Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5000850-41.2018.4.03.6006
Relator(a)
Desembargador Federal NERY DA COSTA JUNIOR
Órgão Julgador
3ª Turma
Data do Julgamento
15/07/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 16/07/2021
Ementa
E M E N T A
DIREITO ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. DESCONTO
INDEVIDO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO FRAUDULENTO
EM DETRIMENTO DA PARTE AUTORA. PRIVAÇÃO DE VERBA ALIMENTAR. DANO MORAL
CONFIGURADO. APELO PARCIALMENTE PROVIDO.
01. O cerne da controvérsia diz respeito à aferição da responsabilidade civil do INSS, por danos
morais, em virtude dos descontos indevidos efetuados sobre as parcelas do benefício
previdenciário de aposentadoria por idade da autora, mediante a formalização de empréstimo
consignado fraudulento em seu nome.
02. A doutrina pátria adotou a teoria da responsabilidade civil objetiva, no que concerne às
entidades de direito púbico, com fulcro no risco administrativo, a partir do qual prescinde da
comprovação da culpa do agente ou da má prestação do serviço, bastando-se a demonstração
do nexo de causalidade entre a conduta perpetrada pelo agente público e o dano sofrido pela
vítima, à luz do art. 37, §6º da Constituição Federal, reproduzido nos arts. 43 e 927 do diploma
civil.
03. Nos casos de omissão da Administração Pública, a jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 841.526/RS, com repercussão geral
reconhecida, estabeleceu que a responsabilidade civil do Estado por omissão também está
fundamentada no art. 37, §6º da Constituição Federal. Assim, tanto as ações comissivas ou
omissivas do Estado requerem a verificação do preenchimento do nexo de causalidade, embora
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
existam situações que rompam este nexo, quais sejam: o caso fortuito, a força maior e a culpa
exclusiva da vítima ou de terceiros.
04. No presente caso, restou configurada a conduta omissiva do INSS, ao deixar de aferir a
existência de autorização pelo beneficiário para cumprimento de seus deveres legais, atinentes à
operacionalização e repasse dos valores, conforme estabelecidos na Lei nº 10.820/2003. Ao
deixar de fiscalizar os empréstimos fraudulentamente consignados em nome da autora, restou
configurado o nexo de causalidade entre a conduta omissiva perpetrada pela autarquia
previdenciária e os danos suportados pela autora, que deixou de usufruir de sua principal fonte de
renda, tendo em vista se tratar o benefício de aposentadoria por idade.
05. Nesse ponto, cumpre mencionar que a jurisprudência desta Corte Regional tem reconhecido a
responsabilidade civil objetiva do INSS pelo dever de conferência da autorização dos descontos
realizados nos proventos de seus segurados e do dever institucional de regulamentação da
operacionalidade e funcionalidade dos sistemas relacionados a tais pagamentos.
06. É cedido que tal benefício se reveste de natureza alimentar, de sorte que a privação dos
rendimentos, ainda que de parcela deles, transborda a esfera do mero aborrecimento, o que
justifica a condenação por danos morais. Inclusive, a jurisprudência do STJ tem dispensado o
detalhamento do abalo psíquico (nesse sentido: AgRg no REsp 1319768/RS, Rel. Ministro
SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 26/06/2012, DJe 03/08/2012).
07. Indenização por danos morais fixada no importe de R$ 5.000,00, porquanto, condizente com a
situação econômica e social da recorrente, bem como o grau de culpabilidade do apelado,
encontrando-se tal valor alinhado ao entendimento jurisprudencial desta Turma Julgadora.
08. Diante da inversão do resultado do julgamento, o ônus de sucumbência deverá ser
integralmente custeado pelo INSS.
09. Sentença reformada. Apelo parcialmente provido.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000850-41.2018.4.03.6006
RELATOR:Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR
APELANTE: ADELIA MARTINS LOPES
Advogados do(a) APELANTE: ALEX FERNANDES DA SILVA - MS17429-A, JOSIANE
ALVARENGA NOGUEIRA - MS17288-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000850-41.2018.4.03.6006
RELATOR:Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR
APELANTE: ADELIA MARTINS LOPES
Advogados do(a) APELANTE: ALEX FERNANDES DA SILVA - MS17429-A, JOSIANE
ALVARENGA NOGUEIRA - MS17288-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta por Adelia Martins Lopes contra sentença que extinguiu o feito
sem resolução do mérito, em relação ao pedido para que seja declarada irregular a averbação
dos descontos do crédito consignado fraudulento no benefício previdenciário da autora, já que
tal providência já foi adotada no âmbito administrativo, não existindo mais interesse processual
na declaração pretendida; julgou improcedente o pedido de indenização por danos morais
formulado pela parte autora e condenou a parte autora em ônus de sucumbência.
