de suas necessidades elementares, bem
assim de condições de tê-las providas pela família:
"Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de
contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
..........................................................
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei.".
Por outro lado, cabe à autarquia previdenciária a revisão/avaliação da continuidade das
condições que lhe garantiram a concessão do benefício, nos termos do art. 21 da Lei n.
8.742/93, que dispõe sobre a organização da Assistência Social:
"Art. 21. O benefício de prestação continuada deve ser revisto a cada 2 (dois) anos para
avaliação da continuidade das condições que lhe deram origem.
§ 1º O pagamento do benefício cessa no momento em que forem superadas as condições
referidas no caput, ou em caso de morte do beneficiário.
§ 2º O benefício será cancelado quando se constatar irregularidade na sua concessão ou
utilização.
§ 3oO desenvolvimento das capacidades cognitivas, motoras ou educacionais e a realização de
atividades não remuneradas de habilitação e reabilitação, entre outras, não constituem motivo
de suspensão ou cessação do benefício da pessoa com deficiência.
§ 4º A cessação do benefício de prestação continuada concedido à pessoa com deficiência não
impede nova concessão do benefício, desde que atendidos os requisitos definidos em
regulamento.
Art. 21-A. O benefício de prestação continuada será suspenso pelo órgão concedente quando a
pessoa com deficiência exercer atividade remunerada, inclusive na condição de
microempreendedor individual.
§ 1oExtinta a relação trabalhista ou a atividade empreendedora de que trata o caput deste
artigo e, quando for o caso, encerrado o prazo de pagamento do seguro-desemprego e não
tendo o beneficiário adquirido direito a qualquer benefício previdenciário, poderá ser requerida a
continuidade do pagamento do benefício suspenso, sem necessidade de realização de perícia
médica ou reavaliação da deficiência e do grau de incapacidade para esse fim, respeitado o
período de revisão previsto no caput do art. 21.
§ 2oA contratação de pessoa com deficiência como aprendiz não acarreta a suspensão do
benefício de prestação continuada, limitado a 2 (dois) anos o recebimento concomitante da
remuneração e do benefício".
Efetivamente, nota-se que houve alteração da composição do grupo familiar, em especial
decorrente da percepção de benefício pela representante legal do autor.
Porém, não se vislumbra a ocorrência de má-fé do autor, tendo em vista que cabe à autarquia
proceder à revisão bienal do benefício, nos termos do referido diploma legal (art. 21 da Lei n.
8.742/93), a fim de averiguar se permanecem ou não satisfeitos os requisitos necessários para
a manutenção do benefício.
Para tanto, denota-se que a autarquia procedeu à revisão do benefício em 27/05/2004 e ali
concluído pelo direito à sua manutenção, ante a permanência do preenchimento dos requisitos
legais (id Num. 210199857 - Pág. 280).
Ainda, ressalte-se que ao tempo da concessão do benefício o autoratendia os requisitos legais
exigidos pela legislação previdenciária.
Com efeito, não há nenhum indício de que a parte autora praticou qualquer ato fraudulento em
detrimento do INSS, razão pela qual ante a ausência de sua comprovação nos autos, não há
como se imputar qualquer conduta ilícita ao recorrido, tampouco má-fé na percepção do
benefício.
Nesse sentido, o parecer exarado pelo representante do parquet:
"(...)
Ocorre que as verbas previdenciárias, especialmente em casos como o que ora se analisa, por
possuírem natureza alimentar, e mais, tendo sido recebidas de boa-fé, são insusceptíveis de
restituição, ainda quando se tenha concluído, posteriormente, que o pagamento ocorreu de
forma indevida.
Isso porque, consoante inconteste nos autos, não foi ocultada nenhuma informação do INSS,
sendo a própria autarquia responsável pelo deferimento administrativo e pagamento dos
benefícios, não havendo sequer indício de que tenha havido fraude, simulação ou conluio do
beneficiário com terceiros.
Ademais, a autarquia previdenciária possui todas as informações da genitora referentes à
concessão dos benefícios de pensão por morte e de aposentadoria e respectivos valores.
Assim, competia ao INSS efetuar o cruzamento de dados e tomar as providências necessárias,
especialmente, porquanto a Lei 8.742/1993, em seu artigo 21, dispõe que “O benefício de
prestação continuada deve ser revisto a cada 2 (dois) anos para avaliação da continuidade das
condições que lhe deram origem”." (IDNum. 216545535).
Sendo assim, constatada a boa-fé objetiva da parte autora, nos termos do decidido no Tema
979 pelo STJ, inexigível a cobrança do débito pelo INSS.
