
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5031578-12.2021.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - DES. FED. ANA IUCKER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANTONIO LOPES DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: VANIA DE CASSIA VAZARIN ENDO - SP290366-N
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5031578-12.2021.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - DES. FED. ANA IUCKER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANTONIO LOPES DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: VANIA DE CASSIA VAZARIN ENDO - SP290366-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A EXMA. DESEMBARGADORA FEDERAL ANA IUCKER (Relatora):
Vistos.
Trata-se de ação de conhecimento distribuída em dezembro de 2018, na qual a parte autora postula o reconhecimento de períodos especiais e a concessão de aposentadoria especial desde o requerimento administrativo em 21/07/2017.
O pedido foi parcialmente acolhido pelo(a) juiz(a) da 2ª Vara da Comarca de Tanabi/SP, que reconheceu o caráter especial das atividades exercidas pelo autor nos períodos de 01/08/1987 a 10/09/1990, 16/01/1992 a 13/04/1992, 16/04/1992 a 07/05/1994, 01/06/1994 a 26/09/1995, 09/01/1996 a 18/04/1995, 09/01/1996 a 02/07/1997, 24/07/1997 a 20/02/1998, 07/05/1998 a 12/03/2005, 01/08/2005 a 20/08/2010 e de 13/09/2010 a 21/07/2017, e condenou o réu a conceder a aposentadoria especial em favor do requerente desde a DER em 21/07/2017.
Sobreveio apelação do INSS, a qual foi parcialmente provida para restringir o reconhecimento da especialidade ao período de 13/09/2010 a 04/03/2020. Em decorrência dessa limitação, houve a alteração do benefício originalmente concedido, substituindo-se a aposentadoria especial pela aposentadoria por tempo de contribuição, mediante reafirmação da DER para 28/06/2022 (Id 324613576 e 329810667).
Irresignado, o INSS interpôs agravo interno contra a decisão singular, sustentando, em síntese, a impossibilidade de reconhecimento de tempo especial pela exposição ao agente eletricidade após 05/03/1997, em razão da exclusão da periculosidade do rol de agentes nocivos pelos Decretos nº 2.172/97 e 3.048/99. Alega, ainda, que a matéria encontra-se submetida ao julgamento do Supremo Tribunal Federal no Tema 1209 da repercussão geral (RE nº 1.368.225/RS), pugnando pelo sobrestamento do feito até decisão definitiva daquela Corte, bem como pelo afastamento da especialidade reconhecida.
Intimada, a parte agravada não apresentou contrarrazões.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5031578-12.2021.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - DES. FED. ANA IUCKER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANTONIO LOPES DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: VANIA DE CASSIA VAZARIN ENDO - SP290366-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A EXMA. DESEMBARGADORA FEDERAL ANA IUCKER (Relatora):
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do agravo interno.
A possibilidade de julgamento monocrático, instituída pelo Código de Processo Civil, reforça a observância dos princípios constitucionais da celeridade e da efetividade da prestação jurisdicional.
Segundo entendimento consolidado do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, a decisão monocrática proferida pelo relator não configura ofensa ao princípio da colegialidade, considerando a existência de previsão legal para interposição de agravo interno, que possibilita a apreciação da matéria pelo órgão colegiado. Nesse sentido: AgInt no REsp n. 1.831.566/PR, relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 12/9/2022, DJe de 14/9/2022.
No mérito, aduz o agravante que não é possível o reconhecimento da especialidade das atividades desempenhadas sob exposição ao agente eletricidade após 05/03/1997, em razão da exclusão da periculosidade do rol de agentes nocivos pelos Decretos nº 2.172/97 e 3.048/99. Sustenta, ademais, que a matéria encontra-se afetada à sistemática da repercussão geral (Tema 1209/STF – RE nº 1.368.225/RS), requerendo o sobrestamento do feito até decisão definitiva da Suprema Corte.