A presente ação de indenização foi movida por Adelia Martins Lopes em face do Instituto
Nacional de Previdência Social objetivando a reparação civil por danos morais, correspondentes
a cinquenta salários mínimos ou no importe a ser fixado judicialmente.
Narra a inicial que a autora é pensionista do INSS e tomou conhecimento sobre dois contratos
de empréstimos realizados em seu nome (Contrato nº 193902698 e Contrato nº 231377561),
sem nunca os ter pactuados.
Relata que foi surpreendida com descontos realizados, mensalmente, em seu benefício
previdenciário, por meio da sua folha de pagamento e, posteriormente, veio a descobrir que
eram provenientes de dois contratos de empréstimo consignado por ela não firmados, razão
pela qual, passa por fortes transtornos e abalos psíquicos que a motivaram ajuizar a presente
ação.
Sustenta que não realizou qualquer empréstimo junto ao Banco Votorantin e desconhece o
motivo de tais descontos, porquanto, nada comprou junto à instituição financeira.
Pugna pela concessão da tutela antecipada para fins de obrigar a demandada, sob pena de
multa diária, a suspender a cobrança do suposto empréstimo ou a imediata suspensão dos
descontos efetuados no Benefício nº 1026819780, referente ao Contrato nº231377561; a
declaração da inexistência dos débitos; a restituição, em dobro, dos valores pagos; e, por fim, a
condenação da requerida a pagar indenização por danos morais.
Foi deferido o benefício da justiça gratuita (fl. 44, ID 58465232).
Regularmente processado o feito, sobreveio sentença que:
a) extinguiu o feito sem resolução do mérito, com fundamento no art. 485, VI do CPC/15, em
relação ao pedido para que seja declarada irregular a averbação dos descontos do crédito
consignado fraudulento no benefício previdenciário da autora, já que tal providência já foi
adotada no âmbito administrativo, não existindo mais interesse processual na declaração
pretendida;
b) julgou improcedente o pedido de indenização por danos morais formulado pela parte autora,
com fulcro no art. 487, I do CPC/15;
c) condenou a parte autora em ônus de sucumbência, fixou os honorários advocatícios no
importe de R$ 1.000,00, sopesando os critérios do art. 85 do CPC/15 e condenou, ainda, a
demandante a pagar aos patronos dos réus a verba honorária, condicionada à comprovação da
alteração de sua situação patrimonial, nos termos do art. 98, §3º do CPC/15, por ser
beneficiária da justiça gratuita. Isentou a requerente de custas processuais por conta da
gratuidade.
Irresignada, apela a autora, pugnando pela reforma da sentença para o fim de que seja julgada
procedente a presente demanda, para condenar o INSS ao pagamento de indenização por
danos morais no valor de R$ 10.000,00 ou outro valor a ser fixado judicialmente, além de custas
processuais e honorários advocatícios.
Manifestação do INSS, por meio de cota, pugnando pela manutenção da r. sentença (ID
58465232).
O feito foi redistribuído à Segunda Seção, ante a declaração de incompetência proferida na
decisão (ID 120528507).
Tendo em vista envolver a causa sobre interesse de indígena, o MPF foi intimado para
manifestação, nos termos dos arts. 109, XI, 231 e 232, todos da CF/88, e opinou pelo
provimento do apelo autoral (ID 141930714).
É a síntese do relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000850-41.2018.4.03.6006
RELATOR:Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR
APELANTE: ADELIA MARTINS LOPES
Advogados do(a) APELANTE: ALEX FERNANDES DA SILVA - MS17429-A, JOSIANE
ALVARENGA NOGUEIRA - MS17288-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O cerne da controvérsia diz respeito à aferição da responsabilidade civil do INSS, por danos
morais, em virtude dos descontos indevidos efetuados sobre as parcelas do benefício
previdenciário de aposentadoria por idade da autora, mediante a formalização de empréstimo
consignado fraudulento em seu nome.