Ressalte-se, por fim, que não há que se falar em declaração de inconstitucionalidade do art.
115 Lei 8.213/91, senão interpretação sistemática dos dispositivos legais que integram o
ordenamento jurídico pátrio, em face do entendimento aqui externado.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Com o advento do novo Código de Processo Civil, foram introduzidas profundas mudanças no
princípio da sucumbência, e em razão destas mudanças e sendo o caso de sentença ilíquida, a
fixação do percentual da verba honorária deverá ser definida somente na liquidação do julgado,
com observância ao disposto no inciso II, do § 4º c.c. § 11, ambos do artigo 85, do CPC/2015,
bem como o artigo 86, do mesmo diploma legal.
Os honorários advocatícios a teor da Súmula 111 do E. STJ incidem sobre as parcelas vencidas
até a sentença de procedência.
PREQUESTIONAMENTO
Cumpre salientar, diante de todo o explanado, que a r. sentença não ofendeu qualquer
dispositivo legal, não havendo razão ao prequestionamento suscitado pelo Instituto Autárquico.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, nego provimento à apelação, observando-se os honorários advocatícios na
forma acima fundamentada.
É o voto.
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO DE DECLARAÇÃO DE INEXIGIBILIDADE. VALORES
RECEBIDOS A TÍTULO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ALTERAÇÃO DA COMPOSIÇÃO DO
GRUPO FAMILIAR. RESSARCIMENTO INDEVIDO.TEMA 979 DO STJ. BOA FÉ OBJETIVA.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- É assegurada à Administração Pública a possibilidade de revisão dos atos por ela praticados,
com base no seu poder de autotutela, conforme se observa, respectivamente, das Súmulas n.º
346 e 473 do Supremo Tribunal Federal.
- O Superior Tribunal de Justiça, ao analisar o Tema 979 (REsp 1.381.734/RN), fixou a seguinte
tese: "Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados, decorrentes de erro
administrativo (material ou operacional) não embasado em interpretação errônea ou equivocada
da lei pela administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30%
do valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado,
diante do caso concreto, comprove sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que
não lhe era possível constatar o pagamento indevido."
- A respeito especificamente do conceito de boa-fé objetiva, conforme definido pela Exma.
Ministra Nancy Andrighi no julgamento do Recurso Especial nº 803.481/GO, “esta se apresenta
como uma exigência de lealdade, modelo objetivo de conduta, arquétipo social pelo qual impõe
o poder-dever de que cada pessoa ajuste a própria conduta a esse arquétipo, agindo como
agiria uma pessoa honesta, escorreita e leal” (REsp 803.481/GO, Terceira Turma, julgado em
28/06/2007).
- O benefício assistencial de prestação continuada ou amparo social encontra assento no art.
203, V, da Constituição Federal, tendo por objetivo primordial a garantia de renda à pessoa
deficiente e ao idoso com idade igual ou superior a 65 (sessenta e cinco anos) em estado de
carência dos recursos indispensáveis à satisfação de suas necessidades elementares, bem
assim de condições de tê-las providas pela família.
- Cabe à autarquia previdenciária a revisão/avaliação da continuidade das condições que lhe
garantiram a concessão do benefício, nos termos do art. 21 da Lei n.º 8.742/93.
- Efetivamente, nota-se que houve alteração da composição do grupo familiar, porém, não se
vislumbra a ocorrência de má-fé da parte ré, tendo em vista que cabe à autarquia proceder à
revisão bienal do benefício, nos termos da Lei n. 8.742/93, a fim de averiguar se permanecem
ou não satisfeitos os requisitos necessários para a manutenção do benefício.
- Ainda, ressalte-se que ao tempo da concessão do benefício oautor atendia os requisitos legais
exigidos pela legislação previdenciária.
- Com efeito, não há nenhum indício de que a parte autora praticou qualquer ato fraudulento em
detrimento do INSS, razão pela qual ante a ausência de sua comprovação nos autos, não há
como se imputar qualquer conduta ilícita ao recorrido, tampouco má-fé na percepção do
benefício.
- Sendo assim, constatada a boa-fé objetiva da parte autora, nos termos do decidido no Tema
979 pelo STJ, inexigível a cobrança do débito pelo INSS.
- Os honorários advocatícios deverão ser fixados na liquidação do julgado, nos termos do inciso
II, do § 4º, c.c. §11, do artigo 85, do CPC/2015, a incidir, a teor da Súmula 111 do E. STJ sobre
as parcelas vencidas até a sentença de procedência.
- Apelação improvida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento ao recurso de apelação, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
