Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0011208-12.2015.4.03.6183
Relator(a)
Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
13/05/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 18/05/2021
Ementa
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO
PREVIDENCIÁRIO. VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE A TÍTULO DE BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. BOA FÉ OBJETIVA. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS INDEVIDOS.
- Trata-se de ação ajuizada contra o INSS objetivando a anulação de débito apurado em razão da
percepção indevida do benefício assistencial.
- É assegurada à Administração Pública a possibilidade de revisão dos atos por ela praticados,
com base no seu poder de autotutela, conforme se observa, respectivamente, das Súmulas n.º
346 e 473 do Supremo Tribunal Federal.
- O Superior Tribunal de Justiça, ao analisar o Tema 979 (REsp 1.381.734/RN), fixou a seguinte
tese: "Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados, decorrentes de erro administrativo
(material ou operacional) não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela
administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% do valor do
benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do
caso concreto, comprove sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era
possível constatar o pagamento indevido."
- A respeito especificamente do conceito de boa-fé objetiva, conforme definido pela Exma.
Ministra Nancy Andrighi no julgamento do Recurso Especial nº 803.481/GO, “esta se apresenta
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
como uma exigência de lealdade, modelo objetivo de conduta, arquétipo social pelo qual impõe o
poder-dever de que cada pessoa ajuste a própria conduta a esse arquétipo, agindo como agiria
uma pessoa honesta, escorreita e leal” (REsp 803.481/GO, Terceira Turma, julgado em
28/06/2007).
- In casu, a controvérsia cinge-se à cobrança pelo INSS dos valores recebidos a título de
benefício de prestação continuada, no interregno de 15.09.10 a 31.03.11, em que autor
encontrava-se recolhido à prisão.
- Como fundamento para a cessação do benefício, o INSS embasou-se na Instrução Normativa n°
20/INSS/PRES, cujo artigo 623, parágrafo 3º, estabelece que o beneficiário recluso não fará jus
ao Benefício de Prestação Continuada, uma vez que a sua manutenção está sendo provida pelo
Estado.
- Conquanto o ato normativo indicado não encontre mesma previsão em Lei ou na Constituição
Federal, de fato, identifica situação de inexistência de miserabilidade do preso, requisito para a
concessão da benesse.
- Todavia, o montante auferido pelo autor enquanto esteve preso, no período de 15/09/2010 a
31/03/2011, não deve ser devolvido ao INSS.
- No cotejo dos valores em conflito, com base no princípio da razoabilidade (art. 489, §1º, CPC), o
desenvolvimento dos valores fundamentais, como a igualdade substancial, intrínseca à dignidade
da pessoa humana deve sobrepujar a regra de que ninguém pode alegar desconhecimento da lei
prevista do art. 3º da LINDB, embasada no princípio constitucional da segurança jurídica.
- Nesse contexto, é possível extrairdos autos que o autor não desbordou de seu de dever de
lealdade, ao revés, não detinha conhecimentos acerca da existência de instrução normativa que
vedava o recebimento do benefício, donde se reconhece a boa-fé no recebimento dos valores
pagos a título de benefício assistencial durante o período de encarceramento e que são objeto de
cobrança pelo INSS, inviabilizando a restituição dos valores à Autarquia.
- Manutenção da determinação de cessação da cobrança dos valores recebidos a título de
beneficio assistencial pelo autor no período de reclusão e da devolução ao autor daquilo que
parcialmente pagou.
- Indevidos honorários advocatícios à Defensoria Pública quando atua contra pessoa jurídica de
direito público a qual pertença. Súmula 421, do C. STJ e representativo de controvérsia REsp/STJ
1.108.013/RJ.
- Apelação do INSS desprovida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0011208-12.2015.4.03.6183
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CARLOS ALBERTO DE LIMA
Advogado do(a) APELADO: PATRICIA DE ALMEIDA PINTO - SP408086
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0011208-12.2015.4.03.6183
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CARLOS ALBERTO DE LIMA
Advogado do(a) APELADO: PATRICIA DE ALMEIDA PINTO - SP408086
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação em ação ajuizada em 30.11.15 em face do INSS, objetivando a
declaração de inexigibilidade de débito cumulada com condenatória de restabelecimento de
benefício de prestação continuada e restituição de valores, cessado em virtude do
encarceramento do autor. Valor da causa R$ 49.920,34.
