
| D.E. Publicado em 11/10/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, anular, de ofício, a decisão agravada e nos termos do artigo 1.013, § 3º, inciso II, do NCPC, dar parcial provimento à remessa oficial, tida por interposta, e à apelação da parte autora, bem como negar provimento ao recurso de apelação do INSS, restando prejudicado agravo interposto, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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AGRAVO LEGAL EM APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0000697-37.2011.4.03.6104/SP
RELATÓRIO
Trata-se de agravo legal interposto pela parte autora, com fundamento no artigo 557, § 1º, do Código de Processo Civil de 1973, em face da decisão monocrática que não conheceu da remessa oficial, negou seguimento ao recurso do INSS e deu parcial provimento ao seu apelo apenas para reconhecer como especial o período laborado de 06/03/1997 a 21/09/2010, mantendo, assim, a sentença no tocante ao enquadramento do lapso de 01/01/1985 a 05/03/1997 e ao indeferimento do pedido de concessão do benefício de aposentadoria especial (fls.132/138).
Alega a parte autora que, ao contrário do que constou no referido decisum, o tempo total de labor nocivo reconhecido é suficiente para a concessão do benefício postulado (fls. 140/142).
Intimado a se manifestar sobre o recurso, o INSS deixou de fazê-lo (fl.144).
É o relatório.
VOTO
A decisão impugnada analisou a matéria nos seguintes termos:
Conforme se depreende da decisão agravada, não obstante tenha sido reconhecido, no corpo da fundamentação, o direito do segurado ao enquadramento, além do período declarado na sentença (01/01/1985 a 05/03/1997), do lapso laborado de 06/03/1997 a 21/09/2010, concluiu o Julgador não haver tempo suficiente à concessão da aposentadoria especial postulada e, por conseguinte, deu parcial provimento ao apelo autoral.
Dessa forma, verifica-se que o dispositivo da decisão agravada está dissociado de sua fundamentação, tendo em vista que, com o reconhecimento dos referidos interregnos de trabalho especial, cabível seria o acolhimento total do recurso de apelação manejado pela parte autora, com o deferimento da aposentadoria vindicada, pois perfazem, à evidência, mais de 25 anos de tempo de serviço especial. Fica configurada, portanto, hipótese de nulidade do julgado.
Nesse sentido, em casos similares:
Contudo, estando o feito em condições de imediato julgamento, passo à análise do mérito, nos termos do artigo 1.013, § 3º, inciso II, do NCPC, aplicável também em relação às decisões em segunda instância.
Inicialmente, afigura-se correta a submissão da r. sentença à remessa oficial.
De fato, o artigo 475, § 2º, do CPC/1973, com redação dada pelo art. 1º da Lei nº 10.352/2001, que entrou em vigor em 27 de março de 2002, dispõe que não está sujeita ao reexame necessário a sentença em ações cujo direito controvertido não exceda a 60 (sessenta) salários mínimos.
Nessa linha:
No caso vertente, em que a sentença de fls. 94/101v, mantida por decisão proferida em sede de embargos de declaração, em 04/09/2012 (fls.108/109v), cingiu-se a reconhecer determinado interstício de atividade especial, considerando o valor atribuído à causa (R$ 34.934,38, em janeiro/2011), devidamente atualizado (R$ 38.459,03, em setembro/2012), verifico que o direito controvertido excede os 60 salários mínimos.
Portanto, conheço da remessa oficial.
A aposentadoria especial - modalidade de aposentadoria por tempo de contribuição com tempo mínimo reduzido - é devida ao segurado que tiver trabalhado, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, conforme disposição legal, a teor do preceituado no artigo 57 da Lei nº 8.213/91 e no artigo 201, § 1º, da Constituição Federal.
O período de carência exigido, por sua vez, está disciplinado pelo artigo 25, inciso II, da Lei de Planos de Benefícios da Previdência Social, o qual prevê 180 (cento e oitenta) contribuições mensais, bem como pela norma transitória contida em seu artigo 142.