Alega a recorrente que a ação da autarquia previdenciária foi autônoma, causadora de dano,
distinta da conduta perpetrada pelo Banco Votorantin, ensejando a responsabilidade civil e o
respectivo dever de indenizar.
Na primeira parte do dispositivo, a r. sentença extinguiu o feito sem resolução do mérito, com
base no art. 485, VI do CPC/15, em relação ao pedido de declaração da irregularidade da
averbação dos descontos do crédito consignado fraudulento no benefício previdenciário da
autora, ao fundamento de que já foi adotada tal providência no âmbito administrativo, não
subsistindo interesse processual na declaração pretendida. Confira-se trecho da r. sentença:
“O processo deve ser extinto, sem apreciação do mérito, com relação ao pedido declaratório
constante do item “c” do Capítulo “VI- DOS PEIDDOS” da inicial (fl. 13), já que a própria autora
informou ter obtido êxito na ação judicial movida em desfavor do Banco Votorantin S/A, em que,
por sentença, foram declarados inexigíveis os débitos referentes aos contratos de empréstimos
em consignação junto ao benefício da autora e condenado o agente financeiro a devolver em
dobro os valores descontados, conforme extrai-se da cópia da sentença proferida pelo Juizado
Especial Adjunto da Comarca de Iguatemi/MS, acostada às fls. 114/126.
Não há, portanto, utilidade na obtenção de um provimento judicial neste sentido, o que afasta o
interesse processual com relação a esta parte do pedido, uma das condições da ação.”
Conforme destacado no decisum, não há controvérsia sobre a inexigibilidade dos débitos
referentes aos contratos de empréstimo consignado, fraudulentamente, em detrimento da
beneficiária.
Contudo, o argumento impeditivo da condenação do INSS, amparado no fato de que a
demandante já foi ressarcida pela instituição financeira, não comporta acolhida, na medida em
que a configuração da responsabilidade civil por danos morais não pressupõe e nem se
confunde com a reparação por danos materiais.
No ponto, sobreleva anotar que os atos praticados pela autarquia previdenciária são distintos
dos atos perpetrados pelo Banco Votorantin.
Isto porque a doutrina pátria adotou a teoria da responsabilidade civil objetiva, no que concerne
às entidades de direito púbico, com fulcro no risco administrativo, a partir do qual prescinde da
comprovação da culpa do agente ou da má prestação do serviço, bastando-se a demonstração
do nexo de causalidade entre a conduta perpetrada pelo agente público e o dano sofrido pela
vítima, à luz do art. 37, §6º da Constituição Federal. Confira-se:
“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
(...)
§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços
públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros,
assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”
No mesmo sentido, o Código Civil estabelece que a responsabilidade civil do ente público se
afigura objetiva, senão vejamos:
“Art. 43. As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis por atos dos
seus agentes que nessa qualidade causem danos a terceiros, ressalvado direito regressivo
contra os causadores do dano, se houver, por parte destes, culpa ou dolo.”
“Art. 927. Aquele que, por ato ilícito ( arts. 186 e 187 ), causar dano a outrem, fica obrigado a
repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos
especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano
implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.”
Nos casos de omissão da Administração Pública, a jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 841.526/RS, com repercussão geral
reconhecida, estabeleceu que a responsabilidade civil do Estado por omissão também está
fundamentada no art. 37, §6º da Constituição Federal. A propósito, colaciono o seguinte
precedente jurisprudencial (grifei):
“DIREITO CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO, CIVIL E PROCESSUAL CIVIL.
RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. PRESSUPOSTOS. ACIDENTE EM RODOVIA
FEDERAL. VEÍCULO DE PASSEIO QUE INVADIU A PISTA CONTRÁRIA E COLIDIU COM
CAMINHÃO. PÉSSIMAS CONDIÇÕES DA RODOVIA. BURACO QUE PROVOCOU A SAÍDA
DE VEÍCULO PARA A PISTA CONTRÁRIA, VINDO A COLIDIR DE FRENTE COM
CAMINHÃO. CULPA EXCLUSIVA DO DNIT ATESTADA POR PROVA PERICIAL.