De início, entendo que o pedido de efeito suspensivo não deve ser deferido, pois não se verifica, no caso em apreço, a presença da prejudicial de mérito prevista no art. 313, V, “a”, do Código de Processo Civil. Isso porque a controvérsia analisada pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 1209 (RE 1.368.255/RS) limita-se ao reconhecimento da atividade de vigilante como especial, fundamentada na exposição ao risco, seja em período anterior ou posterior à promulgação da Emenda Constitucional nº 103/2019. Trata-se, portanto, de questão distinta da controvérsia submetida à apreciação neste feito.
O Supremo Tribunal Federal ainda não estendeu os efeitos do Tema 1209 a outras categorias profissionais, tampouco determinou o sobrestamento indiscriminado dos feitos que envolvam exposição a risco elétrico.
A propósito, conforme consignado na decisão, a eletricidade é arrolada como agente perigoso no item 1.1.8 do quadro anexo ao Decreto nº 53.831/64, nos seguintes termos: Campo de Aplicação - Eletricidade - Operações em locais com eletricidade em condições de perigo de vida. Serviços e Atividades Profissionais - Trabalhos permanentes em instalações ou equipamentos elétricos com risco de acidentes - Eletricistas, cabistas, montadores e outros; Classificação - Perigoso; Tempo e Trabalho Mínimo - 25 anos; Observações - Jornada normal ou especial fixada em lei em serviços expostos a tensão superior a 250 volts.
Dessa forma, com exceção do engenheiro elétrico, que possui enquadramento por categoria profissional até 28/04/1995 (código 2.1.1), as demais profissões demandam a comprovação da exposição a alta tensão.
Assim, não há que se falar em enquadramento por categoria profissional e, ainda, não basta a simples menção à eletricidade nos formulários, sendo necessário comprovar que havia o perigo de exposição à tensão superior a 250 volts, no desempenho da atividade.
Nessa linha de intelecção, precedente desta C. Nona Turma:
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. ELETRICIDADE E RUÍDO. ENQUADRAMENTO POR CATEGORIA ATÉ 29.04.1995. ESPECIALIDADE COMPROVADA. PPP. REGULARIDADE. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS DA JUSTIÇA FEDERAL. JUROS DE MORA A PARTIR DA CITAÇÃO. MAJORAÇÃO RECURSAL. (...) - Atividade de eletricista em razão da exposição a eletricidade é prevista como insalubre no item 1.1.8 do Decreto nº. 53.831/64. Após 29.04.1995, somente pode ser reconhecida a especialidade desde que comprovada a exposição a tensões elétricas superiores a 250 volts. – PPP’s e demais formulários previdenciários juntados aos autos que comprovam de maneira inequívoca a especialidade dos períodos pleiteados diante da exposição a agentes agressivos. (...) (TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5002184-22.2019.4.03.6121, Rel. Desembargador(a) Federal CRISTINA NASCIMENTO DE MELO, julgado em 08/08/2024, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 14/08/2024)
A despeito de não haver nos Decretos 2.172/1997 e 3.048/1999, e no anexo II, do Decreto n. 83.080/1979, previsão expressa quanto à nocividade da eletricidade, o caráter exemplificativo atribuído às referidas normas permite o reconhecimento da especialidade do labor desenvolvido com exposição à eletricidade média superior a 250 volts, após 05/03/1997.
Ademais, a Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos e o código 1.1.3 (campo "radiações"), da OF/MPAS/SPS/GAB 95/96, permitem reconhecer a natureza nociva do agente eletricidade.
Nesse sentido, o Tema 534/STJ:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ATIVIDADE ESPECIAL AGENTE ELETRICIDADE. SUPRESSÃO PELO DECRETO 2.172/1997 (ANEXO IV). ARTS. 57 E 58 DA LEI 8.213/1991. ROL DE ATIVIDADES E AGENTES NOCIVOS. CARÁTER EXEMPLIFICATIVO. AGENTES PREJUDICIAIS NÃO PREVISTOS. REQUISITOS PARA CARACTERIZAÇÃO. SUPORTE TÉCNICO MÉDICO E JURÍDICO. EXPOSIÇÃO PERMANENTE, NÃO OCASIONAL NEM INTERMITENTE (ART. 57, § 3º, DA LEI 8.213/1991). (...) 2. À luz da interpretação sistemática, as normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991). Precedentes do STJ. (...) Cumpre registrar que, cuidando-se de sujeição à eletricidade (atividade periculosa), é ínsito o risco potencial de acidente, não se exigindo a exposição permanente a tensões acima do patamar de 250 volts, conforme jurisprudência desta C. Nona Turma e E. Tribunal (TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5017654-04.2019.4.03.6183, Juiz Federal convocado JOSE DENILSON BRANCO, julgado em 18/07/2024, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 24/07/2024).