Registre-se, por oportuno, que o Colendo Superior Tribunal de Justiça, em recurso submetido à sistemática do artigo 543-C do CPC/1973, decidiu que a "lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço", de modo que a conversão do tempo de atividade comum em especial, para fins de aposentadoria especial, é possível apenas no caso de o benefício haver sido requerido antes da entrada em vigor da Lei n.º 9.032/95, que deu nova redação ao artigo 57, § 3º, da Lei n.º 8.213/91, exigindo que todo o tempo de serviço seja especial (REsp 1310034/PR, Primeira Seção, Rel.Min. Herman Benjamin, DJe 19/12/2012).
A caracterização e comprovação da atividade especial, de acordo com o atual Regulamento da Previdência Social (Decreto n.º 3.048/1999), "obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço" (art. 70,§ 1º), como já preconizava a jurisprudência existente acerca da matéria e restou sedimentado em sede de recurso repetitivo (REsp 1151363/MG, Terceira Seção, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe 05/04/2011; REsp 1310034/PR, citado acima).
Dessa forma, até o advento da Lei n.º 9.032, de 28 de abril de 1995, para a configuração da atividade especial, bastava o seu enquadramento nos Anexos dos Decretos n.ºs. 53.831/64 e 83.080/79, os quais foram validados pelos Decretos n.ºs. 357/91 e 611/92, possuindo, assim, vigência concomitante.
Consoante entendimento consolidado de nossos tribunais, a relação de atividades consideradas insalubres, perigosas ou penosas constantes em regulamento é meramente exemplificativa, não exaustiva, sendo possível o reconhecimento da especialidade do trabalho executado mediante comprovação nos autos. Nesse sentido, a Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos: "Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial se perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em Regulamento".
A partir da referida Lei n.º 9.032/95, que alterou o artigo 57, §§ 3º e 4º, da Lei n.º 8.213/91, não mais se permite a presunção de insalubridade, tornando-se necessária a comprovação da efetiva exposição a agentes prejudiciais à saúde ou integridade física do segurado e, ainda, que o tempo trabalhado em condições especiais seja permanente, não ocasional nem intermitente.
A propósito:
A comprovação podia ser realizada por meio de formulário específico emitido pela empresa ou seu preposto (SB-40, DISES BE 5235, DSS 8030 ou DIRBEN 8030, atualmente, Perfil Profissiográfico Previdenciário-PPP), ou outros elementos de prova, independentemente da existência de laudo técnico, com exceção dos agentes agressivos ruído e calor, os quais sempre exigiram medição técnica.
Posteriormente, a Medida Provisória n.º 1.523/96, com início de vigência na data de sua publicação, em 14/10/1996, convertida na Lei n.º 9.528/97 e regulamentada pelo Decreto n.º 2.172, de 05/03/97, acrescentou o § 1º ao artigo 58 da Lei n.º 8.213/91, determinando a apresentação do aludido formulário "com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho". Portanto, a partir da edição do Decreto n.º 2.172/97, que trouxe o rol dos agentes nocivos, passou-se a exigir, além das informações constantes dos formulários, a apresentação do laudo técnico para fins de demonstração da efetiva exposição aos referidos agentes.
Incluiu-se, ademais, o § 4º do mencionado dispositivo legal, in verbis:
O Decreto n.º 3.048/99, em seu artigo 68, § 9º, com a redação dada pelo Decreto n.º 8.123/2013, ao tratar dessa questão, assim definiu o PPP:
Por seu turno, o INSS editou a Instrução Normativa INSS/PRES n.º 77, de 21/01/2015, estabelecendo, em seu artigo 260, que: "Consideram-se formulários legalmente previstos para reconhecimento de períodos alegados como especiais para fins de aposentadoria, os antigos formulários em suas diversas denominações, sendo que, a partir de 1º de janeiro de 2004, o formulário a que se refere o § 1º do art. 58 da Lei nº 8.213, de 1991, passou a ser o PPP".