Concedida a tutela antecipada, sobreveio sentença julgando parcialmente procedente o pedido
para determinar a cessação da cobrança pelo INSS dos valores relativos ao benefício de
prestação continuada pagos ao autor de 15.09.10 a 31.03.11 e condenar o INSS a implantar o
benefício de amparo social desde a citação em 01.03.16 e devolver o que o autor pagou no
montante de R$ 2.000,00. Concedida a tutela específica para cessar de imediato a cobrança de
valores e implantar o benefício no prazo de 15 dias úteis. Correção monetária pelo Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal e juros de mora à razão de
6% ao mês da citação. Sem condenação do INSS em honorários advocatícios porque o autor
está representado pela Defensoria Pública Federal (AGRESP 1397109). Sem remessa oficial.
Apela o INSS e requer o sobrestamento do feito por se tratar de tema repetitivo 979. Alega a
legalidade da cessação do benefício quando do encarceramento do autor e da cobrança dos
valores por ele recebidos de 15.09.10 a 31.03.11.
Com contrarrazões.
O MPF opina pelo desprovimento do apelo do INSS.
É o relatório.
ks
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0011208-12.2015.4.03.6183
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CARLOS ALBERTO DE LIMA
Advogado do(a) APELADO: PATRICIA DE ALMEIDA PINTO - SP408086
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Tempestivo o apelo e presentes os demais requisitos de admissibilidade recursal.
SOBRESTAMENTO
Considerando o julgamento do mérito do tema repetitivo 979 pelo C. STJ em 10.03.21, não há
que se falar em sobrestamento do feito, notadamente porque o julgado indicado tem eficácia
imediata, sem previsão de efeito suspensivo a eventual recurso contra ele interposto.
DOS FATOS
Narra o autor, nascido em 05.07.61, que, sendo portador do vírus HIV, conforme atestado
médico que instrui, teve deferido benefício de prestação continuada, por meio de ação judicial
transitada em julgado.
Todavia, preso em 15.09.10, o INSS cancelou o benefício em 31.03.11 e lhe cobra os valores
pagos indevidamente durante sua custódia, no total de R$ 4.580,34.
O autor efetuou o pagamento de R$ 2.000,00, mas alega não dispor de meios para quitar o
restante.
Aduz fazer jus ao benefício de prestação continuada e parcelas atrasadas desde 31.03.11 e
restituição do valor pago pelo autor, ao argumento de que, presentes seus requisitos, o
acolhimento em sistema carcerário não é impeditivo à concessão, por ausência de previsão
legal e inconstitucionalidade do §3º, do art. 623, da IN 20/INSS/PRES, que afronta ao disposto
no art. 203, da Constituição Federal, o qual dispõe que a assistência social será prestada a
quem dela necessitar. Alega, ainda, irrepetibilidade dos valores dada sua natureza alimentar e
boa-fé no recebimento. Pediu a concessão de tutela de urgência.
PODER DEVER DE AUTOTUTELA DA ADMINISTRAÇÃO.
É assegurada à Administração Pública a possibilidade de revisão dos atos por ela praticados,
com base no seu poder de autotutela, conforme se observa, respectivamente, das Súmulas n.º
346 e 473 do Supremo Tribunal Federal:
"A administração pública pode declarar a nulidade de seus próprios atos".
"A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam
ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou
oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação
judicial".
Também é pacífico o entendimento de que a mera suspeita de irregularidade, sem o regular
procedimento administrativo, não implica suspensão ou cancelamento unilateral do benefício,
por ser um ato perfeito e acabado. Aliás, é o que preceitua o artigo 5º, LV, da Constituição
Federal, ao consagrar como direito e garantia fundamental, o princípio do contraditório e da
ampla defesa, in verbis:
"Aos litigantes em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são
assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes".