RESPONSABILIDADE DA AUTARQUIA. FALHA DO SERVIÇO PÚBLICO. DANOS
MATERIAIS. DANOS EMERGENTES E LUCROS CESSANTES. FORMA DE CÁLCULO.
TERMO INICIAL DA ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. BASE DE
CÁLCULO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. VALOR DOS DANOS MORAIS
CONSTANTE DA PETIÇÃO INICIAL. SUGESTÃO DA PARTE AO JUÍZO.
1. A atual Constituição Federal, seguindo a linha de sua antecessora, estabeleceu como baliza
principiológica a responsabilidade objetiva do Estado, adotando a teoria do risco administrativo.
Consequência da opção do constituinte é que de regra os pressupostos dar responsabilidade
civil do Estado são: a) ação ou omissão humana; b) dano injusto ou antijurídico sofrido por
terceiro; c) nexo de causalidade entre a ação ou omissão e o dano experimentado por terceiro.
2. Em se tratando de comportamento omissivo, a jurisprudência vinha entendendo que a
responsabilidade do Estado deveria ter enfoque diferenciado quando o dano fosse diretamente
atribuído a agente público (responsabilidade objetiva) ou a terceiro ou mesmo decorrente de
evento natural (responsabilidade subjetiva). Contudo, o tema foi objeto de análise pelo Supremo
Tribunal Federal em regime de recurso repetitivo no Recurso Extraordinário nº 841.526,
estabelecendo-se que "a responsabilidade civil do Estado por omissão também está
fundamentada no artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, ou seja, configurado o nexo de
causalidade entre o dano sofrido pelo particular e a omissão do Poder Público em impedir a sua
ocorrência - quando tinha a obrigação legal específica de fazê-lo - surge a obrigação de
indenizar, independentemente de prova da culpa na conduta administrativa (...)".
(TRF-4 - AC: 50017698220154047016 PR 5001769-82.2015.4.04.7016, Relator: VÂNIA HACK
DE ALMEIDA, Data de Julgamento: 22/10/2019, TERCEIRA TURMA)
Assim, tanto as ações comissivas ou omissivas do Estado requerem a verificação do
preenchimento do nexo de causalidade, embora existam situações que rompam este nexo,
quais sejam: o caso fortuito, a força maior e a culpa exclusiva da vítima ou de terceiros.
No presente caso, restou configurada a conduta omissiva do INSS, ao deixar de aferir a
existência de autorização pelo beneficiário para cumprimento de seus deveres legais, atinentes
à operacionalização e repasse dos valores, conforme estabelecidos na Lei nº 10.820/2003, que
assim dispõe:
“Art. 6º. Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão do Regime Geral de Previdência
Social poderão autorizar o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a proceder aos descontos
referidos no art. 1o e autorizar, de forma irrevogável e irretratável, que a instituição financeira na
qual recebam seus benefícios retenha, para fins de amortização, valores referentes ao
pagamento mensal de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de
arrendamento mercantil por ela concedidos, quando previstos em contrato, nas condições
estabelecidas em regulamento, observadas as normas editadas pelo INSS.
(...)
§ 2o Em qualquer circunstância, a responsabilidade do INSS em relação às operações referidas
no caput deste artigo restringe-se à:
I - retenção dos valores autorizados pelo beneficiário e repasse à instituição consignatária nas
operações de desconto, não cabendo à autarquia responsabilidade solidária pelos débitos
contratados pelo segurado; e
II - manutenção dos pagamentos do titular do benefício na mesma instituição financeira
enquanto houver saldo devedor nas operações em que for autorizada a retenção, não cabendo
à autarquia responsabilidade solidária pelos débitos contratados pelo segurado.”
Ao deixar de fiscalizar os empréstimos fraudulentamente consignados em nome da autora,
restou configurado o nexo de causalidade entre a conduta omissiva perpetrada pela autarquia
previdenciária e os danos suportados pela autora, que deixou de usufruir de sua principal fonte
de renda, tendo em vista se tratar o benefício de aposentadoria por idade.