Quanto à conceituação do PPP, dispõe o artigo 264 da referida Instrução Normativa:
Assim, o PPP, à luz da legislação de regência e nos termos da citada Instrução Normativa, deve apresentar, primordialmente, dois requisitos: assinatura do representante legal da empresa e identificação dos responsáveis técnicos habilitados para as medições ambientais e/ou biológicas.
Na atualidade, a jurisprudência tem admitido o PPP como substitutivo tanto do formulário como do laudo técnico, desde que devidamente preenchido.
A corroborar o entendimento esposado acima, colhem-se os seguintes precedentes:
Quanto ao uso de Equipamento de Proteção Individual - EPI, no julgamento do ARE n.º 664.335/SC, em que restou reconhecida a existência de repercussão geral do tema ventilado, o Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o mérito, decidiu que, se o aparelho "for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial". Destacou-se, ainda, que, havendo divergência ou dúvida sobre a sua real eficácia, "a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial".
Especificamente em relação ao agente agressivo ruído, estabeleceu-se que, na hipótese de a exposição ter se dado acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do EPI, "não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria". Isso porque não há como garantir, mesmo com o uso adequado do equipamento, a efetiva eliminação dos efeitos nocivos causados por esse agente ao organismo do trabalhador, os quais não se restringem apenas à perda auditiva.
Postas as balizas, passa-se ao exame do caso concreto.
A r. sentença de fls.94/101v reconheceu que o autor exerceu atividade especial, na qualidade de médico, apenas de 01/01/1985 até 05/03/1997, ao fundamento de que, após essa data, "não restou configurada a permanência da sua exposição exclusiva ao agente nocivo infectocontagiante, uma vez que fazia atendimento referente a outras patologias".
No tocante a essa decisão, insurgem-se o INSS - pugnando pela improcedência total do pedido - e o autor, que pretende o enquadramento do período de 01/01/1985 a 21/09/2010 e, consequentemente, a concessão da aposentadoria especial.
A título de comprovação da alegada especialidade, foi juntado aos autos PPP emitido, em 21/09/2010, por SANTOS CLÍNICA COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO, com o respectivo carimbo (subscritor: Sr. Arnaldo Henrique Passanezzi, fls. 23/24), o qual demonstra que o demandante desempenhou o cargo de médico, a partir de 01/01/1985, mediante exposição a microorganismos. Suas atividades estão assim descritas: "Realiza atendimentos e/ou procedimentos nos seguintes setores: Ambulatório, enfermaria, centro cirúrgico e consultório. Entrando em contato com pacientes portadores de todos os tipos de patologias, inclusive doenças infecto contagiosas, com agentes bacterianos, fungos, vírus e com sangue potencialmente contaminado em procedimentos cirúrgicos, nas dependências do hospital Ana Costa S/A". Note-se que consta no referido documento não haver a utilização de EPI eficaz.
Pois bem, em que pese o entendimento em sentido contrário da juíza sentenciante, extrai-se da descrição supra, de forma clara e segura, que o proponente, no exercício de suas funções, estava em constante vulnerabilidade à exposição a agentes de natureza infectocontagiosa, sendo a atividade desempenhada, portanto, passível de enquadramento no código 1.3.2 do Quadro anexo ao Decreto n.º 53.831/64, e nos códigos 1.3.4 (Anexo I) e 2.1.3 (Anexo II) do Decreto n.º 83.080/79, bem como no código 3.0.1 do Anexo IV do Decreto n.º 2.172/97 e do Decreto n.º 3.048/99.