Ainda, o art. 115, II, da lei 8213/91 impõe à autarquia a cobrança dos valores pagos
indevidamente, identificados em regular processo administrativo, sem comprovação na CTPS e
no CNIS.
DO ATO ILÍCITO
Todo aquele que cometer ato ilícito, fica obrigado a reparar o dano proveniente de sua conduta
ou omissão.
Confira-se o disposto no art. 186, do Código Civil:
“Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito
e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”
Ainda sobre o tema objeto da ação, dispõem os artigos 876, 884 e 927 do Código Civil de 2002:
“Art. 876. Todo aquele que recebeu o que lhe não era devido fica obrigado a restituir; obrigação
que incumbe àquele que recebe dívida condicional antes de cumprida a condição.”
“Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a
restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.”
“Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187). causar dano a outrem. fica obrigado a
repará-lo.”
No que concerne à Previdência Social, é prevista no artigo 115 da Lei n. 8.213/91 a autorização
do INSS para descontar de benefícios os valores outrora pagos indevidamente:
"Art. 115. Podem ser descontados dos benefícios: [...] II – pagamento de benefício além do
devido; [...] § 1º Na hipótese do inciso II, o desconto será feito em parcelas, conforme dispuser
o regulamento, salvo má-fé”.
Também, no Decreto n. 3.048/99:
“Art. 154. O Instituto Nacional do Seguro Social pode descontar da renda mensal do benefício:
[...] II – pagamentos de benefícios além do devido, observado o disposto nos §§ 2º ao 5º; [...] §
2º A restituição de importância recebida indevidamente por beneficiário da previdência so-cial,
nos casos comprovados de dolo, fraude ou má-fé, deverá ser atualizada nos moldes do art.
175, e feita de uma só vez ou mediante acordo de parcelamento na forma do art. 244,
independentemente de outras penalidades legais. (Redação dada pelo Decreto n. 5.699/06).”
DEVOLUÇÃO OU NÃO DE VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ
O e. Superior Tribunal de Justiça, ao analisar o Tema 979 (REsp 1.381.734/RN), cuja questão
levada a julgamento foi a “Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de
benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da
Administração da Previdência Social”, fixou a seguinte tese:
"Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados, decorrentes de erro administrativo
(material ou operacional) não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela
administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% do valor do
benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do
caso concreto, comprove sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era
possível constatar o pagamento indevido."
Extrai-se da tese fixada, portanto, que, para a eventual determinação de devolução de valores
recebidos indevidamente, decorrente de erro administrativo diverso de interpretação errônea ou
equivocada da lei, faz-se necessária a análise da presença, ou não, de boa-fé objetiva em sua
percepção.
A respeito especificamente do conceito de boa-fé objetiva, conforme definido pela Exma.
Ministra Nancy Andrighi no julgamento do Recurso Especial nº 803.481/GO, “esta se apresenta
como uma exigência de lealdade, modelo objetivo de conduta, arquétipo social pelo qual impõe
o poder-dever de que cada pessoa ajuste a própria conduta a esse arquétipo, agindo como
agiria uma pessoa honesta, escorreita e leal” (REsp 803.481/GO, Terceira Turma, julgado em
28/06/2007).
Por seu turno, leciona Carlos Roberto Gonçalves que “Guarda relação com o princípio de direito
segundo o qual ninguém pode beneficiar-se da própria torpeza. Recomenda ao juiz que
presuma a boa-fé, devendo a má-fé, ao contrário, ser provada por quem a alega. Deve este, ao
julgar demanda na qual se discuta a relação contratual, dar por pressuposta a boa-fé objetiva,
que impõe ao contratante um padrão de conduta, de agir com retidão, ou seja, com probidade,
honestidade e lealdade, nos moldes do homem comum, atendidas as peculiaridades dos usos e
costumes do lugar” (Direito Civil Brasileiro, volume 3: contratos e atos unilaterais, Saraiva, 2013,
10ª ed., p. 54/61).