Nesse ponto, cumpre mencionar que a jurisprudência desta Corte Regional tem reconhecido a
responsabilidade civil objetiva do INSS pelo dever de conferência da autorização dos descontos
realizados nos proventos de seus segurados e do dever institucional de regulamentação da
operacionalidade e funcionalidade dos sistemas relacionados a tais pagamentos. Confiram-se:
“PROCESSO CIVIL. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO.
DESCONTO INDEVIDO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO
FRAUDULENTO. LEGITIMIDADE PASSIVA DO INSS. PRIVAÇÃO DE VERBA ALIMENTAR.
DANO MORAL. VERIFICADO. APELAÇÃO DESPROVIDA.
1. A questão posta nos autos e devolvida a esta E. Corte diz respeito à responsabilidade civil do
Instituto Nacional do Seguro Social- INSS por descontos indevidos realizados em benefício
previdenciário.
2.É pacífico o entendimento de que o Instituto Nacional do Seguro Social -INSS é parte legítima
nas causas que versem sobre descontos indevidos em benefício previdenciário oriundos de
empréstimo consignado fraudulento.
3.No direito brasileiro, a responsabilidade civil do Estado é, em regra, objetiva, isto é, prescinde
da comprovação de culpa do agente, bastando-se que se comprove o nexo causal entre a
conduta do agente e o dano. Está consagrada na norma do artigo 37, § 6º, da Constituição
Federal.
4. No caso dos autos, é evidente a aplicação do instituto da responsabilidade objetiva, uma vez
que, não obstante o Instituto Nacional do Seguro Social -INSS não participe da contratação do
ajuste, este é responsável por fiscalizar a autorizar os descontos realizados nos proventos de
seus segurados.
5. A responsabilidade do Instituto Nacional do Seguro Social -INSS recai não apenas sobre o
dever de conferência da regularidade de tais operações, como também por decorrência de seu
dever de instituir as normas de operacionalidade e funcionalidade dos sistemas relacionados
atais pagamentos.
6. Nítida a ocorrência do prejuízo moral. É sabido que o mero desconto em verba de caráter
alimentar é suficiente para caracterizar a ocorrência de dano moral, dispensada a
demonstração detalhada do abalo subjetivo.
7. Apelação desprovida."
(ApCiv 0000788-13.2015.4.03.6129, Rel. ANTÔNIO CEDENHO., TERCEIRA TURMA, J.
17/06/2020, DJe 24/06/2020)
“ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DOINSS. FRAUDE EM CONTA
BANCÁRIA. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. AUTARQUIA PREVIDENCIÁRIA DIRECIONOU
DADOS DO AUTOR PARA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA DESCONTAR EM SEU BENEFÍCIO
PARCELA DECORRENTE DE EMPRESTIMOS BANCÁRIOS FRAUDULENTOS. DANO
MORAL EMATERIAL CONFIGURADO. VALOR DA INDENIZAÇÃOMAJORADO.
- O art. 37, §6º, da Constituição Federal consagra a responsabilidade do Estado de indenizar os
danos causados por atos, omissivos ou comissivos, praticados pelos seus agentes a terceiros,
independentemente de dolo ou culpa.
- O autor propôs a presente ação em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
(INSS) e do BANCO SANTANDER S/A para obter indenização por danos materiais e morais,
com a consequente devolução dos valores descontados de seu benefício previdenciário em
decorrência de fraude na alteração da conta corrente beneficiária dos valores da aposentadoria
e na concessão de empréstimos consignados sobre o benefício. Alega ter sofrido danos
materiais e morais em virtude da indevida alteração da conta corrente onde é depositado o
benefício previdenciário, pago pelo INSS, bem como em razão de concessão indevida de
empréstimo pelo BANCO SANTANDERS/A, que mantém tanto a conta de depósitos verdadeira,
aberta por ele, quanto àquela beneficiada pelo pagamento da aposentadoria em06/02/2013.
- O dano moral se mostra evidente. O INSS direcionou dados do autor para desconto em seu
benefício decorrente de empréstimos bancários fraudulentos e retardou o ressarcimento de tais
descontos.
– Com relação ao valor da indenização, embora certo que a condenação por dano moral não
deve ser fixada em valor excessivo, gerando enriquecimento sem causa, não pode, entretanto,
ser arbitrada em valor irrisório, incapaz de propiciar reparação do dano sofrido e de inibir o
causador do dano a futuras práticas da mesma espécie.