Deveras, como cediço, notadamente no que diz respeito aos agentes biológicos, a jurisprudência tem se direcionado no sentido de ser dada maior flexibilidade ao conceito de permanência, de sorte a considerar a especialidade do trabalho em razão da potencialidade do risco de contato com esses agentes e não do contato propriamente dito, como se vê do julgado a seguir transcrito:
De qualquer forma, impende destacar que o labor permanente, para efeito de caracterização da nocividade, deve ser tido como aquele contínuo, o que não implica dizer que a exposição a agentes insalubres tem, necessariamente, de perdurar durante toda a jornada de trabalho (STJ, REsp 658016/SC, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, DJ 21/11/2005, p 318; TRF 3ª Região, APELREEX n.º 0002420-14.2012.4.03.6183, Rel. Desembargador Federal Paulo Domingues, e-DJF3 Judicial 1 DATA:19/08/2016).
Assim, admitida a comprovação do exercício de atividade especial, nos moldes exigidos pela legislação de regência e a jurisprudência pátria, cabe perquirir sobre a existência de recolhimento das contribuições previdenciárias anteriores à Lei n.º 10.666/2003, quando, nos termos de seu artigo 4º, § 1º, passou tal encargo a ser responsabilidade da cooperativa e não mais do associado.
Nessa esteira:
Desta feita, embora a legislação previdenciária permita ao contribuinte individual cooperado a contagem diferenciada do tempo em que laborou em condições especiais (Decreto n.º 3.048/99, art.64), tem-se que, antes do advento da referida Lei n.º 10.666/03, somente será possível o reconhecimento dos períodos em que foram vertidas contribuições aos cofres públicos.
Compulsando os autos, verifica-se que, por ocasião da análise do pedido administrativo, foram computados, no que interessa ao deslinde da causa, os períodos contributivos de 01/01/1985 a 30/09/1987, 01/03/1988 a 30/11/1989, 01/02/1990 a 28/02/1990, 01/04/1990 a 31/05/1990, 01/07/1990 a 31/03/1991, 01/05/1991 a 31/12/1992, 01/02/1993 a 28/02/1995 e 01/03/1995 a 31/03/2003 (fls. 72/73), restando, portanto, incontroversos, não obstante os documentos de fls. 25/29 revelem a ocorrência de interrupções em determinados lapsos de tempo.
Dessa maneira, entendo que faz jus o autor ao enquadramento do labor desenvolvido como médico cooperado nos interregnos mencionados acima e, também, de 01/04/2003 a 21/09/2010, uma vez que, a essa época, repise-se, a arrecadação e recolhimento da exação era atribuição da cooperativa, de sorte que não pode o cooperado ser prejudicado no caso de seu descumprimento ou recolhimento incorreto.
Somados tais períodos, constata-se que o autor possui, até a data do requerimento administrativo (15/12/2010, fl. 54), 24 anos, 09 meses e 21 dias de tempo de serviço especial, insuficientes à concessão da aposentadoria especial pleiteada, a qual, na hipótese, exige o implemento de 25 anos de exercício de atividade insalubre.
Consequentemente, impõe-se tão somente o reconhecimento da especialidade dos períodos aqui considerados, para fins previdenciários.
Persistindo a situação de sucumbência recíproca, mantenho a fixação procedida pela sentença recorrida.
Ante o exposto, ANULO, DE OFÍCIO, A DECISÃO AGRAVADA e, nos termos do artigo 1.013, § 3º, inciso II, do NCPC, DOU PARCIAL PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL, TIDA POR INTERPOSTA, E À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA para apenas reconhecer, como especiais, os períodos laborados de 01/01/1985 a 30/09/1987, 01/03/1988 a 30/11/1989, 01/02/1990 a 28/02/1990, 01/04/1990 a 31/05/1990, 01/07/1990 a 31/03/1991, 01/05/1991 a 31/12/1992, 01/02/1993 a 28/02/1995 e 01/03/1995 a 21/09/2010, determinando a respectiva averbação pela autarquia previdenciária e, em conseguinte, NEGO PROVIMENTO AO APELO DO INSS, mantendo, no mais, a sentença recorrida. Prejudicado o agravo da parte autora.
É como voto.
ANA PEZARINI
Desembargadora Federal
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