DO CASO DOS AUTOS
O INSS não se insurgiu contra a concessão do benefício assistência desde a citação em 2016,
e o autor não interpôs recurso da parte da sentença que reconheceu a legalidade do ato da
administração que cessou o benefício assistencial, por ausente o requisito de situação de
miserabilidade quando do recolhimento à prisão.
Destarte, a controvérsia cinge-se à cobrança pelo INSS dos valores recebidos a título de
benefício de prestação continuada de 15.09.10 a 31.03.11, em que autor encontrava-se
recolhido à prisão e recebeu o benefício.
Como fundamento para a cessação do benefício, o INSS embasa-se na Instrução Normativa n°
20/INSS/PRES, cujo artigo 623, parágrafo 3º, dispõe:
"O requerente ou beneficiário recluso, devidamente comprovado por órgão carcerário, não fará
jus ao Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social BPC-LOAS, uma vez que a sua
manutenção está sendo provida pelo Estado. Não se aplica o mesmo quando o requerente ou
beneficiário estiver em regime de abrigo na forma do § 1° deste artigo".
Conforme ressaltou a magistrada de piso na sentença, a cessação do beneficio fundou-se em
ato normativo infralegal, que embora não encontre mesma previsão na Lei ou Constituição
Federal, de fato, identifica situação de inexistência de miserabilidade do preso quando do
recolhimento, donde não desborda dos ditames legais.
Isso porque, considerando que o benefício assistencial destina-se à pessoa que não possua
meios de prover a própria manutenção nem tê-la provida por sua família, com o recolhimento e
promoção da subsistência do preso pelo próprio Estado, afastada está a situação de
miserabilidade.
Todavia, há que se verificar se o montante auferido pelo autor enquanto esteve preso, no
período de 15/09/2010 a 31/03/2011, deve ser devolvido ao INSS.
Nesse passo, a cláusula geral da boa-fé pode ser indicada como janela aberta pelo legislador
para o aplicador do direito, caso a caso, promovendo a eficácia vertical dos direitos
fundamentais, com a incidência dos princípios constitucionais nas relações entre particular e o
Estado.
Nesse contexto, sopesando os valores em conflito, com base no princípio da razoabilidade (art.
489, §1º, CPC), o desenvolvimento dos valores fundamentais, como a igualdade substancial,
intrínseca à dignidade da pessoa humana deve sobrepujar a regra de que ninguém pode alegar
desconhecimento da lei, que se embasa no princípio da segurança jurídica.
Com efeito, deve prevalecer a norma que tutela a dignidade da pessoa humana e a igualdade
substancial, no tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais.
Sobre o tema, ensina Flávio Tartuce: “(...) Trata-se do superprincípio ou principio dos princípios
como se afirma em sentido geral. A proteção da dignidade humana, a partir do modelo de Kant,
constitui o principal fundamento da personalização do Direito Civil, da valorização da pessoa
humana em detrimento do patrimônio.” (Manual de Direito Civil, 2015, p. 54).
Nesse contexto, é possível extrair-se dos autos que o autor não desbordou de seu de dever de
lealdade, ao revés, não detinha conhecimentos acerca da existência de instrução normativa que
vedava o recebimento do benefício quando de seu recolhimento ao cárcere, donde se
reconhece a boa-fé no recebimento dos valores pagos a título de benefício assistencial durante
o período de 15.09.10 a 31.03.11 e que são objeto de cobrança pelo INSS, inviabilizando a
restituição dos valores à Autarquia.
Como salientou a magistrada de primeiro grau: “...o benefício assistencial foi cessado com base
em ato infralegal, não sendo crível que o autor tivesse conhecimento de que o simples
recolhimento à prisão pudesse ser causa impeditiva para o recebimento do amparo.”
Em face do explanado, de rigor a manutenção da determinação de cessação da cobrança dos
valores recebidos a título de beneficio assistencial pelo autor no período de 15.09.10 a 31.03.11
e a devolução ao autor daquilo que parcialmente pagou, conforme se observa da Guia da
Previdência Social, no valor de R$ 2.000,00, na forma da sentença.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Com esteio na Súmula 421, do C. STJ, representativo de controvérsia REsp/STJ 1.108.013/RJ
e, ainda, AGresp/STJ 1397109, não são devidos honorários advocatícios à Defensoria Pública
quando atua contra pessoa jurídica de direito público a qual pertença.