No caso, o período de 13/09/2010 a 04/03/2020, em que o autor exerceu a função de oficial eletricista de linha morta na empresa Renascer Construções Elétricas Eireli, encontra respaldo probatório consistente para o reconhecimento da especialidade. O laudo técnico pericial produzido em juízo demonstra que o segurado esteve exposto à eletricidade de alta tensão, situação que caracteriza periculosidade nos termos da NR-16 e da legislação aplicável. O perito judicial, em análise detalhada e atual, embasada em visita técnica, confirmou as condições de risco, de modo que restou comprovado o exercício de atividade em condições especiais.
Diante disso, entendo desnecessária nova fundamentação, adotando integralmente os fundamentos da decisão agravada como razões de decidir, os quais permanecem hígidos.
Dispositivo
Posto isto, voto por NEGAR PROVIMENTO ao agravo interno interposto pelo INSS.
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO CÍVEL. ATIVIDADE ESPECIAL. ELETRICIDADE. POSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO APÓS 05/03/1997. ROL DE AGENTES NOCIVOS DECRETOS Nº 2.172/1997 E 3.048/1999. CARÁTER EXEMPLIFICATIVO. INAPLICABILIDADE DO SOBRESTAMENTO (TEMA 1209/STF). DECISÃO MONOCRÁTICA. LEGALIDADE. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
I. CASO EM EXAME
- Trata-se de agravo interno interposto pelo INSS contra decisão que, em sede de apelação, reconheceu a especialidade das atividades exercidas pelo autor no período de 13/09/2010 a 04/03/2020, sob exposição habitual e permanente à eletricidade, para fins de aposentadoria por tempo de contribuição mediante reafirmação da DER.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
- Há duas questões em discussão: (i) definir se é possível o reconhecimento da atividade especial em razão da exposição ao agente eletricidade após 05/03/1997, diante da supressão da periculosidade pelo Decreto nº 2.172/1997; (ii) estabelecer se o processo deve ser sobrestado até o julgamento definitivo do Tema 1209 da repercussão geral pelo Supremo Tribunal Federal.
III. RAZÕES DE DECIDIR
- O agravo interno é admissível, sendo legítima a decisão monocrática proferida pelo relator, que encontra respaldo no CPC/2015 e não ofende o princípio da colegialidade, conforme jurisprudência consolidada do STJ (AgInt no REsp 1.831.566/PR).
- O Tema 1209/STF restringe-se ao reconhecimento da atividade de vigilante como especial, em razão da periculosidade, e não se aplica indistintamente a outras categorias profissionais, como eletricistas. Não há determinação da Suprema Corte de sobrestamento de feitos que discutam risco elétrico.
- A eletricidade, prevista no item 1.1.8 do Decreto nº 53.831/1964, mantém-se como agente perigoso apto a ensejar o reconhecimento de tempo especial, desde que demonstrada a exposição a tensão superior a 250 volts.
- O caráter exemplificativo do rol de agentes nocivos dos Decretos nº 2.172/1997 e 3.048/1999, conforme entendimento pacificado no Tema 534/STJ, autoriza o reconhecimento da especialidade por exposição à eletricidade após 05/03/1997, desde que comprovadas condições permanentes, não ocasionais nem intermitentes (Lei 8.213/91, art. 57, § 3º).
- No caso concreto, laudo pericial judicial confirmou a exposição habitual e permanente do autor a altas tensões, nos termos da NR-16, circunstância suficiente para manter o enquadramento da atividade como especial.
IV. DISPOSITIVO
- Agravo interno desprovido.
ACÓRDÃO
Desembargadora Federal