- Em razão do conjunto probatório e das demais circunstâncias constantes nos autos, fixo o
valor da indenização por danos morais em R$ 10.000,00 (dez mil reais), na proporção de
R$5.000,00 (mil reais) para cada (BANCO SANTANDER e INSTITUTONACIONAL DO
SEGURO SOCIAL).
- Apelo do INSTITUTONACIONAL DO SEGURO SOCIAL improvido. Apelo de
REINALDOCURATOLO parcialmente provido."
(APELAÇÃO CÍVEL 0002731-14.2013.4.03.6104, Rel. Des. Federal MÔNICA NOBRE,
QUARTA TURMA, J. 07/06/2017, DJe 21/06/2017)
É cedido que tal benefício se reveste de natureza alimentar, de sorte que a privação dos
rendimentos, ainda que de parcela deles, transborda a esfera do mero aborrecimento, o que
justifica a condenação por danos morais
Em tais casos, a jurisprudência do STJ tem dispensado o detalhamento do abalo psíquico.
Confira-se:
“AGRAVO REGIMENTAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DÍVIDA DE
CORRENTISTA.RETENÇÃO INTEGRAL DE VENCIMENTOS. DANO MORAL.
CONFIGURAÇÃO.
1.- Na linha dos precedentes desta Corte, a retenção indevida de rendimentos é suficiente para
gerar indenização por danos morais.
2.- No caso, dos autos, porém, o desconto indevido de verbas na conta da Recorrente, foi
compensado pelo descumprimento da obrigação de depositar judicialmente a quantia
equivalente, não havendo por isso, falar em subtração efetiva de numerário alimentar.
3.- Agravo Regimental a que se nega provimento.”
(AgRg no REsp 1319768/RS, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em
26/06/2012, DJe 03/08/2012)
“CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. SAQUES
IRREGULARES EFETUADOS EM CONTA CORRENTE. DANOS MATERIAIS
RECONHECIDOS. DANOS MORAIS. OCORRÊNCIA. VALOR INDENIZATÓRIO DEVIDO.
FIXAÇÃO. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. REEXAME DOS ELEMENTOS PROBATÓRIOS.
IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 07/STJ.
1. Tendo o Tribunal a quo examinado, fundamentadamente, todas as questões suscitadas pelo
recorrente, tanto em sede de apelação como em embargos (fls.141/144, 167/169), não há falar
na ocorrência de omissão e, pois, de ofensa ao art. 535, II, do CPC.
2. No pleito em questão, os saques irregulares efetuados na conta corrente do autor
acarretaram situação evidente de constrangimento para o correntista (que, como reconhece,
expressamente, o Tribunal "perdeu quase todo o seu dinheiro que tinha em sua conta
corrente"), caracterizando, por isso, ato ilícito, passível de indenização a título de danos morais.
Segundo precedentes desta Corte, em casos como este, o dever de indenizar prescinde da
demonstração objetiva do abalo moral sofrido, exigindo-se como prova apenas o fato ensejador
do dano, ou seja, os saques indevidos por culpa da instituição ora recorrida: "a exigência de
prova do dano moral se satisfaz com a comprovação do fato que gerou a dor, o sofrimento,
sentimentos íntimos que o ensejam" . Precedentes.
3. Com o fito de assegurar ao lesado justa reparação, sem incorrer em enriquecimento ilícito,
fixo o valor indenizatório por danos morais em R$3.000,00 (três mil reais).
4. A pretensão do recorrente no sentido de que seja reconhecida a litigância de má-fé implicaria
o revolvimento de elementos probatórios analisados nas instâncias ordinárias, e sobre os quais
o Tribunal a quo fundamentou sua decisão. Incidência da Súmula 07, desta Corte.
5. Recurso parcialmente conhecido e, nesta parte, provido.”
(STJ - Resp: 797689 MT 2005/0189396-6, Relator: Ministro JORGE SCARTEZZINI, Data de
Julgamento: 15/08/2006, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJ 11/09/2006 p. 305)
Isto posto, acolho o parecer ministerial e fixo a indenização por danos morais no importe de R$
5.000,00 (cinco mil reais), porquanto, condizente com a situação econômica e social da
recorrente, bem como o grau de culpabilidade do apelado, encontrando-se tal valor alinhado ao
entendimento jurisprudencial desta Turma Julgadora.