Sem custas à autarquia, em face da isenção prevista em lei.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS, fixados os honorários advocatícios na
forma acima fundamentada.
É o voto.
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO
PREVIDENCIÁRIO. VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE A TÍTULO DE BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. BOA FÉ OBJETIVA. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS INDEVIDOS.
- Trata-se de ação ajuizada contra o INSS objetivando a anulação de débito apurado em razão
da percepção indevida do benefício assistencial.
- É assegurada à Administração Pública a possibilidade de revisão dos atos por ela praticados,
com base no seu poder de autotutela, conforme se observa, respectivamente, das Súmulas n.º
346 e 473 do Supremo Tribunal Federal.
- O Superior Tribunal de Justiça, ao analisar o Tema 979 (REsp 1.381.734/RN), fixou a seguinte
tese: "Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados, decorrentes de erro
administrativo (material ou operacional) não embasado em interpretação errônea ou equivocada
da lei pela administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30%
do valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado,
diante do caso concreto, comprove sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que
não lhe era possível constatar o pagamento indevido."
- A respeito especificamente do conceito de boa-fé objetiva, conforme definido pela Exma.
Ministra Nancy Andrighi no julgamento do Recurso Especial nº 803.481/GO, “esta se apresenta
como uma exigência de lealdade, modelo objetivo de conduta, arquétipo social pelo qual impõe
o poder-dever de que cada pessoa ajuste a própria conduta a esse arquétipo, agindo como
agiria uma pessoa honesta, escorreita e leal” (REsp 803.481/GO, Terceira Turma, julgado em
28/06/2007).
- In casu, a controvérsia cinge-se à cobrança pelo INSS dos valores recebidos a título de
benefício de prestação continuada, no interregno de 15.09.10 a 31.03.11, em que autor
encontrava-se recolhido à prisão.
- Como fundamento para a cessação do benefício, o INSS embasou-se na Instrução Normativa
n° 20/INSS/PRES, cujo artigo 623, parágrafo 3º, estabelece que o beneficiário recluso não fará
jus ao Benefício de Prestação Continuada, uma vez que a sua manutenção está sendo provida
pelo Estado.
- Conquanto o ato normativo indicado não encontre mesma previsão em Lei ou na Constituição
Federal, de fato, identifica situação de inexistência de miserabilidade do preso, requisito para a
concessão da benesse.
- Todavia, o montante auferido pelo autor enquanto esteve preso, no período de 15/09/2010 a
31/03/2011, não deve ser devolvido ao INSS.
- No cotejo dos valores em conflito, com base no princípio da razoabilidade (art. 489, §1º, CPC),
o desenvolvimento dos valores fundamentais, como a igualdade substancial, intrínseca à
dignidade da pessoa humana deve sobrepujar a regra de que ninguém pode alegar
desconhecimento da lei prevista do art. 3º da LINDB, embasada no princípio constitucional da
segurança jurídica.
- Nesse contexto, é possível extrairdos autos que o autor não desbordou de seu de dever de
lealdade, ao revés, não detinha conhecimentos acerca da existência de instrução normativa que
vedava o recebimento do benefício, donde se reconhece a boa-fé no recebimento dos valores
pagos a título de benefício assistencial durante o período de encarceramento e que são objeto
de cobrança pelo INSS, inviabilizando a restituição dos valores à Autarquia.
- Manutenção da determinação de cessação da cobrança dos valores recebidos a título de
beneficio assistencial pelo autor no período de reclusão e da devolução ao autor daquilo que
parcialmente pagou.
- Indevidos honorários advocatícios à Defensoria Pública quando atua contra pessoa jurídica de
direito público a qual pertença. Súmula 421, do C. STJ e representativo de controvérsia
REsp/STJ 1.108.013/RJ.
- Apelação do INSS desprovida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