Diante da inversão do resultado do julgamento, o ônus de sucumbência deverá ser
integralmente custeado pelo INSS.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação para reformar a r. sentença, fixar a
indenização por danos morais no importe de R$ 5.000,00 e inverter o ônus de sucumbência,
nos termos da fundamentação supra.
É COMO VOTO.
E M E N T A
DIREITO ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. DESCONTO
INDEVIDO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO
FRAUDULENTO EM DETRIMENTO DA PARTE AUTORA. PRIVAÇÃO DE VERBA
ALIMENTAR. DANO MORAL CONFIGURADO. APELO PARCIALMENTE PROVIDO.
01. O cerne da controvérsia diz respeito à aferição da responsabilidade civil do INSS, por danos
morais, em virtude dos descontos indevidos efetuados sobre as parcelas do benefício
previdenciário de aposentadoria por idade da autora, mediante a formalização de empréstimo
consignado fraudulento em seu nome.
02. A doutrina pátria adotou a teoria da responsabilidade civil objetiva, no que concerne às
entidades de direito púbico, com fulcro no risco administrativo, a partir do qual prescinde da
comprovação da culpa do agente ou da má prestação do serviço, bastando-se a demonstração
do nexo de causalidade entre a conduta perpetrada pelo agente público e o dano sofrido pela
vítima, à luz do art. 37, §6º da Constituição Federal, reproduzido nos arts. 43 e 927 do diploma
civil.
03. Nos casos de omissão da Administração Pública, a jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 841.526/RS, com repercussão geral
reconhecida, estabeleceu que a responsabilidade civil do Estado por omissão também está
fundamentada no art. 37, §6º da Constituição Federal. Assim, tanto as ações comissivas ou
omissivas do Estado requerem a verificação do preenchimento do nexo de causalidade, embora
existam situações que rompam este nexo, quais sejam: o caso fortuito, a força maior e a culpa
exclusiva da vítima ou de terceiros.
04. No presente caso, restou configurada a conduta omissiva do INSS, ao deixar de aferir a
existência de autorização pelo beneficiário para cumprimento de seus deveres legais, atinentes
à operacionalização e repasse dos valores, conforme estabelecidos na Lei nº 10.820/2003. Ao
deixar de fiscalizar os empréstimos fraudulentamente consignados em nome da autora, restou
configurado o nexo de causalidade entre a conduta omissiva perpetrada pela autarquia
previdenciária e os danos suportados pela autora, que deixou de usufruir de sua principal fonte
de renda, tendo em vista se tratar o benefício de aposentadoria por idade.
05. Nesse ponto, cumpre mencionar que a jurisprudência desta Corte Regional tem reconhecido
a responsabilidade civil objetiva do INSS pelo dever de conferência da autorização dos
descontos realizados nos proventos de seus segurados e do dever institucional de
regulamentação da operacionalidade e funcionalidade dos sistemas relacionados a tais
pagamentos.
06. É cedido que tal benefício se reveste de natureza alimentar, de sorte que a privação dos
rendimentos, ainda que de parcela deles, transborda a esfera do mero aborrecimento, o que
justifica a condenação por danos morais. Inclusive, a jurisprudência do STJ tem dispensado o
detalhamento do abalo psíquico (nesse sentido: AgRg no REsp 1319768/RS, Rel. Ministro
SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 26/06/2012, DJe 03/08/2012).
07. Indenização por danos morais fixada no importe de R$ 5.000,00, porquanto, condizente com
a situação econômica e social da recorrente, bem como o grau de culpabilidade do apelado,
encontrando-se tal valor alinhado ao entendimento jurisprudencial desta Turma Julgadora.
08. Diante da inversão do resultado do julgamento, o ônus de sucumbência deverá ser
integralmente custeado pelo INSS.
09. Sentença reformada. Apelo parcialmente provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por
unanimidade, deu parcial provimento à apelação para reformar a r. sentença, fixar a
indenização por danos morais no importe de R$ 5.000,00 e inverter o ônus de sucumbência,
nos termos da fundamentação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
